O processo de compra e venda de imóveis

Resumo: Este trabalho propõe-se a analisar o processo de compra e venda de imóveis abordando as principais dificuldades enfrentadas pelas partes, bem como os aspectos gerais sobre a segurança na transação imobiliária. Busca elucidar o conceito de registro imobiliário e seus princípios, assim como a documentação inerente ao processo e suas respectivas informações. Apresenta também os benefícios do registro imobiliário e sua importância para a segurança jurídica na transação imobiliária.

Palavras-chave: compra e venda de imóveis. transação imobiliária. registro imobiliário. Princípios. segurança jurídica.

Abstract: This work aims to analyze the process of buying and selling real estate addressing the main difficulties faced by the parties, and the general aspects of security in the real estate transaction. Seeks to elucidate the concept of real estate registration and its principles, as well as the inherent documentation process and their information. It also shows the benefits of real estate registration and its importance to legal certainty in the real estate transaction.

Keywords: Purchase and sale of real estate. real estate transaction. real estate registration. Principles. legal certainty.

Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. Aspectos gerais sobre a segurança na transação imobiliária. 2.2. Registro imobiliário e seus princípios. 2.3. A documentação e a suas respectivas informações. 2.4. Benefícios do registro na transação imobiliária. 3. Conclusão. Referências.

1. Introdução

Com o grande aumento nas aquisições de imóveis na Cidade do Rio de Janeiro, diversas dúvidas surgem tanto para o comprador quanto para o vendedor. Não é tão simples realizar uma transação imobiliária. Ela envolve riscos, como qualquer negócio, mas deve-se ter um especial cuidado com relação à documentação e aos requisitos exigidos pela legislação aplicada, pois existem diversos problemas que podem surgir por ocasião da falta de registro ou averbações necessárias, como por exemplo, pagar um sinal para a compra de um imóvel que não pode ser vendido ou transferido para o nome do atual comprador, ou ainda adquirir um imóvel que não está legalizado ou que foi utilizado como garantia em um processo de execução, correndo o risco de perder o imóvel que se pretende adquirir, entre outros.  Deve-se ter uma preocupação com relação à segurança da transação imobiliária, pois ela envolve um significativo montante em dinheiro. Para muitos compradores e vendedores este montante pode representar as economias de uma vida inteira. Até os advogados devem ter muita cautela na aquisição de um imóvel, principalmente quando não são atuantes na área.

Este artigo tem como objetivo analisar o processo de compra e venda de imóveis na Cidade do Rio de Janeiro, sob o aspecto da legislação vigente, bem como elucidar as principais exigências para alcançar maior segurança nestas transações. Para isso, pretende-se esclarecer algumas terminologias e apresentar o processo de compra e venda de imóveis de forma mais clara, para que desta forma, seja possível minimizar as dificuldades enfrentadas pelas partes durante esse processo.

O assunto é muito vasto, e para delimitação deste trabalho, pretende-se tratar apenas da transação de compra e venda de imóveis urbanos na Cidade do Rio de Janeiro, transações estas realizadas entre pessoas físicas, não englobando comprador ou vendedor como pessoa Jurídica.

A importância do artigo reside no fato de contribuir para o conhecimento e a melhor compreensão sobre a transação imobiliária. Pois a compra e venda de imóveis é um processo comum na vida das pessoas, mas nem sempre elas se atentam para o risco que correm ao não observar requisitos mínimos necessários para uma negociação imobiliária mais segura. Requisitos estes que se atendidos podem evitar enormes prejuízos aos envolvidos.

A metodologia utilizada no presente artigo é a pesquisa bibliográfica, desenvolvida com base na doutrina sobre o tema, na legislação aplicada, nos princípios gerais de direito e na jurisprudência de nossos Tribunais.

2. Desenvolvimento

2.1. Aspectos gerais sobre a segurança na transação imobiliária

A compra e venda de imóveis é um negócio jurídico comum no dia a dia das pessoas. Essa transação apresenta peculiaridades e requisitos, os quais devem ser observados, estudados e atendidos. Embora pareça um negócio simples, requer cuidados especiais e específicos para minimizar os riscos decorrentes dessa transação.

Antes de firmar qualquer contrato para aquisição de um imóvel, devem ser estudados todos os riscos envolvidos nesta transação. Os riscos gerais inerentes a qualquer negócio jurídico, e os específicos para a compra e venda de imóveis.

