O bullying e o direito – como tratar juridicamente este fenômeno

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Resumo: Sabe-se da amplitude do tema que o presente artigo visa abordar e de suas diversas ramificações e detalhes, por isso, não é o escopo do presente, de forma alguma, extinguir a matéria a que se propõe analisar, mas sim tratar, à luz do Direito, de um tema que, apesar de muito antigo, somente recentemente foi amparado pelo Judiciário pátrio, trazendo diversas conseqüências jurídicas inovadoras. Pretende-se com o presente texto, analisar, ainda que de forma sucinta essa mudança na tratativa do tema pelo Direito pátrio.

Palavras-chave: Tortura psicológica. Bullying. Danos Morais. Humilhação Proposital. Responsabilidade dos Pais e Tutores.

Abstract: It´s aware that the theme this article intend to adress has a large proportion  and lots of ramifications and details, therefore, it´s not it´s scope, anyhow, to extinguish the them under analysis, but to see under the Law´s optic a theme that is really antique, but that only recently has been hold by Brasilian Judiciary, bringing with this new point of view new law consequences. The scope of the present text is to analyze, yet very shortly this change in the way our Law treats the theme above.

Keywords: Psychological Torture. Bullying. Emotional Distress. Proposital Humiliation. Responsability of the Parents and the Tutors.

Sumário: Introdução. 1. O que é Bullying. 2. Meios pelos quais se manifesta 3. Legislação Pertinente. 4. Caráter de Utilização Principiológica e Constitucional. 5. Aspectos Penais. 6. Aspectos Civis. 7. Responsabilidade de Pais e Tutores pelos Atos do Menor. 8. Responsabilidade das Instituições de Ensino. 9. Direito Aplicável. 10. Breve Análise de Exemplos e Casos Concretos. Conclusão.

Não há mais dúvidas de que o Bullying existe e que não se trata de brincadeiras inocentes ou de apelidos despretensiosos, mas, em oposição, vai muito além, mexendo não só com a autoestima de quem o sofre, como causando sérias conseqüências.

No Brasil, apesar de não existir ainda uma legislação Federal que ampare ou tipifique a prática de Bullying, seja ele por meio físico ou cybernético, os pilares da proteção jurídica às vítimas de tal prática, resta consagrada, primeiramente em nossa Constituição Federal, e, secundariamente, através de legislações municipais e estaduais que abordam o tema, algumas das quais, que abordaremos no presente trabalho.

A Lei Municipal 14.957 de 16 de Julho de 2009,  vigente no município de São Paulo, por exemplo, aborda o conceito do Bullying em seu artigo segundo, senão vejamos:

“Art. 2º Entende-se por "bullying" a prática de atos de violência física ou psicológica, de modo intencional e repetitivo, exercida por indivíduo ou grupos de indivíduos, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidar, agredir, causar dor, angústia ou humilhação à vítima.

Parágrafo único. São exemplos de "bullying" acarretar a exclusão social; subtrair coisa alheia para humilhar; perseguir; discriminar; amedrontar; destroçar pertences; instigar atos violentos, inclusive utilizando-se de meios tecnológicos.”

Assim, ante a análise literal do texto, vê-se que a intenção do legislador é frisar o caráter humilhante, discriminador e socialmente excludente da conduta do bullying, salientando, outrossim, o caráter intencional e repetitivo do mesmo, não dando a legislação qualquer margem de abertura a análises enganosas ou desidiosas de tal conduta.

Ultrapassado o caráter conceitual do fenômeno, precisamos então analisar o embate de tal conduta com os bens jurídicos tutelados pelo direito pátrio, como ponto de partida para uma análise cível e penal mais acurada acerca das conseqüências da prática de tais atos.

A Constituição Federal Brasileira, em seu artigo 227, redação dada pela Emenda Constitucional nº 65 de 2010, dispõe que É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Diversos Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário, como por exemplo a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), impõe a dignidade física, psíquica e moral do indivíduo, protegendo, portanto, a vítima de bullying que, apesar de não sofrer violência física, sofre coação moral e psíquica, vendo sua esfera psicológica ser abalada em tal processo.

Note-se que não existe um tipo penal que incrimine e tipifique a conduta de “bulinar”, torturar psicológica e reiteradamente um indivíduo, ocasionando diminuição de sua autoestima, intimidando seu desenvolvimento, humilhando e perseguindo seus atos, excluindo-o do convívio social, porém existem tipos penais que vão ao encontro de atitudes perpetradas em tais condutas, como por exemplo a lesão corporal o estupro, a difamação, calúnia, injúria, o crime de racismo, dentre outras condutas penalmente tipificadas que acabam levando à responsabilização penal de seus agentes.

