Breve apontamento da teoria de sistema de Niklas Luhmann: destruição do direito pela corrupção sistêmica da mídia na sociedade brasileira

Resumo: A teoria de Niklas Luhmann busca nas definições biológicas, compreender a sociedade pelas definições sociológicas sem uma valoração moral e contra a tendência da especialização disciplinar e da obsessão empírica. Assim, esse breve estudo, parte do conceito de sistema e sobre os determinantes de uma analise sociológica da mídia quando aliada ao direito na sociedade brasileira, observa-se pela teoria “luhmaniana” com ênfase na corrupção sistêmica e o conceito de alopoiese. Munido disso, observa o atual episódio brasileiro, trançando um conexão da economia e da política, que apontará as relações estabelecidas pela mídia e a corrupção sobre o direito.

Palavras-chave: direito, mídia, corrupção sistêmica, alopoiese. 

Abstract: Niklas Luhmann's theory seeks in biological definitions to understand society by sociological definitions without a moral valuation and against the tendency of disciplinary specialization and empirical obsession. Thus, this brief study, part of the concept of system and the determinants of a sociological analysis of the media when allied with law in Brazilian society, is observed by the "Luhmanian" theory with an emphasis on systemic corruption and the concept of allopoiesis. Armed with this, he observes the current Brazilian episode, drawing a connection between economics and politics, which will point out the relations established by the media and corruption over the law.

Key words: right, media, systemic corruption, alopoiese.

Sumário: Introdução; 1. Observação sobre sistema do direito; 2. A corrupção sistêmica e alopoiese pela mídia; 3. Contextualização da sociedade brasileira; 4. O judiciário (centro do sistema do direito) e a mídia (subsistema da corrupção sistema da política e da economia); Conclusão;

Introdução

A ideia introdutória a conceitos essenciais de direito e mídia advém da acentuada tendência de aproximações que esses dois sistemas no atual episódio brasileiro, para tanto busca nas definições sociológicas entre direito e mídia e de certa demanda por referências sobre o processo de construção racional da teoria de sistemas de Niklas Luhmann e entre relação à compreensão de corrupção sistêmica criando uma alopoiese entre a mídia e o direito. O esforço desse breve estudo, parte do conceito de sistema e sobre os determinantes de uma sociologia da mídia quando aliada ao direito pela observação sociológica “luhmaniana”, com ênfase na apreensão do conceito de corrupção sistêmica.

A teoria social sistêmica proposta por Luhmann, tem-se como distinção fundamental a relação entre “sistema” e “meio-ambiente”, essa distinção de auto referencial se organiza em torno da noção de diferença, possibilitando o fechamento do sistema em relação ao ambiente e estabeleceu recursividade e circularidade como suas características fundamentais, assim temos que os sistemas possuem capacidade de organizar e mudar suas estruturas por meio de referências internas e determinando suas próprias operações se autoproduzem.

A distinção entre sistema e seu meio ambiente é utilizado para explicar tudo entre o que pertence a determinado sistema e o que esta fora[1], cada sistema, à sua diferença, produz-se e reproduz-se conforme a capacidade de vincular os elementos estruturais que lhe são próprios e lhe confere a unidade a partir das prestações captas da relação com o ambiente, são de natureza cognitiva e tem a potência de comunicar conjuntos de sentidos na realização do sistema. A relação de vínculos entre sistema e ambiente proporciona a elaboração do conceito de sistema como uma via de mão dupla, de um lado define o sistema conforme sua operacionalidade e na medida da percepção cognitiva que lhe abre a relação como o ambiente de outro. Implica que a identidade semântica do sistema é a identidade dele em contraposição à identidade captada do ambiente.

Existe uma combinação entre o sistema e ambiente que permite que ambos caminhem em evolução conjunta, assim os sistemas na sociedade moderna, altamente complexa, revela sentido mais próximo da capacidade de estabelecer vínculos entres sistema e ambiente.

