A cumulação de adicionais de periculosidade e de insalubridade: análise com base na doutrina, jurisprudência e legislações interna e internacional

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Robson Shelton Medeiros da Silva: Graduado em Direito pela Faculdade Barão do Rio Branco-Uninorte em 2009. Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Damásio Educacional em 2018. Advogado atuante na área trabalhista há mais de 8 anos. E-mail: [email protected].

 

Resumo: A Constituição Federal prevê o direito dos trabalhadores à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, XXII) e à percepção de adicionais para as atividades penosas, insalubres ou perigosas (art. 7º, XXIII), o que é reforçado pela previsão da Convenção 155 da OIT. Desta feita, a CLT prevê hipóteses de percepção de adicional de insalubridade (art. 189) e de periculosidade (art. 193), mas o parágrafo 2º, do art. 193 da CLT e o item 15.3 da NR-15 preveem a impossibilidade de percepção cumulada. Há intenso dissenso doutrinário e jurisprudencial, sendo questão amplamente discutida em muitas ações que tramitam na Justiça do Trabalho, estando atualmente afetada ao rito de recursos repetitivos. A partir disso, este trabalho se propõe a expor e analisar os principais pontos sobre o tema, levando o leitor a ter uma percepção sobre a matéria, que no futuro deverá ser pacificada no TST.

Palavras-chave: insalubridade. Periculosidade. Cumulação.

 

Abstract: The Federal Constitution provides for the right of workers to reduce the risks inherent to work by means of health, hygiene and safety standards (article 7, XXII) and the perception of additional costs for unhealthy or dangerous activities (art. 7, XXIII), which is reinforced by the provisions of ILO Convention 155. This time, the CLT foresees hypotheses for the perception of additional insalubrity (article 189) and for dangerousness (article 193), but paragraph 2, of art. 193 of CLT and item 15.3 of NR-15 provide for the impossibility of aggregate perception. There is intense doctrinal and jurisprudential dissent, being an issue widely discussed in many actions that process in the Labor Court, being currently affected to the rite of repetitive resources. From this, this paper proposes to expose and analyze the main points on the subject, leading the reader to have a perception on the subject, which in the future should be pacified in the TST.

Keywords: insalubrity. dangerousness. cumulation.

 

Sumário: Introdução. 1. Conceito de salário e sobressalário. 1.1 Princípios do direito do trabalho aplicáveis ao salário. 1.2 Salário e sobressalários: conceitos, natureza jurídica e classificação. 2. Distinções entre adicionais de insalubridade e periculosidade. 2.1 Adicional de insalubridade: conceito e hipóteses de incidência. 2.2 Adicional de periculosidade: conceito e hipóteses de incidência. 3. Incidência dos adicionais sobre o mesmo contrato de trabalho. 3.1 Adicionais com o mesmo fato gerador. 3.2 Adicionais com fatores geradores distintos e autônomos. 4. A cumulação dos adicionais aos olhos da doutrina. 4.1 Entendimentos contrários à cumulação. 4.2 Entendimentos favoráveis à cumulação. 5. A cumulação sob a perspectiva da legislação interna. 5.1 Proteção constitucional sobre meio ambiente de trabalho e os direitos inerentes à saúde e segurança no trabalho. 5.2 A vedação contida na CLT e no item 15.3 da NR-15. 5.3 A dignidade da pessoa humana e sua repercussão sobre a legislação trabalhista. 6. A cumulação com base na OIT. 6.1 Missão institucional da OIT e a adesão do Brasil aos princípios e normas internacionais. 6.2 A convenção 155 da OIT e sua aplicabilidade à discussão da cumulação de adicionais. 7. Entendimentos jurisprudenciais. Conclusão. Referências

 

Introdução

Desde os primórdios da civilização, é o trabalho quem movimenta a sociedade, é por meio do trabalho que a economia cresce, se estabelece, consolida na seara internacional.

O trabalho constitui o coração da sociedade, pois é a partir dele que se concretizam as relações sociais.

Partindo dessas premissas, o presente trabalho tem por tema a possibilidade de acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade à luz da doutrina, legislação e jurisprudência.

Para cumprir tal mister, fez-se necessário analisar, conceituar e compreender os institutos jurídicos envolvidos na celeuma, para seguir rumo confrontação dos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais sobre a matéria.

Assim, o objetivo norteador deste trabalho é expor e analisar os principais pontos de vista sobre o tema, bem como apresentando as principais tendências ou resultados que se pode esperar do julgamento a ser proferida pelo TST para pacificar a matéria na Justiça do Trabalho.

Na elaboração do trabalho foi utilizado o método de abordagem dedutivo, pois se analisou conceitos gerais doutrinários, legislativos e jurisprudenciais, a fim de verificar a compatibilidade do tema e as possíveis tendências do entendimento a ser adotado pelo TST.

