Estereótipo e cárcere privado: similitudes de uma agressão silenciosa

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Resumo: O texto relata aspectos de similitude impressos na contracepção do estereótipo como rotulagem social, com o mesmo impacto psicológico do crime de cárcere privado.

Estereótipo – Os estereótipos são crenças socialmente compartilhadas a respeito dos membros de uma categoria social, que se referem a suposições sobre a homogeneidade grupal e aos padrões comuns de comportamento dos indivíduos que pertencem a um mesmo grupo social. Sustentam-se em teorias implícitas sobre os fatores que determinam os padrões de conduta dos indivíduos. ROTULAGEM.

Agente ativo: Sociedade

Vitima: Indivíduo

Julgamento: aceito socialmente

Cárcere privado –  Crime contra a liberdade individual, consistente em privar alguém de seu direito de liberdade, retendo ou mantendo a vítima em recinto fechado.

Agente ativo: Indivíduo

Vitima: e Sociedade representada pelo Ministério Público (o indivíduo sequestrado- só é parte)

Julgamento: Condenado socialmente

Em qualquer das situações a nossa conformidade social é moldada, quer a priori pelas influências já recebidas dessa mesma sociedade, quer à posteriori, através de um processo que tende para a conformidade com o meio. 

A imagem de Mead sobre o conflito inter-grupal (pode abarcar sociedades ou tradições) que interessa para este aspecto da rotulagem que analisaremos. Sabe-se que os grupos se formam através de objetivos ou características comuns. Na composição dos grupos este aspecto é de extrema relevância porque sem objetivo comum (ainda que difuso) não há pensamento grupal e para este nosso caso não poderia haver rotulagem porque ela está intimamente ligada ao pensamento de grupo e à ideia sobretudo defendida pela Escola de Sociologia de Chicago que conhece dois períodos que se podem dividir grosseiramente até à 2ª Guerra Mundial (vulto principal para este plano George Herbert Mead) e período posterior à 2ª Guerra Mundial onde vamos encontrar a maior parte dos nomes que referem a rotulagem.

Ocorre que esses atributos comuns a determinada esfera social, podem ser consolidados ou precipitados de uma forma negativa através da rejeição de um outro grupo social que funciona como catalisador de uma “outra normalidade”.

 Esse grupo exterior será, para todos os efeitos, um grupo marginal em relação àquele no qual nos inserimos. Mas os processos não são irreversíveis ou eternos, conforme explica também Mead: da exposição do conflito (em que em princípio um grupo considera marginal o outro) podem resultar processos de integração e / ou de transformação quer de um grupo subsumido no outro, quer dos dois grupos entre si encontrando pontos de confluência que levam à fusão, pelo menos parcial, dos dois grupos vindo a formar-se então um único grupo.

O que nos leva á ideia de que, o rótulo, o estigma, tem sofrido alterações e sofre alterações constantes. O que é rotulável negativamente hoje pode não o ser amanhã e o que é rotulável positivamente hoje pode não o ser, igualmente, no futuro.

Vejamos as similitudes dos eventos, tanto na rotulagem quanto no cárcere privado, a vítima está envolta de um sistema que a impede de exercer a expressão cominado com o direito de ir e vir, ambos constitucionalmente garantidos. Dois causam transtornos psíquicos, porém como o homem é um ser adaptável,  acaba desenvolvendo aspectos psicológicos de aceitação deste fato como admissível, ou não, desencadeando  a Síndrome de Estocolmo pode ser considerada uma resposta emocional produzida na vítima, pelo cárcere ou pelo cativeiro, consubstanciada em sua total indefesa e na sua situação de extrema vulnerabilidade.