A proposta da teoria dos sistemas é descrever a sociedade complexa atual, distanciando-se, contudo, das concepções que pretendem normatizá-la prescrevendo soluções para os supostos problemas sociais e que desejam ensinar como deve ser.

1. Observação sobre sistema do direito

O direito como sistema social, possui a comunicação como elemento base, mas não podemos achar que eles formam um único sistema, sua diferenciação do meio ambiente ocorre pelo controle do código binário “direito/ não direito”, esse código produz a autopoiése do sistema, o código é uma diferença e guia, essa diferença serve de modelo de orientação servindo a para classificar as comunicações no sistema.

O código, portanto, implica no fechamento operacional do sistema, mas as escolhas do que é direito/ não direito depende do meio ambiente, ou seja, o direito possui um autocontrole do código, mas ao mesmo tempo, também possui uma abertura cognitiva, pois depende do meio social para definir o que vem a ser direito ou não direito.  

Portanto, o direito define internamento em conceitos, para possibilitar o seu fechamento normativo.

Pode-se afirmar, portanto, que o direito atua na função de sistema imunizador para a sociedade, já que permite tentar resolver a situação imprevistas sem um conhecimento completo dos fatores que levaram ao transtorno. A estrutura paradoxal do direito, assim como a de qualquer outro sistema, permitindo que permaneça sensível à realidade e, portanto, desenvolva sua função.

O direito evolui e constrói as próprias estruturas na medida em que se põe em autor referência, na exata medida em que o direito calibra, repele ou confirma as próprias estruturas na apreensão do sentido normativo pela decisão judicial, o que permite afirmar que os próprios elementos do direito a construir e desenvolver o próprio sentido do direito.

Um sistema mantém seu caráter autopoiético na medida em que se refere a si mesmo e ao seu ambiente. As mais diversas determinações do ambiente, no entanto, somente serão inseridas no sistema quando filtradas pelo código-diferença específico de cada uma das espécies dos subsistemas sociais.

Para Luhmann, um subsistema social tem como estrutura um código-diferença através do qual elementos externos (extrasistêmicos ou do “ambiente”) são inseridos.[2] O direito, como subsistema social, pode ser interpretado como controle do código diferença “lícito/ ilícito”. Na teoria de Luhmann pode-se dizer que o direito não passa de “um sistema normativamente fechado, mas cognitivamente aberto”.

O direito pode assimilar, de acordo com seu código-diferença, os fatores do ambiente (abertura cognitiva), não sendo diretamente influenciado por eles, porquanto a vigência jurídica de expectativas normativas depende de processos seletivos de filtragem no interior do sistema jurídico.

Nesse sentido, as diversas determinações do ambiente só são inseridas no sistema (abertura) quando este, de acordo com seus próprios critérios e código/diferença, atribui lhes forma (fechamento). É a chamada autopoise no direito.[3] Assim, “todos os valores que circulam o discurso geral da sociedade são, após a diferenciação de um sistema jurídico, ou juridicamente irrelevante, ou valores próprios do direito”[4]. O fechamento operacional, o qual garante a autopoíese no direito, dá-se pelo código/diferença “lícito/ilícito: o responsável pela comutação dos fatos externos e a respectiva inserção no sistema.”[5] Se, e somente se, um elemento “passar” por tal filtro, estar-se-á ante um sistema jurídico autopoiético.

O poder econômico, político, religioso, por exemplo, para exercerem influência num direito organizado autopoieticamente, deve, sempre, passar por tais filtros, de modo que, se o direito não lhe autoriza a entrada, será mero “ambiente”. Segundo Arnaud: O código jurídico regula todas as comunicações internas, mas tão somente a comunicação interna do sistema jurídico.

