Homologação e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras no Brasil

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Resumo: O excesso de ações judiciais no país, a falta de juízes para atender o crescimento das demandas por prestação jurisdicional, a imprevisibilidade dos julgados e a demora dos processos judiciais são algumas das razões que fazem com que principalmente grandes corporações busquem a arbitragem; além disso, a necessidade de árbitros com conhecimentos mais técnicos do que jurídicos contribuem também para as partes optarem pela arbitragem para a solução de controvérsias.


Palavras-chave: Homologação. Execução. Sentenças arbitrais estrangeiras. 


Abstract: The excess of lawsuits in the country, the lack of judges to meet the growing demands for adjudication, the unpredictability of trial and delay of court proceedings are some reasons that make mainly large corporations seek arbitration, in addition, the need for referees with more technical knowledge than legal parts also contribute to opt for arbitration for the settlement of disputes.


Keywords: Homologation. Execution. Foreign arbitral awards.


Sumário: 1. Introdução. 2. Homologação e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras no Brasil. 3. Conclusão. Referências bibliográficas.


1. Introdução


A homologação de sentença arbitral é um fenômeno dos tempos modernos. Uma consequência das transações comerciais e negociais internacionais. É uma necessidade das grandes corporações econômicas com a finalidade de solucionar suas lides e por em termos legais e legítimos seus interesses particulares.


2. Homologação e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras no Brasil


Quanto maior o grau de desenvolvimento de um país mais freqüentemente se observa o uso de procedimento alternativo de solução de controvérsias, motivado prioritariamente, pela disposição cultural e econômica das pessoas e das organizações privadas de alguns países, como acontece nos Estados Unidos da América.


O processo judicial apesar de útil e estar investido sob a tutela estatal com juízes qualificados em julgar, vem sendo visto como de encontro às necessidades econômicas e estruturais de um mundo essencialmente capitalista. Esses são os argumentos dos defensores da idéias alternativistas para o julgamento dos litígios, em especial, no âmbito internacional.


A constante evolução das relações negociais e comerciais que se transformam continuamente advêm como um reflexo do processo de globalização das transações econômicas e financeiras entre empresas multinacionais ou transnacionais sediadas nos diversos países do mundo.


A rapidez como os acordos são realizados, como as mercadorias circulam e como a riqueza é transferida de um lugar para outro constantemente, exige que eventuais conflitos sejam solucionados em tempo hábil.


A arbitragem almeja ser um instrumento em consonância com o dinamismo da economia de mercado, tornando-se um dos procedimentos de maior aceitação no mundo das transações comerciais. O instituto está diretamente ligado ao direito que rege o comércio internacional e o direito internacional público e privado.


O cumprimento da sentença arbitral estrangeira geralmente é feito de forma voluntária, visto que essas decisões por terem caráter privado se compõem de um grande ônus pecuniário para a parte que negligência ou descumpre com das obrigações firmadas na sentença. No entanto, em várias situações cotidianas envolvendo matéria decidida em sentença arbitral foram constatadas, com uma frequência razoável, o descumprimento da decisão arbitral.


Nesse caso, a parte credora deve pleitear a homologação da sentença arbitral para que seja reconhecida junto ao órgão judiciário competente do país destinatário da execução a obrigação. A ratificação e análise da sentença arbitral, após cumpridos os seus requisitos essenciais, torna-se existente e válida no território do país destinatário e, com isso, a parte já pode exigir a produzir dos seus efeitos executivos necessários.


Como já estudado, a Emenda Constitucional n. 45, dentre as inúmeras inovações incorporadas junto ao ordenamento jurídico brasileiro, alterou a competência do Supremo Tribunal Federal para o Superior Tribunal de Justiça reconhecer e homologar sentenças estrangeiras (inclusive as proferidas por árbitros), bem como a concessão do exequatur às cartas rogatórias alienígenas. Visando regulamentar tal procedimento, o STJ estabeleceu várias resoluções internas até chegar à resolução atual, número 9 de 04 de maio de 2005, salientando-se que elas vão perdurar até que se estabeleça um regimento interno próprio para tal finalidade. No entanto, muito embora se tenha alterado a competência, persiste, por outro lado, algumas normas legislativas, vale dizer, a Lei de arbitragem brasileira – 9307/96 -, bem como alguns dispositivos do CPC, mesmo diante da alteração de alguns de seus dispositivos.


