O jovem, o estatuto da juventude e a EC 65/2010

Resumo: Discute as primeiras impressões acerca do tratamento constitucional e legislativo da Juventude no Brasil (EC 65/2010 e Projeto de Lei 4.529/04). Busca em especial, apontar a promoção da cidadania e da autonomia juvenil, afastando-se da tradição dos estatutos brasileiros de vulnerabilidade e proteção.


Palavras-chave: Juventude. Estatuto. Autonomia. Cidadania. Vulnerabilidade.


Sumário: 1. Introdução. 2. Conceito legal. 3. Vulnerabilidade, proteção e autonomia juvenil. 4. Emenda constitucional. 5. Conclusão. Referências bibliográficas.


“O jovem no Brasil nunca é levado a sério.” (Não é Sério. Chorão, Champignon, Pelado, e Negra Li)


1. Introdução


Pode-se conceituar a juventude como a última etapa do processo de socialização da pessoa humana, consubstanciada no afrouxamento da relação parental-filial e na consolidação das responsabilidades e vínculos sociais. Seja através da universidade, do trabalho ou (infelizes casos!) da criminalidade, o jovem sai de casa (conotativo ou denotativamente) e vai para o âmbito público.


A EC65/10 e o Projeto de Lei 4.529/04[i] são os trabalhos legislativos cuja função é tutelar com especificidade os direitos do jovem. Certamente trarão muitas questões ao direito brasileiro em todos os seus campos (Trabalho, Crime, Família, Público, etc.). Dotados de humildade acadêmica necessária ao trato das questões novas do direito, procuraremos tratar de algumas dúvidas que se apresentam preliminarmente.


Quem pode ser compreendido como “jovem” para a proteção jurídica? Em qual sentido é possível falar em proteção ao jovem? Qual o papel da juventude na construção de seus próprios direitos e deveres? O que se pode esperar para o futuro? Qual a eficácia da EC 65/2010?


2. Conceito legal


Naturalmente, em se tratando de uma sociedade plural, a que se pretende a brasileira, é impossível construir um conceito de juventude partindo de aspectos da personalidade. Muito embora o senso comum estabeleça alguns traços – a (des)construção das utopias, a tendência ao questionamento dos valores moralmente construídos, etc. – são tão genéricos e polissêmicos que pouco ajudam na construção de uma definição jurídica do que vem a ser a juventude.


Uma tradição brasileira, como do direito romano-germânico em geral, é a definição mediante critérios etários objetivos (assim o ECA, o Estatuto do Idoso e o CC na regulação das capacidades). Dessa forma é aconselhável que o Legislador mantenha este costume, até por unidade do sistema. O conceito de juventude, portanto, há de ter por definidor a idade.


A EC 65/210 não estipulou esta faixa etária, mas já é possível ter como vigorante os direitos ali previstos a todas as pessoas compreendidas entre 15 e 24 anos. Isso porque a ONU indicou as idades de 15 a 24 anos como um conceito médio de juventude. É verdade que na mesma oportunidade, as Nações Unidas admitiram que cada país pode adotar uma faixa jovem diferenciada[ii]. No entanto, enquanto o Brasil não legisla qual seria a sua faixa jovem, deve-se aplicar analogicamente a das nações unidas, para que não se permita a um direito constitucional padecer de ineficácia por ausência de conceito.


Aconselha-se, no entanto, que o Brasil estabeleça seu próprio enquadramento de juventude.


Segundo a doutrina, pode-se definir a faixa jovem brasileira entre os 18 e 24 anos, evitando-se contra-senso com o conceito de adolescentes. Ademais, é a idade de 18 anos que normalmente marca o fechamento do ensino médio e a entrada no mercado de trabalho e/ou na universidade, além de coincidir com a conquista da capacidade civil, criminal, aos direitos políticos passivos, a habilitação de trânsito, etc. Ou seja, a idade de 18 anos no Brasil é um marco bastante considerável no desenvolvimento pessoal, significando mesmo a concepção de assunção plena da diretiva pessoal pelo próprio indivíduo. Preserva-se dessa forma a unidade do sistema em benefício, inclusive, da compreensão social sobre os direitos e deveres do jovem.


