Salário-maternidade para pais adotivos

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Resumo: Este artigo trata do benefício previdenciário salário-maternidade, se dispondo a fazer uma abordagem restritiva ao Regime Geral da Previdência Social e relativa às suas extensões recentes, primeiro às mães adotantes e, mais recentemente, a extensão do mesmo aos pais adotivos e solteiros, abordando principalmente os princípios que permitiram essa expansão mesmo sem previsão legal expressa.

Palavras-chaves: Salário-Maternidade; Homem; Mulher; INSS

Abstract: This article deals with the benefit pension paid maternity leave, is providing to make a restrictive approach to the General Social Security System and relative to its recent extensions, first to adoptive mothers and more recently, the extent of it to foster and single parents, addressing especially the principles that enabled this expansion even without express legal provision.

Keywords: Pension for Maternity Leave; Man; Woman; Social Security

Sumário: Introdução; 1 –Evolução dos Princípios Fundamentais do Salário-Maternidade; 1.1 –  Princípio de Proteção à Maternidade; 1.2 – Princípio de Proteção à Criança; 2 – Licença–Maternidade e Salário-Maternidade para Gestante; 2.1 – Nascimento Programado; 2.2 – Nacimento de Criança Morta; 2.3 – Aborto; 2.4 – Barriga de aluguel; 3 – Licença-Maternidade e Salário-Maternidade para a Adotante; 3.1 – O Instituto da Adoção e da Guarda; 3.2 – A Extensão do Salário-Maternidade à Adotante; 4 – Princípio da Isonomia e a Extensão do Salário-Maternidade ao Pai Solteiro; 5 – Princípio da Isonomia e a Extensão do Salário-Maternidade para Casal Homossexual; Conclusão; Bibliografia

INTRODUÇÃO

Parece anacrônico produzir um artigo a respeito do salário-maternidade para pais adotivos quando o assunto parece pacificado na jurisprudência e na doutrina.

De fato, este tema era mais intrigante há alguns anos, quando este autor o analisou pela primeira vez. Contudo, o recrudescimento do conservadorismo no seio da sociedade é objeto de preocupação para quem estuda o tema, inobstante a lei 12.873/2013 tenha trazido segurança jurídica para um instituto construído pela Doutrina e pela Jurisprudência.

O direito ao salário-maternidade para mães e pais adotivos representa uma evolução no que tange à proteção da família, sendo que a lei acima referida acabou com uma situação de preconceito clara contra famílias constituídas por casais homossexuais, que não podiam abrir mão de um período de convivência com as crianças que adotavam. Assim, um benefício que nasceu para proteger a mulher no trabalho, que sempre foi explorado de forma abusiva, sendo que muitos empregadores restringiam ou ainda restringem conquistas de espaço profissional pela mulheres à abdicação delas ao sonho da maternidade, hoje serve para proteger as famílias em todas as suas formas de constituição.

Desse direito social se depreende o esforço do legislador em proteger a família sobre três importantes aspectos como a fragilidade da criança; a necessidade de preservação da família e; a necessidade de contribuição para o orçamento doméstico de todos que constituem a família.

Como direito social, a licença-maternidade, tem previsão não só na Consolidação das Leis Trabalhistas e na Lei de Benefícios da Previdência Social, como também é constitucionalmente prevista, sempre com características imperativa, inviolável e irrenunciável, mas foi implementado no Brasil após a ratificação da Convenção 103 da Organização Internacional do Trabalho em 1965, primeiro custeado pelo empregador, mas em 1974, por força da lei n° 6.136/74, passou a ter caráter de benefício previdenciário.

Inicialmente, esse benefício visava a proteção à gestação, de forma que originalmente, apenas a mulher contribuinte gestante é quem podia gozar desse direito. Porém, em seguida, o objetivo passou a ser também a proteção à criança.

Nessa esteira, o legislador incluiu no benefício previsto pelo artigo 71 da Lei n° 8.213/91 o artigo 71-A, que fora introduzido pela Lei n° 10.421/03, que acabou por estender o direito à licença-maternidade também às mães adotivas.

