A solução da responsabilidade civil, sob a óptica do direito do consumidor: ponderações sobre o enunciado da Súmula 595 do Superior Tribunal de Justiça e da interação entre os personagens jurisdicionados

Resumo: Este artigo visa destacar o recente posicionamento enunciado em súmula pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no que tange à responsabilidade civil por eventuais danos, provenientes da relação de consumo entre aluno e instituição de ensino superior; destaca-se, perifericamente, a discricionariedade do Ministério da Educação, enquanto agente da Administração Pública direta, no reconhecimento dos cursos de educação superior, presencial e à distância. Em virtude de uniformização da jurisprudência, a súmula 595 do Superior Tribunal de Justiça pavimentou o entendimento da Segunda Seção desta Corte de que, nas ações ajuizadas por força da incidência de prejuízos, suportados pelo aluno, haverá responsabilização civil da Instituição de Ensino Superior (IES), independentemente da demonstração de culpa do aluno. A reparação civil é devida, uma vez que o aluno prejudicado não conhecia previamente ou não fora informado, no momento da matrícula, de que o curso não possuía reconhecimento expedido pelo Ministério da Educação (MEC). Nesse mérito, basta à ocasião danosa e o nexo entre o consumidor e o fornecedor, para ensejar à reparação civil. Ressalta-se que é indispensável à IES que o Ministério da Educação chancele o funcionamento dos cursos pretendidos. A atuação do MEC se dividirá em três atos administrativos autorizativos, independentes entre si, quais sejam: credenciamento e recredenciamento, autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento. Há de se mencionar que o reconhecimento poderá ser superveniente à matrícula, entretanto, a falta de tal ato poderá prejudicar o educando e discorrer à reparação civil, como deveras se estudará.

Palavras-chave: Responsabilidade. Consumidor. Reparação. Educação. Credenciamento.

Abstract: This article aims to highlight the recent position set forth in a summary by the Superior Court of Justice (STJ), regarding civil liability for possible damages, arising from the relation of consumption between student and institution of higher education; the discretion of the Ministry of Education, as an agent of the Direct Public Administration, in the recognition of higher education courses, in person and at a distance, is peripherally highlighted. By virtue of the uniformity of jurisprudence, the 595 of the Superior Court of Justice paved the understanding of the Second Section of this Court that, in the actions filed as a result of the incidence of losses, supported by the student, there will be civil responsibility of the Institution of Higher Education ), regardless of the student's demonstration of guilt. Civil damages are due, since the injured student was not previously known or had not been informed, at the time of enrollment, that the course did not have recognition issued by the Ministry of Education (MEC). In this merit, it is enough to the harmful occasion and the nexus between the consumer and the supplier, to lead to civil reparation. It is important to note that it is indispensable to the HEI that the Ministry of Education should be able to operate the intended courses. The activities of the MEC will be divided into three authorizing administrative acts, independent of each other, namely: accreditation and re-accreditation, authorization, recognition and renewal of recognition. It should be mentioned that recognition may be supervenient to enrollment, however, the lack of such an act may harm the student and address civil remedy, as will be studied.

Keywords: Responsibility. Consumer. Repair. Education. Recognition.

Sumário: Introdução. 1. O posicionamento da Administração Pública. 2. O emprego do Código de Defesa do Consumidor na relação entre aluno e Instituição de Ensino Superior. 2.1. Dos Direitos básicos do consumidor. 2.2 A expectativa dos consumidores. 2.3. A responsabilidade civil do fornecedor. 2.4. Prazo prescricional da responsabilidade civil. 2.5. Decisões que influenciaram o enunciado da súmula. 3. A minúcia do enunciado da súmula, aprovada pela Câmara de Direito Privado. 4. Considerações finais.

INTRODUÇÃO

É imprescindível que a Administração Pública exerça sua tutela no viés da educação, sobretudo, em se tratando da qualidade educacional oferecida. Em sede do ensino superior, o Ministério da Educação desempenha uma atribuição importante, ao reconhecer e autorizar o funcionamento dos cursos de graduação e pós-graduação; por isso, permite-se interpretar que o ensino educacional é um produto, do qual a instituição de ensino superior é fornecedora. Daí, entende-se que o controle de qualidade seja exercido pela própria Administração (a título de exemplo, Conselho Nacional de Educação – CNE, Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior – SINAES, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, entre outras autarquias funcionando como termômetros da qualidade do ensino).

A partir de uma interpretação extensiva, o aluno, estudante do ensino superior, atua como consumidor propriamente dito quando adquire a prestação educacional do curso e, nesse viés, deve ser amparado pela norma consumerista, isto é, pelo Código de Defesa do Consumidor. Desde logo, a relação consumerista está caracterizada: de um lado, o estudante como consumidor e de outro lado a instituição de ensino superior, como fornecedora; o curso educacional é o produto oferecido ao destinatário final.

Levando-se em conta a recorrência de várias ações ajuizadas na Justiça Estadual, indicando prejuízos patrimoniais e morais, sofridos pelos consumidores, o Superior Tribunal de Justiça unificou o entendimento dos estudos desse tema, mencionando a súmula 595 do STJ. Os precedentes desta súmula vêm, originariamente, das ações de natureza de direito civil, cuja situação fática aponta a violação dos direitos básicos do consumidor, por parte da instituição de ensino, sendo esta responsável pela reparação de tal incongruência.

Por hora, deve-se ressaltar que a eloquência da súmula somente se dará na hipótese do preenchimento de duas condições salutares à responsabilização do fornecedor: i. Situação de desconhecimento por parte do aluno, no momento da contratação do curso de graduação junto à instituição de ensino superior, que não possui autorização ou reconhecimento dos seus cursos junto ao Ministério da Educação, nem informa ao contratante da corrente situação; ii. Ocorrência de prejuízo ao aluno, ao qual é devida a reparação civil, seja em função de prejuízo moral ou patrimonial, destarte, a responsabilidade da instituição será objetiva.