Por muitas vezes, é possível nos depararmos com pessoas envolvidas em uma transação imobiliária que acabam tendo sérios problemas por desconhecimento ou simplesmente não dar a devida importância para certas medidas, que deveriam ter sido adotadas antes de assinar um contrato imobiliário de compra e venda. Em decorrência disso, como por exemplo, podem de imediato não conseguir ou ter grande dificuldade para registrar o imóvel adquirido.

Diversas são as dificuldades que podem ser enfrentadas pelas partes em uma transação imobiliária. Para que se possa efetivar o registro imobiliário, os compradores podem se deparar com a situação, por exemplo, em que o imóvel que se pretende adquirir encontra-se prometido à venda para um terceiro.

Com a efetivação do devido registro imobiliário da promessa de compra e venda por parte deste terceiro, impede que o atual adquirente consiga registrar sua escritura.

“Assim, ainda que outro comprador, posteriormente, queira registrar uma escritura pública de compra e venda, outorgada pelo vendedor, não conseguirá obter o registro e, assim, não adquirirá a propriedade do imóvel, uma vez que a propriedade é dada àquele que primeiro efetuou o registro”.[1]

Outra situação comum é com relação à propriedade do imóvel. É possível se deparar com casos em que as pessoas que se apresentaram como vendedores, na verdade não sejam realmente proprietárias deste bem.

Desta forma, há a ausência de legitimidade para efetuar a transação imobiliária, como por exemplo, nos casos em que o suposto proprietário não possui e nunca possuiu o título aquisitivo, sendo mero possuidor ou ainda por ter anteriormente alienado o imóvel a terceiros, ou seja, existem diversas possibilidades para ausência de legitimidade.

O fato de encontrar um imóvel que atenda as necessidades e que se adequa ao orçamento pode tirar o foco do comprador sobre a preocupação com a segurança da negociação, que é um fator de extrema importância.

Em um primeiro momento, independente de o imóvel atingir as expectativas, é imprescindível, que se mantenha o foco no aspecto da segurança da transação, tomando as medidas básicas apresentadas pela doutrina e pela legislação vigente.

Uma das primeiras providências a ser adotada é analisar com calma e de forma minuciosa a documentação apresentada, tanto a do imóvel quanto dos vendedores. Devendo verificar se as pessoas que se apresentam como proprietárias são realmente legitimadas para realizar tal transação, bem como analisar se o imóvel possui documentação apta para a venda e respectivo registro imobiliário.

Com relação às partes envolvidas na transação imobiliária assim como em qualquer outro negócio jurídico, elas devem ter capacidade. Importante destacar que “capacidade é a condição legal ou física que deve uma pessoa possuir para poder participar de um ato jurídico ou ser parte de um contrato”[2]. Esta condição se aplica a ambas as partes, comprador e vendedor.

Neste sentido, tratando-se de um contrato que se pretende firmar, é primordial que, no mínimo, se atenda aos pré-requisitos ou requisitos gerais para qualquer ato jurídico, independente de sua natureza. Desta forma, igualmente se aplica no caso da compra e venda.

“Como em qualquer ato jurídico, para a validade dos contratos, em geral, é necessário que estejam atendidos os requisitos de capacidade do agente, de licitude do objeto e, também, a forma que deva ser observada. No caso da compra e venda de imóveis, há que se entender não só os pressupostos gerais dos contratos, assim como os que são próprios da compra e venda e, ainda, os que são específicos da venda de imóveis.[3]

Destarte, evidente é a importância de se analisar toda documentação, seja para constatar capacidade, identificar o verdadeiro proprietário do imóvel, identificar a inexistência de alienação anterior a terceiros, ou qualquer outra das inúmeras possíveis situações prejudiciais de uma negociação, como por exemplo, dívidas que venham a recair sobre o imóvel.

2.2. Registro imobiliário e seus princípios

Antes de falar sobre o registro em si, é importante tecer a distinção entre Registro de Imóveis e registro imobiliário. O primeiro é o local onde será realizado o ato de registro, também é conhecido como Cartório de Registro de Imóveis.