Anteriormente à Lei de Arbitragem, o sistema vigente de reconhecimento de sentenças arbitrais alienígenas era o de dupla homologação. A sentença deveria ser sancionada pelo órgão judiciário competente no seu país de origem para, posteriormente, ser homologada pelo órgão judiciário competente brasileiro.


Coerentemente, o legislador acabou com essa necessidade e, para essa mesma sentença ser reconhecida ou executada, basta, tão somente, sua homologação, a princípio, pelo Superior Tribunal de Justiça.


Assim, as mesmas razões que justificam a aplicação extraterritorial da lei estrangeira dão suporte ao reconhecimento das sentenças, estatais ou arbitrais, provenientes de outros países[1].


O artigo 34 da Lei n.9307/96 dispõe que:


                         


“A sentença arbitral estrangeira será reconhecida ou executada no Brasil de conformidade com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento interno e, na sua ausência, estritamente de acordo com os termos desta Lei.


Parágrafo único. Considera-se sentença arbitral estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional.”


Em seguida, o artigo 35 da referida lei determina:


“Para ser reconhecida ou executada no Brasil, sentença arbitral estrangeira está sujeita, unicamente, à homologação do Supremo Tribunal Federal.”


Assim, se verifica que o espírito da lei arbitral foi o de facilitar, aperfeiçoar e promover o intercâmbio jurídico junto à comunidade internacional.


No caso brasileiro, após a entrada em vigor da respectiva Lei de Arbitragem, verifica-se que foi adotado o sistema territorialista ou monista[2], de tal sorte que, são consideradas sentenças arbitrais nacionais aquelas proferidas em território nacional. Destarte, serão sentenças arbitrais estrangeiras quando forem prolatadas fora de nosso território, posto que a redação do parágrafo único do art. 34 da Lei de arbitragem dispõe que “Considera-se sentença arbitral estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional“.


O preceito encontra ressonância nos requisitos do compromisso e da cláusula arbitral cheia, na exata medida em que o art. 10, IV, da Lei de Arbitragem, exige, sob pena de nulidade (art. 32, I), que a sentença decline o local em que será proferida a sentença.[3]


A prova da convenção de arbitragem é requisito indispensável à homologação do laudo arbitral.


Neste sentido, em recente decisão o Superior Tribunal de Justiça asseverou que:


“Sentença estrangeira contestada. Juízo arbitral. Ausência de prova quanto a sua eleição. Artigo 37, inciso II, da Lei n. 9.307/1996. I – Não trazida aos autos a prova da convenção de arbitragem, não é possível homologar-se laudo arbitral. II – Observância à norma contida no inciso II do artigo 37 da Lei n. 9.307/1996. III – Pedido homologatório indeferido”. (Sentença Estrangeira Contestada n. 885-EX (2005/0034898-7) Rel. Ministro Francisco Falcão, DJ. 03.12.2010).


Nesta ordem, o princípio da autonomia da vontade, que fundamenta a liberdade de as partes elegerem o foro (jurisdição) para solução de suas controvérsias contratuais, tem sido amplamente utilizado nas relações comerciais internacionais, e deve ser respeitado pelos tribunais, elevando o grau de segurança jurídica nas contratações internacionais.


Como acima citado, a atual jurisprudência dos tribunais superiores tem conhecido e permitido no Brasil a escolha do foro na jurisdição internacional.


A jurisprudência até então firmada, era vacilante[4], a despeito de decisão autorizativa do STF na década de 50[5].