Com base em tudo isso, chegou-se ao resultado de que a questão deve ser encarada sob a ótica da máxima efetividade dos direitos fundamentais dos trabalhadores, pelo que a vedação da acumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade somente se aplica na hipóteses em que são decorrentes de uma única causa de pedir ou fato gerador.

 

  1. Conceito de salário e sobressalário

No Direito do Trabalho, o termo salário é utilizado para discriminar a forma de retribuição do empregado pelos serviços prestados.

Etimologicamente, o termo salário deriva do latim salarium, que tem sua origem na palavra sal (salis), que se tratava de uma utilidade fornecida pelos romanos como pagamento aos domésticos. Além disso, o sal também servia como pagamento aos soldados das legiões romanas, para que permitir que comprassem comida.

Fato é que na atualidade o salário designa a contraprestação dada ao empregado em decorrência do trabalho.

Não é por acaso que logo em seu início, a CLT prevê a onerosidade contra um dos requisitos do liame empregatício, justamente porque a relação de trabalho é marcada por uma retribuição dada em função do trabalho.

Conquanto a onerosidade não seja um dos principais requisitos hábeis para a caracterização da relação de emprego, posto que se mostra presente na grande maioria das modalidades de trabalho humano, ela é um traço marcante na relação de trabalho subordinada.

Assim, o salário possui uma feição marcante no conteúdo da relação de emprego.

Também nas relações sociais, o salário ganha nota de relevância, uma vez que é a partir dele que o trabalhador ganha meios de prover o sustento próprio e familiar.

No mesmo sentido, a teor do artigo 7º, IV da Constituição Federal, o salário, pelo menos na teoria, deveria ser adequado e capaz de atender as necessidades vitais básicas do trabalhador e de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservassem o poder aquisitivo.

Na prática, o salário acaba atendendo poucas necessidades do trabalhador e, não raras vezes são constatadas tentativas de reduzir o salário, ou mesmo de implementar formas de remuneração cada vez menores, como o contrato de tempo parcial previsto na CLT e a inovação do contrato intermitente trazido pela Lei nº 13.467/2017.

Celeumas à parte, é relevante destacar que em muitos trechos a CLT é bastante confusa, ora usando a expressão salário, ora usando remuneração.

A doutrina distingue salário de remuneração, mas também há os que defendem que se tratam de expressões que designam o mesmo instituto jurídico.

Assim, pode-se conceituar salário como a retribuição que é devida e paga pelo empregador ao empregado, em decorrência dos serviços prestados e também pelo tempo em que permanece à disposição por força do contrato.

Por outro lado, a remuneração pode ser definida como a retribuição devida e paga ao empregado, mas não só pelo empregador, como também por terceiros, em decorrência do contrato de trabalho.

Da comparação desses conceitos, é possível extrair que remuneração é termo mais abrangente que engloba o salário e seus componentes, como também os adicionais.

Os adicionais também são conhecidos como sobressalários.

Singelamente, o sobressalário representa a prestação que, por sua natureza, integra o complexo salarial como complementos do salário básico.

Assim, por regra, as denominadas parcelas sobressalário, integram o salário do empregado, e encontram-se previstas no §1º do art. 457 da CLT.

A partir da compreensão dessas noções básicas sobre salário e sobressalário, é importante ter a percepção de que o salário lato sensu goza de intensa proteção legal, reforçada por princípios básicos do direito do trabalho e também por princípios peculiares.

 

  • Princípios do direito do trabalho aplicáveis ao salário

São clássicas as conceituações de princípios como as vigas mestras e fundamento de validade das normas e regras jurídicas.

No caso do Direito do Trabalho, os princípios ganham relevo ainda mais marcante.

Isto porque, os princípios peculiares ao Direito do Trabalho trazem tônica e marcam este ramo laboral de forma significativa.

É por meio dos princípios que o Direito do Trabalho deixa claro a sua distinção, individualidade, originalidade e identidade em face dos demais ramos do direito.

Essa distinção se dá principalmente pela adoção do princípio da proteção ao trabalhador hipossuficiente.

É clássica também a teoria de Américo Plá Rodrigues, mas para fins deste trabalho é importante ter em mente apenas que o direito do trabalho procura conferir mecanismos de superioridade jurídica ao trabalhador para aquilatar a inferioridade econômica constatada em face da força do capital de que é detentor o empregador.

Independentemente de cada uma das vertentes deste princípio (condição mais benéfica, in dúbio pro operário, norma mais favorável), o operador do direito deve se ater à raiz da proposição, que no caso é sintetizada na busca de uma superioridade jurídica para corrigir a inferioridade econômica.

As regras do princípio da proteção também se aplicam no campo do salário, porquanto a proteção se estende sobre as regras do contrato de trabalho.

No mesmo sentido, o princípio da primazia da realidade, o qual dispõe que as relações trabalhistas são definidas pela realidade fática, consubstanciada pela forma como se realizou a prestação de serviços, pouco importando o nome que lhes foi atribuído pelas partes.