Como não poderia ser diferente, essa mudança introduzida nesse benefício trouxe à tona a questão da situação do pai adotante, seja solteiro, ou envolvido em um relacionamento homoafetivo, sendo que lhe é permitida a adoção ou a guarda.

Assim, pelo princípio da isonomia, passou a doutrina e a jurisprudência a aceitar que o homem na situação de adotante solteiro ou em relacionamente homossexual deveria ter o mesmo direito que, outrora, a lei concedeu às mães adotivas em situação parecida.

Neste contexto, em 25/10/2013 foi publicada a lei 12.873 que passou a estender o direito ao salário-maternidade, também, aos homens na condição de adotantes solteiros ou em união estável.

Desses pontos trazidos à tona é que passa a se desenvolver o presente trabalho, de forma a aprofundá-los e explicá-los de maneira clara e objetiva.

1 – EVOLUÇÃO DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO SALÁRIO-MATERNIDADE

O salário-maternidade surgiu tendo como objetivo básico a proteção da segurada mulher, sendo um benefício substitutivo do salário da mãe no período de licença-maternidade, como se denota do artigo 391 da Consolidação das Leis do Trabalho e dos artigos 7°, XVIII e 201 da Constituição Federal.

Porém, com a publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente, houve um aumento da preocupação social com a situação das crianças, outrora abandonadas, que passavam por um processo de guarda para fins de adoção ou a adoção propriamente dita, pois neste caso, como ficaria a situação dos pais adotantes?

Preocupada com esta questão, a jurisprudência pátria construiu uma posição entendendo que o processo de adoção e guarda é demasiadamente doloroso para uma criança e para os pais adotantes, que devem eivar esforços para constituir laços mutuos., pelo que estendeu o direito à licença-maternidade e ao salário-maternidade às mães adotantes como forma de obediência ao princípio de proteção à criança e não mais só em nome da proteção à maternidade.

Posteriormente, o legislador passou a compreender também a necessidade de proteção à criança e assegurou o direito à licença-maternidade para a mãe adotante, através da lei n° 10.421/02.

Ainda, seguindo esta corrente orientadora do benefício previdenciário do salário-maternidade e da licença-maternidade, a jurisprudência deu um passo além e construiu o entendimento de que a proteção à criança deveria ser mais importante do que o sexo do segurado e estendeu o benefício previdenciário do salário-maternidade e o direito trabalhista da licença-maternidade para o homem adotante, seja na condição de único pai ou concedendo o direito a um dos pais em relações homoafetivas.

Felizmente, seguindo a construção jurisprudencial, o legislador promulgou a lei n° 12.873/2013, que alterou o salário-maternidade para concedê-lo ao pai adotante, independentemente do sexo do segurado, como garantia de proteção à criança.

1.1 – Princípio da Proteção à Maternidade

A Convenção 103 da OIT[1] foi a raiz da legislação brasileira no tocante à proteção do trabalho da mulher, incluindo o direito à licença-maternidade e como se pode verificar a partir do artigo 3° dessa Convenção, essa licença se destinava exclusivamente às mulheres gestantes.

Ocorre que, esse instituto tal como confeccionado naquele momento histórico, era imprescindível para garantir o acesso da mulher ao mercado de trabalho, sem causar problemas ao “Pacto de Gerações”, com a redução da natalidade de modo que não pudesse nem repor a população daquele momento, pois empregadores buscavam interferir na vida de suas empregadas para que as mesmas não tivessem filhos e prejudicassem a sua produtividade.

No entanto, a gestação é algo imprescindível para a manutenção da sociedade tal como a conhecemos hoje.

Por isso, a maternidade foi um dos primeiros direitos a ser protegido quando da inserção da mulher no mercado de trabalho, haja visto que a sociedade não pode abrir mão dela e a mulher hoje precisa contribuir para o sustento da casa, sem contar que em muitas casas ela é a chefe de família.

Assim, a Constituição Federal, a Consolidação das Leis do Trabalho, a Lei de Benefícios da Previdência Social passaram a dispor de normas que sempre deixaram explícitas a proteção à gestante e à maternidade, fixando essa proteção como princípio orientador de suas normas na regulação das relações trabalhistas, sendo que para garantir a manutenção do nível de renda da segurada que se licencia em razão da maternidade é criado o benefício previdenciário salário-maternidade.

