A não incidência da contribuição previdenciária sobre planos de saúde ofertados pelas empresas aos empregados e seus dependentes

Resumo: Analisa-se as Contribuições Previdenciárias incidentes sobre planos de saúde ofertados aos empregados e seus dependentes com base no alcance da isenção prevista no art. 28, §9º, q, da Lei 8.213/91 sobre o viés jurisprudencial e administrativo dos tribunais.

Palavras Chave: Tributário. Planejamento tributário. Contribuições Previdenciárias. Não incidência. Planos de saúde.

Sumário: Introdução. 1. Do entendimento jurisprudencial e administrativo. 2. Da possibilidade de extensão aos dependentes. 3. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

A Lei 8.212/91 que disciplina a forma de organização e custeio da Seguridade Social, dispõe que o critério material das Contribuições Sociais Previdenciárias (cota patronal) incidirá sobre as verbas destinadas a retribuir o trabalho efetivamente prestado ou o tempo à disposição do empregado ao empregador.

A própria lei se encarregou de estabelecer as hipóteses de isenção do tributo, impedindo a formação da relação jurídica tributária com o consequente vínculo dos sujeitos envolvidos.

Assim, foi expressamente afirmado no art. 28, §9º da Lei nº 8.212/91:

“Art. 28. Entende-se por salário-de-contribuição:(…)

§ 9º Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente(Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)(…)

q) o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, despesas médico-hospitalares e outras similares, desde que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa; (Incluída pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)”

Pela simples leitura da norma, percebe-se que os valores referentes à assistência médica ou odontológica, própria da empresa ou por ela conveniada, não devem ser incluídas na base de cálculo das contribuições previdenciárias, desde que a cobertura abranja todos os empregados e dirigentes da empresa.

Num primeiro momento, levada por uma interpretação puramente literal do dispositivo, a Receita Federal se posicionava de forma favorável para incidência das Contribuições Previdenciárias sobre planos de saúde oferecidos pela empresa aos seus empregados.

Tal entendimento era embasado, inclusive, no art. 458 da CLT que afirma que os valores devidos ou pagos a funcionários, ainda que in natura, ou em forma de utilidade, incorporavam-se à remuneração para todos os efeitos legais, e constituíram base de incidência das contribuições previdenciárias.

Ocorre que com a Lei nº 10.243/2001 que acrescentou o §2º no art. 458 da CLT, tal interpretação ficou comprometida uma vez que assim dispôs:

“§ 2º Para os efeitos previstos neste artigo, não serão consideradas como salário as seguintes utilidades concedidas pelo empregador:

IV – assistência médica, hospitalar e odontológica, prestada diretamente ou mediante seguro-saúde. (com redação dada pela Lei nº 10.243, de 10.06.2001)”

Analisando a norma pelo viés teleológico, percebe-se que a intenção do legislador ao estipular a respectiva isenção foi a de estimular a concessão de planos de saúde pela rede privada para os empregados das referidas empresas, almejando um menor impacto na quantidade de dependentes do precário Sistema Único de Saúde – SUS.

A contraprestação fiscal pela permanência dessa conduta por parte das empresas é justamente diminuir o impacto orçamentário da cota patronal das Contribuições Previdenciárias.

Pelo texto legal, percebe-se por uma interpretação estritamente literal/gramatical que para obtenção da referida isenção, basta que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa.

Como se sabe, a interpretação literal é a forma mais rasa de compreensão das normas jurídicas. Por isso, é mister sempre conhecer os posicionamentos dos tribunais superiores e tribunais administrativos a respeito da matéria versada, trazendo melhores elucidações.

I – DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL E ADMINISTRATIVO

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF (órgão de cúpula no âmbito administrativo fiscal), em recente decisão, se manifestou num caso específico onde uma empresa que custeava a assistência à saúde para todo o seu quadro de funcionários, mas contemplava um dirigente com plano de categoria superior àquela assegurada aos demais, entendendo por unanimidade pela manutenção da autuação por ter descontado o valor da despesa mensal (planos de saúde) da base de cálculo da contribuição previdenciária, afastando assim a isenção:

“Contribuições Sociais. Previdenciárias. Período de apuração: 01/01/2007 a 31/12/2008. ASSISTÊNCIA À SAÚDE. DIVERSIDADE DE PLANOS E COBERTURAS. Os valores relativos a assistência médica integram o salário-de-contribuição, quando os planos e as coberturas não são igualitários para todos os segurados. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES PRINCIPAIS E ACESSÓRIAS. APLICAÇÃO DE PENALIDADE. RETROATIVIDADE (Acórdão 9202-003.846)

(…) ASSISTÊNCIA MÉDICA. DISTINÇÃO ENTRE PLANOS DE ASSISTÊNCIA MÉDICA. INCIDÊNCIA SOBRE AS DIFERENÇAS DE VALORES DOS PLANOS.