Não existe nem input do direito para o interior do sistema, nem tampouco output do direito para o exterior do sistema. Fora do direito não se pode fazer nada com o direito. O contato do direito com seu ambiente social deve ser tratado sob outro sentido como sendo suas oportunidades políticas, sua utilidade econômica, sua perturbação pelo contato do sistema em movimento, etc., assim, em torno de cada sistema é que se localizam os casos concretos.[6]

Por outro lado, a “corrupção” do sistema significa exatamente o oposto disso: os elementos de outro sistema, sem passarem pelo filtro do código-diferença de um determinado subsistema, entram e permanecem neste. Quando as fronteiras entre um subsistema e o ambiente diluem-se, todavia, está-se diante da chamada alopoiese. Do grego alôs (“um outro”, “diferente”) e poieses (“produção”, “criação”), o termo designa que o sistema se reproduz por critérios do ambiente. O direito alopoiético, nesse contexto, perde sua autonomia operacional.

Os agentes do sistema jurídico põem de lado o código-diferença licito/ilícito e passam a conduzir-se com base em injunções diretas da economia (ter/não-ter), da política (poder/nãopoder), da ciência (verdadeiro/falso), da religião (transcendente/imanente).[7]

Segundo Marcelo Neves: Não se trata, portanto, de bloqueios eventuais na reprodução autopoiética do direito positivo, superáveis através de mecanismos imunizatórios complementares do próprio sistema jurídico. O problema implica o comprometimento generalizado da autonomia operacional.[8]

O comportamento deixa de orientar-se primariamente pela semântica jurídica dos modelos textuais da Constituição, da lei, para orientar-se primariamente por outros modelos sociais de conduta. “O paradoxo ‘lícito porque ilícito’ é desparadoxizado pelas fórmulas ‘lícito porque rico’, ‘lícito porque amigo’, etc.” Em síntese, o conceito de autopoiese é o contrário ao de alopoiese, de modo que a negação de um implica na presença do outro.[9]

2. A corrupção sistêmica e alopoiese pela mídia

Para Marcelo Neves, a modernidade periférica latino-americana é alopoiética, sendo instransponível o modelo luhmaniano da autopoiese a esta realidade jurídica. A miscelânea social[10], afirma o autor, implica dificuldades na construção da identidade da esfera de juridicidade, o que resulta na falta de autonomia das respectivas conexões sociais de ação.

Na sociedade brasileira, a sobreposição dos códigos econômico e político às questões jurídicas impossibilita a autonomia do sistema jurídico. O direito passa a ser instrumento da política, “seja por meio da mutação casuística das estruturas normativas, principalmente durante períodos autoritários, ou através do jogo de interesses particularistas bloqueadores do processo de concretização normativa”.[11]

A mídia no Brasil é uma corrupção sistêmica dos sistemas da economia e da política, ou seja, a mídia já é um subsistema alopoiético, que irá corromper o sistema do direito, criando uma nova alopoiese por meio de nova corrupção sistema, logos os códigos (ter/não ter) da economia, misturado como (poder/ não poder) da política, irá dizer o que será lícito ou ilícito, o código do direito ficará a mercê dos interesses da mídia, que julgará pelos critérios políticos e econômicos o que é lícito ou ilícito.

Assim, o episódio brasileiro, alopoiético coloca a direito e a mídia como líderes e parceiros de um mesmo modo de leitura e interpretação da realidade. Essa conexão “Mídia-Direito” não é nova e muito menos ocasional ou ingênua.

Nesse sentido destacamos a posição de Pedro Serrano, que aponta para a necessidade de compreender a “procedimentação” do direito e da mídia na defesa de posições, ideias e interesses cada vez mais evidentes.[12]

3. Contextualização da sociedade brasileira

Temos na história do Brasil, que nossa independência foi relativamente pacífica; o desenlace de Portugal, amistoso e negociado, não é outra coisa senão a velha e insidiosa conciliação, se pudéssemos conceituar o código dessa negociata seria do amigo/não amigo. Mas este é apenas um dos muitos obstáculos que se repetem ao longo do caminho, numa monotonia suspeita.

