Execução de sentença penal condenatória antes do trânsito em julgado: análise da virada jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal com destaque para seu reflexo na identificação do termo inicial do prazo prescricional da pretensão executória

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Resumo: O presente artigo tem por objetivo uma breve análise dos posicionamentos do Supremo Tribunal federal acerca da possibilidade de execução da sentença penal condenatória antes do trânsito em julgado, fazendo um contraponto entre estes e o princípio da presunção de inocência.  Após a conceituação do princípio, é feita a análise dos posicionamentos adotados pela Corte Constitucional, e seus respectivos argumentos. Foram estudados também os reflexos da virada jurisprudencial na identificação do termo inicial do prazo prescricional da pretensão executória. O método usado foi o dedutivo, fundamentado por meio de livros, doutrinas, artigos científicos e jurisprudência.

Palavras-chave: Princípio da Presunção de Inocência – Execução Provisória de Sentença Penal – Prescrição da Pretensão Executória

Abstract: This article aims at a brief analysis of the positions of the Supreme Federal Court about the possibility of execution of the criminal sentence before the final judgment, making a contrast between them and the principle of presumption of innocence. After the concept of principle is made the analysis of the positions adopted by the Constitutional Court, and their arguments. Also studied were the effects of the jurisprudential shift in identification of the initial term of the limitation period of enforceable claim. The method used was deductive, based through books, doctrines, scientific articles and jurisprudence.

Keywords: Principle of Presumption of Innocence – Provisional Execution of Criminal Sentence – Prescription Claim Enforceable

Sumário: Introdução. 1. Princípio da Presunção de Inocência. 2. Posicionamento anterior: impossibilidade de execução da pena antes do trânsito em julgado. 3. Virada jurisprudencial: possibilidade de execução provisória da pena antes do trânsito em julgado. 4. Reflexos na prescrição da pretensão executória do estado. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem como objetivo a análise da mudança de entendimento no Supremo Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus de nº126.292/SP, que declarou a possibilidade de execução provisória de sentença penal condenatória, tema tem despertado debates acalorados de constitucionalistas.

A possibilidade da execução da pena antes do trânsito em julgado tem como contraponto o princípio constitucional da presunção de inocência, positivado no art. 5°, LVII, da Constituição-Cidadã de 1988. O cerne da controvérsia está na possível violação, ou não, de tal princípio face ao novo entendimento adotado.

Portanto, o objetivo deste trabalho, além de contribuir com o debate sobre matéria tão relevante, é analisar esses posicionamentos – possibilidade de execução provisória de pena versus princípio da presunção da inocência – fazendo um estudo de como sua aplicação interfere na identificação do termo inicial para contagem do prazo prescricional da pretensão executória do Estado.

Assim, por meio do método dedutivo, fundamentado em jurisprudência, livros, artigos científicos e doutrinas, estruturou-se este trabalho em quatro  capítulos, de forma a melhor apresentação do tema.

No artigo serão abordados o princípio constitucional da presunção de inocência, a posição majoritária anterior à virada jurisprudencial e os argumentos contrários e a favor acerca da matéria.

Para encerrar, há de ser esclarecido se a nova posição do Supremo Tribunal Federal implica mudança no termo inicial da contagem do prazo prescricional da pretensão executória do Estado, e em caso positivo, quando seria iniciada a contagem.

1. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

O princípio da presunção de inocência, também conhecido como princípio da não culpabilidade, positivado na Constituição Brasileira de 1988 no artigo 5°, inciso LVII decorreu da adesão do país à Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, que previa, no seu art. 11.1:

"1.Toda a pessoa acusada de um acto delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade  fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. ”

Postulado de extrema importância no Estado Democrático de Direito, trata-se de um direito de primeira geração, uma garantia do indivíduo face ao Estado, do qual decorem vários outros princípios como o devido processo legal, ampla defesa, contraditório, juiz natural, dentre outros.

Em decorrência de tal princípio, o ônus da prova de culpa cabe ao Estado-Punidor, reservando-se ao acusado, durante todo o processo, o benefício da dúvida acerca do seu suposto comportamento contra a ordem jurídica, pelo que não pode ser tratado como culpado antes de dirimidas quaisquer incertezas acerca do fato delituoso.