“O Registro de Imóveis, portanto, é a instituição jurídica organizada pelo Estado que proclama oficialmente as situações jurídicas relativas à propriedade de imóveis e suas modificações. Pela publicidade registral se exteriorizam, de forma contínua e organizada, as situações jurídicas de natureza real, a fim de que seja assegurada a sua eficácia perante todos os demais membros da sociedade”.[4]

O registro imobiliário é o ato pelo qual as partes tornam pública a transação imobiliária realizada. Esta transação é reduzida a termo por meio do título translativo, que juntamente com toda documentação das partes são levados ao Cartório de Registro de Imóveis para que seja realizado o registro.

Desta forma, é possível constatar que o serviço de Registro de Imóveis tem como função dar publicidade, garantir a autenticidade e eficácia das transações imobiliárias referentes aos direitos reais imobiliários, assim como todas as informações importantes inerentes à situação jurídica dos imóveis e dos seus respectivos titulares de direitos reais[5].

Portanto, ao adquirir um imóvel não basta pagar o preço ajustado, analisar a documentação e obter o título translativo. De acordo com a legislação brasileira vigente esse título deve ser registrado para que se concretize a propriedade sobre o bem.

Em outras palavras, além de assinar a escritura definitiva de compra e venda, esta deve ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Pois, a tradição, ou seja, a transferência da propriedade só ocorrerá com o devido registro no cartório competente.

Neste sentido, institui o Código Civil vigente em seu artigo 1.245 que a transferência da propriedade entre vivos ocorre mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. E no §1º do referido dispositivo legal estabelece que até que seja registrado o título translativo alienante continua como se ainda fosse o proprietário do imóvel.

Importante ressaltar que existem diversos tipos de título translativo, não apenas a escritura pública de compra e venda, esta é apenas uma das diversas modalidades.

Outros exemplos de títulos aquisitivos ou translativos são a carta de arrematação, no caso da aquisição de um imóvel em hasta pública, ou seja, em um leilão, e também o instrumento particular de compra e venda que pode ser, por exemplo, um contrato realizado entre as partes, ou ainda um contrato firmado com uma instituição bancária no caso da aquisição de imóvel utilizando um financiamento imobiliário.

Assim, é possível tecer uma diferenciação entre escritura pública e instrumento particular.

“Escritura pública é um documento que pode ser produzido em qualquer cartório de notas (tabelionato), por um agente público, que é a pessoa devidamente autorizada pelo Poder Público a exercer essa função, ou em um consulado brasileiro no exterior (art. 221, I, d a Lei nº 6.015/73). Instrumento particular, ao contrário, é elaborado por qualquer pessoa que não tenha essa função pública.”[6]

A lei nº 6.015 de 1973 dispões sobre os registros públicos, dentre eles em seu título V especificamente sobre registro de imóveis. A referida lei em seu artigo 1º disciplina que “o registro imobiliário tem por finalidade a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos […]”[7]

Para o melhor entendimento a respeito do registro, se faz necessária a distinção entre matrícula, averbação e registro.

Na matrícula constam informações importantes, ela guarda um registro histórico e cronológico do imóvel. Trata-se de uma folha de papel, em um livro ou ficha, que possui uma numeração única para cada imóvel específico. Desta forma, como cada imóvel possui apenas uma numeração a matrícula é chamada de carteira de identidade do imóvel[8].

Para um melhor entendimento, a figura[9] a seguir ilustra como seria na prática uma matrícula imobiliária.

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No que se refere às informações apresentadas pela matrícula podemos citar, por exemplo, o endereço, quem foi o primeiro proprietário, para quem vendeu o imóvel, o tipo de título translativo utilizado, o valor atribuído ao bem, entre outras tantas informações que nela são apresentadas. Em outras palavras, “a matrícula é o cerne do registro imobiliário e, portanto, da propriedade imóvel e da sua segurança jurídica”[10].

“[…] a matrícula é um registro geral e permanente do imóvel e, nessa matrícula, fazem-se os registros, quer de títulos que se referem à alienação do imóvel (transferência), quer quanto aos títulos que constituem, modificam ou extinguem outros direitos. Aliás, as expressões, transcrição e inscrição, previstas no Código Civil, continuam na Lei nº 6.015, sob denominação geral de registro”. (grifo do autor).[11]

A lei de registros públicos estabelece taxativamente em seu artigo 167, inciso I, os atos que podem ser objetos de registro.

As averbações são alterações realizadas no conteúdo do registro. São fatos que não alteram a causa ou natureza do título translativo anteriormente registrado.