Os valores pagos a título de assistência médica pela empresa não integram o salário de contribuição se e somente se forem destinados a todos os empregados e dirigentes e tenham a mesma cobertura, ou seja, a mesma especificidade, o mesmo valor.

A base de cálculo das contribuições previdenciária incidentes sobre os valores pagos a título de assistência médica em desacordo com a norma isentiva é a diferença entre o valor dos planos ofertados a seus diretores e gerentes e o valor do plano básico disponibilizado para os demais trabalhadores. (…)” (Processo  10830.011996/2008-25, Data da Sessão 28/01/2016, Acórdão 2401-004.067).

A relatora do voto entendeu que se o plano de saúde oferecido pela empresa não for uniforme quantitativamente (princípio da universalidade) para todos os funcionários, seja empregados ou altos dirigentes (princípio da isonomia quanto à extensão do benefício fiscal), não estaria abarcada pela norma de isenção do art. 28, §9º, da Lei nº 8212/91, assim se manifestando:

“Sempre que houver patamares de valores e tipos de planos e coberturas diferentes entre os funcionários de uma empresa, quaisquer que sejam a sua remuneração, cargo ou assunção de benefícios correspondentes ao grau das responsabilidades que desempenham ou do salário que auferem, essa distinção, por si só, tem o condão de desnaturar o benefício da não incidência prevista na Lei e que portanto o valor relativo a mesma, nessas hipóteses, deve incorporar o salário-contribuição para fins da incidência respectiva contribuição previdenciária”.

Existe controvérsias doutrinárias especificamente envolvendo a temática da decisão no sentido de o CARF não poderia ter distinguido onde a lei não o fez e criando condições que não estão expressas na norma jurídica, pois teria atuado o tribunal como legislador positivo, ofendendo o princípio da legalidade e separação dos poderes, trazendo, inclusive, precedentes do STJ( REsp 192531/RS, Rel. Min. João Octavio de Noronha, 2ª Turma, Dj 17/02/05, Dje 16/05/05), sendo o único requisito para a concessão a oferta de forma ampla para todos os empregados.

A controvérsia é tamanha que dentro do próprio CARF havia divergências:

“A Segunda Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) tem julgado nesse exato sentido, ou seja, entendendo que a “condição estabelecida no art. 28, § 9º, alínea ´q´ da Lei 8.212/91 para que não se incluam no salário de contribuição e não sejam objeto de incidência de contribuição previdenciária os valores relativos à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, despesas médico-hospitalares e outras similares, é que exista cobertura abrangente a todos os empregados e dirigentes da empresa. Exigir que haja cobertura a todos os empregados e dirigentes da empresa é diferente de exigir que haja a mesma cobertura a todos estes funcionários. A condição imposta pelo legislador para a não incidência da contribuição previdenciária é, simplesmente, a existência de cobertura que abranja a todos os empregados e dirigentes, não cabendo ao intérprete estabelecer qualquer outro critério discriminativo” (Processo  11070.002845/2007-15,  Recurso Especial do Procurador,  Data da Sessão 29/07/2014, Acórdão 9202-003.256).

Essa pesquisa se posiciona de forma contrária ao entendimento adotado pelo CARF, concordando em grau, número e gênero com o posicionamento do STJ, no sentido de que a inclusão de outros requisitos, como, a exigência de planos de saúde “iguais e da mesma categoria” a todos os funcionários ultrapassa as condições impostas pela lei e viola de certa forma o art. 111, II do CTN.

Apesar dos argumentos em sentido contrário, a decisão é válida e eficaz, trazendo o posicionamento dos tribunais administrativos a respeito do tema, tendo importância ímpar para os contribuintes que almejarem preencher todos os “requisitos” para gozarem do benefício da isenção fiscal.

II – DA POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AOS DEPENDENTES

Outro fator interessante a respeito do tema de incidência das contribuições sociais previdenciárias sobre planos de saúde é a possibilidade extensão aos dependentes dos empregados sem ônus tributário para a empresa, uma vez que a lei é omissa quanto a maiores condições, sendo assim abrangida a situação pela norma imunizante.

