A importância das garantias funcionais do poder judiciário como mecanismos assecuratórios de sua independência: uma visão constitucional

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Resumo: A produção em tela tem por escopo perscrutar a origem das garantias funcionais, essenciais ao bom desempenho do papel judicante, bem como analisar a sua evolução e como essas garantias são asseguradas na Constituição de 1988. A pergunta de partida dessa obra científica é: “Qual o alcance e dimensão das garantias funcionais da magistratura no Brasil?”. Há de se considerar a autonomia que carecia o Poder Judiciário no seu nascimento, já que as decisões eram tomadas a favor de quem detinha o real poder, não dando margem para se operar a efetiva justiça, prejudicando, desse modo, todo o sistema desde a sua fundação. Com o passar do tempo, essas prerrogativas foram ganhando força no sistema, de modo a tornarem-se indispensáveis ao exercício da magistratura. A título de exemplo, testifica-se que o Supremo Tribunal Federal, no exercício da função contramajoritária, julga com base nessas garantias funcionais, que assim asseguram a independência de seus ministros, protegendo-os de pressões políticas e midiáticas. Serão mencionados relevantes pontos acerca da magistratura, analisando-se os aspectos desde o descobrimento do Brasil, bem como o início dos conflitos nas terras brasileiras, importantes para a compreensão da sociedade contemporânea e essenciais ao entendimento do nascimento das garantias em destaque.

Palavras-Chave: Poder Judiciário. Magistratura. Garantias funcionais. Função Contramajoritária.

Sumário: 1. Breve abordagem acerca do surgimento da magistratura no brasil: período colonial; 2. A magistratura no período imperial; 3. Conceito, origem e evolução das garantias da magistratura; 4. As garantias     do poder judiciário na constituição federal de 1988; 5. A função contramajoritária do supremo tribunal federal como exemplo de atuação baseada nas garantias funcionais do magistrado; 6. A importância das garantias funcionais para a independência do magistrado nos dias atuais; 7. Considerações finais.

 INTRODUÇÂO

As garantias do Poder Judiciário nem sempre estiveram delimitadas de forma clara e efetiva no Brasil. Não havia garantias institucionais e tampouco funcionais.

Essas garantias foram conquistadas ao longo da trajetória desse Poder desde sua instituição no Brasil. Pela falta de prerrogativas, os primeiros magistrados julgavam em conformidade com o interesse dos poderosos e não em prol da coletividade, como deveria ser. Entretanto, com o avanço do Estado, sentiu-se a necessidade de proteger os magistrados para esses decidirem conforme o bem comum, livre de pressões políticas e sociais que poderiam comprometer a imparcialidade judicial.

Para uma noção mais detalhada da falta dessa autonomia e suas implicações negativas, em sua brilhante obra acerca da organização do Poder Judiciário, o mestre Luciano Athayde elucida que quanto à natureza do cargo, os primeiros magistrados eram servidores reais a serviço da Coroa portuguesa, não possuindo autonomia e independência, porque a autoridade do Estado absoluto monárquico era o rei.

A presente produção monográfica enfocará justamente a importância das garantias funcionais e institucionais do Poder Judiciário no Brasil, enfatizando sua importância que objetiva assegurar a independência e autonomia necessárias ao exercício da carreira da magistratura. Haverá ainda uma abordagem acerca da origem dessas garantias para uma melhor compreensão da razão de seu nascimento no sistema jurídico pátrio.

Para elucidar o tema em questão, faremos menção a atuação pró-ativa do STF, visando provar que todo magistrado necessita dessas garantias funcionais para desempenhar o seu papel com mais segurança e liberdade.

Certamente, não foi a nossa finalidade o esgotamento de assunto tão complexo e amplo, cujos capítulos, isoladamente, já oferecem campo para ampla investigação.

Importa salientar, por oportuno, que a metodologia predominante será a pesquisa bibliográfica investigativa, que terá por alicerce a opinião e crítica de alguns doutos no assunto.