Mais uma vez, importa mencionar que, nesse caso supracitado, incidirão as normas cogentes, de ordem pública, atinentes ao Código de Defesa do Consumidor, observando-se as matérias circunscritas da Constituição Federal de 1988. No que toca à função do Ministério da Educação, aludem-se as normas administrativas, acerca dos atos de gestão, quando do reconhecimento e autorização das instituições de ensino superior em fornecer cursos de graduação.

Com efeito, aduz-se que a instituição de ensino superior deveria promover a informação adequada e exposta previamente ao aluno, como forma de obstar que eventuais prejuízos venham a ocorrer, nessa hipótese, para ambas as partes. Nessa minuta, pretende-se elucidar o posicionamento vigente dos Tribunais, as atribuições do Poder Público e o conteúdo do enunciado sumular.

1. O POSICIONAMENTO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A educação tem escopo constitucional e deve ser respeitada como um direito atinente a todos os brasileiros, sem exceção. A priori, a Carta Magna brasileira de 1988 elenca os direitos sociais, dentre os quais a educação representa um componente fundamental. A educação como direito social é uma matéria ratificada pelo Protocolo de San Salvador, sendo este diploma referendado no Brasil por meio de Decreto, com força de lei infraconstitucional.

Adiante, dito isto, desprende-se do texto constitucional que a União tem competência privativa[1] para estabelecer as diretrizes e bases da educação nacional; não obstante, a competência será comum[2] à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em se tratando de proporcionar os meios acessíveis à educação. Nesta tela, cumpre mencionar que a esfera abordada por esse estudo será a competência privativa da União, atribuída, precipuamente, na Administração Pública federal direta, pelo Ministério da Educação, criado em 1930[3] .

Recentemente, o Presidente da República em exercício, Michel Temer, aprovou o Decreto nº 9.005/2017[4], cujo cerne visa estruturar o regimento do Ministério da Educação e do quadro de funcionários. Anexo a esse decreto, o documento chamado estrutura regimental do Ministério da Educação encorpa, no primeiro capítulo e artigo, a área de competência desse ministério:

“Art. 1. O Ministério da Educação, órgão da administração federal direta, tem como área de competência os seguintes assuntos:

I – política nacional de educação;

II – educação infantil;

III – educação em geral, compreendendo ensino fundamental, ensino médio, ensino superior, educação de jovens e adultos, educação profissional, educação especial e educação à distância, exceto ensino militar;

IV – avaliação, informação e pesquisa educacional;

V – pesquisa e extensão universitária;

VI – magistério; e

VII – assistência financeira a famílias carentes para a escolarização de seus filhos ou dependentes.”

Elaborada a referência desse órgão, é salutar que seja notada a ramificação desse Ministério, ao redor do país. Em destaque, o órgão colegiado do Conselho Nacional da Educação (CNE) é responsável pelas resoluções e instruções que circundam as demais engrenagens do ministério; ademais, as autarquias, como o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FDNE) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), a fundação pública como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a empresa pública como a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, inclusive os órgãos específicos e singulares que auxiliam ao Ministro da Educação, cargo atualmente ocupado por Mendonça Filho, são derivados do Ministério da Educação, propriamente.

Considerando a devida apresentação, deve-se retomar que o Ministério da Educação possui competência sobre a autorização e reconhecimento do ensino superior no país. Sendo assim, exige-se um ato administrativo que estabeleça tal condição de reconhecimento ao curso de graduação ou de pós-graduação. Esse ato autorizativo[5] se divide em duas extensões:

a)    Credenciamento e recredenciamento

O credenciamento funciona da seguinte forma: antes do início das atividades educacionais, a instituição de ensino superior deverá solicitar o credenciamento dos seus respectivos cursos junto ao Ministério da Educação. Em concordância com a organização acadêmica da instituição de ensino superior, a credencial poderá ser de faculdade, centro universitário ou universidade.

A princípio, a instituição será credenciada como faculdade; se, porventura, a faculdade solicitar o credenciamento como centro universitário ou universidade, deverá realizar o cadastro específico para tal, garantido o funcionamento regular e qualidade satisfatória, atestados pelo Ministério da Educação. O primeiro credenciamento das faculdades e centros universitários vigora pelo prazo máximo de três anos; no que tange à universidade, o primeiro credenciamento vigorará pelo prazo máximo de cinco anos.

Em outra tela, o recredenciamento será solicitado pela instituição de ensino superior ao final de cada ciclo avaliativo do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES), junto à Secretaria competente do Ministério da Educação.

b)    Autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento.

As instituições de ensino superior demandam a autorização do Ministério da Educação para que sejam ofertados os cursos de graduação. Aqui, trata-se de mero ato administrativo do Ministério, para permitir que funcionem regularmente os cursos superiores.

Deve-se observar que apenas as faculdades demandam autorização para o funcionamento. Os centros universitários e universidades têm autonomia e, portanto, independem de autorização para tal; por outro lado, elas deverão informar à Secretaria competente do Ministério da Educação os cursos abertos em funcionamento, com a finalidade de supervisão, avaliação e posterior reconhecimento[6].

Vale mencionar que, em se tratando de cursos de graduação de Direito, Medicina, Odontologia e Psicologia, a Secretaria de Educação Superior considera indispensável à manifestação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho Nacional de Saúde.

No momento em que o curso de graduação alcançar metade de sua carga horária, a instituição de ensino superior deverá elaborar uma solicitação de reconhecimento do curso ao Ministério da Educação: trata-se da condição necessária para a validade nacional dos respectivos diplomas (ponto em que se assenta o presente estudo). Sobretudo, os Conselhos supracitados gozam de prerrogativas para manifestar-se junto ao Ministério, isto é, o reconhecimento passa pela chancela dos órgãos de classe.