2. POSICIONAMENTO ANTERIOR: IMPOSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO DA PENA ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO

A princípio, em diversas oportunidades, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido de que o princípio constitucional de presunção de inocência não impedia a execução provisória de sentença condenatória, ainda que na pendência de julgamento de recursos extraordinários. Nesse sentido:

"EMENTA: HABEAS-CORPUS. CRIME DE ROUBO QUALIFICADO, PRATICADO POR PACIENTE QUE CUMPRIA PENA PELO MESMO DELITO EM REGIME SEMI-ABERTO. RECEBIMENTO DA APELAÇÃO CONDICIONADO AO RECOLHIMENTO À PRISÃO. PRETENSÃO DE RECORRER EM LIBERDADE. IMPUGNAÇÃO DO DECRETO DE PRISÃO EXPEDIDO ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. 1. A prisão do réu é mero efeito da sentença condenatória recorrível – salvo se for prestada fiança, quando cabível (CPP, artigo 393, I) – e a apelação não tem efeito suspensivo (CPP, artigo 597, primeira parte). 2. Para ser admitida a apelação, a regra é que o condenado seja recolhido à prisão e a exceção é que recorra em liberdade, o que só pode ocorrer em três hipóteses: a) que preste fiança, quando for o caso; b) que seja ao mesmo tempo primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória; ou c) que tenha sido condenado por crime de que se livre solto (CPP, artigo 594). 3. A jurisprudência desta Corte está orientada no sentido de que o princípio constitucional da não-culpabilidade impede que se lance o nome do réu no rol dos culpados enquanto não tiver transitado em julgado a decisão condenatória, mas não impede que se inicie a execução provisória, desde que a apelação não tenha efeito suspensivo. Precedente: HC nº 72.610-MG, Min. CELSO DE MELLO, in DJU de 06.09.96, pág. 31.850. 4. Habeas-corpus conhecido, mas indeferido”. (HC 80174, Relator(a):  Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, julgado em 06/06/2000, DJ 12-04-2002 PP-00053 EMENT VOL-02064-03 PP-00481)"

Entretanto, no dia 05/02/2009, em julgamento realizado pelo Plenário do STF no HC84.078/MG, por sete votos a quatro, assentou-se que o princípio da presunção da inocência impediria a execução da pena antes do trânsito em julgado da condenação. Vide a ementa do referido julgado:

"EMENTA: HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O art. 637 do CPP estabelece que "[o] recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelo recorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância para a execução da sentença". A Lei de Execução Penal condicionou a execução da pena privativa de liberdade ao trânsito em julgado da sentença condenatória. A Constituição do Brasil de 1988 definiu, em seu art. 5º, inciso LVII, que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". 2. Daí que os preceitos veiculados pela Lei n. 7.210/84, além de adequados à ordem constitucional vigente, sobrepõem-se, temporal e materialmente, ao disposto no art. 637 do CPP. 3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se a pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão. 5. Prisão temporária, restrição dos efeitos da interposição de recursos em matéria penal e punição exemplar, sem qualquer contemplação, nos "crimes hediondos" exprimem muito bem o sentimento que EVANDRO LINS sintetizou na seguinte assertiva: "Na realidade, quem está desejando punir demais, no fundo, no fundo, está querendo fazer o mal, se equipara um pouco ao próprio delinqüente". 6. A antecipação da execução penal, ademais de incompatível com o texto da Constituição, apenas poderia ser justificada em nome da conveniência dos magistrados — não do processo penal. A prestigiar-se o princípio constitucional, dizem, os tribunais [leia-se STJ e STF] serão inundados por recursos especiais e extraordinários e subseqüentes agravos e embargos, além do que "ninguém mais será preso". Eis o que poderia ser apontado como incitação à "jurisprudência defensiva", que, no extremo, reduz a amplitude ou mesmo amputa garantias constitucionais. A comodidade, a melhor operacionalidade de funcionamento do STF não pode ser lograda a esse preço. 7. No RE 482.006, relator o Ministro Lewandowski, quando foi debatida a constitucionalidade de preceito de lei estadual mineira que impõe a redução de vencimentos de servidores públicos afastados de suas funções por responderem a processo penal em razão da suposta prática de crime funcional [art. 2º da Lei n. 2.364/61, que deu nova redação à Lei n. 869/52], o STF afirmou, por unanimidade, que o preceito implica flagrante violação do disposto no inciso LVII do art. 5º da Constituição do Brasil. Isso porque — disse o relator — "a se admitir a redução da remuneração dos servidores em tais hipóteses, estar-se-ia validando verdadeira antecipação de pena, sem que esta tenha sido precedida do devido processo legal, e antes mesmo de qualquer condenação, nada importando que haja previsão de devolução das diferenças, em caso de absolvição". Daí porque a Corte decidiu, por unanimidade, sonoramente, no sentido do não recebimento do preceito da lei estadual pela Constituição de 1.988, afirmando de modo unânime a impossibilidade de antecipação de qualquer efeito afeto à propriedade anteriormente ao seu trânsito em julgado. A Corte que vigorosamente prestigia o disposto no preceito constitucional em nome da garantia da propriedade não a deve negar quando se trate da garantia da liberdade, mesmo porque a propriedade tem mais a ver com as elites; a ameaça às liberdades alcança de modo efetivo as classes subalternas. 8. Nas democracias mesmo os criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade (art. 1º, III, da Constituição do Brasil). É inadmissível a sua exclusão social, sem que sejam consideradas, em quaisquer circunstâncias, as singularidades de cada infração penal, o que somente se pode apurar plenamente quando transitada em julgado a condenação de cada qual Ordem concedida.
(HC 84078, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 05/02/2009, DJe-035 DIVULG 25-02-2010 PUBLIC 26-02-2010 EMENT VOL-02391-05 PP-01048)"