Fornecida aquela visão genérica acerca do Poder judiciário no Brasil, resultando em alguns breves esclarecimentos a priori, passemos a uma análise mais minudente acerca do assunto em evidência.

1. BREVE ABORDAGEM ACERCA DO SURGIMENTO DA MAGISTRATURA NO BRASIL: PERÍODO COLONIAL

Antes de adentrar à esfera do objetivo da presente obra cientifica, que é a prosseguir nas investigações acerca das garantias funcionais da magistratura previstas na Constituição Federal de 1988, importante relatar como essa brilhante carreira surgiu no Brasil, para que possamos traçar um paralelo entre as garantias atuais e as iniciais. Para esse mister, voltemos ao tempo do descobrimento das terras brasileiras.

O período pré-colonial se iniciou com expedições portuguesas chegando ao Brasil em busca de riquezas. Com esse evento, operou-se o descobrimento do nosso País por Pedro Alvares Cabral, que na verdade se tratou de uma conquista a serviço do mercantilismo luso. Inicia-se a partir desse ponto, o período colonial.

Esse período foi o primeiro cenário da aparição da magistratura no Brasil, marcada pela chegada de Martin Afonso de Sousa, que recebeu poderes judicantes do Rei de Portugal, D. Joao III, tendo como consequência a instalação da justiça, no ano de 1500.

A dificuldade de exercer as funções judiciárias cresceu proporcionalmente ao aumento da população e isso foi decisivo para os importantes coronéis passarem a administrar a justiça local. Essa situação, que em nada agradava a coroa portuguesa, foi diluída com a nomeação de algumas autoridades municipais e judiciárias, que foram os primeiros juízes do povo, na Vila de São Vicente. Além disso, designaram-se, outrossim, escrivães, meirinhos e outros oficiais. Após a instituição das capitanias hereditárias, que foi o primeiro sistema politico-administrativo descentralizado, Martin nomeou os primeiros juízes no Brasil e regressou a Portugal, deixando em seu lugar o padre Gonçalo Monteiro, em 1533 (MATHIAS, 2009).

À época, não havia o que se falar em garantias do Poder Judiciário. Como já mencionado em linhas anteriores havia total submissão à Coroa Portuguesa, o que deixava os magistrados desprovidos de autonomia ou independência.

Prova disso, seguindo na perspectiva do regime das capitanias, o donatário, após receber a carta de doação, poderia exercer o usufruto e a administração das terras e respectivas costas, com jurisdição civil e criminal, mas para ter esse privilégio, ele devia satisfação e obediência à Coroa Portuguesa de tudo que iria executar.

O sistema acima citado falhou e, em consequência desse evento, surgiu a necessidade de se instaurar um novo sistema político para substituir as capitanias: os Governos Gerais. Esse sistema foi um modelo de organização estabelecida por Portugal em 1549, que passou a centralizar a organização da colônia, instituindo a função de Governador Geral, que passou a ser a autoridade mais elevada do Brasil, e representava os interesses da coroa portuguesa, sendo Tomé de Souza o primeiro a ocupar essa posição.

Para uma melhor administração, o governador geral criou três funções para lhe auxiliar: o provedor-mor, que administrava o dinheiro do governo; o capitão-mor, que cuidava da defesa do território, e o ouvidor-mor, que era o juiz, que aplicava as leis e resolvia os conflitos que surgiam entre a população da colônia.

Importante destacar que os três primeiros governadores gerais foram Tomé de Souza (capitão dos mares da Índia); Duarte da Costa (funcionário palaciano) e Mem de Sá, sendo este último juiz do Desembargo do Paço em Lisboa e o primeiro juiz no Brasil com formação jurídica, o qual deteve poderes mais amplos (MATHIAS, 2009).

 Portanto, não era necessário ter nível superior para exercer a magistratura. Em verdade, naquela época a educação era escassa, o que tornava essa exigência impossível de ser efetivada.