A renovação do reconhecimento se exerce da mesma maneira que o recredenciamento. Ao final do ciclo avaliativo do SINAES, a instituição de ensino superior deverá solicitar a renovação do reconhecimento do curso junto à Secretaria competente do Ministério da Educação.

Deve-se notar que as instituições de ensino superior têm plena ciência de que o reconhecimento dos seus cursos é um fator preponderante em relação à qualidade e adequação de sua oferta. Além disso, os mesmos pressupostos de reconhecimento dos cursos de graduação valem também para os cursos de pós-graduação. Esse entendimento deixa bem claro que, a despeito da literalidade cobrada por lei e da burocracia indispensavelmente exigida pelo Ministério da Educação, as instituições de ensino superior que funcionam sem o devido reconhecimento de seus cursos assumem a opção em que se colocam, isto é, dispõem-se à eventualidade do risco.

2. O EMPREGO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NA RELAÇÃO ENTRE ALUNO E INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR

No segundo artigo do CDC se encontra a definição de consumidor propriamente dita: consiste em toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. A título de conhecimento, o mesmo Código descreve a existência do consumidor por equiparação, consumidor vítima de acidentes de consumo e aquele consumidor exposto às práticas comerciais.

Adiante, reside no terceiro artigo do CDC a acepção de fornecedor: toda pessoa física ou jurídica que desenvolve atividade produtiva, comercializa produtos ou presta serviços. É lícito que os fornecedores, enquanto pessoas jurídicas, tenham cunho público ou privado, nacional ou estrangeiro, assim como podem ser entes sem personalidade jurídica.

É mister suscitar que fornecedor e consumidor têm o seguinte elo: o produto ou serviço[7]. Quando se tratar de produto, este compreende qualquer bem, material ou imaterial, móvel ou imóvel; em se tratando de serviço, estende-se o entendimento por qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante pagamento, com exceção das relações de natureza trabalhista.

Exercida a apresentação, vale destacar que as instituições de ensino superior atuam como fornecedoras, ao ofertar a prestação de serviços educacionais. Originariamente, essa prática comercial pertence à iniciativa privada, vez que haverá cobrança de valores a título de contraprestação, no entanto, a oferta não é exclusividade e também pode ser empregada pela iniciativa pública. Nessa esteira, o aluno que adquire o produto como destinatário final será o consumidor, propriamente dito; a instituição, que presta o serviço educacional será a fornecedora.

Nos termos da Constituição Federal[8], ao Estado é atribuída a defesa do consumidor, na forma da Lei; concomitantemente, a adoção do CDC gerencia a proteção do consumidor e determina o procedimento pertinente às relações de consumo. Acerca do Código de Defesa do Consumidor, trata-se de norma de ordem pública, isto é, norma cogente que não pode ser afastada (o consumidor não pode abrir mão ou ceder seu direito, tendo em vista a inafastabilidade das normas dessa ordem).

A compreensão dos Tribunais brasileiros está sedimentada sobre a positiva existência da relação de consumo entre o aluno e a instituição de ensino superior, prestadora de serviço educacional. Nesse instante, pode-se afirmar que, no advento dessa interação, haverá espaço para a responsabilidade civil, à medida que sejam resguardados os direitos básicos do consumidor, previstos pela legislação que lhe circunda.

A aplicação do CDC nas relações entre aluno e instituição de ensino superior tem sido amplamente difundida nos Tribunais, ao passo que a configuração da relação de consumo é um reflexo da evolução das normas cogentes. Nota-se a compreensão de consumidor no seguinte julgado[9]:

“PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS – CURSO UNIVERSITÁRIO NÃO RECONHECIDO PELO MEC – CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELOS PREJUÍZOS RESULTANTES DA INSUFICIÊNCIA DAS INFORMAÇÕES PRESTADAS ACERCA DA FRUIÇÃO DOS SERVIÇOS – INDENIZAÇÃO PELOS DANOS MATERIAIS CONSISTENTES NAS DESPESAS EFETIVAMENTE DEMONSTRADAS, SUPORTADAS EM RAZÃO DA TRANSFERÊNCIA DA ALUNA PARA OUTRA INSTITUIÇÃO DE ENSINO – FATO IMPUTÁVEL UNICAMENTE À EMPRESA RÉ – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES, MERAMENTE HIPOTÉTICOS NO CASO DOS AUTOS – SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA QUE IMPÕE O RATEIO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.” TJ/SP – Apl 9151502-52.2008.8.26.0000 – Relator Desembargador Edgard Rosa.

Levando-se em conta o estudo feito sobre o voto do Desembargador Relator nos autos em epígrafe[10], existe relação de consumo entre a instituição de ensino e a estudante, na dicção do art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, por ser ela destinatária final dos serviços educacionais prestados e disso decorrerá a incidência das disposições à espécie. Dessa maneira, considerando a relação entre o consumidor e fornecedor, cumpre enfatizar o evento da responsabilidade civil, também o nexo causal entre a prestação do serviço e a ocorrência de danos ao consumidor.

2.1 DOS DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR

Em observação às disposições do Código de Defesa do Consumidor, aglutinam-se aos preceitos constitucionais os direitos básicos do consumidor, previstos no terceiro capítulo da Lei nº 8.078/90. Especificamente, esse estudo trará um rol exemplificativo dos direitos básicos do consumidor, tendo em vista que a preocupação da súmula enunciada pelo STJ, intitulada nesse artigo, assenta-se na responsabilidade civil.

Sumariamente, os direitos básicos inerentes ao consumidor são indisponíveis e devem obedecer às normas de ordem pública, conforme explícito no caput anterior. Esses direitos são elencados da seguinte forma:

“Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:

i. a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

ii. a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;

iii. a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

iv. a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;

v. a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

vi. a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

vii. o acesso aos órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;

viii. a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segunda as regras ordinárias de experiências;

ix. (vetado);

x. a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Art. 7º. Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade […].”