Observa-se o paradigma de Jésse Souza “nosso berço é a escravidão (e não Portugal), e a nossa elite é a da rapina de curto prazo, e não do projeto nacional”, filia-se ao pensamento que houve um equívoco ao afirmar que a “herança portuguesa maldita”[13] e da corrupção como dado cultural e histórico apenas do Estado não é uma história neutra e sem intenções políticas. Assim o casuísmo deixa demonizar o Estado para demonizar apenas o inimigo escolhido.

O esforço de reconstrução, melhor dito, de construção da democracia no Brasil ganhou ímpeto após o fim da ditadura militar, em 1985. Uma das marcas desse esforço é a voga que assumiu a palavra cidadania. A cidadania, literalmente, “caiu da boca do povo”. Mais ainda: substituiu o próprio povo na retórica política. Cidadania virou gente; até a Constituição de 1988 foi denominada “Constituição Cidadã”.

Havia ingenuidade no entusiasmo. Havia a crença de que a democratização das instituições traria rapidamente a felicidade nacional. Pensava-se que o fato de termos reconquistado o direito de votar seria garantia de liberdade. De fato, o direito de voto nunca foi tão difundido. Mas as coisas não caminharam tão bem em outras áreas.

O que deu errado?

Nota-se que os problemas sociais não se resolveram na velocidade esperada por muitos. Em consequência, os próprios mecanismos e agentes do sistema democrático – como as eleições, partidos, Congresso e políticos – desgastaram-se e perderam a confiança dos cidadãos.

Tem-se no atual episódio do Brasil o nascimento de um novo herói nacional: o direito e seus subsistema o Poder Judiciário como partido corporativista, para manter suas regalias e privilégios. Ou seja, temos a elite escravocrata até hoje, a dita elite da rapina selvagem e de curto prazo, movida por interesses pequenos e pessoais. Vigora a mesma lei do Brasil atual, com uma elite sem projeto para o país cujo desejo é o assaltar mediante mecanismos de mercado e de Estado e privatizar suas riquezas para seu próprio proveito. É isso, afinal, que a privatização sempre representou. Alguma diferença real? Nunca houve verdadeiro aprendizado dessas nossas elites espoliadoras.

A mídia, por sua vez, conservadora cantará em prosa e verso as maravilhas para impor aquilo quiser, basta apenas ter dinheiro para pagar que essa será usa em seu favor. A mídia no Brasil é tradicional, assim como o Judiciário, fruto de uma aristocracia familiar. Não é à toa que as maiores empresas do setor são controlas por não mais que dez famílias perpetuadas no poder.

Em especial, o rádio e a televisão, que são concessões públicas, acarretam a subserviência da mídia às questões de Estado, misturando e confundindo o público com o privado. A moeda de troca seria o apoio político em troca da concessão dos direitos de uso. Vale lembrar que muitos políticos são os verdadeiros controladores (donos) de jornais, rádios e televisões. A mídia torna-se uma engrenagem bastante eficaz à manutenção de poucos que detém poder. Assim, temos uma mídia que tentar ser por ela mesma protagonista, interferindo nos rumos do país.

Não se pode deixar de observar que num país com elevado índice de analfabetismo a imagem propagada na televisão é o único mecanismo de informação – a sociedade da imagem, a mídia do espetáculo.

Historicamente, identifica-se uma sólida afinidade entre a ação do Direito e a opinião da imprensa tradicional como uma conexão articulada pela elite dominante. As duas instituições seriam, na visão de vários estudiosos, ferramentas poderosas, úteis e necessárias ao exercício pleno do poder. Há uma confusão sistêmica entre eles, partindo do pressuposto proposto por Luhmann isso destruíra os sistemas, vez que a instrumento comunicacional deles é diverso.