1.2 – Princípio da Proteção à Criança

A proteção à criança é um dos princípios sociais assegurados pelo artigo 6° da Constituição Federal. No entanto, a priori, quando do advento do instituto da licença-maternidade e do salário-maternidade, esse princípio ficou em segundo plano e adstrito aos filhos naturais como disposto no artigo 71 da lei n° 8.213/91.

No entanto, em nome do princípio da isonomia os tribunais passaram a estender esses direitos às mães adotantes, justamente por causa da necessidade de se observar o princípio basilar da proteção à criança, que foi reforçado no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim pode-se observar das decisões abaixo transcritas proferidas pelo Tribunal Superior do Trabalho:

"SALÁRIO-MATERNIDADE – MÃE ADOTIVA.

Inobstante a legislação trabalhista seja omissa acerca do direito à licença-maternidadeda mãe adotante, negar tal direito a esta, contudo, importaria discriminação ao próprio filho adotivo, contrariando-se, assim, a Carta Magna que, ao instituir a licença-maternidade, visou resguardar o interesse social em que o novo ser humano alcance desenvolvimento pleno e satisfatório sob os aspectos físico e psicológico. Ao Estado, enquanto comunidade, interessa a formação de um ser humano hígido, saudável. E nisso é insubstituível o papel da mãe, especialmente nos primeiros meses, seja o filho natural, ou não."[2]

"LICENÇA-MATERNIDADE – MÃE ADOTIVA.

A mãe adotante de recém-nascido, cuja integridade objetivam a Constituição e a Lei proteger, tem direito à licença maternidade, em igualdade de condições com a mãe biológica. Inteligência do artigo duzentos e vinte e sete, parágrafo sexto, da Constituição Federal."[3]

"LICENÇA-MATERNIDADE – MÃE ADOTIVA.

O princípio de proteção ao menor, consagrado na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, impõe a aplicação analógica, nos termos do artigo oitavo da CLT, dos benefícios legais concedidos à gestante, tal como o direito ao gozo da licença-maternidade, para a mãe adotiva, uma vez que o que se objetiva é proteger a maternidade e não estritamente a mãe empregada."[4]

Diante do reconhecimento desse direito às mães adotivas, tardiamente, o legislador estendeu legalmente esse através da lei n° 10.421/02, fazendo jus em definitivo à necessidade de proteção à criança. E, posteriormente, em 2013, o legislador estendeu o salário-maternidade aos pais adotivos, independentemente, do sexo do segurado, através da lei n° 12.873/2013.

Frise-se que o que foi protegido foi o direito da criança até 8 (oito) anos de idade, posto que a partir de tal idade a lei não concede o direito à licença-maternidade para os pais adotantes, apesar de isso ferir gravemente o princípio da isonomia. É como se apenas as crrianças menores é que precisassem de tempo para se adaptar à uma nova família.

2 – LICENÇA-MATERNIDADE E SALÁRIO-MATERNIDADE PARA GESTANTE

Conforme já visto, a licença-maternidade é um direito trabalhista que, precipuamente, se destinava às gestantes e tem duração de 120 dias, sendo que se aconselha que o mesmo passe a ser gozado 28 (vinte e oito) dias antes do parto e os outros 92 (noventa e dois) dias sejam gozados depois do parto.

Houve uma mudança recente advinda da lei n° 11.770/08, que trouxe algumas alterações no direito de licença-maternidade, estendendo-o opcionalmente à 180 (cento e oitenta dias) caso seja requerido pela mãe no primeiro mês do parto ou da adoção, além de dar o direito à remuneração integral no período de afastamento do emprego, quando a pessoa não exercer outra atividade remunerada no período de gozo do benefício e não deixar a criança em creche.

No entanto, as mudanças só começarão a ser aplicadas ao setor privado em 2010, apesar de já valerem no setor público.

Já o salário-maternidade é um benefício previdenciário de prestação continuada e substitutivo da renda no período de licença do segurado em razão da maternidade, limitado a 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste.