Na perspectiva do direito comparado, verifica-se que há inúmeros países que desde há muito admitem a eleição do foro pela vontade das partes. Na Inglaterra, as cláusulas de eleição de foro são válidas desde o final do século XVIII; nos Estados Unidos, a Suprema Corte passou a admiti-la na década de 1970; na França, desde a década de 1930, e, na Itália, com a lei de direito internacional privado de 1995. No âmbito do espaço europeu, a autonomia da vontade para escolha de jurisdição é admitida desde 1968, com a Convenção de Bruxelas, estando atualmente disciplinada pelo Regulamento (CE) n.º 44/2001.


Observa-se marcante incoerência entre as disposições da Lei de Arbitragem – segundo a qual as partes são livres para resolver os litígios decorrentes de seu contrato mediante arbitragem – e a ineficácia de cláusula de eleição de foro ou jurisdição internacional. Sendo as partes livres para excluir por inteiro a jurisdição estatal em prol da jurisdição arbitral, não se justifica que não possam excluir determinada jurisdição estatal, em prol de jurisdição estatal estrangeira de sua mútua preferência.


Dessa forma, se a lei brasileira eximiu-se de definir arbitragem internacional, punctum dolens enfrentado com evidente dificuldade por outras leis sobre arbitragem (como, p. ex., a Lei Modelo da Uncitral[6] e a da França), esbarrou em problema de igual dificuldade ao defrontar-se com a tarefa de definir a sentença arbitral estrangeira.


Isto porque desprezou a fórmula consagrada em direito comparado, de identificar a nacionalidade da sentença arbitral segundo o país eleito como sede da arbitragem, preferindo adotar o chamado “critério geográfico“, que determina a nacionalidade da sentença arbitral segundo o país em cujo território foi a sentença proferida.


Por outro lado, a legislação brasileira ao adotar o sistema “territorialista” na concessão da nacionalidade a uma sentença arbitral estrangeira, acompanhou o modelo adotado pela ley de Arbitrage espanhola e aquele modelo preconizado pela Convenção de Nova Iorque (1958), salientando-se que, o Brasil ratificou inúmeras convenções e acordos internacionais que tratam da matéria, a saber: a Convenção Interamericana de Arbitragem Comercial Internacional (Panamá, 1975), Decreto n. 1.902/96, a Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial de Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros (Montevidéu, 1979), Decreto n. 2.411/97, a CNI acima mencionada, Decreto n. 4.311/02, o Protocolo de Las Leñas[7], Decreto n. 2067/1996 e, mais recentemente, o Acordo sobre Arbitragem Comercial Internacional do Mercosul[8] (Buenos Aires, 1998), Decreto n. 4.719/03.


Neste ponto, válido lembrar que a Convenção sobre o Reconhecimento e Execução de Laudos é uma das mais bem sucedidas experiências de uniformização jurídica pela via convencional – não a afastaram de interpretações divergentes de relevantes consequências, em especial, daquela acerca dos arts. V, § 1.°, e, e VII, §


1.°, nos quais se lê:


“Art. V


1.° reconhecimento e a execução de uma sentença poderão ser indeferidos, a pedido da parte contra a qual ela é invocada, unicamente se esta parte fornecer, à autoridade competente onde se tenciona o reconhecimento e a execução, prova de que: […] e) a sentença ainda não se tornou obrigatória para as partes ou foi anulada ou suspensa por autoridade competente do país em que, ou conforme a lei do qual, a sentença tenha sido proferida.[9]


Art. VII


1. As disposições da presente Convenção não afetarão a validade de acordos multilaterais ou bilaterais relativos ao reconhecimento e à execução de sentenças arbitrais celebrados pelos Estados signatários nem privarão qualquer parte interessada de qualquer direito que ela possa ter de valer-se de uma sentença arbitral da maneira e na medida permitidas pela lei ou pelos tratados do país em que a sentença é invocada”.[10]


Como já tratado por várias obras e juristas, bem como da análise do instituto desde a promulgação da Lei 9.307/96[11], é de fácil apreensão que a arbitragem avançou muito em nossa sociedade, seja pela sua utilização como meio alternativo de solução de conflitos, seja como valoroso meio de pacificação social e acesso à justiça, máxime ainda tenha muito a crescer e se desenvolver.