O caso já foi discutido no Colendo Superior Tribunal de Justiça – STJ, no caso REsp nº 1.430.043/PR, quando a Segunda turma entendeu de forma favorável aos contribuintes, afirmando que a assistência médica paga pela empresa não integra o salário de contribuição dos empregados, independentemente da sistemática de concessão do benefício, nesse sentido:

“Nesse contexto, não há falar em ampliação ou violação da norma isentiva, pois, como bem observado pelo Tribunal de origem, “embora   não conste na folha de pagamento, trata-se em verdade de forma de reembolso dos valores despendidos pelos empregados com medicamentos”, sendo que tal sistema “apenas evita etapas do moroso procedimento interno de reembolso via folha de pagamento, que, com certeza, seria mais prejudicial ao empregado (…).” (Resp nº 1.430.043/PR, Relator: Min. Mauro Cambell Marques, Segunda Turma, julgado: 25.2.2014)

O entendimento do STJ já é seguido por vários Tribunais Regionais Federais – TRFs, se manifestando que o plano de saúde concedido a empregados e dependentes não integra o conceito de salário de contribuição, tudo nos termos do art. 28, §9º, Q, da Lei 8.212/91 (Apelação/Reexame necessário nº 424703, TRF-2ª, 4ª turma, Dje 15/04.2014; Apelação 2008.71.05.003324-7/RS, 2ª Turma, TRF-4ª, Dj. 30/06/2009).

No âmbito do CARF ainda não há uma posição consolidada quanto a extensão da assistência médica aos dependentes dos empregados, porém a interpretação da Receita Federal do Brasil (solução de consulta nº 77 – Cosit), no caso de planos de saúde é no sentido de que:

“PLANO DE SAÚDE DISPONIBILIZADO A TODOS OS EMPREGADOS E DIRIGENTES. EXCLUSÃO DA BASE DE CÁLCULO. O valor relativo a Plano de saúde pago por empresa a cooperativa médica não integra o salário de contribuição, desde que a empresa disponibiliza o referido plano à totalidade dos seus empregados e dirigentes, ainda que alguns deles, por motivos particulares, manifestem por escrito que não pretendem participar de plano”. (Dispositivos Legais: Lei nº 8.212, de 1991, art. 28, § 9º, “q”).

Infere-se que a única restrição do art. 28, §9º, q, da Lei nº 8.212/91 para que seja afastado o recolhimento da contribuição previdenciária sobre os valores da assistência médica concedida aos empregados e dependentes está relacionado à disponibilidade do benefício a todos os empregados e dirigentes.

O princípio da legalidade possui interpretações diferentes a depender do destinatário: particular ou Administração Pública. Para Administração Pública, estritamente vinculada aos preceitos legais, todas as suas condutas têm de ter respaldo legal sob pena de serem nulas.

Já o particular, pode fazer tudo aquilo que a lei estritamente não proibir. Assim, não tendo comando legal expressamente proibindo a conduta, ela é permitida. Dessa forma, a extensão aos dependentes é perfeitamente excluída da incidência das contribuições no entender dessa pesquisa, interpretação aliada ao princípio da estrita legalidade no âmbito tributário.

 O nome dessa desoneração tributária chama-se elisão fiscal, meio pelo qual o contribuinte lança mão para evitar a ocorrência do fato gerador do tributo ou mitigar-lhe os efeitos financeiros, não podendo as autoridades administrativas oporem-lhe resistência, por tratarem-se de compromissos lícitos, suportados pelo princípio da reserva à lei, do qual sobreleva a premissa de que o contribuinte é livre para organizar o seu negócio e as suas atividades da maneira que lhe aprouver, não havendo fundamento moral ou cívico que o obrigue a adotar a solução mais vantajosa para o tesouro.

III – CONCLUSÃO

Diante do exposto, pode-se concluir que sendo o benefício ofertado a todos os empregados, com ou sem a adesão dos dependentes, não havendo distinção de valores quanto aos planos, a empresa estará no gozo da isenção quanto as contribuições previdenciárias.

Esse entendimento é amparado por uma análise extensiva na posição jurisprudencial majoritária dos tribunais administrativos e judiciais a respeito do tema.

Para evitar eventual embaraço fiscal com a Receita Federal quanto a tais operações, com a possibilidade de inclusão no cadastro de proteções ao crédito da empresa, ajuizamento de execuções fiscais, bloqueio online de contas (Bacen Jud), restrições de circulação de veículos (Renan Jud), penhoras, etc.

Mister se faz o estudo e análise de um planejamento tributário com um escritório de advocacia para trazer maior segurança, transparência e previsibilidade das relações fiscais, evitando posteriores frustrações que poderiam ter sido evitadas com uma consultoria tributária de excelência.

O planejamento tributário visa justamente a adoção de procedimentos implicitamente autorizados pelo ordenamento jurídico, plano da licitude, que podem ser usados com o propósito de incorrer numa menor carga tributária.

 

Referências

Informações Sobre o Autor

Filipe Reis Caldas

Advogado Tributarista. Pós-Graduado em Direito Público pela FACESF. Pós-Graduando em Direito Tributário pelo IBET. Membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/PE.


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