Esta posição é defendida por Jorge Barrientos-Parra:


“O reconhecimento da ONU de que o termo juventude é variável em todo o mundo abre espaço para que no Brasil adotemos uma definição que reflita nossa realidade. Nesse sentido, propomos que se considere como jovem as pessoas com idade entre 18 e 25 anos.


Para todos os efeitos jurídicos, essa conceituação, de um lado, tem a vantagem de não conflitar com o Estatuto da Criança e do Adolescente e, de outro, incorpora conceitos consagrados no Código Civil de 2002 como o de menoridade, que cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civi”l.[iii]  


No entanto, o Projeto do Estatuto da Juventude, em tramitação no Congresso, adotou definição mais ampla do que ONU:


“Art. 1º Esta lei institui o Estatuto da Juventude destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade entre quinze e vinte e nove anos, sem prejuízo do disposto na Lei nº 8.069, de 12 de julho de 1990 e dos demais diplomas legais pertinentes.”


Dessa forma, se o Estatuto da Juventude entrar em vigor na forma como no Projeto de Lei 4.529/04, serão caracterizados como jovens as pessoas entre 15 e 29 anos, o que inclui mais de 20% da população brasileira[iv].


A partir desta norma, as pessoas entre 15 e 18 anos estarão sobre um duplo estatuto de proteção, enquanto adolescentes (ECA) e enquanto jovens. Importante afirmar que pela leitura do Projeto não se depara com direitos conflitantes nos dois estatutos, podendo afirmar que haverá unicamente uma ampliação de direitos e leve diferenciação do tratamento dos jovens incapazes.


É bem neste a justificação legislativa, redigida pelo Deputado Benjamim Maranhão:


“Um dos pontos controvertidos, por exemplo, é a conceituação do termo juventude. Porém não tivemos outro caminho que não fosse o aspecto cronológico para caracterizá-la, o que fizemos por meio da fixação de uma faixa etária compreendida entre 15 e 29 anos. Essa escolha, todavia, não conflitará como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), aprovado pela Lei no 8.069, de 12 de julho de 1990, que dispõe sobre a proteção de adolescente, definida nessa lei como pessoa entre 12 e 18 anos de idade, na medida em que não estabelece o mesmo tratamento dado nesse diploma. Para a faixa etária contemplada no ECA, o Estatuto da Juventude disporá sobre direitos suplementares ainda não assegurados aos jovens entre 15 e 18 anos.”


Nesse ínterim cabe-nos elogiar a previsão estatutária. Ao incluir como jovens os adolescentes entre 15 e 18 anos há de provocar uma releitura das responsabilidades e da autonomia dos incapazes.


De fato, a sociedade contemporânea convive com adolescentes afinados aos meios de comunicação global e lidando com questões muito próximas da vivenciadas pelos adultos, como a preocupação com a profissionalização. Além de se ter que ressaltar a maior participação nas atividades esportivas e artísticas, de forma que o precoce jovem tem sido protagonista na sociedade, na opinião pública e, infelizmente, na criminalidade.


O ECA não trata deste adolescente, com a devida responsabilização e autonomia. Erro que o Estatuto da Juventude pode socorrer. É esta a oportunidade de o Judiciário, o Ministério Público e a sociedade abandonar o vício de infantilizar e vitimizar o jovem adolescente.


Incapacidade jurídica não pode mais significar irresponsabilidade e ausência de autonomia e nesse ponto é de se elogiar o legislador na configuração da juventude desde os 15 anos.


É imperioso ressaltar que o Estatuto da Juventude, em uma série de dispositivos trabalha a promoção da participação juvenil na sociedade e na política através da promoção de grupos organizados e nas manifestações populares, como ainda se verá. A autonomia e a cidadania são características marcantes do Estatuto da Juventude, diferente do ECA mais pautada na proteção de vulneráveis. O próximo tópico tecerá maiores comentários.