“As averbações (Lei nº 6.015, art. 167, inciso I) são registros relativos a modificações não essenciais da matrícula ou dos registros, como baixas, extinção de direitos, cessões, transferências para outros bens de direitos e qualquer outra alteração, como modificação do nome ou estado civil do titular, a construção ou demolição de benfeitorias, qualquer alteração ou novação de obrigação hipotecária.”[12]

O Registro imobiliário possui diversos princípios que o norteiam. Além é claro do princípio da boa fé que deve fundamentar qualquer negócio jurídico. Contudo, primeiramente deve ser citado o princípio da publicidade que é fundamental para todos os registros.

“A publicidade registral pode ser definida como a garantia dos direitos reais inscritos e, tal como estão inscritos, da pessoa que consta como titular registral; e ainda como garantia da tutela dos interesses daqueles que, confiando nas informações constantes do Registro, realizam negócios jurídicos imobiliários. A publicidade registral, assim, é uma presunção de veracidade e integridade do registro para todo aquele que confia no registro e inscreve o título de aquisição do imóvel. Por publicidade registral se entende a publicidade jurídica que é obtida por meio da inscrição de um título específico em um órgão específico denominado Registro”.[13]

Além do princípio da publicidade, existem diversos outros princípios, um muito importante é o princípio da inscrição, no qual “a propriedade se torna factível mediante o ato de registro e só ele atribui o direito de propriedade”[14]. (grifos do autor).

Desta forma é possível observar que há uma estreita relação entre o princípio da inscrição e o princípio da publicidade, pois ele objetiva permitir que qualquer pessoa tenha ciência dos direitos reais existentes ou não sobre o imóvel de interesse, possuindo assim um efeito perante todos[15].

Outro princípio que merece destaque é o da presunção e de fé pública, no qual “o principio da presunção significa que é válido o direito inscrito. Mas essa validade não é absoluta, pois havendo prova em contrário, o direito pode ser anulado e o registro, cancelado”[16]. E “a fé pública está intimamente ligada à presunção de validade do registro. O oficial do registro tem fé pública, isto é, credibilidade para os registros, para as suas declarações e certidões, até prova em contrário”[17].

Este princípio possui outra nomenclatura, mas no mesmo sentido. Ele também é chamado de princípio da segurança e fé pública. Em outras palavras, “estabelece a presunção de veracidade e autenticidade de todos os atos, até prova em contrário, do domínio e preferência contra o direito de terceiros, ou em favor de qualquer ato cuja natureza, para produção de efeitos reais, necessite de registro”[18].

O registro imobiliário é realizado de forma cronológica e consecutiva, ou seja, segue uma sequência que deve ser respeitada. Os atos são registrados seguindo a ordem em que são apresentados. Este é o denominado princípio da prioridade ou anterioridade, no qual significa “[…] que o título registrado em primeiro lugar tem preferência em relação a todos os outros que forem apresentados. Vale o que for registrado em primeiro lugar (Lei nº 6.015, de 1973, arts. 12, 174 e 175)”[19].

“Desta forma, um título apresentado passa a ter, em face de qualquer outro, exclusividade ante aos demais outros existentes por registrar, mesmo que prenotados em igualdade formal de condições, […] pela ordem de apresentação, definem como inquestionável a exclusividade do direito declarado, preferencialmente, ao primeiro, permitindo, a partir dessa definitividade, ditar-se a secessão do bem e a preferencia do crédito, como dito.”[20]

Outro princípio basilar para o registro imobiliário é o princípio da continuidade, no qual estabelece uma ligação entre os atos registrados, formando assim uma sequência lógica.

“Esse princípio obriga a que toda e aquisição de direito sobre um imóvel tenha, obrigatoriamente, como alienante desse direito a pessoa em nome de quem estiver inscrito, encadeando-se os títulos e as transferências uns com os outros, em sequência absoluta, sem interrupção, como os elos de uma corrente, bastando a falta do registro de um título para impedir que se realize o registro subsequente”[21].

Sendo assim, se “A” vende o imóvel a “B”, que vende para “C”, que por sua vez transfere para “D”. Para que este último tenha o seu título registrado, os anteriores a ele devem ter sido registrados, pois em caso contrário, “D” ficará impedido de realizar o registro de seu título. “O objetivo da adoção do princípio da continuidade é impedir que aquele que, perante o registro imobiliário, não é o proprietário, possa vender o imóvel”[22].