Como trata a psicóloga Marisa Fortes, profissional militante do Grupo Operativo de Resgate à Integridade Psíquica (GORIP), do Hospital das Clínicas em São Paulo, ao ser entrevistada pelo editor Fernando Galacine, em relação aos sintomas da síndrome, manifestou a seguinte opinião:

“Essa síndrome pode ocorrer em qualquer situação de opressão em que havia um algoz e uma pessoa subjugada a ele, dependendo dele para manter-se viva. […] Note que envolve situações de extrema violência e que envolve a certeza por parte da vítima de que pode ser morta ou seriamente ferida por seu agressor […] Como estamos falando do que pensamos ser um desdobramento do TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático), há que se lidar também com os sintomas desta problemática. Porém o que temos percebido é que, após algum tempo distante da influência do opressor e afastada a crença de que este poderá fazer-lhe mal, há uma tendência de que a vítima experimente remissão dos sintomas que são os seguintes: sentimentos de amor e ódio pelo agressor; gratidão exagerada por qualquer bondade mostrada pelo agressor; negação ou racionalização da violência do agressor; visão de mundo a partir da ótica do agressor, percepção de pessoas que querem ajudá-la como más e dos agressores como bons; medo de que o agressor volte para pegá-la, ainda que preso ou morto […]”.

Imaginemos agora, uma pessoa criada desde bebê numa casa sem contato externo nenhum, conhecendo somente aquilo que lhe é colocado como verdade. È natural que esta pessoa estabeleça um profundo amor e admiração por aqueles que a cercam. Porém, no dia que este adulto conhecer um outro mundo, que não aquele que foi criado, onde a realidade imposta, desse novo convívio, for fascinante para ele, provavelmente criará uma sensação de ingratidão muito grande às mesmas pessoas que amava cegamente, pelo fato de neste momento ter a percepção de todo o universo qual fora alijado, por estar encarcerado numa realidade imposta, por aquela que era a sua aparente sociedade.

Assim, vamos aos rótulos sociais, os estereótipos, nascemos e vivemos cercados de projetos e títulos sociais impostos, uma realidade imposta, ou pelo gênero, ou pela raça, ou pelas crenças religiosas, ou pelo nível social inserido, que são as prisões mentais, ou melhor “as paredes da casa” em que crescemos. Com o passar dos anos, à própria sociedade que rotulou uma verdade absoluta, começa a necessitar de transformar este rótulo, para a sua sobrevivência.

“O estereótipo imprime uma imagem social tão forte, que é fácil definirmos mentalmente alguns papéis sociais – “a mãe”, “a esposa”, “o patrão”, “a escola”, “o médico”, “o fumante”, “ o padre”, “a criança”. Se fecharmos os olhos veremos a seguinte sequencia, “a mãe” uma mulher angelical com uma criança, talvez duas ao seu lado, “a esposa” a mesma mulher servindo ao marido, “o patrão” um homem alto e nervoso, “escola” uma sala cheia de carteiras, “médico” um homem pomposo de branco com estetoscópio envolto no pescoço, “o fumante” e um homem inquieto de um lado para outro com os dentes amarelados com um cigarro na mão, “o padre” um senhor ponderado de batina, “a criança” uma pessoa pequena e frágil. Estamos falando de rótulos.

Agora vamos tentar alterar os pensamentos, veja “a mãe” uma senhora má, bem velha num asilo, “a esposa” uma grande executiva de uma multinacional onde o marido é o faxineiro, “o patrão” uma mulher nova, de estatura baixa, de minissaia, extremamente sensual, “a escola” uma bela praia, “o médico” – aquele mesmo moço que há pouco tempo, lavava o seu carro ou engraxava os seus sapatos, “o fumante” – um galã de cinema lindo, perfumado, sensualíssimo, “o padre” casado, com filhos e uma lida esposa bem mais jovem que ele, e “as crianças” com escopetas carregadas, tentando assaltar a sua casa e matar a sua família. Neste momento, tais imagens acabam de agredir a sua imaginação, pois existe um modelo universal que acreditamos por “verdade”, muitas vezes imposta governamentalmente ou pela mídia, que ao nos depararmos com um contexto diferente daquele dito “real” nos frustra e nos faz refutar a ideia da quebra de paradigma. Este é o verdadeiro peso trazido pelo estereótipo, onde inconscientemente refutamos o que não nos é padrão.

Assim, podemos afirmar que o estereótipo é o primeiro agressor da sociedade, onde a pessoa no seu direito de ser como ela quer, sem interferir no comportamento do grupo, é impedida ou compelida socialmente pela grande massa em prol de uma falsa “verdade”.