Uma primeira conclusão é que a EC 65/2010, já em vigor, deve lançar seu rol de proteção sobre toda pessoa compreendida na faixa etária de 15 a 24 anos, adotando-se o conceito de juventude explicitado pela ONU, tapando a lacuna provisória do direito interno. Não obstante é de se aguardar a criação de uma faixa jovem tipicamente brasileira pelo Estatuto da Juventude, em que, possivelmente, há de se caracterizar um imensa gama de pessoas, já que o Projeto de Lei prevê proteção especial a todos entre 15 e 29 anos.


3. Vulnerabilidade, proteção e autonomia juvenil


A proteção integral constitucional e a promulgação de um estatuto de tutela especial aos jovens, não pode significar, nem jurídica, sociológica ou filosoficamente a vulnerabilidade do jovem ou a restrição de autonomia juvenil.


É o jovem quem deve ser o protagonista da defesa dos próprios direitos além de investir-se na vida pública em prol dos direitos alheios.


Em um sem-número de artigos, o Projeto de Lei do Estatuto da Juventude mostra-se centrado neste conceito de juventude muito vinculado a autonomia, ao respeito da tolerância e da pluralidade, e a promoção da responsabilização solidária e individual do jovem.


Os estatutários são convidados ao debate político, tomando frente na administração escolar (art.26 e 30) e ganhando representatividade pública de suas associações, além de consideração das opiniões individuais ou coletivas (Capítulos II e VII).


Trata-se de reconhecimento merecido da importância da participação juvenil no História brasileira. Os “cara pintadas”, a resistência à ditadura militar, as idéias abolicionistas, v.g., estiveram vinculadas a juventude militante. Anda bem o Projeto de Lei quando reafirma o compromisso com a vocação cidadã dos jovens.


Ademais, aliada à pluralidade, outro ponto marcante do Estatuto da Juventude, tem-se o respeito ao direito geral ao livre desenvolvimento da personalidade humana.


Dessa forma, não se permite seja o jovem tratado como vulnerável, carente de proteção paternalista. Tampouco admite-se a substituição do indivíduo na tutela dos próprios direitos[v]. É o jovem (individual ou coletivamente considerado) o protagonista da própria luta, devendo por si só decidir pelo que lutar e o quanto, ao ordenamento cabe ordenar as modalidades do exercício do direito à participação e buscar sustentá-lo.


Insiste-se nesta questão porque é tradição do direito brasileiro utilizar-se de estatutos para proteção de partes consideradas vulneráveis. O ECA, o Estatuto do Idoso e o Estatuto da Mulher Casada tem este ideário. Não se pode confundir, no entanto; o jovem não é vulnerável, é dotado de responsabilidade e capacidade, devendo assim ser tratado pelos Poderes. Teme-se que os aplicadores do Direito, acostumados a tratar os estatutários como vulneráveis, assim o façam aos Jovens ante o Estatuto da Juventude.


Razão pela qual, chama atenção ao art.51 do Estatuto da Juventude. Ao tentar construir um conceito de “jovem em situação de risco”, erige critério quase nenhum de tão abstrato e genérico. Pelo dispositivo, se algum direito reconhecido no Estatuto não estiver sendo respeitado, haverá aí situação de risco; sinceramente, todo jovem está em situação de risco.


A lesão a direito não pode implicar por si só, situação de risco capaz, inclusive, de permitir ao Ministério Público utilizar-se de instrumentos contrários à autonomia juvenil (art.51, III e IV).


Os operadores do direito, em especial o parquet, deverão ter cautela extremada na interpretação e aplicação do artigo. A proteção em demasia por acarretar um efeito colateral gravíssimo, qual seja, a infatilização do jovem.