Quanto à competência do Superior Tribunal de Justiça no que tange ao reconhecimento e homologação de sentenças estrangeiras, estatais ou privadas, a Emenda Constitucional n. 45, como dito anteriormente, veio tratar justamente daquelas proferidas em solo estrangeiro, o que, conforme a lei de arbitragem brasileira, confere às mesmas um caráter alienígena.


A homologação é o ato pelo qual o Poder Judiciário Brasileiro uma vez provocado por pedido se manifesta por sentença constitutiva, visando, dar e ou conferir à sentença estrangeira[12] executoriedade no território nacional.


Entre nós vigora a possibilidade de homologação pelo STJ sem a necessidade de prévia homologação no país de origem (o sistema da double exequatur, que não foi adotado entre nós, exige a prévia homologação no Estado de origem).[13]


Assim, antes da Lei 9.307/96, exigia-se a dupla homologação, mais um elemento de dificuldade para a validade dessas sentenças no território nacional, distorção que foi corrigida pela Lei de Arbitragem, vez que existiam países que não contavam, nos seus sistemas jurídicos, com a possibilidade de homologação da sentença arbitral – como Portugal e Espanha -, o que inviabilizava por completo a nacionalização das decisões lá proferidas.


Quanto aos pressupostos visando o reconhecimento, a Emenda Constitucional n. 45 em nada alterou aqueles já previstos pela Lei de Arbitragem, Convenção de Nova Iorque de 1958, na Convenção do Panamá 1975 ou, ainda, no  Protocolo de Las Leñas de 1992.


Porém, tanto o seu procedimento no STJ como o entendimento de questões anteriormente consolidadas na jurisprudência do STF já sofreram algumas sensíveis modificações.


Sob tal prisma, a homologação de sentença arbitral estrangeira seguirá idêntico procedimento para homologação de sentença judicial.


O Brasil desde o ano de 2002 (Dec. 4.311) ratificou a Convenção de Nova Iorque[14], acima citada, a qual concede aos países signatários a execução imediata de suas sentenças arbitrais no país.


A aplicabilidade da Convenção de Nova Iorque em pleitos que tratam da homologação de sentença estrangeira é acolhida pelos Tribunais.[15]


Em verdade, a lei brasileira de arbitragem, tendo incorporado o artigo V da Convenção de Nova Iorque, gerou a inversão do ônus da prova (cabe ao demandado provar que a sentença não tem condições de ser homologada) e revolucionou nas condições para a concessão da homologação (principio da eficácia máxima), o que influenciará na escolha do Brasil como sede de procedimentos arbitrais internacionais[16].


Neste diapasão, no tocante a defesa apresentada, segundo as disposições do artigo 9° e seus parágrafos da Resolução n. 09 do STJ e igualmente como ocorre no procedimento de homologação de sentenças judiciais estrangeiras, aquela somente poderá versar sobre autenticidade dos documentos, inteligência da decisão e observância dos requisitos desta Resolução, versando-se, por exemplo, sobre questões de forma como a ausência de tradução juramentada, ou de regularidade da arbitragem, como a prova da convenção arbitral ou mesmo ausência de citação do réu.


Nessa medida, em 2005 o próprio STJ decidiu pela impertinência de se alegar na defesa, questões de mérito do laudo arbitral estrangeiro, quando o que se debatia era a viabilidade ou não de seu reconhecimento, como se pode notar nos dizeres do Ministro Celso de Mello ao julgar pela procedência do pedido de homologação de uma sentença arbitral proferida pela câmara arbitral inglesa Liverpool Cotton Association, envolvendo como parte autora uma empresa suíça e como parte demandada um grupo empresarial brasileiro, vejamos:


“Em conclusão, considerando a prática internacional em contratos da espécie, que deve ser sempre relevada, não vejo como desqualificar a existência da Convenção arbitral. A participação da requerida no processo, com a apresentação de razões e a intenção de nomear novo árbitro indica manifestação induvidosa sobre a existência acordada da cláusula compromissória. Quanto ao mais, alcançando a matéria de mérito, é impertinente em homologação de sentença estrangeira” (SE n. 3.407/República Francesa, Pleno, Relator o Ministro Oscar Correa, DJ de 7/12/84; SEC n. 7.473/EU, Pleno, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ de 7/4/95).