Por óbvio, existem inúmeros outros princípios inerentes ao registro imobiliário, ou ainda que venham a refletir sobre ele, mas os princípios ora citados cumprem um papel importante para o entendimento do processo de compra e venda de imóveis bem como a garantia da segurança no referido processo.

2.3. A documentação e a suas respectivas informações

Visando diminuir o risco da transação imobiliária algumas medidas devem ser adotadas, dentre elas a análise pormenorizada de toda documentação, pois, é por meio desta análise que será possível identificar situações já existentes e, que podem se tornar problemas futuros, gerando dificuldades desnecessárias para as partes.

Existem certidões que podem trazer informações de extrema importância para o processo de compra e venda de imóveis, e que se consideradas na negociação proporcionam uma maior segurança.

O título de propriedade, que pode ser a escritura pública de compra e venda, juntamente com a certidão de propriedade do imóvel, também chamada de certidão de ônus reais, devem ser ou primeiros documentos analisados.

A certidão de ônus reais trata-se de um documento, no qual são extraídas todas as informações da matrícula do imóvel, retrata todos os registros e averbações constantes na matrícula.

Qualquer pessoa pode solicitar esta certidão, para isto, basta o requerimento junto ao Cartório de Registro de Imóveis, no qual o imóvel tenha sido registrado, mediante o pagamento das custas e emolumentos inerentes.

Tanto o título de propriedade quanto a certidão de ônus reais “[…] se destinam a comprovar a titularidade sobre o domínio e a inexistência de ônus reais ou gravames incidindo sobre o bem”[23].

 Insta ressaltar que para prover uma maior segurança ao negócio jurídico, é necessário exigir uma certidão atualizada, ou seja, que tenha sido emitida há no máximo trinta dias[24]. Um dos motivos para essa exigência é que “o imóvel já pode ter sido vendido e uma certidão antiga não mostrará o novo proprietário, embora os trinta dias, a bem da verdade, não garantam plenamente que o imóvel não tenha outro dono por ocasião da escritura”[25]. No entanto, com essa medida é possível diminuir potencialmente os riscos.

Outra parte importante da documentação são as denominadas certidões negativas pessoais dos vendedores. Estas certidões demonstram se há algum impedimento para a realização da venda do imóvel. Por este motivo, tais certidões devem ser negativas, ou seja, não constar nenhum obstáculo à venda.

Obstáculos esses que podem ser, entre outros, a existência de algum processo de interdição, o que está relacionado diretamente ao requisito da capacidade das partes, ou ainda qualquer outro processo que possa comprometer o seu patrimônio, de forma que a venda realizada possa ser avaliada como fraude a credores.[26]

No que se refere à capacidade e o processo de interdição Bruno Mattos e Silva afirma que “a interdição constitui uma cessação da capacidade do interditado de praticar atos jurídicos, como a venda de bens. Ela pode decorrer de várias causas, tais como prodigalidade, toxicomania, psicopatia ou demência senil”[27].

O processo de interdição pode ocorrer tanto para o vendedor quanto para o comprador, e estas informações podem ser encontradas nas Certidões do 1º e 2º Ofícios de Interdições e Tutelas.

Com relação às certidões negativas pessoais dos vendedores, cada região possui suas exigências próprias, no Rio de Janeiro, por exemplo, as certidões negativas pessoais dos vendedores se caracterizam pelas certidões do 1º, 2º, 3º e 4º Ofícios de distribuição, que se referem às ações cíveis, e também o 9º Ofício de Distribuição, que se refere à Fazenda Pública[28].

As certidões negativas reais também devem ser analisadas, elas informam se há alguma constrição judicial no imóvel, como, por exemplo, penhora, arresto, sequestro, entre outras constrições, e também se há algum processo de execução que possa incidir sobre o imóvel[29].

A penhora trata-se de um ato judicial que incide sobre o imóvel e visa vincular o imóvel ao pagamento de uma dívida específica do proprietário. “[…] A penhora terá prioridade sobre a venda, o que significa que o imóvel poderá ser alienado em praça (hasta pública) para garantir a obrigação do vendedor, mesmo que o comprador já tenha registrado a escritura definitiva […].”[30] Desta forma, caso o proprietário tenha contraído alguma dívida, poderá ser instituída a penhora do seu imóvel para a execução desse pagamento, cumprindo assim a obrigação contraída.