A grosso modo, é desprezada a ficção jurídica.

No campo do salário, tal princípio é bastante relevante, haja vista que o emprego informal é uma realidade em nosso país, conforme dados recentes e também pela constatação vivenciada no repertório diário das ações que tramitam nas Varas do Trabalho em todo o país.

Da mesma forma, não raras vezes, os contratos, holerites e anotações na CTPS não reproduzem ou evidenciam a totalidade das parcelas salariais que são pagas pelo empregador ao empregado, o que costuma ser chamado de salário a latere ou salário por fora.

Com a aplicação do princípio da primazia da realidade, tais questões podem ser solucionadas nas demandas julgadas perante a Justiça do Trabalho.

No mesmo sentido, o princípio da irrenunciabilidade possui forte ligação com o princípio da primazia da realidade, na medida em que se destina a limitar a autonomia da vontade das partes.

A irrenunciabilidade é necessária porque o ordenamento jurídico prevê uma serié de normas que tutelam a relação de trabalho e não haveria viabilidade para essas normas caso se permitisse que o empregado se despojasse de seus direitos, mormente no curso do contrato, onde vigora o temor da demissão.

Tal princípio também é aplicado no campo salarial, mormente face à vedação de pagamento de salário inferior ao mínimo legal.

Assim, o empregado não pode renunciar a esse direito, uma vez que estaria se despojando de direito integrante do contrato mínimo, indispensável ao alcance de sua dignidade como cidadão e trabalhador.

Outro princípio peculiar do Direito do Trabalho e que tem aplicação na nossa discussão, é o da continuidade.

Como sabido, o contrato de trabalho é de trato sucessivo, posto que perdura no tempo, pelo que a relação de emprego pressupõe uma vinculação que se prolonga.

Tal princípio tende a ser usado como uma das regras na distribuição do ônus da prova, visto que há uma presunção de que o contrato é contínuo e que o trabalhador tem interesse na manutenção do contrato de trabalho.

Desta feita, caso o empregador negue a prestação de serviços e o despedimento, em sendo evidenciado o vinculo empregatício, ao empregador competirá o ônus de provar as razoes ensejadoras do término do contrato de trabalho.

Na prática, um das evidências que são buscadas para aferir se a relação se configura como empregatícia é a freqüência do pagamento de retribuição, assim caso pactuado salário mensal com prestação de serviço ao longo de vários meses, já se pode pensar que a relação está mais próxima de um vínculo empregatício.

Lado outro, embora não seja peculiar ao Direito do Trabalho, há autores que acrescentam a dignidade da pessoa humana como um dos princípios deste ramo.

A dignidade da pessoa humana é um fundamento do Estado Democrático de Direito (art. 1º, CF), e como tal, orienta e norteia o ordenamento jurídico brasileiro como um todo.

Em lições clássicas, a dignidade é concebida como o conjunto de atributos da pessoa humana que a distinguem dos outros seres vivos.

Aline Monteiro de Barros enfatiza:

“A dignidade humana ocupa posição de destaque no exercício dos direitos e deveres que se exteriorizam nas relações de trabalho e aplica-se em várias situações, principalmente, para evitar tratamento degradante do trabalhador. Sob a ótica laboral, o direito à intimidade é uma das variáveis mais importantes da dignidade, situando-se aqui a proteção ante o assédio sexual e aos exames médicos que se destinam a investigar sem o consentimento do empregado, aspecto capaz de discriminá-lo. Os controles pessoais no emprego, entre os quais se incluem as revistas, devem ser feitos respeitando-se, ao máximo, a dignidade de quem a eles se submeter; as opiniões políticas sindicais e religiosas também devem ser respeitadas. A dignidade humana tem servido ainda para consolidar a não discriminação em função de sexo, cor, idade, estado civil, orientação sexual, além de outros aspectos.”

Também por meio da dignidade humana se fundam ações em que se discute equiparação salarial, diferenças salariais por desvio de função ou acumulo de tarefas.

A dignidade do ser humano fundamenta ainda o direito dos trabalhadores a percepção do salário mínimo, já que este é destinado para a satisfação das necessidades básicas, pessoais e familiares do trabalhador.

Além dos princípios até aqui elencados, pode-se destacar princípios específicos e que são voltados para a proteção do salário.

Em primeira análise, tem-se o princípio da irredutibilidade salarial, o qual reza que o salário é irredutível.

Por meio desse princípio, não se permite a redução salarial, pois os contratos devem ser cumpridos (pacta sunt servanda), o que é corroborado pelo artigo 468 da CLT que proíbe qualquer alteração contratual que cause prejuízo ao empregado.

Todavia, toda regra tem exceção e, no caso da irredutibilidade, em situações excepcionais, mediante negociação coletiva, os salários podem ser reduzidos temporariamente em caso de dificuldades da empresa, conforme autorização contida no art. 7º, VI da CF.