A atenção se dirigirá para o inciso VI do artigo 6º da Lei 8.078/90, cujo tratamento versa sobre a reparação dos danos experimentados e também da prevenção deles. A prevenção dos prejuízos é uma preocupação advinda do Código Civil e foi transportada para o Código de Defesa do Consumidor; a reparação desses prejuízos, idem.

 Considerando que a CF/88 foi pioneira ao suscitar a promoção da defesa do consumidor exercida pelo Estado, as leis infraconstitucionais desta seara seguiram a mesma trajetória, isto é, não perderam tônica protetiva, tanto que várias outras leis foram editadas posteriormente, tratando sobre o mesmo núcleo: a proteção do consumidor. A título de exemplificação, destacam-se:

– Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, que dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC).

– Decreto nº 6.523, de 31 de julho de 2008, que regulamenta o Código de Defesa do Consumidor, para fixar normas gerais sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC).

– Lei nº 12.291, de 20 de julho de 2010, que torna obrigatória a manutenção de exemplar do CDC nos estabelecimentos comerciais e de prestação de serviços.

– Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, dispondo sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica.

Estes exemplos acima servem para elucidar a importância que a configuração do consumo tem na sociedade brasileira. As relações consumeristas devem sempre observar o pálio da Constituição Federal e também as leis infraconstitucionais, a fim de evitar que se provoquem danos ou prejuízos a terceiros.

2.2. A EXPECTATIVA DOS CONSUMIDORES

Atualmente, os estudantes visam, não somente a formação intelectual, mas também à prática, que lhes condicionará oportunidades de emprego. Essa visão é subsidiada por uma boa qualificação técnica e pessoal: o currículo. As instituições de ensino superior são buscadas para realizar tal qualificação, sejam elas organizações públicas ou privadas.

No âmbito das instituições públicas de ensino superior, o método de ingresso nas fileiras é o processo seletivo, inclusive para as transferências; aprovado, o estudante não terá que arcar com valores de matrícula ou mensalidade, em relação ao curso pretendido. Em outro viés, tratando-se de instituições privadas de ensino superior, o método de ingresso também será o processo seletivo, no entanto deverá, posteriormente, haver o custeio do ensino, por meio da cobrança de mensalidade ou anuidade, a título de contraprestação.

Tornou-se comum o financiamento estudantil, isto é, um ônus, que permite aos estudantes sem condições financeiras de arcar integralmente com os valores cobrados pelas instituições de ensino superior, arcar, de forma diluída, com estes pela instituição ao compasso do estudo. Nessa hipótese, todavia, trata-se de contrato de empréstimo.

O financiamento estudantil é subsidiado pelo governo federal, cuja proposta tem cobrança diferenciada e períodos de carência mais acessíveis, segundo o FIES, Programa de Financiamento Estudantil, fomentado pelo Ministério da Educação[11]. As instituições bancárias têm difundido amplamente esse subsídio estudantil, financiando o custo dos estudos e tornando o estudante devedor do próprio banco.

É salutar mencionar que, concomitante ao crescimento do número de estudantes do ensino superior, as instituições de ensino superior também aumentaram em número, na contramão da qualidade de ensino, reflexivamente. A título de demonstração, depreende-se o número de ações ajuizadas em face das instituições de ensino superior, cujo pleito é exatamente a titulação do ensino; vê-se no Superior Tribunal de Justiça o seguinte julgamento[12]:

“MANDADO DE SEGURANÇA. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. PORTARIA. AUMENTO NO NÚMERO DE VAGAS DOS CURSOS JURÍDICOS SEM PRÉVIA MANIFESTAÇÃO DA OAB. IMPOSSIBILIDADE. DESCUMPRIMENTO DE REQUISITO FORMAL PARA A PRÁTICA DO ATO ADMINISTRATIVO. RELEVÂNCIA CONSTITUCIONAL DA PROFISSÃO DE ADVOGADO E DEMAIS CARREIRAS JURÍDICAS.” MS: 8219 DF 2002/0023319-6, STJ. Relator: Ministro Franciulli Netto, Data de julgamento: 23/10/2002, S1 – Primeira Seção, Data de Publicação: DJ 12.05.2003 p. 205.

Ante o julgamento exposto, é possível destacar que compete ao Estado a prestação da educação de boa qualidade, sobretudo apoiando-se nas normas gerais educacionais pré-estabelecidas. Portanto, resta claro que obsta ao Estado a fixação deliberada de normas, especialmente quando houver desrespeito aos direitos dos particulares que se dedicam ao ensino ou à qualidade da educação abordada pela mesma Constituição Federal. Deve-se anotar, contudo, que as políticas públicas de controle de qualidade do ensino devem sempre ser observadas, a fim de que haja manutenção do sistema educacional de natureza qualificada e não ocorram prejuízos irreparáveis aos estudantes.

2.3 A RESPONSABILIDADE CIVIL DO FORNECEDOR

No tocante da relação de consumo, entre instituição de ensino superior e aluno, o qual seja a prestação de serviço educacional o produto fornecido, deve-se salientar que, no caso de prejuízo proporcionado ao consumidor, o fornecedor será responsável pelo seu ressarcimento. Em outras palavras, essa disposição está descrita no caput do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”.

Em minúcia, o fornecedor de serviços defeituosos responderá civilmente pela reparação dos prejuízos ocasionados ao consumidor, seja pela inutilidade da prestação ou, especialmente para esse estudo, pela desídia na informação do consumidor sobre os adventos do produto oferecido. Contudo, o fornecedor poderá ser elidido da responsabilidade se provar que não houve defeito, decorrente da prestação do serviço ou o dano adveio de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro[13].