No mesmo rumo, a Corte Especial do STJ, por unanimidade, deferiu o pedido de homologação, não se abrindo possibilidade para análise de mérito, nos seguintes termos:


“HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. CAUÇÃO. DESNECESSIDADE. LEI 9.307/96. APLICAÇÃO IMEDIATA.


CONSTITUCIONALIDADE. UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM COMO SOLUÇÃO DE CONFLITOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ORDEM PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DO MÉRITO DA RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL. OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. INEXISTÊNCIA. REGRA DA EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. ART. 20, § 4º DO CPC. PEDIDO DE HOMOLOGAÇÃO DEFERIDO. I – Não é exigível a prestação de caução para o requerimento de homologação de


sentença estrangeira. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. II – A sentença arbitral e sua homologação é regida no Brasil pela Lei nº 9.307/96, sendo a referida Lei de aplicação imediata e constitucional, nos moldes como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal. III – Consoante entendimento desta Corte, não viola a ordem pública brasileira a utilização de arbitragem como meio de solução de conflitos. IV – O controle judicial da homologação da sentença arbitral estrangeira está limitado aos aspectos previstos nos artigos 38 e 39 da Lei nº 9.307/96, não podendo ser apreciado o mérito da relação de direito material afeto ao objeto da sentença homologanda.  Precedentes. V – Não resta configurada a ofensa ao contraditório e à ampla defesa se as requeridas aderiram livremente aos contratos que continham expressamente a cláusula compromissória, bem como tiveram amplo conhecimento da instauração do procedimento arbitral, com a apresentação de considerações preliminares e defesa. VI – A Eg. Corte Especial deste Tribunal já se manifestou no sentido de que a questão referente à discussão acerca da regra da exceção do contrato não cumprido não tem natureza de ordem pública, não se vinculando ao conceito de soberania nacional. Ademais, o tema refere-se especificamente ao mérito da sentença homologanda, sendo inviável sua análise na presente via. VII – O ato homologatório da sentença estrangeira limita-se à análise dos seus requisitos formais. Isto significa dizer que o objeto da delibação na ação de homologação de sentença estrangeira não se confunde com aquele do processo que deu origem à decisão alienígena, não possuindo conteúdo econômico. É no processo de execução, a ser instaurado após a extração da carta de sentença, que poderá haver pretensão de cunho econômico. VIII – Em grande parte dos processos de homologação de sentença estrangeira – mais especificamente aos que se referem a sentença arbitral – o valor atribuído à causa corresponde ao conteúdo econômico da sentença arbitral, geralmente de grande monta. Assim, quando for contestada a homologação, a eventual fixação da verba honorária em percentual sobre o valor da causa pode mostrar-se exacerbada. IX – Na hipótese de sentença estrangeira contestada, por não haver condenação, a fixação da verba honorária deve ocorrer nos moldes do art. 20, § 4º do Código de Processo Civil, devendo ser observadas as alíneas do §3º do referido artigo. Ainda, consoante o entendimento desta Corte, neste caso, não está o julgador adstrito ao percentual fixado no referido §3º. X- Pedido de homologação deferido.” (Corte Especial, SEC 507/EX, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 18.10.2006, DJ 13.11.2006, p. 204).


Os julgados do Superior Tribunal de Justiça de prestigiar as decisões arbitrais, homologando-as sem entrar no seu mérito, reveste-se da maior importância, pois revela consenso, tanto nos argumentos apresentados nos diversos acórdãos, como nas conclusões dos julgamentos, refletindo o pensamento da quase totalidade dos Ministros que integram o tribunal.