Há ainda, o princípio da intangibilidade, o qual preleciona que o obreiro tem o direito de receber o salário integralmente, pelo que o empregador não pode efetuar descontos no salário, salvo as hipóteses legais, como previsto no artigo 462 da CLT.

Tal princípio é reforçado pelo art. 7º, X da CF, o qual prevê que constitui crime a retenção dolosa do salário.

Feitas essas explanações sobre os princípios aplicáveis ao instituto do salário, torna-se imperioso conceituá-lo.

 

  • Salário e sobressalários: conceitos, natureza jurídica e distinções

De modo geral, o salário é tido como uma retribuição devida e paga diretamente pelo empregador ao empregado.

Por outro lado, o sobressalário se constitui de complementos salariais que são integrados à remuneração do trabalhador.

Existem algumas teorias que procuram explicar a natureza jurídica do salário.

Há as que consideram o salário como um preço do trabalho, o que prevaleceu no período em que se equiparava o trabalho a uma mercadoria.

Há a corrente que sustenta que o salário é uma indenização paga a título de compensação pela energia despendida em razão da relação de trabalho.

Ainda, há a teoria que sustenta a natureza alimentícia do salário.

Destaca-se ainda a corrente que sustenta a natureza de contraprestação pelo serviço prestado, e outra corrente que expõe a natureza jurídico do salário como um dever de retribuição.

Prevalece o entendimento de que o salário tem natureza de retribuição paga ao empregado não só pelos serviços prestados, mas pelo fato de colocar-se à disposição do empregador, subordinando-se à referida organização de trabalho.

No que diz respeito aos sobressalários, por serem complementos salariais, em regra possuem natureza salarial, uma vez que remuneram o serviço prestado pelo trabalho em condições especificas.

São exemplos de parcelas sobressalário as gratificações ajustadas, comissões, percentagens, etc.

Também são consideradas parcelas sobressalário: o adicional de horas extras, adicional noturno, adicional de insalubridade, periculosidade e o adicional de tempo de serviço.

Observando-se as modalidades de sobressalário, é possível perceber que a grande maioria possui razão de ser vinculada a algum evento específico ou mesmo a alguma situação específica vivenciada na execução do contrato de trabalho.

É por este motivo que alguns doutrinares costumam chamá-los de salário-condição, uma vez que dependentes de condições especificas para que se possa cogitar no respectivo pagamento. Quando a condição é implementada, existe o fato gerador do pagamento do salário.

Apesar da grande importância do estudo dos mais variados tipos de salário condição, vamos nos ater aos adicionais de insalubridade e periculosidade, objeto do presente trabalho.

 

  1. Distinções entre adicionais de insalubridade e periculosidade

O salário base é forma de retribuir o empregado pelo labor despendido em favor do empregador nas condições normais ou simplesmente quando permanece à disposição aguardando suas ordens.

Desta feita, o salário visa remunerar as condições normais de execução do trabalho, conforme previsão no contrato de trabalho entabulado entre as partes.

No entanto, situações anormais podem ocorrer durante a execução do trabalho, assim consideradas pela lei ou pelas demais fontes do direito.

Assim, o empregado poderá ser exposto a uma situação anormal de trabalho, a qual poderá resultar em um prejuízo para sua vida, saúde, incolumidade física.

Com isso, a lei passou a prever a obrigação do empregador de pagar um plus salarial como forma de compensar esse desgaste maior proporcionado pelo trabalho, que são denominados adicionais.

Nas palavras de Mauricio Godinho Delgado: “Os adicionais correspondem a parcela salarial deferida suplementarmente ao obreiro por este encontrar-se, no plano do exercício contratual, em circunstâncias tipificadas mais gravosas.”

Nas lições de Luciano Martinez:

“O adicional, então, traz consigo a idéia de que, por conta de situações extraordinárias ou desvantajosas, o empregado receberá um valor de hora de trabalho maior do que aquela outorgada em situações normais. Em nome da não complessividade, então, destaca-se o valor da hora normla do correspondente adicional, acréscimo ou pagamento suplementar e identificam-se tais elementos no recibo.”

Neste sentido, temos os adicionais de insalubridade, periculosidade, noturno, de horas extras, de tempo de serviço e de transferência, além de outros que podem ser criados pelas normas coletivas.

No presente estudo, será dado enfoque aos adicionais de insalubridade e periculosidade.

A Constituição Federal, em seu artigo 7º, XXIII, assegura aos trabalhadores o direito aos adicionais aqui discutidos.

 

2.1 Adicional de insalubridade: conceito e hipóteses de incidência

O adicional de insalubridade é acréscimo salarial devido ao empregado por sua exposição aos agentes químicos, físicos ou biológicos que são tidos como nocivos à sua saúde.

Neste aspecto, a CLT prevê:

“Art. 189 – Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)”

Aqui a lei pretendeu proteger a saúde do trabalhador, uma vez que o trabalho em condições insalubres, ainda que intermitentes envolve maior perigo para a saúde do trabalhador, e por tal motivo deve implicar em um aumento na remuneração do empregado.

O trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância fixados pelo Ministério do Trabalho, assegura ao empregado o direito ao recebimento de um adicional de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo ou mínimo profissional, conforme se classifique a insalubridade em mínimo, médio ou máximo, conforme seja apurado por perito, médico ou engenheiro do trabalho.

É relevante destacar que não basta a mera constatação da insalubridade por laudo pericial, posto que a jurisprudência mansa e pacífica do TST exige o enquadramento da atividade na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho.

Por se tratar de salário condição, não há direito adquirido ao seu recebimento, pelo que em havendo reclassificação ou descaracterização da insalubridade por ato da autoridade competente, isso poderá repercutir na diminuição ou cessação do pagamento.

Vale frisar que a base de incidência do adicional de insalubridade é o salário mínimo ou o salário profissional, posto que foi dada liminar na Medida Cautelar em Reclamação n. 6.266-0, pelo que restou suspensa aplicação da Súmula 228 do TST, tendo aplicação a disposição celetista que manda observar o salário mínimo.

Ademais, a identificação do agente nocivo, a indicação da natureza, das condições e dos métodos nocivos 10 e o estabelecimento dos limites de tolerância cabem, por força de lei (art. 155, I, da CLT), ao Ministério do Trabalho e Emprego. É ele quem aprova, mediante atos administrativos, o quadro indicativo de atividades e de operações insalubres, sendo também o responsável pela adoção de normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, os meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes.

As hipóteses de incidência do adicional de insalubridade são previstas na Norma Regulamentadora nº 15 do Ministério do Trabalho e nos seus respectivos anexos, onde são estipulados os agentes físicos (ruído, calor, pressões hiperbáricas, vibrações, frio e umidade), químicos (substâncias químicas e poeiras minerais devidamente identificadas no anexo da NR-15) ou biológicos (agentes biológicos devidamente identificados no anexo da NR-15), com os respectivos limites de tolerância.

Relevante destacar que o caráter intermitente do trabalho realizado em ambiente insalubre não afasta, por si só, o direito à percepção do adicional ora em análise, conforme Súmula adiante transcrita:

Súmula 47 do TST. INSALUBRIDADE. O trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional.

Vale destacar que o item 15.3 da NR 15 dispõe que: “no caso de incidência de mais de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa”.

Alguns doutrinadores, a exemplo de Alice Monteiro de Barros, criticam tal previsão, pois ela teria extrapolado os limites da lei, que não proíbe a cumulação de mais de um adicional de insalubridade e, ainda, afirma que tal medida fará com quem o empregador não se preocupe em eliminar outros agentes agressivos.

Também merece destaque o entendimento firmado no âmbito do TST quanto a obrigatoriedade da realização da perícia para aferir o direito ao adicional de insalubridade, nos termos do verbete sumular indicado abaixo:

“Orientação Jurisprudencial 278 da SDI-1 do TST. Adicional de Insalubridade. Perícia. Local de Trabalho Desativado. A realização de perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de prova.”

Outro ponto digno de nota diz respeito ao pagamento espontâneo do adicional por parte do empregador, posto que a Súmula 453 do TST referindo-se ao adicional de periculosidade, menciona que o pagamento espontâneo dispensa a realização da prova técnica exigida pelo art. 195 da CLT, pois torna incontroversa a existência do trabalho em condições perigosas. Dada a similitude entre os institutos, entende-se pela aplicação analógica do aludido entendimento ao adicional de insalubridade.

No mesmo sentido, é entendimento assente que a constatação de  prestação de serviços em condições nocivas, considerado um agente insalubre diferente do apontado na petição inicial, não prejudica o pleito de adicional de insalubridade, conforme verbete ora transcrito:

“Súmula 293 do TST. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CAUSA DE PEDIR. AGENTE NOCIVO DIVERSO DO APONTADO NA INICIAL. A verificação mediante perícia de prestação de serviços em condições nocivas, considerado agente insalubre diverso do apontado na inicial, não prejudica o pedido de adicional de insalubridade.”

Finalmente, o adicional de insalubridade é típico complemento salarial, pelo que deverá compor a remuneração para todos os efeitos previstos em lei, entre os quais FGTS, férias, décimo terceiro salário e aviso prévio indenizado. Não se permite a repercussão sobre o repouso semanal remunerado, posto que o adicional de insalubridade tem periodicidade mensal, já tendo embutido o da verba semanal de descanso.

 

2.2 Adicional de periculosidade: conceito e hipóteses de incidência

O adicional de periculosidade pode ser compreendido como o acréscimo pago em favor de quem realiza atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

A CLT assim prevê:

“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:                         (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.                           (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

  • 1º – O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 3º Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo. (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)
  • 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014)”

Assim, de forma sintética podemos afirmar que atividades ou operação perigosas são as que implicam risco acentuado por conta da exposição permanente a inflamáveis, explosivos, energia elétrica, roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, trabalho em motocicletas ou ainda a radiação ionizante/substância radioativa.