O valor do benefício é a renda mensal para seguradas trabalhadoras avulsas e empregadas, não estando sujeito ao limite do teto do salário de contribuição; para as empregadas domésticas será a renda mensal correspondente ao último salário de contribuição desta seguarada; já para as seguradas especiais será de um salário mínimo e para as demais seguradas será dado por 1/12 da soma das 12 últimas contribuições apuradas em um período não superior a 15 meses.

O salário-maternidade é pago pelo empregador e abatido das contribuições sociais devidas por estes ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Já para as demais seguradas, incluídas as trabalhadoras avulsas e empregadas do microempreendedor individual, o benefício será pago diretamente pela Previdência Social.

Cumpre ressaltar que, para as seguradas empregadas, domésticas e avulsas não há carência para a concessão do salário-maternidade, porém, para as seguradas contribuintes individuais, facultativas e seguradas especiais há carência, qual seja de 10 (dez) contribuições mensais, segundo o disposto no artigo 25, III, da lei n° 8.213/91.

A alíquota aplicada é de 100% (cem por cento) do salário, não havendo, portanto, nenhum desconto, exceto para benefícios pagos às seguradas individuais e facultativas, que sofrem desconto de 20% (vinte por cento) no valor do seu benefício, correspondente à contribuição previdenciária, inobstante não haja disposição na lei n° 8.213/91 sobre este desconto. Destaco este ponto, pois não concordo com este desconto, mas a Jurisprudência fixou posição favorável ao desconto, seguindo a disposição do Decreto n° 3.048/99.

Isso é o que se aplica no caso da gestante com a ocorrência do nascimento programado. Mas a gestante ainda terá direito ao benefício no caso de nascimento de criança morta, em caso de aborto e também no caso de barriga de aluguel, com durações diferentes.

2.1 Nascimento Programado

O salário-maternidade é direito da gestante segurada e tem duração de até 120 (cento e vinte) dias. A origem do instituto em estudo visava proteger justamente as trabalhadores empregadas e seguradas nessa condição.

O nascimento programado é o nascimento esperado de uma gravidez. Nesse caso o salário-maternidade fica mais evidente a proteção à mãe, mas é importante salientar que tanto a Constituição Federal quanto o Código Civil protegem o direito do nascituro desde a concepção.

A partir do parto é que a proteção à maternidade e o princípio da proteção à criança adquirem o mesmo valor, posto que é necessário reestabelecer a saúde da mãe, bem como proteger o bebê indefeso que precisa dos primeiros cuidados da mãe, pelo que em regra, o salário-maternidade pode ser pleiteado a partir do 28° (vigésimo oitavo) dia antecedente ao parto, e o período maior do benefício, 92 (noventa e dois) dias é destinado à adaptação da criança no seio familiar.

Nesse esteio, caso a mãe ou a criança precisem de mais cuidados em relação às suas condições de saúde, o médico pode determinar a extensão do período de licença-maternidade por até 15 (quinze) dias e caso não seja suficiente, a mãe passará a se afastar do seu trabalho e receber não mais a licença-maternidade e sim o auxílio-doença.

Em caso de dispensa da gestante a posição institucional da Previdência Social é de que o benefício do salário-maternidade não deve ser concedido. Confira-se:

O que acontece quando a empregada gestante é despedida?Não havendo mais a relação de emprego, a Previdência Social não concederá o benefício salário-maternidade. O empregador, conforme o caso, efetuará os pagamentos nas indenizações trabalhistas.”[5]

Esta seguramente não é a posição da doutrina e nem da jurisprudência, que consideram que o benefício é devido enquanto a pessoa for segurada, incluindo o período de graça.

2.2 – Nacimento de Criança Morta

O nascimento de uma criança morta é um evento não esperado e certamente um dos mais indesejados. Ocorre quando, após o 6° (sexto) mês de gestação, o parto acontece, sendo que é dado a luz à uma criança morta. Nesse caso a licença-maternidade também é direito da mãe segurada. Ressaltado aqui o 6° (sexto) mês da gestação, pois antes disto é considerado aborto.

Porém, o período de gozo ainda não foi bem definido e é discutível, pois seu enquadramento não é fixo na lei 8.213/91 e nem no Decreto n° 3.048/99 o benefício é devido.