O arresto consiste em um ato de garantia, ou seja, é uma medida provisória que antecede a penhora[31]. Trata-se de uma medida cautelar que visa a proteção do bem para que o proprietário não o venda antes do cumprimento da obrigação. Nos termos do artigo 820 do Código de Processo Civil, nos casos de pagamento da dívida, novação ou acordo entre as partes será cessado o arresto.

Já o sequestro se diferencia do arresto e da penhora, ele visa proteger o próprio imóvel objeto do litigio, no caso de receio de dano ao bem.[32] Conforme o Código de Processo Civil em seu artigo 822, a decretação do sequestro será feita pelo juiz a requerimento da parte.

Se na matrícula do imóvel que se pretende adquirir constar o registro de uma penhora, arresto ou sequestro, o adquirente não poderá alegar desconhecimento da constrição em decorrência da publicidade adquirida com o registro.

“Caso o comprador deseje adquirir um bem que esteja penhorado, arrestado etc., poderá fazê-lo mediante entendimento com o vendedor e com o credor ao qual a medida constritiva beneficie, pagando ou assumindo o comprador a dívida do vendedor, com desconto desse valor no preço do imóvel, fazendo constar da escritura pública, com expressa autorização e assinatura do credor, que a dívida foi paga ou assumida e por tal razão fica autorizado o levantamento da constrição, esteja ela registrada ou não, devendo a escritura especificar, de forma detalhada, qual é ou quais são as constrições cujo levantamento esteja sendo autorizado.”[33]

Destarte, até é possível adquirir um imóvel com tais restrições, mas devendo sempre ter atenção com esses requisitos para evitar problemas posteriormente por ocasião da faltam de algum deles.

Outras certidões importantes para aumentar a segurança no negócio imobiliário são as certidões de quitação fiscal imobiliária. Com estas certidões é possível verificar se o imóvel possui algum débito com o fisco[34]. Como, por exemplo, débitos de Imposto Predial e Territorial Urbano, mais conhecido como IPTU. Elas apresentam tanto as parcelas em aberto do ano corrente, quanto os débitos de exercícios anteriores que já tenham sido incluídos na dívida ativa.

Existem diversos outros documentos que podem ser solicitados visando uma maior segurança jurídica aos negócios imobiliários, mas todos versando basicamente sobre os mesmos aspectos. É possível também receberem nomenclatura diferente de acordo com a região, pois essa relação de documentos pode variar conforme a cidade.

Com relação à Cidade do Rio de Janeiro os documentos necessários para proporcionar maior segurança à transação imobiliária são: a certidão de ônus reais vintenária com situação enfiteutica e data do habite-se (certidão emitida exclusivamente pelo cartório de registro de Imóveis competente mediante pagamento dos respectivos emolumentos), certidão de situação fiscal e enfitêutica (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente pelo site da Prefeitura), certidão de taxa de incêndio (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente pelo site do Corpo de Bombeiros), certidão da receita estadual (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente pelo site da Secretaria de Fazenda), certidão da receita federal (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente pelo site da Receita Federal), certidão do distribuidor da justiça federal (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente do site da Justiça Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro), certidão do distribuidor da justiça do trabalho – de feitos ajuizados trabalhistas (certidão emitida mediante pagamento da Guia de Recolhimento da União, demais informações no site do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região), CNDT – certidão negativa de débito trabalhista (certidão gratuita e pode ser emitida diretamente do site do Tribunal Superior do Trabalho), certidão da 1ª circunscrição do RCPN (Registro Civil de Pessoas Naturais) da Capital – interdições e tutelas (certidão emitida no referido cartório mediante pagamento dos respectivos emolumentos), certidão do 2º ofício de registro de interdições e tutelas (certidão emitida no referido cartório mediante pagamento dos respectivos emolumentos), certidões do 1º, 2º, 3º e 4º ofícios do registro de distribuições, 9º oficio do registro de distribuição em nome do vendedor e também sobre o imóvel (certidões emitidas nos respectivos distribuidores ou na central das certidões mediante pagamento dos respectivos emolumentos)[35].

2.4 – Benefícios do registro na transação imobiliária

Para a transação imobiliária evidente é a importância da prévia análise de toda documentação e consequentemente a realização do registro imobiliário.