Considerando o tema proposto por esse estudo, vale adequar-se a situação concreta à disposição do Código de Defesa do Consumidor: o aluno terá direito à indenização, enquanto consumidor do produto educacional fornecido pela prestadora de serviços, a instituição de ensino superior, na hipótese de eventuais prejuízos acerca da prestação inadequada do serviço. Essa reparação civil somente será devida quando a instituição de ensino superior não informar adequadamente o aluno, no momento da adesão, sobre o reconhecimento e autorização dos cursos oferecidos a este.

Na contramão do que se dispõe no Código Civil[14], acerca da temática macro da responsabilidade extracontratual ou aquiliana, o Código de Defesa do Consumidor estabelece que, havendo a configuração de uma relação contratual de consumo, deve-se provar apenas a ocorrência do prejuízo, demonstrando-se o elo entre o consumidor e o fornecedor, para ensejar a responsabilidade objetiva; diferentemente do CDC, o Código Civil postula a reparação em detrimento da comprovação do dano provocado por dolo ou culpa.

“PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. CONFIGURAÇÃO DE RELAÇÃO DE CONSUMO. CURSO DE MESTRADO NÃO RECONHECIDO OFICIALMENTE PELO PODER PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELO VÍCIO DO SERVIÇO. ART. 20 DO CDC. INEXISTÊNCIA DE FATO DE TERCEIRO A EXIMIR A RÉ DA OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR OS VALORES PAGOS A TÍTULO DE CONTRAPRESTAÇÃO. DANOS MORAIS RECONHECIDOS. EVENTUAL CIÊNCIA DA ALUNA A RESPEITO DO NÃO RECONHECIMENTO DO CURSO QUE NÃO ELIDE A RESPONSABILIDADE DA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE REGULARIZAR A PENDÊNCIA VISANDO À OBTENÇÃO DO TÍTULO ACADÊMICO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO […].” SÚMULAS 326 E 362 DO STJ. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TJ-SP. APELAÇÃO: APL 9147224-71.2009.8.26.0000. DJe: 09/11/2012. Relator: Desembargador Edgard Rosa. 25ª Câmara de Direito Privado.

Com efeito, devem-se observar decisões sobre esse tema, primeiro, pela razão de o entendimento se encontrar pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive dotado de caráter de orientação para as demais Câmaras e segundo, dirimir eventuais dúvidas sobre o assunto, primando pela reparação da justiça e do meio adequado de solução de conflitos. Obviamente, a súmula enunciada pelo STJ não vincula os julgamentos posteriores, no entanto reforça uma linha coesa de pensamento e estudo, buscando a justiça. Esse entendimento enriquece a jurisprudência no que tange à matéria da reparação civil e do direito do consumidor.

2.4 PRAZO PRESCRICIONAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Levando-se em conta a relação de consumo estabelecida entre aluno e instituição de ensino superior, aplicar-se-ão os prazos indicados no Código de Defesa do Consumidor em preponderância aos prazos do Código Civil. Em relação aos danos provenientes de acidentes de consumo, por fato do produto ou do serviço, o prazo da pretensão para ajuizar demanda de reparação dos danos prescreverá em 5 anos, contados a partir do conhecimento do prejuízo; em se tratando da reparação civil, naturalmente abordada pelo artigo 203, §3º, V do Código Civil, a pretensão prescreverá em 3 anos, aplicando-se as causas de interrupção ou suspensão do prazo prescricional.

Deve-se abarcar que a prescrição fulminará a pretensão da responsabilidade civil, tendo em vista o prazo prescricional decorreu sem que nenhuma medida fosse tomada a respeito da reparação. Nesse advento, a legitimidade ativa para propor a ação pertence ao consumidor lesado, enquanto a legitimidade passiva estará com o fornecedor do produto ou serviço. Em outras linhas, o consumidor terá oportunidade de fruir da competência territorial, do extenso prazo até a prescrição da pretensão e da legislação consumerista para protegê-lo, enquanto o fornecedor deverá demonstrar que o produto ou a prestação do serviço foi executado de forma adequada.

2.5 DECISÕES QUE INFLUENCIARAM O ENUNCIADO DA SÚMULA

Esse ponto destaca prioritariamente as decisões emitidas pelo Superior Tribunal de Justiça, acerca da temática provida pela súmula. O cerne reside na adequação da indenização civil do consumidor prejudicado, em virtude da falta de informação ou prestação pontual de serviço, que gerou dano de ordem moral ou patrimonial; nesse mérito, deve-se consignar que este pedido é o principal da ação ajuizada e, portanto, merece destaque frente aos outros pedidos de caráter suplementar.

Há espaço para menção de várias decisões, recentemente apreciadas pelo STJ, com atenção para o Recurso Especial[15], proveniente do estado de Rondônia, que chamou a atenção dos Ministros do Tribunal e também dos juristas brasileiros, discutindo em juízo aspectos importantes para uniformização da jurisprudência. Independentemente de repercussão ou notoriedade, a matéria julgada pelo Superior Tribunal de Justiça tem relevância e, pelo pioneirismo no assunto, ensejou o enunciado do entendimento, por intermédio da aprovação e publicação da súmula 595.