A partir de então, o STF consignou que, apesar da ausência de efeito suspensivo dos recursos extraordinários, o princípio constitucional retro mencionado só possibilitava o encarceramento do réu após o julgamento final, sob pena de, no caso de absolvição pelas Cortes Superiores, ter havido a prisão de um inocente,  situação inadmissível segundo célebre frase do iluminista Voltaire:  "É melhor correr o risco de salvar um homem culpado do que condenar um inocente".

Contudo, a impossibilidade de prisão antes do trânsito em julgado era excepcionada, somente quando presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva, elencados no artigo 313 do Código de Processo Penal:

"Art. 313.  Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: 

I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II – se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

III – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV – (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

Parágrafo único.  Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011)."

Assim, na ocorrência de algum requisito autorizador da prisão preventiva, poderia o juiz determinar que a espera do julgamento do recurso não obstasse a prisão.

Ocorre que, na prática, tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto o Supremo Tribunal Federal demoram anos para julgar os recursos interpostos, o que gerava uma sensação de impunidade perante a sociedade. Vejamos, por exemplo, o caso amplamente divulgado pela mídia, do assassinato de Sandra Gomide no dia 20 de agosto de 2000, pelo ex-namorado, o jornalista Pimenta Neves, que não aceitava o fim da relação.

Réu confesso, o jornalista foi condenado por júri popular, no ano de 2009, a 19 (dezenove) anos de prisão (depois reduzida para 15 anos), mas, somente foi recolhido mais de 10 (dez) anos do assassinato, quando confirmada a pena pelo STF, situação responsável por uma sensação de impunidade pela população.

Destarte, a principal crítica a esse posicionamento está no incentivo a interposição de sucessivos recursos protelatórios, congestionando o Poder Judiciário, principalmente as instâncias superiores com recursos sem qualquer proveito para efetivação da justiça.

3. VIRADA JURISPRUDENCIAL: POSSIBILIDADE DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA ANTES DO TRÂNSITO EM JULGADO

Recentemente, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal foi novamente alterado, quando do julgamento do HC 126.292/SP, julgado no dia 17/02/2016, conforme ementa abaixo colacionada:

"Ementa: CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado. (HC 126292, Relator(a):  Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016)"

O entendimento segue a trilha da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar n° 135/2010), que alterou a Lei Complementar n° 64/90, para prever expressamente como causa de inelegibilidade a existência de sentença condenatória pelos crimes nela previstos quando proferidas ou confirmadas por órgão colegiado (art. 1°, I, e), bem como está alinhado aos ordenamentos jurídicos alienígenas, que não preveem a possibilidade de suspensão da execução depois de observado o duplo grau de jurisdição.

Restou consignado na decisão paradigma que os recursos de natureza extraordinária não tem por finalidade específica examinar a justiça ou injustiça das sentenças ou acórdãos, eis que se destinam, precipuamente, à preservação da higidez do sistema normativo, a análise de aspectos meramente objetivos, e por isso, raramente modificariam a situação do sentenciado.

Restou ainda registrado no voto do relator do paradigma que

"a execução da pena na pendência de recursos de natureza xtraordinária não compromete o núcleo essencial do pressuposto da não-culpabilidade, na medida em que o acusado foi tratado como inocente no curso de todo o processo ordinário criminal, observados os direitos e as garantias a ele inerentes, bem como respeitadas as regras probatórias e o modelo acusatório atual. Não é incompatível com a garantia constitucional autorizar, a partir daí, ainda que cabíveis ou pendentes de julgamento de recursos extraordinários, a produção dos efeitos próprios da responsabilização criminal reconhecida pelas instâncias ordinárias."

Assim, restou consignado que o exaurimento da cognição sobre matéria fática pelos tribunais, seja em ação originária, seja em grau recursal, possibilita desde então a execução provisória de sentença penal condenatória, sem que se possa falar em violação ao princípio da presunção de inocência.

Em típico caso de mutação constitucional, conferiu-se ao artigo 5º, LVII, da CF/88, interpretação mais condizente com a sistemática do ordenamento constitucional, garantindo a efetividade da lei penal em prol da elevada importância dos bens jurídicos de status constitucional que ela visa resguardar, como a vida, a liberdade e a propriedade.