Ao adquirir um imóvel não se pode deixar de registrá-lo, pois a ausência do registro pode ocasionar diversos problemas. No entanto se o adquirente tomar as medidas de segurança cabíveis, analisando as certidões e não constando nenhuma possível constrição no imóvel diminuirá potenciais riscos.

Tomando como base a premissa já tratada alhures de que só é proprietário quem registra. Uma das diversas situações possíveis decorrentes da ausência do registro, por exemplo, é a realização de outra escritura de compra e venda pelo vendedor com terceiros tendo como objeto o mesmo imóvel. E neste caso como já visto, com base nos princípios da anterioridade e da continuidade caso este terceiro efetue o registro primeiro, por mais que a escritura dele tenha sido posterior, o que é levado em consideração é a ordem de apresentação dos títulos no Cartório de Registro de Imóveis.

Neste sentido, é, portanto, irrelevante saber qual escritura foi realizada primeiro. “O que importa é a data de seu registro, aferindo-se isso pelo protocolo da prenotação no Cartório imobiliário […]. A escritura que for primeiro registrada é que terá o condão de transferir a propriedade, impedindo o registro da outra”[36]

Outro problema decorrente da ausência do registro é a situação em que o vendedor, independentemente de antes ou depois de realizada a escritura de compra e venda do imóvel, venha adquirir uma dívida que não sendo quitada poderá o credor solicitar judicialmente a penhora do imóvel para satisfação do seu crédito. Neste caso, na ausência do registro da nova transferência, como constará que o bem adquirido ainda é de propriedade do proprietário anterior, poderá recair sobre o imóvel esta constrição, e este bem vir a ser objeto de constrição judicial.

Inúmeros são os processos tramitando no Poder Judiciário versando sobre esses assuntos, o que possibilita analisar algumas jurisprudências. O entendimento dos nossos tribunais é no sentido de que na hipótese da venda de um mesmo imóvel para pessoas distintas a situação se resolve com base no princípio da anterioridade, ou seja, a propriedade do imóvel cabe à parte que primeiro registrou o título aquisitivo. Já no que se refere à ausência de registro o entendimento é de que o adquirente pode pleitear seu direito judicialmente, mediante embargos de terceiros, independente do registro do título, conforme súmula 84 do Superior Tribunal de Justiça.

Desta forma é possível constatar que existem diversos problemas que podem vir a ocorrer em decorrência da falta ou ainda pela demora excessiva na realização do registro do imóvel adquirido. E caso estes problemas sobrevenham, o adquirente terá que recorrer ao Poder Judiciário para solucionar a situação. No entanto, são transtornos que podem ser evitados quando se tem a devida cautela no processo de compra e venda de imóveis.

3. Conclusão

A transação imobiliária é um negócio jurídico de risco como qualquer outro, e requer cuidados especiais. Desta forma, para alcançar maior segurança nestas transações é primordial atender as principais exigências inerentes ao processo.

Ao analisar o processo de compra e venda de imóveis, sob o aspecto da legislação vigente, é possível perceber que inúmeras peculiaridades devem ser observadas. Pois apesar de comum no dia a dia das pessoas não se trata de um processo simples, possui certo grau de complexidade, o que requer atenção das partes até a conclusão de todo o processo, na qual ocorre pela ocasião do devido registro do título aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis competente.

Neste contexto, é possível perceber que diversas são as dificuldades enfrentadas partes envolvidas na negociação imobiliária. No entanto, a legislação vigente apresenta medidas que devem ser tomadas para diminuir essas dificuldades, bem como os riscos intrínsecos, ou seja, analisar toda a documentação de forma minuciosa, esta análise se aplica a ambas as partes, do vendedor e do comprador, este último com relação à capacidade para o ato, assim como à documentação do imóvel. Além é claro de finalizar o processo, pois não adianta seguir todas as orientações, tomar todos os cuidados, analisar a documentação, realizar a escritura e não registrá-la.

Sem o registro do imóvel as partes continuam suscetíveis aos mesmos riscos. Pois a simples análise da documentação não garante a segurança jurídica da transação, uma vez que há a possibilidade de advirem fatos supervenientes que podem incidir sobre o imóvel devido à ausência do registro e a consequente publicidade inerente ao ato.