Inicialmente, o consumidor ajuizou uma ação de indenização por danos morais e materiais em face do fornecedor, na Comarca de Vilhena – ES; segundo o consumidor, matriculou-se no curso de mestrado oferecido pela fornecedora, pagando prestações mensais desde a contratação. Tendo apresentado a dissertação final, pertinente, o consumidor prosseguiu ao recebimento do título de Mestre, entretanto descobriu que o Ministério da Educação (MEC), órgão da Administração Pública, não reconhecia o curso de mestrado oferecido pela fornecedora. A partir dessa controvérsia, iniciou-se a batalha judicial, na qual o aluno buscava o ressarcimento dos valores dispendidos ao decorrer do curso, enquanto a instituição de ensino superior demonstrava que a prestação foi exercida, apresentando, posteriormente, o devido reconhecimento do MEC. Ilustra-se, oportunamente, o voto do Ministro Luís Felipe Salomão, em sede de REsp, acerca do cabimento do direito:

‘’ Em regra, não se faz uma graduação ou mestrado por diletantismo, por simples amor ao conhecimento, mas também, e principalmente, por razões pragmáticas, para efeito de profissionalização, titulação ou ascensão profissional. Diante do desemprego e dos baixos salários, não se pode presumir que a opção de se cursar um mestrado não tenha a finalidade, sobretudo, profissional, de se inserir ou se manter no mercado de trabalho, de ascensão profissional ou de plus salarial.

E é certo, por outro lado, que todos esses resultados somente se logram se o curso estiver devidamente reconhecido pelos órgãos competentes (MEC/CAPES). Em realidade, a tese da recorrida, segundo a qual "o curso era para lapidar a intelectualidade dos alunos e não para galgar reconhecimento pelo MEC", é uma afronta à boa-fé-objetiva, que deve nortear tanto a execução como a formação dos contratos (art. 422 do CC/02) […].

5.2. É inconteste que a relação existente entre uma instituição de ensino particular e o aluno é de índole consumerista, uma vez que este é destinatário final dos serviços prestados por aquela, estando também presente o traço da vulnerabilidade jurídica (arts. 2º e 4º, inciso I, do CDC).

No particular, em contratos de prestação de serviços educacionais, a maior de todas as cláusulas, porque respeita a boa-fé objetiva – ainda que não seja expressa -, deve ser aquela que preveja, ao final, a titulação do aluno no grau a que se propôs o curso, devendo esta ter alguma utilidade, a qual somente se alcança com o reconhecimento pelo órgão competente […].

A instituição de ensino, ao se enveredar na seara da educação superior, graduação ou pós-graduação, assume o ônus do reconhecimento do curso junto ao MEC/CAPES. A validade do curso, no entanto, depende unicamente da qualidade do serviço prestado e da adequação às regras técnicas. Por isso mesmo, não pode o risco do não-reconhecimento ser dividido com o aluno, que em nada contribui para o insucesso’’.

Ato contínuo, o acórdão proferido pelo STJ consignou pelo parcial provimento do recurso especial, apenas no que tange ao reconhecimento da indenização dos lucros cessantes correspondentes à gratificação pretendida pelo consumidor, haja vista a especificidade do caso concreto. Nesse sentido, a decisão gozou de efeito retroativo, remetendo desde o término do curso educacional até o reconhecimento da diplomação.

Foram considerados cerca de nove precedentes, decididos em grau recursal pelo Superior Tribunal de Justiça, antes da formulação da intitulada súmula desse estudo. Todas as decisões ponderadas acerca são relevantes e merecem destaque. A título de conhecimento, anotam-se o Recurso Especial nº 1.034.289 – SP[16] e o Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial nº 651.099 – PR[17], ambos os processos decididos pelo STJ e adotados como fonte jurisprudencial para a postulação da súmula 595 da referida Câmara.

3. A MINÚCIA DO ENUNCIADO DA SÚMULA, APROVADA PELA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

Considerando a competência prevista pelo artigo 105 da CF/88, relacionada ao Superior Tribunal de Justiça, entende-se que as súmulas fornecidas por essa Corte não têm efeito vinculante às demais Cortes; apesar de não consistir em lei, as súmulas do STJ terão tal qualidade, produzindo efeito principalmente entre as partes.

Conforme citado anteriormente, as súmulas terão atribuição de uniformizar, tornar mais clara a jurisprudência e orientar os Tribunais de diferentes graus a considerar o entendimento do STJ e relevar o estudo dispendido em cima da temática. Dessa forma, orienta-se, não se obriga.

A aprovação de uma súmula do Superior Tribunal de Justiça deverá ser votada, em sessão plenária de uma das seções da Câmara. Ato contínuo, o enunciado deverá ser publicado no Diário da Justiça eletrônico por três vezes, em datas próximas, obedecendo à previsão do Regimento Interno do Tribunal[18].

A segunda Seção, Câmara de Direito Privado do STJ, responsável pela apreciação das temáticas de comércio, consumo, contratos, família e sucessões, por exemplo, aprovou o enunciado da súmula 595, em plenário realizado no dia 06/11/2017, considerando os seguintes termos:

“As instituições de ensino superior respondem objetivamente pelos danos suportados pelo aluno/consumidor pela realização de curso não reconhecido pelo Ministério da Educação, sobre o qual não lhe tenha sido dada prévia e adequada informação.”

O entendimento ficou firmado na jurisprudência e, inclusive, já orienta os Tribunais, no mesmo compasso, valendo destacar que qualquer dos Ministros da Seção ou Corte Especial, poderá propor a revisão da jurisprudência compendiada na súmula[19]. A partir do referendo da revisão, esta se realizará pelos Ministros do Órgão Especial e Seções, à medida que a argumentação não seja alvo de discórdia entre os Ministros, salvo a interação de atender a utilidade de uniformização do entendimento e a harmonia entre os pares.

Enfim, na matéria, os fornecedores serão responsáveis à reparação civil dos danos proporcionados aos consumidores, em se tratando da prestação de serviço inadequada e equívoca, independentemente da demonstração de culpa: o serviço prestado foi defeituoso ou incauto. Com efeito, ressaltar-se-á a tendência das decisões judiciais já mencionadas outrora nesta minuta, demonstrando que a responsabilidade incide sobre os fornecedores e que os danos suportados pelo consumidor podem ser de monta patrimonial ou moral, a depender do caso concreto.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As credenciais são merecidas para o Superior Tribunal de Justiça, que exerce uma atribuição indispensável na Administração Pública, na segurança do sistema da ampla defesa, assim como no exercício jurisdicional de uniformização de entendimentos perante os Tribunais do país.