Ainda, segundo a história, pela investigação do autor acima citado, com a morte de Mem de Sá e a divisão do Brasil em dois governos, inicia-se após um tempo o domínio espanhol e a organização judiciária ficou estruturada da seguinte maneira: a Casa de Suplicação como órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Tribunal da Relação na Bahia, que era um tribunal de segunda instância, O Desembargo do Paço e os juízes de fora.

Com a chegada da família real ao Brasil, algumas alterações ocorreram na organização judiciária, dentre elas a mudança da capital da colônia de Salvador/BA para o Rio de Janeiro, criando-se ainda o Tribunal de Relação do Rio de Janeiro, juntas de justiça e juntas de comércio (MATHIAS, 2009).

2. A MAGISTRATURA NO PERÍODO IMPERIAL

Com a proclamação da independência no ano de 1822, o Brasil se torna um império e uma Assembleia Constituinte é convocada para elaborar a primeira Constituição do Estado, que foi outorgada pelo imperador Dom Pedro I apenas em 1824.

A Constituição do Império, como ficou conhecida, reconhecia a existência de quatro Poderes: o Legislativo, o Executivo, o Judicial e o Moderador, sendo este último exercido pelo imperador.

Essa carta trouxe novidades marcantes para as garantias do Poder Judiciário, estabelecendo a sua independência, ainda que meramente formal, e a perpetuidade dos juízes de direito, que só poderiam perder o cargo mediante sentença, ainda que o Imperador pudesse suspendê-los por queixas (ATHAYDE, 2015, p. 13).

Além das tímidas garantias conferidas aos magistrados, o Poder Judiciário não possuía garantias institucionais de autonomia administrativa, financeira e orçamentária, caracterizando, dessa maneira, a sua submissão ao Imperador.

3. CONCEITO, ORIGEM E EVOLUÇÃO DAS GARANTIAS DA MAGISTRATURA

As garantias de independência e perpetuidade dos magistrados foram citadas no texto da primeira Constituição Federal de 1824, no período imperial. Entretanto a garantia da inamovibilidade não foi consagrada nessa Carta (DALLARI, 1996).

Na CF/1891 a vitaliciedade é ratificada e a irredutibilidade de vencimentos aparece como nova garantia dos membros, ambas asseguradas no artigo 57 do texto em evidência.

Apenas com a Constituição de 1934 temos, pela primeira vez, de forma completa, as garantias dos membros do Poder Judiciário, em seu artigo 64[1], sendo tais prerrogativas confirmadas pela Constituição de 1937, de 1946, 1967, pela EC/69 e pela nossa vigente CF/88.

A Constituição Federal de 1988 consagrou, conforme já mencionado, de maneira completa, as garantias dos membros do Poder Judiciário e, nas palavras de José Afonso da Silva, essas garantias tem o objetivo de manter a independência dos juízes, para que eles possam exercer a função jurisdicional com dignidade, desassombro e imparcialidade (SILVA, 2005).

Além de garantias funcionais, o texto da Magna Carta cita as garantias institucionais, fortalecendo e atribuindo ampla legitimidade para a instituição até os dias atuais.

Por conseguinte, podemos afirmar que a origem e evolução dessas garantias, fundamentais ao bom desempenho do magistrado, foi de suma importância para os magistrados proclamarem a justiça de maneira mais independente e livre de pressões dos demais poderes, da mídia e dos políticos influentes.

4. AS GARANTIAS DO PODER JUDICIÁRIO NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

Chegamos ao ponto fundamental deste trabalho científico e passaremos de agora em diante a analisar as garantias do Poder Judiciário em conformidade com a Constituição em vigor.