Claro, há situações de escancarada vulnerabilidade juvenil. Situações em que o vulnerável há de ser substituído, podendo até mesmo ter sua vontade desconsiderada, com toda cautela no entanto, e sem significar o completo esvaziamento de sua personalidade[vi]. São, por exemplo, os casos de alcoolistas, toxicômanos, mulheres vítimas de violência doméstica crônica e violência sexual, deficientes mentais, etc.


Assim, a situação de risco deve ser conceituada como exceção, jamais banalizada.


Sirvam-se os aplicadores do direito de critérios espalhados pelo ordenamento jurídico quando estiver diante do caso concreto. Por exemplo, a toxicomania como determinante de vulnerabilidade encontra respaldo no art.4o, II, do CC. Voltar-se tão somente ao art.51 do Estatuto da Juventude, não será concorde aos direito constitucional da dignidade humana, cujo substrato é também a autonomia privada[vii].


O leitor, neste momento, pode estar questionando qual a razão de uma emenda constitucional e um estatuto da juventude? O questionamento é interessante porque, de fato, a promulgação de um estatuto constrói uma tendência de infantilizar os protegidos entendendo pela vulnerabilidade irresponsável.


Repita-se, no entanto, atenção especial, não significa vulnerabilidade. É possível destinar proteção sem infantilizar. E, de fato, os jovens brasileiros estão carecendo de atenção especial.


A contemporaneidade tem trazidos exemplos correntes de infelizes acontecimentos envolvendo a juventude. A criminalidade, violenta ou não, atinge jovens de todas as classes sociais em bárbaros crimes (vítimas e criminosos). As drogas cada vez mais viciantes constroem uma maça de dependentes e doentes. A gravidez precoce e irresponsável impõe a formação de famílias desequilibradas, econômica e moralmente. As doenças sexualmente transmissíveis tem avançado independente das campanhas governamentais. As dificuldades de alcançar o primeiro emprego, a utopia do nível superior e a carência de cursos técnicos dificultam a ascensão social ou mesmo o alcance da independência ao lar paternos. Tratam-se apenas de exemplos que, a nosso ver, embasam a necessidade de uma atenção especial, mas não de tratar os jovens como vulneráveis.


 Nestes campos a juventude precisa ser contempladas com especial proteção. E é justamente aí que o Estatuto visa cumprir esta lacuna. Por exemplos, o Projeto de Lei prevê linhas de crédito ao jovem empreendedor (art.45), bolsa trabalho (art.41), majoração do ensino técnico (arts.21, 40, I, e 43), a inclusão digital (art.25), o transporte escolar e universitário gratuitos (art.24). O combate as doenças sexualmente transmissíveis e a gravidez precoce é de ocorrer através da orientação, habilitação dos profissionais de saúde e educação, associação com demais grupos da sociedade civil (Igrejas, escolas e empresas) e limitação da livre iniciativa (art.16 e 17)[viii].  


Todas essas práticas, no entanto, demandam custos. O Estatuto da Juventude, talvez para conquistar aprovação mais rápida, não trabalha a divisão de competências entre os entes federados para implantação desses direitos, nem informa sobre dotações orçamentárias. Obviamente o regramento constitucional das competências e orçamento público são todo aplicáveis, mas alguns dos instrumentos de proteção mereciam regramento específico especialmente para fugir do empurra-empurra de competência que somente garante a ineficácia dos direitos[ix].


Um exemplo é o direito ao transporte escolar universitário. A competência dos transportes rodoviários municipais é do Município intermunicipais (art.30, V, CF), mas quanto a educação universitária é prioritariamente competência da União (art.211, CF). Qual desses critérios de competência regularizará o transporte escolar universitário? Poderá ser uma dúvida aparenta levantada para justificar a não realização do direito. Mais grave será o caso dos estudantes que dependerem de transporte intermunicipal.


Muitas outras dúvidas poderão ser levantadas pelo Estado para não efetivarem os direitos previstos no Estatuto até uma regulamentação. Uma única finalidade, permanecer como se está. Ressalta-se que a norma não afirma que o transporte será gratuito…


4. Emenda constitucional


A emenda constitucional 65/2010 alterou o art.227 da CF, estreando no ordenamento jurídico a preocupação com a juventude e essa é sua principal virtude, além da previsão expressa de promulgação do Estatuto da Juventude.