De fato, parece haver um consenso entre as várias decisões no sentido de reconhecer, de modo explícito ou implícito, a exata função da homologação, que não pode rever o mérito da sentença arbitral, não se confundindo com as ações de anulação ou de revisão, que têm premissas e requisitos distintos.


Vale lembrar, que a sentença estrangeira não terá eficácia no Brasil sem a prévia homologação pelo Superior Tribunal de Justiça ou por seu Presidente[17], existindo a possibilidade da homologação dos provimentos não judiciais que, pela lei brasileira, teriam natureza de sentença, ressaltando-se ainda que as decisões arbitrais estrangeiras igualmente podem ser homologadas parcialmente.


3. CONCLUSÃO


Como estudado, a homologação de sentença arbitral é um fenômeno dos tempos modernos e uma consequência das transações comerciais e negociais internacionais.


Reconhecemos, assim, que diante da corrente consolidada no Superior Tribunal de Justiça, a arbitragem acabou conquistando uma posição de relevo. Podemos até dizer que essa sedimentação, realizada em aproximados seis anos, revela a grande sensibilidade e a atuação eficaz dos nossos magistrados numa matéria nova, que não tiveram o ensejo de examinar no passado.


Se, em outras épocas, houve quem se referisse ao atraso do direito em relação à economia[18], não só no Brasil como no exterior, podemos afirmar que, ao contrário, hoje a jurisprudência dos tribunais está acompanhando pari passu o aumento do nosso comércio internacional, ciente de que, além de distribuir justiça, tem também a função de garantir a segurança jurídica, considerada como verdadeiro imperativo constitucional, do qual depende o desenvolvimento econômico e social do país.


 


Referências bibliográficas:

ACCIOLY, Hildebrando e SILVA, G. E. do Nascimento. Manual de direito internacional público. 19. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2003.

CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei n. 9307/96. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2005.

CASTRO, Amílcar de. Direito Internacional Privado. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado. Parte Geral. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

KALICHSZTEIN, Juliana. Homologação de Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros no Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2002.

MORAES, Guilherme Pena de. Homologação de sentença estrangeira à luz da jurisprudência do STF. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris. 2002.

SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de Arbitragem. 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

TIBURCIO, Carmem; BARROSO, Luís Roberto. O Direito Internacional Contemporâneo. Estudos em Homenagem ao Professor Jacob Dolinger. 1. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

 

Notas:

[1] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à lei n. 9307/96. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 346.

[2] Definição dada por Selma Lemes, in Arbitragem na Administração Pública. São Paulo: Quartier Latin, 2007.

[3] “Art. 10. Constará, obrigatoriamente, do compromisso arbitral: (…) IV – o lugar em que será proferida a sentença arbitral”.

Art. 32. É nula a sentença arbitral se: I – for nulo o compromisso; (…).

[4] Em sentido favorável à eleição de foro: Recurso Especial n. 242.383/SP, STJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 03/02/2005; Recurso Especial n. 505.208/AM, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 19/08/2003. Em sentido contrário à eleição de foro: Recurso Especial n. 804.306/SP, STJ , Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 19/08/2008; Recurso Especial nº 251.438, Rel. Min. Barros Monteiro, j.08/08/2000; Ação Rescisória n. 133/RS, Rel. Min. Cláudio Santos, j. 30/08/1989; Recurso Extraordinário n. 34.606/DF. Rel. Min. Luiz Gallotti, j. 05/12/1957 Recurso Extraordinário n. 18.615/DF, Rel. Min. Antonio Villas Boas, j. 21/06/1957.

[5] Recurso Extraordinário n. 30.636/DF, Rel. Min. Candido Motta, j. 24/01/1957.