Há quem advogue que neste caso o benefício é devido por 15 (quinze) dias após o parto, equiparando o parto de natimorto com o aborto e enquadrando-o no artigo 93, §5°, do Decreto n° 3.048/99.

Mas essa questão está longe de ser pacífica, sendo que grande parte da doutrina e da jurisprudência, ao qual o autor deste artigo se filia, considera que o nascimento de criança sem vida após o 6° (sexto) mês de gestação garante à segurada os mesmos direitos de uma mãe que tem um parto no qual a criança nasça com vida, qual seja os 120 (cento e vinte) dias de salário-maternidade, situação que se enquadra perfeitamente no artigo 93, §4°, do Decreto n° 3.048/99.

2.3 – Aborto

Outro caso indesejado é o de aborto, mas esse já está bem regulado pelo artigo 395 da Consolidação das Leis do Trabalho e, principalmente, disposto de forma clara no artigo 93, §5°, do Decreto n° 3.048/99, estando, também, bem assentado na doutrina e na jurisprudência, sendo que o período de direito de salário-maternidade da segurada é de 15 (quinze) dias.

A questão aqui é só diferir o aborto do nascimento de criança sem vida. Como já dito anteriormente o nascimento de criança sem vida é tradicionalmente definido como o parto ocorrido à partir do 6° (sexto) mês de gestação, já o aborto ocorre antes desse período, que é o período considerado em que o feto é inviável e não sobreviveria.

É mister salientar que o aborto coberto pela Previdência Social é o aborto espontâneo ou necessário, já o aborto ilegal, que é considerado crime, não é protegido por esse direito e a mãe não terá direito à licença-maternidade.

2.4 – Barriga de Aluguel

O caso da barriga de aluguel é algo que ainda aguarda um posicionamento legal, apesar de já estar há anos em discussão na Jurisprudência e na doutrina.

Esse é o caso de uma gestante de filho de outra que é incapaz, por alguma deficiência de seu corpo, de gestacionar um feto.

Nesse caso há duas mães, uma a gestante ou parturiente e a outra que será criadora da criança. Assim surge a dúvida, como definir quem gozará da licença-maternidade e receberá o salário-maternidade?

É uma questão de definir o que é mais importante proteger a saúde da mãe ou a proteção à criança? A questão é facilmente solucionada, ambos são importante, então devem ser igualmente protegidos. Sendo que ambas as seguradas devem fruir igualmente a licença-maternidade e receber o benefício do salário-maternidade.

A gestante deve ter direito aos 120 (cento e vinte) de uma mãe que teve seu filho que nasceu com vida, em razão dos cuidados com a gestação e para se recuperar dos desgastes da mesma após o parto; e a outra, que criará a criança, também deve ter direito à 120 (cento e vinte) dias de licença-maternidade como alguém que adota ou toma a guarda para fins de adoção de uma criança.

Em resumo, ambos os direitos devem ser protegidos por serem igualmente importantes e não haver nenhum óbice legal. Aliás, situação análoga é a regulada no artigo 93 – A do Decreto n° 3.048/99 e no artigo 71-A da lei n° 8.213/91, que assegura à mãe adotante o direito à licença-maternidade, mesmo que a mãe biológica já tenha gozado desse direito.

3 – LICENÇA MATERNIDADE E SALÁRIO-MATERNIDADE PARA A ADOTANTE

O direito à licença-maternidade e ao salário-maternidade para a mãe adotante foi desde cedo entendido tanto pela jurisprudência, quanto pela doutrina, que eram devidos a ela, mas isso só se transformou em lei em 2002, com a aprovação de lei n° 10.421, que alterou o artigo 71 – A da lei n° 8.213/91.

A referida lei estabeleceu um tipo de tabela em que o período da licença-maternidade varia em função da idade do adotado de forma inversa, sendo que quanto maior a idade do adotado menor é o prazo de direito a licença-maternidade. Conforme tabela que segue:

“Crianças adotadas até 1 anos de idade – Licença-maternidade de 120 dias

Crianças adotadas de 1 à 4 anos de idade Licença-maternidade de 60 dias

Crianças adotadas de 4 à 8 anos de idade – Licença-maternidade de 30 dias”

Mas a lei não estabeleceu o direito de licença-maternidade apenas para as adotantes, também conferiu o mesmo direito aos guardiões legais quando estão nessa condição para fins de adoção. Portanto cabe falar melhor um pouco desses intitutos para melhor compreensão mais à frente.