O estereótipo de beleza, imprime padrões sociais, que passam da normalidade, onde a mídia veicula o homem bonito, como alto, forte e rico, a mulher bonita a modelo. Qual o preço do estereotipo? Para ser um grande executivo, deve ostentar um padrão de riqueza que nem sempre possui. Para ser um cara descolado deve usar um relógio da moda. Para ser um bom médico, deve ser de família rica. Quanto custa todas essas mentiras e quem paga por elas?

Vamos aos fatos, há 120 anos atrás, o mercado de trabalho feminino era bastante escasso, ou melhor o rótulo social posto ao gênero, era o de “boa esposa”. Passados alguns anos, com questões sociais onde o homem comprovadamente, morria em idade ainda jovem, foi necessitando de uma nova mão de obra,  – e porque não mais barata -, onde se a mulher concebida socialmente para servir o homem, – sem salário nenhum- , seria muito fácil, se prestar a trabalhar por muito menos que habitam pagar para os homens. Com o passar do tempo, os modelos foram se solidificando e a mulher conquistando ainda mais o seu lugar no mercado.Porém, para um homem de costumes antigos, criado no interior, que veio para a cidade, onde a sua mulher não pode falar em trabalhar, que ele se sente ameaçado e a agride. De quem é a culpa? Dele? Ou do estereótipo que a sua “verdade social”, impresso ao longo de toda a sua história, em seu conceito de “casamento”? Psicologicamente e socialmente quem sofre mais a pessoa criada em cárcere privado ou esta esposa impedida de buscar junto à sociedade uma valorização com o seu trabalho?

Para essas questões exemplificaremos a pesquisa de Émile Durkheim concebia jogos e conflitos entre representações sociais simbólicas o comportamento desviante é todo aquele que for rotulado como tal. Por delinearem a interdependência existente entre nomes e objetos, e a forma como o ato de nomear não apenas descreve eventos ou fenómenos, mas contribui para a sua criação, reformulação, estrutura e objetividade, os mais proeminentes interacionistas simbólicos foram apelidados de «labelling theorists», e demonstram deste modo como a criação e a definição, por parte do meio «normal», de novas categorias ou arquétipos de comportamento sociais concorrem para definir o que é tido, em determinado meio, por desvio.

“Numa sociedade fragmentada, as pessoas buscam se integrar e se identificar por meio de tribos”, segundo Oliveira, fazer parte de um grupo é característica do processo de desenvolvimento, afirmação e aceitação social.

Assim, como cidadãos, devemos estar atentos ás bandeiras que levantamos como “verdade”, e quais os modelos defendemos, onde a rotulação engessa qualquer processo, principalmente, atrasa qualquer avanço. Assim, como um prisioneiro em uma casa, temos que mensurar o quanto e o motivo de estamos presos aos estereótipos, que nos faz reagir com preconceito ou até mesmo nos abandonar como indivíduos, para seguir um modelo previamente rotulado-estabelecido.

 

Referências
Ballone, G. J. Perícia psiquiátrica forense. PsiqWeb. Disponível em: <htpp://www.psiqweb.med.br>. Acesso em: 16 ago. 2006.
Cogan, Arthur. Crimes Contra a Segurança Nacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1976.
Costa, Alvaro Mayrink da. Direito Penal. Parte especial. 2. v. Rio de Janeiro: Forense, 1987.
França, Genival Veloso de. Medicina legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004.
Mirabete, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte especial. São Paulo: Atlas, 2002.
Peixoto, Afranio. Medicina legal. Psico-Patologia Forense. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1938.
Kapczinski, Flávio; Margis, Regina. Transtorno de estresse pós-traumático: critérios diagnósticos. Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v. 25, p. 2-4, jun. 2003.
Síndrome de Estocolmo. Disponível em: <htpp:pt.wikipédia.org/wiki/5%C3%ADndrome_de_Estocolmo

Informações Sobre o Autor

Flávia Cristina Reis Sulz

Mestrado UNB: Desenvolvimento Sustentável 50 do curso concluído, Doutorado Psicologia Social- Esla Universidad Jonh Kennedy


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