[6] Uncitral é a sigla do órgão da ONU denominado United Nations Commission on International Trade Law, que muito tem contribuído para o desenvolvimento da arbitragem internacional. A Lei Modelo, elaborada pela Uncitral, foi aprovada pela Assembléia Geral da ONU em 11.12.1985, com a recomendação de que os países membros a levassem na devida consideração para se atingir a desejada uniformidade das leis sobre arbitragem. Vide o item 10 do nosso artigo Uma introdução à arbitragem internacional, publicado na obra coordenada por Ricardo Ramalho Almeida, Arbitragem interna e internacional: questões de doutrina e da prática. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 33 e ss.

[7] O Protocolo de Las Leñas foi assinado nesta cidade, em 27 de junho de 1992 (CMC/DEC nº 5/92). Encontra-se ratificado por todos os membros do MERCOSUL: Argentina (Lei 24.578), Brasil (Decreto do Poder Executivo 2067), Paraguai (Lei 270) e Uruguai. Este tratado refere-se à cooperação judiciária internacional entre os países do MERCOSUL e, dentre outros temas, regula o reconhecimento e a execução de laudos arbitrais estrangeiros (arts. 19 e 20).

[8] O Acordo entrou em vigor no Brasil em 09/10/2002 e foi promulgado pelo Decreto 4719 de 04/06/2003, sendo que o decreto em seu artigo 1º ressalvou que o artigo 10º do Acordo deve ser interpretado no sentido de permitir às partes escolherem, livremente, as regras de direito aplicáveis à matéria a que se refere o disposto em questão, respeitada a ordem publica internacional, e em seu artigo 2º de que qualquer revisão no Acordo ou atos que possam acarretar encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional nos termos do artigo 49, I da Constituição Federal estão sujeitos à aprovação do Congresso Nacional.

[9] Lê-se na versão oficial em francês: “Article V. 1. La reconnaissance et l’exécution de la sentence ne seront refuses, sur requite de la partie contre laquelle elle est invoquée, que si cette partie fournit à l’autorité competente du pays où la reconnaissance et l’exécution sont demandées la prevue: […] e) Que la sentence n’est pas encore devenue obligatoire pour les parties ou a été annulée ou suspendue par une autorité compétente du pays dans lequel, ou d’après la loi duquel, la sentence a été rendue.” Lê-se na versão official em inglês:”Article V. 1. Recognition and enforcement of the award may be refused, at the equest of the party against whom it is invoked, only if that party furnishes to the competent authority where the recognition and enforcement is sought, proof that: […] e) The award has not yet become binding, on the parties, or has been set aside or suspended by a competent authority of the country in which, or under the law of which, that award was made.” Lê-se na versão oficial em espanhol: “Artículo V. 1. Sólo se podrá denegar el reconocimiento y la ejecución de la sentencia, a instancia de la parte contra la cual es invocada, si esta parte prueba ante la autoridad competente del país en que se pide el reconocimiento y la ejecución: […] e) Que la sentencia no es aún obligatoria para las partes o ha sido anulada o suspendida por una autoridad competente del país en que, o conforme a cya ley, ha sido dictada esa sentencia.”

[10] Lê-se na versão oficial em francês: “Article VII 1. Les dispositions de la presente Convention ne portent pas atteinte à la validité des accords multilatéraux ou bilatéraux conclus par les Etats contractants en matière de reconnaissance et d’exécution de sentences arbitrales et ne prive aucune partie intéressée du droit qu’elle pourrait avoir de se prévaloir d’une sentence arbitrale de la manitère et dans la mesure admise par la législation ou les traités du pays ou la sentence est invoquée.” Lê-se na versão oficial em inglês: “Article VII 1. The provisions of the present Convention shall not affect the validity of multilateral or bilateral agreements concerning the recognition and enforcement of arbitral awards entered into by the Contracting States nor deprive any interested party of any right he may have to avail himself of an arbitral award in the manner and to the extent allowed by the law or the treaties of the country where such award is sought to be relied upon.” Lê-se na versão oficial em espanhol: “Artículo VII l. Las disposiciones de la presente Convención no afectarán la validez de los acuerdos multilaterales o bilaterales relativos al reconocimiento y la ejecución de las sentencias arbitrales concertados por los Estados Contratantes ni privarán a niguna de las partes interesadas de cualquier derecho que pudiera tener a hacer valer una sentencia arbitral en la forma y medida admitidas por la legislación o los tratados del país donde dicha

sentencia se invoque.”