Evidentemente, a súmula 595 do STJ cerca um assunto importante para a esfera do direito privado, qual seja a responsabilidade civil. No estudo da súmula, aborda-se a relação de consumo, observando o contrato estabelecido entre as partes. Essa contratação destacou o julgador a organizar o seu entendimento a partir das acepções do Código de Defesa do Consumidor.

A instituição de ensino superior, enquanto prestadora de serviços, oferece a sua prestação educacional ao aluno, consumidor, que espera um resultado, visado desde o momento da contratação. Todavia, a prestação é defeituosa, gerando prejuízos ao consumidor, por não atender à expectativa deste e dispor de reconhecimento indispensável para a validação da prestação educacional, ou seja, o curso educacional é irregular. Logo, o fornecedor é responsável pela reparação civil dos danos ocasionados ao consumidor.

Oportunamente, cumpre salientar que existirá a possibilidade do fornecedor elidir a sua responsabilização em detrimento do prejuízo experimentado pelo consumidor, considerando-se que esse ônus lhe pertença, haja vista a obediência da norma de ordem pública e o ajuizamento de ação de reparação civil por parte do consumidor lesado. Basta o fornecedor provar é culpa exclusivamente do comportamento do consumidor ou que a prestação do serviço foi adequada.

Em uma análise apertada, as instituições de ensino superior têm ciência de que a superveniência do reconhecimento e autorização, ratificados pelo MEC, dos cursos educacionais oferecidos, evitará o ajuizamento de ações nesse condão, uma vez que a regularidade do curso projeta confiabilidade e competência à instituição. Em outras palavras, o ato expedido pelo Ministério da Educação importa em uma cadeia de condutas: poupa a saliência de processos na alçada, evita a movimentação desnecessária do Judiciário e, não menos importante, impede a ocorrência de danos ao consumidor, que dentre várias opções disponíveis, optou pela seriedade e competência da regular instituição. Enfim, a instituição de ensino superior deverá sair da inércia e asseverar pela regularidade, tendo em vista o preenchimento das requisições do MEC.

A Administração Pública tem aqui uma atribuição fundamental, levando-se em conta que o Ministério da Educação autoriza o funcionamento de determinados cursos educacionais ao redor do país. Os órgãos delegados para tal atribuição devem ser caracterizados pela seriedade e discricionariedade, todavia, encontram-se atribulados e perdidos, deveras; essa confusão permite a abertura de cursos inadaptados e inadequados diante dos requerimentos do ofício; os cursos formam profissionais despreparados ou indiferentes à realidade do mercado de trabalho. Basta que se analise o posicionamento das entidades de classe como o Conselho Federal de Medicina e da Ordem dos Advogados do Brasil, que oficiaram a contrariedade em detrimento da autorização do MEC à abertura de novos cursos, ano após ano, sem análise de qualidade. Por enquanto, apenas o CFM exitou.

Na seara consumerista, resta evidente que o consumidor não deverá suportar os prejuízos advindos de uma prestação de serviços precária. Em havendo danos patrimoniais ou morais ao consumidor, o fornecedor deverá indenizá-lo, independentemente da existência de culpa, isto é, objetivamente. Obriga-se apenas ao consumidor demonstrar o nexo de causalidade da interação entre aluno e instituição de ensino superior, além do prejuízo eventualmente suportado.

Doravante, a orientação geral do Superior Tribunal de Justiça pondera que o caso concreto deve ser apreciado conforme a sua peculiaridade, ou seja, o conjunto fático deve ser especificamente estudado; dessa forma, o enunciado da súmula trabalha como uma diretriz para o julgamento, levando em consideração o estudo da doutrina e das decisões judiciais anteriores, feitas sob o pálio da lei e da jurisprudência. Destarte, a súmula 595 do STJ não foge à regra: demonstrou-se a pertinência da abordagem dessa temática nos juízos, chegando, oportunamente, aos Tribunais e à Seção de Direito Privado dessa Corte, que se utilizou de fundamentos legais para o enunciado da súmula.

Ao final, é imprescindível que o fornecedor observe às normas de ordem pública e proceda com a informação adequada e efetiva ao consumidor, no momento da contratação. A conduta correta evita a proporção de danos, tanto para o consumidor quanto para o fornecedor, não obstante, a correição garantirá a credibilidade da prestação dos serviços educacionais e adequação do consumo, sendo vantagem para ambos, consumidor e fornecedor.

 

Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Texto disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/constituicao/constituicao.asp. Acesso em 4 abr. 2018.
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BRASIL. Decreto nº 5.773, de 9 de maio de 2006. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino. Texto disponível em: http://www2.mec.gov.br/sapiens/portarias/dec5773.htm. Acesso em 24 abr. 2018.
BRASIL. Decreto nº 9.005 de 14 de março de 2017. Aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Cargos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Educação, remaneja cargos em comissão e substitui cargos em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DAS por Funções Comissionadas do Poder Executivo – FCPE. Texto disponível em: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/2017/decreto-9005-14-marco-2017-784453-normaatualizada-pe.html. Acesso em 16 abr. 2018.
BRASIL. Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017. Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação das instituições de educação superior e dos cursos superiores de graduação e de pós-graduação no sistema federal de ensino. Texto disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Decreto/D9235.htm#art107. Acesso em 23 abr. 2018.
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JÚNIOR, Nélio Silveira Dias. A responsabilidade civil nas relações de consumo e a facilitação do exercício deste instituto de direito. Texto disponível em: http://silveiradias.adv.br/a-responsabilidade-civil-nas-relacoes-de-consumo-e-a-facilitacao-do-exercicio-deste-instituto-de-direito/. Acesso em 23 abr. 2018.
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Notas
 
[1] art. 22, inc. XXIV, CF/88.