O texto do artigo fica assim:


“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais, mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos: (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


I – aplicação de percentual dos recursos públicos destinados à saúde na assistência materno-infantil;


II – criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


§ 2º – A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.


 § 3º – O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:


 I – idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;


II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;


III – garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola; (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


IV – garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;


V – obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;


VI – estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;


VII – programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


§ 4º – A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.


§ 5º – A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.


§ 6º – Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.


§ 7º – No atendimento dos direitos da criança e do adolescente levar-se- á em consideração o disposto no art. 204.


§ 8º A lei estabelecerá: (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


I – o estatuto da juventude, destinado a regular os direitos dos jovens; (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)


II – o plano nacional de juventude, de duração decenal, visando à articulação das várias esferas do poder público para a execução de políticas públicas. (Incluído Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010)”


Pelo que se lê, não traz direitos bastante delimitados, mas deve ter sua aplicabilidade imediatamente reconhecida, principalmente quanto ao jovem deficiente, trabalhador-estudante e dependente químico.


Além de significar sério compromisso do Executivo implementar políticas públicas de atendimento dos jovens, ao Judiciário caberá interpretação conforme, por exemplo, das penas da Lei de Drogas (mais interessada na recuperação dos dependentes químicos) da obrigação alimentar e ampliação das pensões previdenciários em caso de jovens universitários após os 21 anos, além de possibilidade em reconhecer o direito ao jovem trabalhador direito a horário especial quando matriculado em instituição de ensino (a exemplo do que já ocorre no setor público).


Ao tempo caberá construir a eficácia jurídica da EC 65/2010 quando os casos concretos começarem a se apresentar ao Judiciário.


5. Conclusão


A guisa de conclusão é preciso questionar o quanto significa mais uma Emenda Constitucional e mais um estatuto para o Brasil, a um povo inflado de direitos ocos e promessas que não se cumpre. De fato, pode ser só mais uma inovação legislativa que afastasse a carta constitucional da realidade da gente.


Talvez a juventude permaneça violentada e violenta, presa em cadeias que não socializam, mais garantem a perpetuação dos vícios, da ignorância, dos preconceitos e da falta de oportunidade, enganada em escolas cuja educação não é capaz de profissionalizar tampouco de garantir um mínimo de cultura ou cidadania, atordoados por empregos de base e sem remuneração, continue a política restrita às Casas de Legisladores e aos gabinetes, sem conexão com a população jovem, amesquinhada pela polícia em geral pronta para encerrar manifestações públicas como se crime fossem.


Não nos parece ser este o caso do Estatuto da Juventude. A leitura do Projeto de Lei demonstra que o Legislador está consciente de que o Estatuto sem o compromisso dos jovens será só texto sem razão. Sábio reconhece que a cidadania efetiva é que efetivará os direitos estatuídos.


Cabe a juventude buscar a efetivação dos direitos previstos e ao tempo construir nos fatos os direitos previstos nos papéis. De fato, a cidadania previstas no Estatuto não compadece dos jovens que se exoneram da missão de participar na produção dos próprios direitos.


Este estudo é, antes de tudo, um primeiro passo na sala escura de um Projeto de Lei, ainda sem texto definitivo quanto menos aplicação efetiva, na labuta pela concretização dos direitos juvenis. É uma esperança compromissada, de quem não espera ou já se cansou de só esperar.


 


Referências bibliográficas:

BARCELLOS, Ana Paula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. 3.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011

BARRIENTOS-PARRA, Jorge. O estatuto da juventude: instrumento para o desenvolvimento integral do jovem. Disponível em: <http://www.uje.com.br/estatutodajuventude/arquivos/EstatutodaJuventudecomentado.pdf>. acesso em: 6 ago. 2011.