Saliente-se entretanto que, se tal conduta for perpetrada por adolescentes, estaremos diante de medidas socioeducativas, não de penas propriamente ditas.

Na esfera cível, entretanto, temos diversas formas de indenização que agora estão sendo descobertas e aplicadas a diversos casos concretos, responsabilizando-se não somente os pais ou tutores dos menores envolvidos, mas também o ambiente escolar onde tais atos foram perpetrados, sem que se houvesse uma medida repressiva capaz de interromper a referida agressão.

Prevê o conhecido artigo 186 do Código Civil que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete o chamado “ato ilícito”, o qual gera o dever de indenizar, em conformidade com o artigo 927 do mesmo diploma.

Desta sorte, patente é o dever de indenizar daquele que pratica a conduta, que, na terminlogia, é conhecido como “buller”, obrigação a qual é repassada aos pais ou responsáveis, por força dos artigos 932 e 933 do diploma Civilista, haja vista que os menores não podem ser sujeitos de deveres, mas devem ser guardados por seus pais e/ou tutores, que serão responsabilizados por seus atos.

Latente também é o dever de indenizar cabível às instituições de ensino que permitem, por ação ou omissão que tal conduta se perpetue em seu estabelecimento.

Trata-se, no caso em tela, de relação de Consumo entre Instituição de Ensino e Aluno, remetendo a presente análise, ao Código de Defesa do Consumidor.

Ao tratar o Instituto Consumerista de “fornecedor” como o prestador de serviços habitual que aufere lucro com tal serviço, nota-se que a Instituição de Ensino subsume-se em tal conceito, sendo certo que não há outro lugar neste contexto para os alunos envolvidos, senão no papel de “consumidores”.

Notando-se o serviço que está sendo prestado por uma escola, não podemos nos olvidar que não se trata apenas de matérias escolares jogadas aleatoreamente aos consumidores, mas toda uma socialização, o desenvolvimento de personalidades especulativas e o aproveitamento do conhecimento por elas repassado. Também é oferecido um ambiente pretensamente saudável para que tal aprendizado e desenvolvimento ocorra, sendo certo que as crianças passam o dia dentro de tal estabelecimento sendo monitoradas e seguindo pequenas normas de conduta, que devem ser supervisionadas por funcionários da fornecedora.

Diante de tal quadro, não existem dúvidas acerca de uma medida, ao menos omissiva destas instituições frente à casos de bullying em seus estabelecimentos, vez que a segurança e a sanidade que seu ambiente escolar deveria oferecer está sendo desrespeitado e violado pela conduta do buller, sendo tal estabelecimento solidariamente responsável pelos danos causados àqueles que o freqüentam.

Estamos assim, diante da responsabilidade objetiva que deriva do risco da atividade do fornecedor, o que culmina na necessidade da participação das escolas na composição passiva da lide processual civil, posto que solidariamente responsáveis pela conduta dos alunos, desde que, saliente-se, tais condutas ocorram também dentro de seu estabelecimento.

Note-se que, apesar de muito se falar no bullying como conduta perniciosa existente entre crianças e adolescentes, as diversas facetas do mesmo o puxam também para outros ambientes corporativos, pouco explorados, porém muito atingidos.

Um grande exemplo que pode ser citado no presente trabalho é o caso de uma estudante de uma Universidade que foi largamente ofendida por colegas, sem que a segurança do referido estabelecimento pudesse fazer qualquer ato para conter a multidão em 22 de outubro de 2009, cujo caso ganhou repercussão nacional.

Após tal acontecido, a Instituição em comento foi condenada ao pagamento de R$ 40.000,00 à aluna a título de Danos Morais sofridos em seu estabelecimento.

Da mesma sorte, podemos citar o chamado “Assédio Moral”, que nada mais é do que o Bullying ocorrido dentro de empresas, como o recente caso de uma estagiária de direito que acabou cometendo o suicídio após pretensamente ter sido estuprada em uma festa de confraternização da mesma e após o ocorrido ainda sofrido com diversos comentários injuriosos acerca de sua pessoa, caso o qual continua em aberto.

Diante de tais considerações, vemos que é possível penalizar criminal e civilmente os “bullers”, ou seja, aquele que comete o bullying, ainda que não exista uma legislação específica que trate do tema, exceto algumas legislações esparsas municipais e estaduais.