4. O judiciário (centro do sistema do direito) e a mídia (subsistema da corrupção sistema da política e da economia)

O direito à informação foi uma conquista realizada durante o período da ditadura militar e, no contexto atual, encontra-se amparado constitucionalmente pela garantia da liberdade de expressão. É notória a essencialidade dos meios de comunicação, uma vez que são responsáveis pela disseminação de notícias e acontecimentos relevantes, no Brasil ou no mundo. Entretanto, tal disseminação muitas vezes se desvirtua do seu objetivo principal, qual seja, o de emitir e propagar informações passíveis de fortalecer o espírito crítico e o senso de Justiça dos indivíduos, a mídia passa a propagar o código lícito/ilícito.

A liberdade de expressão, entendida como liberdade da imprensa, está assegurada pelos preceitos constitucionais. Contudo, percebe-se que o interesse da imprensa atualmente não é só o de veicular informações, mas também noticiar eventos que ofereçam maiores índices de audiência, geralmente relacionados aos casos de grandes repercussões na seara criminal, casos nos quais os fatos são narrados de forma parcial e sensacionalista. Os suspeitos já se encontram previamente condenados na televisão, nos jornais e na internet, antes mesmo de seu julgamento.

A TV Justiça, por exemplo, deu ao Judiciário uma notoriedade quase que instantânea e, aos seus membros, fama assemelhada à de atores de novela. Não podermos deixar de anotar que, dos três poderes, repousa no Judiciário (o centro do sistema do direito) o mais conservador e elitista, fruto de uma tradição de concurso que privilegia aqueles que possuem melhor condição de comprar educação (sim, aqui educação é confundida com informações instrucionais que podem ser compradas como mercadoria).

Tendo assegurada a vitaliciedade, temos no Judiciário o poder menos legítimo a promover a judicialização da política, vez que ele esta descolado da vontade popular, movimento digno de um grande espetáculo a dar inveja a qualquer programa de auditório.

Há uma corrupção sistêmica entre dois subsistemas sociais: o da mídia, que define o que é notícia e o que não é; e o do direito, que determina o lícito e o ilícito. Temos a problemática relativa à chamada “lógica própria do direito” sendo substituída pela “lógica da notícia”. Nesses casos, já se sabe o resultado de um julgamento, antes dele ocorrer.

Esse tipo de fenômeno representa um risco à democracia. Processos judiciais que recebem atenção da mídia são corrompidos. A defesa nesses casos não passaria de “mera maquiagem”: uma coisa é o que está no processo, outra é o universo que a mídia cria. O problema se agrava, quando a “corrupção sistêmica” passa a ser usada de forma refletida e racional, como se observa no atual episódio brasileiro.

Neste caso, a disfuncionalidade acaba servindo para que o Judiciário (centro do sistema do direito), ao invés de agente de direito, se torne um agente de exceção, determinando aquilo que seria ou não legal, de acordo com seus interesses e convicções.

Os julgamentos prévios midiáticos estão diretamente relacionados à decisão do juiz e o futuro do processo, visto que a estigmatização dos acusados pela imprensa impossibilita a aplicação das garantias processuais e constitucionais, principalmente em relação ao contraditório e à ampla defesa.

Televisionar ao vivo um julgamento penal é trazê-lo ao patamar de um linchamento contemporâneo. É constranger juízes e jurados a seguirem os impulsos primitivos da turba sob pena de sofrerem constrangimentos inaceitáveis à proteção que faz jus o julgador. E se o julgador ousar divergir desse sentimento público se transformará em réu da opinião pública ou publicada, os juízes e os jurados terão sua vida perturbada por ofensas em locais públicos.

A independência da atuação do juiz diante dos julgamentos precoces pela mídia, que busca atrair a atenção do público por meio de distorções da realidade e sensacionalismo de informações, com objetivos eminentemente subjetivo.

Passada a gestão de centro-esquerda democrática no Poder Executivo e realizadas várias nomeações para o STF, a Corte continua com o perfil conservador que, de uma forma ou de outra, sempre teve.