Pela teoria tripartite elaborada por Montesquieu, ratificada implicitamente pela nossa CF/88, o artigo 2º dispõe que a União é composta por três Poderes, independentes e harmônicos, sendo eles o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Para assegurar a sua autonomia e independência Poder Judiciário goza de algumas garantias necessárias ao exercício da função judicante, de naturezas institucional e funcional. As garantias institucionais conferem proteção à Instituição e, nas palavras de Paulo Bonavides, visam assegurar a permanência da instituição, que não deve ser atingida ou violada, sob pena de perecimento do ente protegido (BONAVIDES, 2005, p.508)

Essas garantias estão elencadas a partir do artigo 96 da Constituição, e recebem a seguinte subdivisão: garantias de autonomia administrativa, financeira e orçamentária. A autonomia administrativa está inserta no artigo 96 da CF/88 e pode ser definida como a capacidade que o Poder Judiciário tem de estabelecer a estrutura de seus próprios órgãos, sem a necessidade de aprovação dos demais poderes. Já no que diz respeito à autonomia financeira e orçamentária, temos que esta consiste na capacidade deste Poder elaborar o seu orçamento, prevista no artigo 99 da CF/88.

Já as garantias funcionais asseguram a independência do Poder Judiciário, previstas no artigo 95 da CF/88, sendo elas a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsídios. No que respeita a vitaliciedade, podemos concluir que o magistrado, após o estágio probatório de dois anos, só perde o cargo em apenas uma hipótese: sentença judicial transitada em julgado, assegurada a ampla defesa e o contraditório. Importante destacar que obviamente o juiz pode pedir exoneração a qualquer tempo, bem como se aposentar compulsoriamente ao atingir a idade de 70 anos. Pela prerrogativa de inamovibilidade, o juiz não poderá ser removido ou transferido para outro lugar sem a sua aquiescência, salvo se por interesse público pela decisão da maioria absoluta do Tribunal ao qual está vinculado ou do Conselho Nacional de Justiça. Por derradeiro, a irredutibilidade de subsídios assegura a independência econômica do juiz, garantindo que ele não pode ter seus vencimentos reduzidos, salvo descontos relativos aos impostos e os de natureza previdenciária.

A Lei Complementar n. 35/79, denominada de Lei Orgânica da Magistratura, estabelece algumas prerrogativas especiais, entretanto, o objeto do presente trabalho se limitou às garantias funcionais de cunho constitucional.

5. A FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMO EXEMPLO DE ATUAÇÃO BASEADA NAS GARANTIAS FUNCIONAIS DO MAGISTRADO

Com o objetivo de enriquecer a presente obra, traremos um exemplo de atuação do Poder Judiciário, se utilizando das garantias funcionais que lhes são conferidas pela CF/88.

A democracia tem por base o princípio majoritário, tendo em vista que deve prevalecer a vontade da maioria nas decisões estatais, já que a CF estabelece que todo poder emana do povo. Porém, há casos que o Poder Judiciário deve se utilizar do princípio contramajoritário, no objetivo de defender a própria Constituição, já que sua função social é justamente protegê-la e guardá-la.

Esse princípio é de manuseio exclusivo do STF, que em seu papel de guardião da CF, tem decidido questões que, a princípio, seria de competência dos poderes representativos, mas que diante da omissão destes, acaba a suprema corte tendo a sua atuação político-jurídica ampliada. Portanto, deixando os demais poderes de cumprir com a sua função típica, resta ao judiciário suprir a lacuna, visando efetivar os direitos e garantias fundamentais, dando ensejo ao ativismo judicial.

Tendo em vista que a nossa sociedade é pluralista e complexa e sendo o pluralismo político um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, está o STF legitimado a agir no interesse das minorias, quando estes não são supridos pelos demais poderes. (MENDES, 2014)

Foi nessa perspectiva, que, julgando a ADPF 132, de autoria do Governador do RJ, Sérgio Cabral, em conjunto com a ADI 4277, o STF decidiu pelo reconhecimento jurídico da união de pessoas do mesmo sexo, como entidade familiar, expandindo o conceito de família, baseado no princípio da igualdade, proibindo a discriminação em relação aos homossexuais.