O novo entendimento contribui para afastar a sensação de impunidade pela população, restaurando a confiança no sistema de justiça penal.

Demais disso, visa dar concretude ao princípio da igualdade, haja vista que a possibilidade de interpor sucessivos recursos aproveita sobretudo aos réus mais abastados, bem como ao princípio da celeridade processual, na medida em que desestimulou a interposição de recursos meramente protelatórios.

4. REFLEXOS NA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA DO ESTADO

A decisão interfere, ainda, na identificação do termo inicial para contagem da prescrição da pretensão executória.

Sabe-se que, pela literalidade do art. 112, inciso I, do Código Penal, o evento deflagrador da contagem do prazo é o trânsito em julgado para a acusação. Contudo, face ao entendimento anterior do STF, a interpretação literal do dispositivo era francamente prejudicial ao Estado, contrariando a finalidade da norma.

É que até o julgamento do HC 126.292/SP, para o início da execução provisória da pena exigia-se o trânsito em julgado também para a defesa, haja vista que a interposição de recurso especial e extraordinário eram óbice ao encarceramento.

Assim, na vigência desse posicionamento, o Estado estaria impedido de exercer a pretensão executória até que a sentença transitasse em julgado; assim, seria inconcebível o início do o prazo prescricional de uma pretensão que ainda não pode ser juridicamente exercida comece a correr, punindo-se a inércia daquele que estava impedido de agir.

À época, a interpretação literal do art.112, inciso I, além de contrariar a finalidade da norma prescricional, acarretaria um efeito prático extremamente gravoso: o estímulo à interposição de recursos protelatórios a fim de acarretar a extinção da punibilidade.

A partir da guinada jurisprudencial que possibilitou a execução provisória de sentenças penais condenatória, dando exequibilidade imediata ao título judicial, mesmo na pendência de recursos extraordinários manejados pela defesa, o prazo prescricional têm início, para os processos sentenciados após o julgamento do HC 126.292/STF, a partir do exaurimento de cognição da matéria fática.

CONCLUSÃO

Ao longo desse estudo foi possível conceituar o princípio da presunção da inocência, posicionando-o no ordenamento jurídico como decorrente da adesão do país à Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948.

Após, foi analisado o posicionamento anterior do Supremo Tribunal Federal, que considerava violador do princípio da presunção de inocência a possibilidade de encarceramento do réu antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória. A principal crítica a este entendimento está no incentivo à interposição de recursos protelatórios.

No ano de 2016, a Corte Constitucional, em autêntica mutação constitucional, acatou a possibilidade de execução provisória da pena desde que exaurida a cognição de matéria fática, o que leva à conclusão de que a interposição de recursos extraordinários não tem mais o condão de obstar o recolhimento à prisão. Foi expressamente consignado que tal possibilidade para além de não caracterizar afronta ao princípio da presunção de inocência, visa dar concretude a proteção de bens constitucionais.

Por fim, a mudança do posicionamento teve o efeito prático de alterar o termo inicial para contagem da prescrição da pretensão executória pelo Estado.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em 11 jul. de 2016.
_______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 126.292/SP. Impetrante: Maria Cláudia de Seixas. Paciente: Marcio Rodrigues Dantas. Relator: Ministro Teori Zavascki. Brasília, 17 de fevereiro de 2016. Disponível em <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10964246> Acesso em 10 jul. 2016.
_______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 80.174/SP. Impetrante: Tânia Regina Mathias gentle. Paciente: Pedro Antonio Fachin e outros. Relator: Ministro Maurício Corrêa. Brasília, 06 de junho de 2000. Disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=78268> Acesso em 10 jul. 2016.
_______. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n° 84.078/MG. Impetrante: Omar Coelho Vitor. paciente: Omar Coelho Vitor. Relator: Ministro Eros Grau. Brasília 05 de fevereiro de 2009. Disponível em < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=608531> Acesso em 10 jul. 2016.
_______.Organização das Nações Unidas no Brasil. A ONU e os Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-os-direitos-humanos/>. Acesso em 10 jul.2016.
BARROSO, Luis Roberto. Fundamentos Teóricos e Filosóficos do Novo Direito Constitucional Brasileiro (Pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo). Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, outubro 2005.
CARNELUTTI, Francesco. As Misérias do Processo Penal. Campinas: Edicamp, 2002.
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 4ª. ed. Salvador: Jus Podivm, 2010.

Informações Sobre o Autor

Luiza Helena da Silva Guedes

Procuradora da Fazenda Nacional. Graduada em Administração e Direito. Pós-graduada em Direito Constitucional Direito Civil e Processual Civil


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