Outrossim, mais recentemente, a lei n° 8.213/91 foi alterada novamente pela lei n° 12.873/2013 no seu artigo 71-A que, entre outros avanços que serão referidos mais a diante, acabou com a diferencicação do tempo de fruição do salário-maternidade em razão da idade do adotado, regulamentando que ele será de 120 (cento e vinte) dias em todos os casos de adoção de menor de idade.

3.1 – O Instituto da Adoção e da Guarda

Segundo a Professora Silvana Maria Carbonera a guarda é a atribuição do dever de cuidar de um menor que é atribuído a um pessoa, confira-se:

“Um instituto jurídico através do qual se atribui a uma pessoa, o guardião, um complexo de direitos e deveres a serem exercidos com o objetivo de proteger e prover as necesssidades de desenvolvimento de outra que dele necessite, colocada sob sua responsabilidade em virtude de lei ou decisão judicial.”(CARBONARA. 2000 – p. 47)[6]

Mas a guarda que importa nesse caso é a atribuída pelo juiz para fins de adoção, ou seja, terá direito ao salário-maternidade aquela pessoa que obtenha a guarda de um menor com o desejo de adotá-lo, concedida por um juiz no processo de adoção.

Já a adoção deve obedecer um processo judicial e só pode  se concretizar se trazer benefícios para o adotado. O Código Civil exige algumas condições para o adotante, como ser maior de 18 (dezoito) anos e pelo menos 13 (treze) anos mais velho do que a criança adotada.

A adoção tem caráter irrevogável após o trânsito em julgado da decisão que a concede e nela a criança adotada adquire todos os direitos sucessórios de qualquer filho natural, inclusive adquirindo o sobrenome dos adotantes. Frise-se que a Constituição Federal, o Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente veda qualquer tipo de descriminação entre os filhos naturais e os adotados.

3.2 – A Extensão do Salário-Maternidade à Adotante

Como já dito anteriormente, com o advento da lei n° 10.421/2002 e, posteriormente a lei n° 12.873/2013, restou expresso em lei a expansão do direito à licença-maternidade às mães adotantes, porém muito antes da aprovação dessa lei as cortes desse país já haviam expandido esse direito em nome do princípio da isonomia.

Considera-se que isso aconteceu, pois passou-se a levar em consideração não só o princípio da proteção à gestante, mas deveu-se a valorização do princípio de proteção à criança.

Um fato que gerava polêmica na extensão da licença-maternidade para as adotantes era a tabela de período de gozo da licença que variava em função da idade da criança adotada e que já foi demonstrada anteriormente. Felizmente, o legislador consertou este equívoco, extirpando esta tabela com a lei n° 12.873/2013, sendo que a maior parte da doutrina considerava que esse fator de discrímen não tinha razão de existência e feria gravemente a isonomia, sem falar no absurdo que era limitar esse direito apenas quando o adotado tivesse menos de 8 (oito) anos, como se a criança de idade maior ou a família adotante de tal criança não precisasse usufruir de tal direito para estreitar laços e tornar o convívio mais harmonioso. Nesse sentido se manifestou o nobre jurista Dr. Marcus Orione Gonçalves Correia[7]:

“Não há fato de discrímen suficiente para autorizar o menor prazo de gozo de benefício nos casos de adoção. A maternidade não sugere apenas a proteção biológica quer da mãe, quer do filho, mas sim de todo o complexo de relações que decorrem deste status. A proteção ao filho é também foco que não pode ser menosprezados e, nos casos de adoção, a necessidade de maior tempo com a mãe para adaptação no novo lar sugere que o lapso deva ser o mesmo que o concedido à mãe natural. Diga-se de passagem que esta adaptação, que se encontra incluída na proteção da maternidade, indicada constitucionalmente, é tanto mais complexa, quanto maior for a idade do filho e não o contrário.” (CORREIA. 2008 – P. 368)

Como já referido, a lei n° 12.873/2013 acabou com esta discriminação injusta, restaurando o respeito ao princípio da isonomia concedendo salário-maternidade para segurados adotantes por 120 (cento e vinte) dias de qualquer criança ou adolescente.