O julgamento dessas essas ações ocorreu no ano de 2011, entre os dias 4 e 5 de maio, tendo como relator o ministro Ayres de Brito, onde a corte suprema, dando uma interpretação conforme a CF/88, por unanimidade, reconheceu a constitucionalidade da união estável entre casais do mesmo sexo, dando-lhe status de família, vedando qualquer tentativa de impedimento de reconhecimento dessa união pelo artigo 1723 do Código Civil de 2002, destacando a postura da Corte contra o preconceito e a discriminação. Desta forma, a união homoafetiva foi equiparada à união estável, preenchidos todos os requisitos para a sua configuração. (SOARES, 2015)

O nosso País viveu esse momento ímpar, acompanhado com muito afinco pela comunidade LGBT, pelos juristas e pela sociedade de uma maneira geral.

O julgamento favorável deu ensejo a uma incessante e vultuosa polêmica entre os opositores dos direitos da comunidade LGBT, bem como alguns operadores do direito e, prova disso foi o posicionamento do jurista Lênio Streck, em entrevista dada a Revista Consultor Jurídico, em 10 de agosto de 2014, onde entendeu que não caberia ao STF decidir a favor do casamento homoafetivo, uma vez que a CF reconhece a união estável apenas entre um homem e uma mulher e que todos os grandes países europeus fizeram isso via parlamento. (STRECK, 2014)

A principal crítica entre os constitucionalistas foi de que estaria o ativismo judicial do STF invadindo a esfera do legislativo, ferindo o princípio da separação, já que decidiu uma questão que caberia àquele Poder.

São essas duras críticas e demais manifestações sociais que nos fazem chegar à conclusão de que o STF, somente decidiu essa questão, porque tem amparo nas garantias funcionais dos magistrados, que os fazem julgar sem temer por represálias dos demais poderes ou da mídia.

6. A IMPORTÂNCIA DAS GARANTIAS FUNCIONAIS PARA A INDEPENDÊNCIA DO MAGISTRADO NOS DIAS ATUAIS

Imaginemos a inexistência das garantias funcionais dos magistrados. Se assim fosse, como poderiam os ministros do Supremo Tribunal Federal julgar a questão acima mencionada, com plena liberdade e segurança, sem temer à perda de seus cargos?

É certo estaríamos diante de uma nebulosa questão e não teriam os nossos magistrados capacidade plena para dar prosseguimento à apreciação de causas de repercussão, além de estarem, outrossim, sujeitos a toda sorte de ações duvidosas praticadas pelas pessoas denominadas como influentes na sociedade ou na política, tendo em vista que não haveria como julgar contra o anseio da maioria da sociedade.

Graças às garantias funcionais da magistratura, os nossos ministros podem se utilizar do princípio contramajoritário, com o objetivo de defesa da própria CF, velando pelo papel de guardião do texto constitucional, tendo asseguradas a sua autonomia e independência.

Legitimando essa linha de raciocínio, em seus ensinamentos, José Renato Nalini, afirma que o princípio da independência profissional elimina quaisquer vínculos interferentes na ação profissional do direito, capazes de condicionar ou orientar sua atuação de forma diversa ao interesse da justiça. Essa independência é atributo consagrado a todos os operadores do direito e, mormente, ao juiz, que deve harmonizar essa liberdade com os demais princípios legais e constitucionais. (NALINI. 2011)

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho monográfico foi justamente apontar e analisar o alcance e dimensão das garantias funcionais do Poder Judiciário no Brasil, mediante abordagem histórica e pesquisa dirigida, com métodos apropriados de forma a contemplar desde o surgimento, no período imperial, bem como sua evolução e importância nos dias atuais.

Vale dizer que no período colonial inexistiam tais garantias no Brasil em virtude da total submissão à coroa portuguesa. Essas garantias foram timidamente adentrando no sistema jurídico do país a partir do império, com a outorga da Constituição de 1824, onde abrangia a perpetuidade dos juízes e a independência destes, apesar do rígido controle do Poder Moderador sobre os Poderes do Estado. Com a Constituição de 1934 todas as garantias que hoje conhecemos se encontravam no texto, sendo ratificadas nas constituições posteriores.