[2] art. 23, inc. V, CF/88.

[3] Decreto nº 19.402, em 14 de novembro de 1930.

[4] art. 1º, Anexo I, Decreto nº 9.005 de 14 de março de 2017.

[5] Apresentação das instituições de ensino superior credenciadas junto ao MEC. Texto disponível em: http://portal.mec.gov.br/instituicoes-credenciadas/apresentacao. Acesso em 4 abr. 2018.

[6] art. 28, §2º, Decreto 5.773, de 9 de maio de 2006.

[7] §§1º e 2º, art. 3º, Lei 8.078/90.

[8] art. 5º, XXXII, CF/88.

[9] No referido recurso, em primeira tela, o Desembargador Relator Edgard Rosa julgou a apelação interposta pela Ré, em detrimento da sentença que a condenou à reparação civil. No que tange ao voto do Relator, é possível destacar que a configuração da relação de consumo é um ponto específico e importante, a partir do qual se permitirá a incidência das normas do Código de Defesa do Consumidor.

[11] Texto disponível em: http://sisfiesportal.mec.gov.br/. Acesso em 05 abr. 2018.

[12] O Mandado de Segurança (MS 8219/DF 2002-0023319-6), julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, foi impetrado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – CFOAB em face do Ministro da Educação, versando sobre portaria expedida pelo Ministério da Educação, ordenando às instituições de ensino superior o aumento de 50% do número de vagas nos seus cursos disponíveis: trata-se da Portaria nº 2.402, de 9 de novembro de 2001; o Ministro Relator do processo entendeu pela concessão da segurança e impediu a criação destas vagas até que houvesse um atestado da Ordem dos Advogados do Brasil acerca dos cursos jurídicos.

[13] §3º, art. 14, Lei 8.078/90.

[14] A primeira Constituição Federal que previu os direitos do consumidor foi a Carta de 1988. No ano de 1990, foi referendada a Lei Federal nº 8.078, trazendo em seu bojo o Código de Defesa do Consumidor; a referência utilizada pela lei consumerista sobre a temática da responsabilidade remete-se ao Código Civil de 1916, no que tange ao direito obrigacional deste Código. Não obstante, o Código Civil atual, estipulado em 2002, foi influenciado, por sua vez, pelo Código de Defesa do Consumidor, acerca do dever de indenizar.
Vale ressaltar que a Lei 8.078/90 ocupa lugar de destaque no cenário jurídico mundial, inclusive recebendo elogios de juristas estrangeiros, consagrados, inclusive mencionando-se a notoriedade em seminário, vide: https://stj.jusbrasil.com.br/noticias/2930064/responsabilidade-no-codigo-de-defesa-do-consumidor-brasileiro-e-destaque-em-seminario-internacional. Acesso em: 15 abr. 2018.

[15] REsp nº 998.265 – RO (2007/0248032-9) STJ – Superior Tribunal de Justiça. Relator: Ministro Luís Felipe Salomão. DJe: 01/02/2011.

[16] RECURSO ESPECIAL Nº 1.034.289 – SP (2008/0034798-0). RESPONSABILIDADE CIVIL. CURSO SUPERIOR RECONHECIDO PELO MEC SOMENTE APÓS A FORMATURA. INDEFERIMENTO DA INSCRIÇÃO DE EX-ESTUDANTE PELO CONSELHO PROFISSIONAL. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO. ALEGAÇÃO DE CULPA DO CONSELHO PROFISSIONAL. MATÉRIA QUE NÃO INTERFERE NA RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO RELATIVAMENTE AO ALUNO. RESPONSABILIDADE POR DANO MORAL DETERMINADA. DANO MATERIAL NÃO RECONHECIDO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO, SEM A VINDA DE RECURSO PARA ESTE TRIBUNAL. 1. A instituição de ensino que não providencia, durante o curso, a regularização de curso superior junto ao MEC, é responsável pelo dano moral causado a aluno que, a despeito da colação de grau, não pode se inscrever no Conselho Profissional respectivo e, assim, exercer o ofício para o qual se graduou. 2. Não afasta a responsabilidade da Instituição de Ensino perante o aluno a possível discussão entre a aludida Instituição e o Conselho Profissional a respeito da exigibilidade, ou não, por este, da comprovação de seu reconhecimento pelo Ministério da Educação, reservando-se a matéria para eventual acionamento entre a Instituição de Ensino e o Conselho Profissional. 3. Retardando-se a inscrição do ex-aluno no Conselho Profissional, porque não reconhecido o curso, tem ele direito a indenização por dano moral, mas não à devolução do valor dos pagamentos realizados para a realização do curso, nem, no caso concreto, porque matéria irrecorrida, à condenação da Instituição de Ensino por danos materiais […].

[17] AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 651.099 – PR (2015/0008551-9). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART.544 DO CPC) – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO. INSURGÊNCIA DA RÉ. 1. A instituição de ensino superior responde objetivamente pelos danos causados ao aluno em decorrência da falta de reconhecimento do curso pelo MEC, quando violado o dever de informação ao consumidor. Precedentes. 2. Óbice da súmula 7/STJ no tocante à tese de ausência da responsabilidade civil. Tribunal local que, com amparo nos elementos de convicção dos autos, entendeu estar provado o fato constitutivo do direito do autor, ante ausência de informação adequada acerca do não reconhecimento do curso superior. Impossibilidade de reexame de fatos e provas. 3. Agravo regimental desprovido.

[18] Art. 123, RISTJ.

[19] §1º, Art. 125, RISTJ.


Informações Sobre o Autor

Matheus Guilherme dos Santos Morais

Bacharel em Direito, pela Universidade do Estado de Minas Gerais. Civilista


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