Outro ponto que causava polêmica era a possibilidade de adoção por homem tanto solteiro quanto em relacionamento homoafetivo, pois a legislação anterior concedeu o direito às seguradas adotantes, mas não aos segurados em situação idêntica, ou seja criou-se uma discussão sobre se a adoção por homens gerava ou não direito à licença-maternidade já que a lei era omissa nesse quesito, o que foi acertado, também, pela lei 12.873/2013, como se verá a seguir.

4 – PRINCÍPIO DA ISONOMIA E A EXTENSÃO DO SALÁRIO-MATERNIDADE AO PAI SOLTEIRO

A expansão legal do direito ao salário-maternidade para as mães adotantes, suscitou um novo questionamento a partir de 2002, que seria a expansão desse direito aos pais adotantes, já que como é sábido, o instituto da adoção e da guarda não são restritos às mulheres.

Nesse sentido a Professora Doutora Érica Paula Barcha Correia[8] se pronunciou:

“Teria o segurado, adotante, direito à concessão do salário-maternidade? Nossa resposta é afirmativa, partindo-se do pressuposto de que o conceito de maternidade, nestes casos, envolve uma nova modalidade familiar.

O conceito de maternidade não pode se reportar tão somente à figura feminina. O Direito, por sua vez, não pode deixar de regular novas modalidades de constituição familiar, v.g., as famílias monoparentais”

É nessa esteira que já em 2007 se pronunciou o Tribunal Regional do Trabalho de Campinas, que decidiu por estender o direito trabalhista da licença-maternidade ao servidor público Gilberto Antonio Semensato que adotou uma criança, sendo ele solteiro, considerando o princípio da isonomia, aplicando o mesmo direito que a lei concedeu às mães adotantes e seguradas.

Aquela decisão se tornou paradigma na Jurisprudência e orientou os tribunais trabalhistas no sentido de estender a licença-maternidade para os pais adotantes, discussão esta que foi mais longa na Justiça Federal em relação à extensão do benefício salário-maternidade para o pai adotante.

Porém, todas estas discussões foram pacificadas com a alteração da lei n° 8.213/91 pela lei n° 12.873/2013, que alterou o artigo 71-A da primeira lei para o fim de atribuir o direito ao salário-maternidade para o segurado ou segurada adotante ou que obtenha guarda para fins de adoção. Ressalto novamente que tais conquistas são recentes e anteriores ao recrudescimento do conservadorismo social a partir da última eleição presidencial em 2014, conquistas estas que não podem ser colocadas em risco no corpo de uma discussão de reforma previdenciária.

5 – PRINCÍPIO DA ISONOMIA E A EXTENSÃO DO SALÁRIO-MATERNIDADE PARA CASAL HOMOSSEXUAL

Ainda, decisões que estenderam o salário-maternidade para o pai adotante solteiro geraram outra polêmica ainda maior que é a situção de como ficaria a aplicação desse direito quando o assunto tratado fizesse referência a um casal homossexual.

Saliente-se que a adoção por casais homoafetivos enfrenta bastante preconceito social, pelo que estes casais enfrentam resistências em todas as esferas para concretizar uma adoção, ainda hoje.

Outra questão que nasceu dessa situação era a de se os dois no casal são segurados da Previdência Social, seria possível dizer que os dois gozariam de tal benefício?

Para responder essas perguntas, antes da alteração mais recente da lei n° 8.212/91, o entendimento pacificado já era no sentido de que o benefício seria concedido a apenas uma das pessoas no casal homossexual, por duas razões simples: primeira, o direito à adoção por casal homossexual não é legalmente regulamentado, pelo que, até tempos recentes, era comum que a adoção por este tipo de casal sofria restrições e preconceitos e era em geral concedida apenas a um dos segurados requisitantes (apenas recentemente foi admitido a adoção por casal homoafetivo e o casamento).