Além disso, o art. 6º, III da Lei nº 11901/2009 também assegura o pagamento de adicional de periculosidade em favor do bombeiro civil.

Relevante destacar que todas as situações previstas no artigo 193 da CLT estão submetidas à regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, uma vez que é o órgão estatal incumbido esclarecer em que hipóteses as atividades ou operações perigosas produzem, por sua natureza ou pelo método de trabalho aplicado, o mencionado risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador.

Neste sentido, as hipóteses de incidência do adicional de periculosidade são previstas nas Normas Regulamentadoras nº 16, 19 e 20 do Ministério do Trabalho e nos seus respectivos anexos

Quanto a conceituação de exposição permanente, vejamos as lições de Luciano Martinez:

“Entende-se por “exposição permanente” aquela não ocasional, em virtude da qual o contato do trabalhador com o agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, em decorrência da subordinação jurídica à qual se submete. Anotem-se, nesse particular, dois detalhes importantes:

  1. a) Nos termos da Súmula 364 do TST, “ faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido”.
  2. b) Não quebra o conceito de permanência o exercício de função de supervisão controle ou comando em geral ou outra atividade equivalente, desde que seja exclusivamente em ambientes de trabalho cuja periculosidade tenha sido constatada.

Observe-se que a exigência de “ exposição permanente”, ao contrário do que ocorria antes da publicação da Lei n. 12.740, de 2012, que somente existia em relação aos “ inflamáveis” e “ explosivos”, é ora exigível não apenas das mencionadas causas, mas também da energia elétrica e até mesmo das situações de “ roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial”. Esse pressuposto, entretanto, não está presente quando a causa geradora da periculosidade for a prestação de trabalho sob a exposição à radiação ionizante ou à substância radioativa. Nessa situação a fonte normativa criadora da situação perigosa não exigiu, para a sua constatação, a “ exposição permanente”, mas “ qualquer exposição do trabalhador”. O mesmo se pode dizer em relação ao bombeiro civil, que não exige mais do que o exercício da atividade para a garantia do direito ora em análise.

Perceba-se que a modificação legislativa imposta pela Lei n. 12.740/2012 tornou estéril a discussão que dizia respeito à relação entre o tempo de permanência na área de risco elétrico e a proporcionalidade do pagamento do adicional de periculosidade. Afirma-se isso porque o Decreto n. 93.412, de 14 de outubro de 1986, seguindo o destino dado à Lei n. 7.369/85, também foi revogado. Nesses moldes, a Súmula 361 do TST 25, então, perdeu a sua razão de existir.”

Por se tratar de hipótese de salário condição, uma vez desaparecida a causa geradora da periculosidade, desaparecerá o correspondente adicional.

O pagamento desse adicional é realizado na dimensão de 30 (trinta) por cento sobre o salário-base.

O adicional de periculosidade deve ser integrado à remuneração para o cálculo de férias, décimo terceiro salário, gratificações habituais, FGTS e verbas resilitórias, e também, deve refletir em horas extras conforme Súmula 132, I do TST.

Todavia, não há incidência sobre as horas de sobreaviso, pois entende-se que o obreiro não se encontra sujeito a situação de risco,  conforme Súmula 132, II do TST.

 

  1. Incidência dos adicionais sobre o mesmo contrato de trabalho

A partir dessa análise sobre os dois adicionais, é possível constatar que algumas atividades poderão ter previsão em mais de uma Norma Regulamentadora do Ministério do Trabalho.

Assim, passaram a surgir debates sobre a possibilidade ou não de percepção acumulada de adicionais.

A CLT é enfática ao prever expressamente a impossibilidade de cumulação dos referidos adicionais:

“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:       (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;       (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.       (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

  • 1º – O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 3º – Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo. (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)
  • 4o – São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014).”

Da literalidade do dispositivo se extrai a impossibilidade de cumulação do adicional de insalubridade com o adicional de periculosidade, cabendo ao trabalhador, quando fizer jus a ambos, optar por um deles.

Por outro lado, há os que defendem a necessidade de adoção de uma interpretação evolutiva do artigo 193, §2º da CLT, com lastro no artigo 5º, §2º e artigo 7º, XXII da CF e da Convenção 155 da OIT, para se permitir que os adicionais fossem pagos concomitantemente.

Apontado este cerne, vamos analisar as possibilidades de incidências acumuladas.

 

3.1 Adicionais com o mesmo fato gerador

Não é comum, mas é possível que um mesmo fato gerador desencadeie a exposição do trabalho a um agente nocivo à saúde e também exposição permanente a um risco acentuado para sua vida.

Assim, poderia se cogitar na possibilidade do empregado ter direito à percepção dos adicionais de periculosidade e insalubridade incidentes sobre a atividade e com o mesmo fato gerador.