[11] Já que antes do advento da Lei de Arbitragem, a utilização da arbitragem não dava segurança para as partes, não dando a cláusula compromissória efeito vinculante, e a necessidade de homologação judicial do laudo arbitral.

[12] Como em julgamento proferido no STJ, no qual ratificou-se a ausência de ofensa à ordem pública e presentes os requisitos da Resolução 9/2005 do STJ e os requisitos dos artigos 38 e 39 da Lei 9.307/96: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 2.517 – EX (2007/0251382-3): ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, deferir o pedido de homologação. Os Ministros Felix Fischer, Aldir Passarinho Junior, Gilson Dipp. Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Paulo Gallotti, Nancy Andrighi, Laurita Vaz, Luiz Fux, João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Nilson Naves, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler e José Delgado votaram com o Ministro Relator. Ausentes,

justificadamente, o Ministro Francisco Falcão e, ocasionalmente, o Ministro Cesar Asfor Rocha. Brasília, 19 de dezembro de 2007. (data de julgamento)

[13] SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Manual de Arbitragem. 3. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 191.

[14] “Art. 1. A presente Convenção aplicar-se-á ao reconhecimento e à execução de sentenças arbitrais estrangeiras proferidas no território de um Estado que não o Estado em que se tencione o reconhecimento e a execução de tais sentenças, oriundas de divergências entre pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas. A Convenção aplicar-se-á igualmente a sentenças arbitrais não consideradas como sentenças domésticas no Estado onde se tencione o seu reconhecimento e a sua execução.” Artigo I da Convenção de Nova Iorque, aos 10 de junho de 1958. 

[15] 05/10/2005 – SEC 856 – STJ 2005/0031430-2 Corte Especial – L´Aiglon/Têxtil União. “Homologação de sentença estrangeira contestada – Alegação de que contrato continente da convenção de arbitragem, na forma de cláusula compromissória, não conta com assinatura expressa da parte contra quem a homologação é pedida – Reconhecimento, pelo STJ, de que atos materiais de cumprimento de obrigações materiais relativas ao contrato comercial continente da convenção da arbitragem importam aceitação de convenção de arbitragem – Convenção de Nova Iorque – Homologação deferida”.

[16] Conf.: LEE, João Bosco. A homologação de Sentença Arbitral Estrangeira: A Convenção de Nova Iorque de 1958 e o Direito Brasileiro de Arbitragem. In: LEMES, Selma Ferreira (Coord). Arbitragem. Estudos em Homenagem ao Prof. Guido Fernando Silva Soares, in memoriam. São Paulo: Atlas, 2007. p. 187-188.

[17] Art. 4° Resolução 9 de 04/05/2005. 

[18] Georges Stigler afirmava que o jurista olha para o passado para restabelecer o status quo ante, enquanto o economista olha para o futuro (“Law or Economics?” in Journal of Law and Economics, 1992). 


Informações Sobre o Autor

Márcio Mateus Barbosa Júnior

Mestre em Direito Internacional Econômico e Tributário pela Universidade Católica de Brasília com ênfase em Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Civil, Especialista em Direito Empresarial e Contratos pelo Centro Universitário de Brasília e Bacharel em Direito pela Universidade do Estado de Minas Gerais. Membro de Grupo de Pesquisa da Universidade Católica de Brasília – UCB. Membro do IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Processual e ABDPC – Academia Brasileira de Direito Processual Civil. Atualmente é advogado, sócio fundador do escritório Barbosa, Lobo & Meireles Advogados (BL&M, Advogados, Brasil) e professor universitário na cadeira de Direito Processual Civil. Tem experiência e atua nas áreas do Direito Civil, Empresarial, Societário e Internacional.


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