A segunda razão e não menos importante é que a obediência ao princíoio da isonomia não poderia permitir uma distinção de tal natureza, concedendo benefício do salário-maternidade aos dois adotantes, enquanto nas famílias em que ocorriam nascimento natural, apenas a mãe gozaria do benefício. Assim, a jurisprudência fixou desde o primeiro momento que apenas uma pessoa no casal faria jus ao benefício do salário-maternidade em qualquer hipótese.

Importa destacar, que mais uma vez a jurisprudência se antecipou ao legislador, passando a reconhecer a adoção por casal homossexual antes de uma regulamentação legal, sendo um julgado bem ilustrativo nesse sentido do Rio de Janeiro que garantiu a ex-parceira da falecida cantora Cássia Eller a adoção do filho dela quando da ocorrência de sua morte, mesmo com parentes próximos do menino pleiteando a sua guarda.

Ademais, a redação introduzida na lei n° 8.213/91 pela lei n° 12.873/2013 encerrou qualquer tipo de discussão neste sentido com um texto bem genérico no artigo 71-A, §2°, , deixando claro que apenas uma pessoa no casal adotante ou na maternidade biológica, seja qual for o tipo de relação. Tal disposição foi totalmente acertada e encerrou uma discussão doutrinária e jurisprudencial com o máximo respeito ao princípio da isonomia.

Posto isso, hoje é garantido aos segurados em relação homoafetiva o direito à adoção e, também, a uma das pessoas no casal a percepção do benefício do salário-maternidade, um avanço social realmente significativo e muito recente.

CONCLUSÃO

Do exposto se denota que, a despeito do salário-maternidade ter começado como um benefício previdenciário concedido apenas à gestante empregada, a aplicação de princípios constitucionalmente assegurados, tais como: proteção à criança; proteção à maternidade e; a isonomia aplicados pelos tribunais brasileiros, possibilitaram a extensão desse direito primeiro às outras trabalhadoras, depois às mães adotantes através de construções jurisprudenciais.

Assim, o legislador, correndo atrás da jurisprudência estendeu este benefício previdenciário primeiro às mães adotantes através da lei n° 10.421/02 e, posteriormente, aos pais adotivos, independentemente do sexo do segurado, através da lei n° 12.873/13, verdadeiras conquistas liberais que devem ser preservadas dentro do espírito de reforma do sistema previdenciário e do recrudescimento do conservadorismo na sociedade brasileira.

O benefício do salário-maternidade é uma proteção não apenas à família ou à segurada na forma que foi constituído hoje, mas uma proteção à criança, que é a garante do equilíbrio futuro de qualquer sistema de previdência social baseado no pacto de gerações, como é o Regime Geral da Previdência Social brasileira.

Há alguns anos parecia muito difícil uma conquista legal deste porte, como a extensão do direito ao salário-maternidade aos segurados homens que adotassem crianças, mas hoje é uma realidade construída à duras penas, que não pode ser objeto de qualquer medida legal atinente a voltar ao “status quo” conquanto seja um verdadeiro direito humano, sendo vedado o retrocesso nesta área do direito dentro do atual regime constitucional.

 

Referências
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Notas
[1] Organização Internacional do Trabalho. Essa Convenção foi adotada em 1952 na 35ª Sessão da Conferência em Genebra.

[2] RR, 1ª Turma, Ac. 4611 de 04.06.1997, Ministro Relator Lourenço Prado

[3] RR, 5ª Turma, Ac. 240925 de 18.11.1998, Ministro Relator Gelson de Azevedo

[4] RR, 4ª Turma, Ac. 269871 de 19.08.1998, Ministro Relator José Carlos Perret Schulte

[5] Fonte: http://www.dataprev.gov.br/servicos/salmat/salmat_def.htm

[6] Carbonara, Silvana Maria. Guarda de Filhos na Família Constitucionalizada. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris. 2000. P. 47

[7] Comentário no Livro Legislação Previdenciária Comentada. DPJ. 1ª Edição. 2008. P. 368.

[8]Comentário como colaboradora no livro: Curso de Especialização em Direito Previdenciário – Benefícios da Seguridade Social. Vol. 2. Juruá. 2006. Coordenado pelos Professores Daniel Machado da Rocha e José Antônio Savaris.


Informações Sobre o Autor

Rafael Perales de Aguiar

Advogado e Mestrando em Direito Previdenciário pela PUC-SP


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