A título exemplificativo, pode-se mencionar a seguinte situação hipotética: empregado de mineradora que, no trabalho de campo, ativa-se em contato direto com detonação de explosivos e, por essa razão, já percebe adicional de insalubridade em decorrência da exposição a ruído intenso. Referido empregado ajuíza reclamação trabalhista para postular o pagamento cumulativo de adicional de periculosidade, em face do manuseio de explosivos, com base no mesmo fato gerador: labor diretamente relacionado à detonação de explosivos.

Este último exemplo foi indicado no Acórdão do processo TST, SDI-I, E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064, Redator Ministro: João Oreste Dalazen, Data de Julgamento: 28/04/2016, DEJT 17/06/2016.

Na hipótese mencionada, o empregado está submetido a condições insalubres e periculosas e que se fundam no mesmo fato gerador (explosivos).

Apesar de haver alguns entendimentos doutrinários e jurisprudenciais defendendo a acumulação, de modo geral acaba prevalecendo a impossibilidade de acumulação nessa hipótese, uma vez que a norma prevista na CLT não abre margem para interpretação dissonante.

Neste sentido, destaca-se o entendimento manifestado no julgamento da SDI-I no E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064

“5. Entretanto, interpretação teleológica, afinada ao texto constitucional, da norma inscrita no art. 193, § 2º, da CLT, conduz à conclusão de que a opção franqueada ao empregado, em relação à percepção de um ou de outro adicional, somente faz sentido se se partir do pressuposto de que o direito, em tese, ao pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade deriva de uma única causa de pedir.”

Portanto, quanto a impossibilidade de acumulação de adicionais de periculosidade e insalubridade motivados por causa de pedir única, penso que já há consolidação de entendimentos em âmbito jurisprudencial.

 

3.2 Adicionais com fatores geradores distintos e autônomos

Há ainda situações em que o trabalho pode causar exposição do trabalhador a agente nocivos à saúde e também a risco acentuado para sua vida, mas com fatores geradores distintos e autônomos.

Neste sentido, podemos citar exemplo em que um empregado labora como operador em empresa dedetizadora, pelo que acaba tendo contato direito com agentes nocivos à saúde que lhe são direito ao adicional de insalubridade em grau médio. Ocorre que, para o exercício de sua atividade ele utiliza motocicleta fornecida pela empresa, na qual labora durante toda a sua jornada, pelo que em perícia judicial acaba tendo reconhecido o direito ao adicional de periculosidade.

Veja-se que nessa hipótese, temos dois fatos geradores distintos, para a insalubridade temos o contato com substâncias químicas de dedetização e para a incidência de periculosidade temos a utilização de motocicleta.

Outro exemplo também, seria a situação em que empregado cortador de cana-de-açúcar que trabalha perto de uma caldeira com risco de explosão e sob intensa radiação solar acima dos limites de tolerância.

Nesse último exemplo, é possível constatar o fato gerador da periculosidade (caldeira com risco de explosão) e o da insalubridade (calor).

Nos exemplos citado, há dissociação clara dos fatores, de modo que o empregado é submetido a vários riscos para sua saúde e vida.

Os julgados que permitiam a acumulação por fatos geradores distintos, fundamentavam-se na alegação de que o pagamento dos adicionais também teria um cunho educativo, no sentido de alertar o empregador de que ele deve implementar medidas para impedir a exposição dos trabalhadores a agentes nocivos à saúde ou que implicassem exposição permanente a risco acentuado para a vida e incolumidade física do obreiro.

Assim, sustentavam que a vedação de acumulação de adicionais com fatos geradores distintos implicaria na inércia do empregador, pois acabaria deixando de adotar medidas e esforços para eliminar o risco ou exposição danoso que não fosse remunerada.

Em um primeiro momento, tínhamos julgados que negavam a possibilidade de acumulação nessa hipótese (fatores geradores distintos e autônomos), até que no julgamento da SDI-I no E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064, ficou incluído no Acórdão a possibilidade de percepção acumulada por causas de pedir distintas, conforme exposto abaixo:

“6. Solução diversa impõe-se se se postula o pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, concomitantemente, com fundamento em causas de pedir distintas. Uma vez caracterizadas e classificadas as atividades, individualmente consideradas, como insalubre e perigosa, nos termos do art. 195 da CLT, é inarredável a observância das normas que asseguram ao empregado o pagamento cumulativo dos respectivos adicionais – arts. 192 e 193, § 1º, da CLT. Trata-se de entendimento consentâneo com o art. 7º, XXIII, da Constituição Federal de 1988. Do contrário, emprestar-se-ia tratamento igual a empregados submetidos a condições gravosas distintas: o empregado submetido a um único agente nocivo, ainda que caracterizador de insalubridade e também de periculosidade, mereceria o mesmo tratamento dispensado ao empregado submetido a dois ou mais agentes nocivos, díspares e autônomos, cada qual em si suficiente para gerar um adicional. Assim, se presentes os agentes insalubre e de risco, simultaneamente, cada qual amparado em um fato gerador diferenciado e autônomo, em tese há direito à percepção cumulativa de ambos os adicionais.”