Observemos alguns julgados relativos à matéria em estudo:

“TJRJ – 0003372-37.2005.8.19.0208 – APELACAO – 1ª Ementa  DES. ADEMIR PIMENTEL – Julgamento: 02/02/2011 – DECIMA TERCEIRA CAMARA  CIVEL  ESTABELECIMENTO DE ENSINO  FALHA NA PRESTACAO DO SERVICO  RESPONSABILIDADE OBJETIVA  DANO MORAL  PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. VIOLENCIA ESCOLAR.  "BULLYNG". ESTABELECIMENTO DE ENSINO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL CONFIGURADO. DESPROVIMENTO DOS  RECURSOS. I – Palavra inglesa que significa usar o poder ou força para intimidar,  excluir, implicar, humilhar, "Bullying" é um termo utilizado para descrever atos de  violência física ou psicológica, intencionais e repetidos; II  – Os fatos relatados e  provados fogem da normalidade e não podem ser tratados como simples  desentendimentos entre alunos. III  – Trata-se de relação de consumo e a  responsabilidade da ré, como prestadora de serviços educacionais é objetiva,  bastando a simples comprovação do nexo causal e do dano; IV – Recursos – agravo  retido e apelação aos quais se nega provimento.”(g.n.)

“TJRJ – 0015239-71.2007.8.19.0203 – APELACAO – 1ª Ementa DES. CARLOS EDUARDO PASSOS  – Julgamento: 28/07/2010  – SEGUNDA CAMARA  CIVEL  RELAÇÃO DE CONSUMO. Estabelecimento de ensino. Prestação de serviço de tutela de menor. Alegação de abalos psicológicos decorrentes de violência escolar. Prática de Bullying. Ausência de comprovação do cometimento de agressões no interior do  estabelecimento escolar. Adoção das providências adequadas por parte do  fornecedor. Observância do dever de guarda. Falha na prestação do serviço não  configurada. Fatos constitutivos do direito da autora indemonstrados. Manutenção  da sentença. Recurso desprovido.”(g.n.)

“TJRJ – 0050622-06.2008.8.19.0000 (2008.002.34646) – AGRAVO DE INSTRUMENTO – 2ª Ementa  DES. CELSO FERREIRA FILHO  – Julgamento: 02/12/2008  – DECIMA QUINTA  CAMARA CIVEL  AGRAVO DE INSTRUMENTO contra ato do juiz que indeferiu a produção de prova  pericial em vítima de assédio moral e bullying, sob o fundamento de que a mesma  seria desnecessária ao deslinde do feito. Rejeição da preliminar argüida pelo  agravado, vez que o descumprimento da norma do artigo 526 do Código de  Processo Civil, não lhes ocasionou prejuízo. Necessidade de realização da prova  pericial psicológica e estudo social por perito de confiança do juízo tendo em vista a  natureza da lide. DECISÃO MONOCRÁTICA, COM FULCRO NO ARTIGO 557, §1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, DANDO PROVIMENTO AO RECURSO.” (g.n.)

“Número: 70041878885 Seção: CIVEL – Órgão Julgador: Sétima Câmara Cível  Tipo de Processo: Agravo  Decisão: Acórdão  Relator: Jorge Luís Dall'Agnol  AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 557, CAPUT, DO CPC. AÇÃO  ORDINÁRIA. ACESSO À EDUCAÇÃO INFANTIL. TRANSFERÊNCIA DE ESCOLA.

BULLYING. INFANTE QUE APRESENTOU PROBLEMAS PSICOLÓGICOS. MUDANÇA DE COLÉGIO NECESSÁRIA AO DESENVOLVIMENTO FÍSICO E PSÍQUICO DO MENOR.  RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO PREVISTA CONSTITUCIONALMENTE.  SENTENÇA MANTIDA. Agravo interno desprovido. (Agravo Nº 70041878885, Sétima  Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall'Agnol, Julgado em 13/04/2011)” (g.n.)

Conclusão

Diante de toda a análise perpetrada anteriormente, cristalina se faz a aplicação do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor no que tange à responsabilização civil do menor envolvido no bullying e da própria Instituição de Ensino, responsável pelas condutas tomadas em seu estabelecimento e apenadas ante sua omissão.

Vimos outrossim como tratar juridicamente o caso do bullying sob o âmbito principiológico e indenizatório, bem como a necessidade da apuração da participação (conduta comissiva ou meramente omissiva) dos Estabelecimentos de Ensino onde tais condutas se perpetuam, bem como a visão recente de nosso judiciário no que tange à indenização moral em casos práticos e a necessidade inclusive de Exame Pericial de caráter Psicológico que visa auferir e majorar o dano causado ao psique daquela criança ou adolescente vítima de tal fenômeno, até mesmo como forma de quantificar o importe devido a título de indenização de Danos Morais, bem como auferir a efetiva perpretação ou não da conduta humilhante do bullying.


Informações Sobre o Autor

Aline Vivian Jokuska Camero

Advogada especialista em Direito do Consumidor, pós graduada em Direito Civil e Processo Civil, sócia do escritório J&P Assessoria Jurídica, árbitra inscrita na CONIMA


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