No Brasil de hoje, o inimigo é o “bandido”. O bandido tem etnias diversas, de acordo com o local do território nacional, mas, em geral, é afrodescendente, integrante de um movimento social ou de um partido de esquerda (ou centro-esquerda). E sempre é pobre.[14]

Os membros do Ministério Público tem relação de proximidade, esta sim, indevida com os membros do poder Judiciário. É comum nos fóruns haver o “lanche da tarde” tomado em conjunto pelos juízes e membros do Ministério Público.

Notícia passa a ser o encontro do fato com os valores ideológicos de quem a produz. Dessa forma, não se noticia o fato, mas o relato de um fato, carga ideológica e interpretativa com interesses subjetivos de quem notícia.  A notícia e a imparcialidade são como duas linhas paralelas: jamais se encontrarão no mesmo espaço por todo o infinito, mas podem estar a um centímetro ou a quilômetros de distância uma da outra.

Não podemos deixar de destacar que não há regime democrático sem que os cidadãos possam saber o que ocorre no interior das estruturas estatais. O Estado é propriedade da sociedade e não de seus gerentes ocasionais. O jornalista e a empresa jornalística cumprem a importante missão democrática e constitucional de informar a sociedade sobre os ocorridos no interior do Estado.

Nossa grande tragédia é nossa imensa desigualdade social. Não há Estado de Direito que se construa no meio da injustiça social. A maior razão para a sobrevivência de práticas próprias de um Estado de Polícia no interior do nosso Estado Democrático de Direito é o fosso social imenso, que deixa grande parte da população à margem de tudo.

Propriedade e direito de propriedade, como já esclarecido exaustivamente por nossa melhor doutrina jurídica, não são conceitos que se confundem. Propriedade é um conceito filosófico e político, ilimitado a priori como qualquer conceito ideal. Direito de propriedade é a forma e os limites com que a propriedade é estabelecida numa ordem normativa concretamente, ou seja, é conceito limitado, tanto por limites explícitos a ele inerentes positivamente, como sua função social determinada na Constituição, como também por outros direitos que, no caso concreto, com ele entrem em tensão ou colisão.

Se de um lado as nossas elites, com todas as limitações de eficiência que se podem argumentar quanto ao funcionamento estatal, são reconhecidas e têm assegurados os direitos fundamentais e os valores democráticos estabelecidos em nossa Constituição, por outro lado ao nosso povo pobre só lhe são estipuladas, de fato, obrigações. O povo pobre recebe do Estado somente obrigações e violência.

Conclusão

A partir da fixação dos conceitos pela teoria de Niklas Luhmann, podemos indentificarna sociedade brasileira o subsistema da mídia ao prestar-se dos códigos da economia e da política, corrompe o direito, pois não se presta a fins normativo-jurídico, implica numa alopoiese do direito.

Aquele que foi definido como a reprodução do sistema do direito como base no código diferença “lícito/ ilícito”. Por sua vez, a alopoise quando o sistema jurídico perde sua capacidade de releitura das determinantes do ambiente pelo seu código diferença, conduzindo-se primariamente com base nas injunções diretas de outros subsistemas, no caso especifico de esse breve estudo a mídia, produzindo algo que nada tem a vez com a logica do direito.

Assim, o direito como ator principal, aliando-se a mídia numa sociedade de imagem, distorce a cidadania, retira a igualdas entre os cidadãos e torna-se o próprio “Soberano”, apontando quem seria ou não inimigo (o não igual), estabelecendo assim a corrupção sistêmica que pode acabar com o direito. Afina-se seus desejos e anseios da mídia, pautados por sua ideologia e totalmente afastado do direito. Nesse contexto, ampara-se afirmações conservadoras como: “direitos humanos para humanos direitos”, ou seja, o bandido não é humano, por tanto justificasse a barbárie.

A mídia faz coro com esse tipo de afirmação, observa-se com temor exemplos em apresentadores de telejornal comemoram o massacre em presídios no norte do país, tentado de estimular que se faça novos massacres para diminuir a população carcerária.