IBGE. População jovem no Brasil: a dimensão demográfica. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/populacao_jovem_brasil/comentario1.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2011

SARLET, Ingo Wolfgang. Notas sobre a dignidade da pessoa humana na jurisprudência do stf. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Saúde, corpo e autonomia privada. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.

 

Notas:

[i] Os comentários ao Projeto de Lei 4.529/04 é segundo ao texto disponível para download no seguinte endereço <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=271219>, a data de 20 ago. 2011.

[ii] “Como hipótese de trabalho, aceitaremos aqui a definição que a Assembléia Geral da ONU adotou em 1985 para o Ano Internacional da Juventude. Ao subscrever as diretrizes para o planejamento e o acompanhamento das questões atinentes à juventude, a Assembléia Geral, para fins estatísticos, definiu como jovens as pessoas entre os 15 e os 24 anos, sem prejuízo de outras definições de Estados Membros.

Posteriormente, quando a mesma Assembléia aprovou o Programa Mundial de Ação para a Juventude para além do ano 2000, reiterou que definia a juventude como sendo a faixa etária 15-24. No entanto, acrescentou que, “para além dessa definição estatística, o sentido do termo juventude variava em todo o mundo e que as definições de juventude haviam mudado continuamente como resposta a flutuações das circunstâncias políticas, econômicas e socioculturais”. (BARRIENTOS-PARRA, Jorge. O estatuto da juventude: instrumento para o desenvolvimento integral do jovem. Disponível em: <http://www.uje.com.br/estatutodajuventude/arquivos/EstatutodaJuventudecomentado.pdf>. acesso em: 6 ago. 2011. p. 133)

[iii] BARRIENTOS-PARRA, Jorge. O estatuto da juventude: instrumento para o desenvolvimento integral do jovem. Disponível em: <http://www.uje.com.br/estatutodajuventude/arquivos/EstatutodaJuventudecomentado.pdf>. acesso em: 6 ago. 2011. p.133.

[iv] Segundo dados do IBGE, em 1996 a população brasileira de faixa etária entre 15 a 24 anos é de 20%. IBGE. População jovem no Brasil: a dimensão demográfica. Disponível em: < http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/populacao_jovem_brasil/comentario1.pdf>. Acesso em: 6 ago. 2011.

[v] Aqui não se levanta críticas à democracia representativa e à tutela de direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos por  meio de ações coletivas. São estes mecanismos de participação popular, inclusive juvenil. Entremeios, mesmo com o Estatuto da Juventude, o país ainda está longe de conceber uma democracia representativa efetivamente democrática, ou seja, com participação qualificada dos cidadãos. Defendemos, não neste texto, a valorização da democracia participativa e das instituições de grupos, afinal, em uma sociedade em que tudo muda tão rápido, é questionável se o voto legitima uma representação por extensos quatro anos.

[vi] Estuda com clareza o tratamento digno da pessoa em situação de vulnerabilidade: TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Saúde, corpo e autonomia privada. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.

[vii] A dignidade, dentre outras implicações, faz“[…] propiciar e promover sua [da pessoa] participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a teia da vida ” (SARLET, Ingo Wolfgang. Notas sobre a dignidade da pessoa humana na jurisprudência do stf. In. SARMENTO, Daniel; SARLET, Ingo Wolfgang. Direitos fundamentais no supremo tribunal federal: balanço e crítica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p.51.)

[viii] O Estatuto da Juventude escolheu a sigla SIDA ao invés de AIDS. Criticamos a opção terminológica do legislador, já que o termo americanizado é mais difundido no Brasil, inclusive sendo o adotado pelas políticas e campanhas públicas, livros didáticos e pela mídia em geral.

[ix] Levantando o problema e indicando solução para o problema da ineficácia da implementação de direitos pelo empurra-empurra de competências: BARCELLOS, Ana Paula. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. 3.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.


Informações Sobre o Autor

Ricardo Henriques Pereira Amorim

Advogado. Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Graduado pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce (FADIVALE).


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