Introduzidas de forma gradual, mas com a sua evidente relevância, as garantias funcionais dos magistrados tem o escopo de assegurar a proteção à pessoa do juiz e do seu cargo, certificando-lhe real amparo, primando pelo julgamento livre e independente, resguardando, ademais, a imparcialidade, mormente diante de questões polêmicas, que em regra, geram desconforto social, ou até mesmo quando as partes interessadas no julgamento são pessoas influentes, que poderiam vir a cometer represálias quanto à pessoa do julgador, caso as garantias funcionais não existissem.

A título de ilustração mencionamos o exemplo do julgamento da ADPF 132 em conjunto com a ADI 4277, onde o STF, no exercício de sua função contramajoritária, para defender os interesses de uma minoria, indo contra a vontade da maioria, reconheceu como família, a união estável entre duas pessoas do mesmo sexo e que dela decorrem todos os direitos e deveres assegurados à família tradicional.

Importante mencionar, por fim, que essas garantias, presentes na CF/88 encontram limitações nos próprios direitos fundamentais, não podendo o magistrado se utilizar delas para decidir conforme o seu livre convencimento, desprovidos de fundamentação no caso concreto, pois agindo desse modo, não estaria amparado pelas garantias funcionais, mas sim no exercício da terrível arbitrariedade, eliminando assim qualquer forma de legitimidade em sua atuação, o que seria um atentado ao Estado democrático de Direito.

 

Referências
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 542. 51 SILVA, op. cit., p. 588.
CHAVES, Luciano Athayde. A organização do Poder Judiciário no Brasil (da colônia ao Império):(des)centralização, independência e autonomia.
DALLARI, Dalmo de Abreu. O poder dos juízes. São Paulo: Saraiva, 1996.
STRECK, Lênio. Abandonar as próprias vontades para julgar é o custo da democracia. Entrevista a Revista Consultor Jurídico, 2014.
MATTEUCCI, Nicola. Contratualismo. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 11. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998, v. 1, p. 272.
MATHIAS, Carlos Fernando. Notas para uma história do judiciário no Brasil / Carlos Fernando Mathias. – Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009.
NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. 8. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
NOVAIS, Fernando A. A independência política do Brasil. Editora: Hucitec. 1996.
ROSSEAU, Jean Jacques. O contrato social e outros escritos. 20 ed. São Paulo: Cultrix, 1999. P. 174
MENDES, Renat Nureyev. O princípio contramajoritário e a união homoafetiva: a fundamental importância do poder judiciário na solução de um debate hodierno. Disponível em: http://npa.newtonpaiva.br/direito/?p=1718 Acesso em: 20 Maio 2016.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 590
SOARES, Hugo Henry Martins. As minorias sociais e o papel contramajoritário do Supremo Tribunal Federal. Disponível em https://jus.com.br/artigos/32053/as-minorias-sociais-e-o-papel-contramajoritario-do-supremo-tribunal-federal. Acesso em 20 Maio 2016.
 
Nota:
[1] Art 64: Salvas as restrições expressas na Constituição, os Juízes gozarão das garantias seguintes:
a)vitaliciedade, não podendo perder o cargo senão em virtude de sentença judiciária, exoneração a pedido, ou aposentadoria, a qual será compulsória aos 75 anos de idade, ou por motivo de invalidez comprovada, e facultativa em razão de serviços públicos prestados por mais de trinta anos, e definidos em lei;
b)a inamovibilidade, salvo remoção a pedido, por promoção aceita, ou pelo voto de dois terços dos Juízes efetivos do tribunal superior competente, em virtude de interesse público;
c)a irredutibilidade de vencimentos, os quais, ficam, todavia, sujeitos aos impostos gerais.


Informações Sobre o Autor

Priscila Cristina Moreira de Sales

Residente Judicial da Escola da Magistratura Do Rio Grande do Norte e Pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário do Rio Grande do Norte UNI-RN


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