 De outra banda, temos membros do ministério público e do Judiciário, publicando em suas páginas pessoais nas redes sociais e/ou em entrevista em programas de televisão, que deve haver barbárie contra movimentos sociais ou grupos excluídos, afirmando sem menor constrangimento “que bandido bom é bandido morto”, bandido aqui entendido como inimigo.

A ideologia do direito brasileiro é fruto de uma sociedade aristocrática: os quadros do Judiciário são formados em imensa maioria de brancos de classe média ou alta, amparados por uma aprovação num concurso público que privilegia o interesse da elite. Logo, tal poder afirmará seus valores para se perpetuar na condição “aristocrática”.   

Buscou-se explicitar de que forma sucinta com a mídia influencia os indivíduos, sobretudo em questões que estão sendo tratadas pelo direito. Nesse sentido, destacamos também que o modo como a mídia trata a questão judicializada acaba gerando uma percepção distorcida do fenômeno sob judice no senso comum, amedrontando as pessoas, acentuando a sensação de insegurança no tecido social. Nota-se que a mídia possui influência direta na análise incorreta sobre o que está sendo julgado.

Discussões sobre o controle social da mídia não pode ser confundido com censura, esse discurso tolo prestasse a esvaziar uma discussão necessária própria de uma sociedade democrática e evoluída, foi assim que países da Europa conseguiram assegurar um certo grau de democracia na mídia, não se pode confundir controle social com controle do Estado.

 

Referências
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DEBORD, Guy. A Sociedade do Espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.
GUERRA FILHO, Willis Santiago; CARNIO, Henrique Garbelini. Teoria Política do Direito. 2ª ed. São Paulo: RT, 2013.
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LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. Mexico: Editorial Herder, 2006.
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SOUZA, Jessé. Radiografia do golpe. São Paulo: LeYa, 2016.
 
Notas
[1] GUERRA FILHO, Willis Santiago e CARNIO, Henrique Garbellini. Introdução à sociologia do direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016. p. 295.

[2] LUHMANN, Niklas. La sociedad de la sociedad. Mexico: Editorial Herder,2006. p. 38 e 41.

[3] ADEODATO, João Maurício. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 187.

[4] NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p.139.

[5] Op. Cit p. 146

[6] ARNAUD, André-Jean; LOPES JÚNIOR. Dalmir. (Organizadores). Niklas Luhmann: do sistema social à sociologia jurídica. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2004, p.60.

[7] 32 NEVES, Marcelo. Entre têmis e leviatã: uma relação dificil. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p.86. 

[8] NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p.146 

[9] ARNAUD, André-Jean; LOPES JÚNIOR. Dalmir. (Orgs). Niklas Luhmann: do sistema social à sociologia jurídica. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 2004, p. 148.  

[10] NEVES, Marcelo. Do pluralismo jurídico à miscelânea social: o problema da falta da(s) esfera(s) da juridicidade na modernidade periférica e suas implicações na América Latina. Trabalho apresentado do II Encontro Internacional de Direito Alternativo, realizado em Florianópolis, SC, 29 de setembro de 1993, p. 14.

[11] Op. Cit. p. 17

[12] SERRANO. Pedro Estevam Alves Pinto. Autoritarismo e golpe na América Latina: breve ensaio sobre jurisdição e exceção. São Paulo: Alameda, 2016. p. 59

[13] SOUZA, Jessé. Radiografia do golpe. São Paulo: LeYa, 2016. p. 40

[14] SERRANO. Pedro Estevam Alves Pinto. Autoritarismo e golpe na América Latina: breve ensaio sobre jurisdição e exceção. São Paulo: Alameda, 2016. p. 72


Informações Sobre o Autor

AbÍlio Osmar Santos

Mestrando em Filosofia do Direito PUC/SP. Especialista em Direito e Processo do Trabalho e Graduado em Direito ambos pela Universidade Presbiteriana Mackenzie com estudo em MBA em Gestão de Estratégica e Econmica de Recursos Humanos FGV/EAESP. Advogado


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