É lógico que mesmo tomando todas as precauções possíveis as partes são passíveis a problemas decorrentes desse negócio, pois inúmeros são os casos de tentativa de fraude e má fé na transação imobiliária. Para estes casos o caminho para a parte de boa fé resolver o problema é levar a situação para deslinde junto ao Poder Judiciário.

Portanto, essas medidas quando adotadas de forma correta, seguindo o que determina a legislação vigente sobre o tema, proporciona uma maior segurança jurídica para a transação imobiliária.

Desta forma, concluindo todo o processo de compra e venda de imóvel sob essa ótica serão imensamente menores os riscos e os problemas que as partes poderão enfrentar em decorrência dessa transação.

 

Referências
AGHIARIAN, Hércules Egídio Dias. Curso de direito imobiliário. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
AVVAD, Pedro Elias. Direito Imobiliário – Teoria Geral e Negócios Imobiliários. 3ª ed., Forense.
CARVALHO, Fabiano; BARIONI, Rodrigo (Coords.). Processo imobiliário. São Paulo: Forense, 2011.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Volume III – Contratos e Atos Unilaterais – 11.ed., São Paulo: Saraiva, 2014.
LUZ, Valdemar P. da. Direito imobiliário: fundamentos teóricos e práticos. 5. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2009.
SCAVONE JUNIOR, Luiz AntonioDireito Imobiliário – Teoria e Prática. 7.ed., Rio de Janeiro: Forense, 2014.
SILVA, Bruno Mattos e. Compra de imóveis: aspectos jurídicos, cautelas devidas e análise de riscos. 7 ed.  São Paulo: Atlas, 2009.
STAND. Publicações do Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ano VII, n. 28
 
Notas:
[1] SILVA, Bruno Mattos e. Compra de imóveis: aspectos jurídicos, cautelas devidas e análise de riscos. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 48.

[2] LUZ, Valdemar P. da. Direito imobiliário: fundamentos teóricos e práticos. 5. ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2009, p. 42.

[3] AVVAD, Pedro Elias. Direito imobiliário: teoria geral e negócios imobiliários. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 428.

[4]  LOUREIRO, Luiz Guilherme. Registros públicos: teoria e prática. 5. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014, p. 330.

[5]  LOUREIRO, op. cit., p.384.

[6] SILVA, op. cit., p. 4

[7]  AVVAD, op. cit., p. 292.

[8]  SILVA, op. cit., p. 2.

[9]  LOUREIRO, op. cit., p, 243.

[10]  SILVA, op. cit., p. 3.

[11]  AVVAD, op. cit., p. 296

[12]  Ibdi., p.297

[13]  LOUREIRO, op. cit., p. 328.

[14]  AGHIARIAN, Hércules. Curso de direito imobiliário. 11. ed.rev. ampl. e atual. São Paulo: Atlas, 2012, p. 88.

[15]  AVVAD, op. cit., p.294.

[16]  Ibdi, p. 294.

[17]  Ibdi, p. 294.

[18]  AGHIARIAN, op. cit., p. 88.

[19]  AVVAD, op. cit., p. 294.

[20]  AGHIARIAN, op. cit., p. 89.

[21]  AVVAD, op. cit., 295.

[22]  SILVA, op. cit., p.7.

[23]  AVVAD, op. cit., p. 432.

[24]  SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Direito Imobiliário: teoria e prática. 7.ed., Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 791.

[25]  Ibdi., p. 791.

[26]  AVVAD, op. cit., p. 433.

[27]  SILVA, op. cit., p. 116.

[28]  Ibdi., p. 118.

[29]  AVVAD, op. cit., p. 433.

[30]  SILVA, op. cit., p. 41.

[31]  Ibdi., p. 43.

[32]  SILVA, op. cit., p. 44.

[33]  Ibdi., p. 45.

[34]  AVAAD, op. cit., p. 433.

[35]  STAND. Publicações do Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ano VII, n. 28., p. 6.

[36]  SILVA, op. cit., p. 22.


Informações Sobre o Autor

Maria Cristina da Silva Caetano

Pós Graduanda em Direito Imobiliário Bacharel em Direito Associada ABAMI Associação Brasileira de Advogados do Mercado Imobiliário Corretora de Imóveis com registro no CRECI/RJ Pós Graduada em Administração da Qualidade Bacharel em Administração de Empresas


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