Todavia, em julgado mais recente, o TST tem defendido a impossibilidade de percepção acumulada, independente de se tratar de causa de pedir única ou distinta.

A questão aparentava estar pacificada.

No entanto, após interposição de vários recursos discutindo a possibilidade de cumulação motivada por causas de pedir distintas, o TST voltará a se manifestar sobre a matéria.

Notícia veiculada no sitio do TST, anuncia que o ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, do Tribunal Superior do Trabalho, publicou, em 19/12/2017, edital de intimação para que pessoas, entidades e órgãos interessados no Incidente de Recurso de Repetitivo nº 239-55.2011.5.02.0319, cujo tema é “Cumulação de adicionais de periculosidade e de insalubridade amparados em fatos geradores distintos e autônomos”, se manifestem acerca do tema da controvérsia, inclusive quanto ao interesse de admissão no feito como amicus curiae, com o prazo de 15 dias para enviarem os pedidos que devem ocorrer mediante petição ao Tribunal.

Desta feita, sob o ponto de vista jurisprudencial, é esperado que a questão venha a ser pacificada no âmbito dos Tribunais Trabalhistas.

 

  1. A cumulação dos adicionais aos olhos da doutrina

Como já dito, a questão da possibilidade da cumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade sempre gerou intensos debates na doutrina e também nas ações apreciadas perante a Justiça do Trabalho.

A doutrina diverge bastante quanto a possibilidade ou não da acumulação, o que também se nota no âmbito das ações judiciais julgadas pelos Tribunais.

Vejamos os principais argumentos e entendimentos favoráveis e contrários à cumulação.

 

4.1 Entendimentos favoráveis à cumulação

Como já dito, a questão da possibilidade da cumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade sempre gerou intensos debates na doutrina e também nas ações apreciadas perante a Justiça do Trabalho.

No rol de entendimentos favoráveis à cumulação, destacamos a lição de Raimundo Simão de Melo, que assim se manifesta:

“Por conta dessa dicção legal não muito clara, parte majoritária da doutrina e da jurisprudência vem entendendo que o trabalhador não tem direito aos dois adicionais, de insalubridade e de periculosidade, mesmo trabalhando em contato com ambos os agentes insalubres e perigosos.

Todavia, a questão merece reflexão. É que os dois adicionais têm natureza diversa, com consequências também diversas para a integridade física e a saúde do trabalhador. Ademais, decorre de princípio constitucional que a todo agravo deve corresponder uma reparação (inciso V do artigo 5º da Constituição Federal).

Enquanto o adicional de insalubridade visa compensar o trabalhador pelos danos causados à sua saúde pelo contato paulatino com os respectivos agentes agressivos, o adicional de periculosidade destina-se à compensação pelo risco iminente à vida do obreiro que se ativa em contato com o agente perigoso.

Para dizer se é devido ou não o pagamento cumulativo dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, é preciso, antes, fazer-se uma análise do disposto no parágrafo 2º do artigo 193 da CLT, que diz, repita-se, “o empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido”.

Assinalo que dessa disposição resultou o entendimento de que o empregado que postula o pagamento de adicional de insalubridade na Justiça do Trabalho deve renunciar ao adicional de periculosidade e vice-versa, porque os dois não se cumulam, cuja conclusão não parece ser cientifica e juridicamente a mais correta.

Se na linguagem comum se diz que “água e óleo não se misturam”, em Direito do Trabalho duas ou mais verbas somente não se cumulam quando tiverem a mesma natureza jurídica, o que não parece ser o caso, porque os dois adicionais aludidos têm natureza jurídica distinta. O adicional de insalubridade tem por fim “indenizar” o trabalhador pelos males causados à sua saúde pelo contato continuado com os respectivos agentes agressivos ao organismo humano, os quais provocam doenças no ser humano, de menor ou maior gravidade, de acordo com o tempo de exposição e fragilidade maior ou menor do organismo de cada trabalhador. Diferentemente ocorre com a periculosidade, cujo adicional é devido simplesmente pelo risco/perigo potencial da ocorrência de acidente de trabalho. O empregado pode trabalhar a vida inteira em contato com agente perigoso e não sofrer acidente algum, mas pode, no primeiro dia de trabalho, ter a vida ceifada pelo contato com um agente periculoso, por exemplo, um choque elétrico.

Assim, se os dois adicionais têm causas e razões diferentes, apenas por lógica devem ser pagos cumulativamente, sempre que o trabalhador se ativar concomitantemente em atividade insalubre e perigosa. Juridicamente o fundamento maior deste raciocínio está no inciso V do artigo 5º da Constituição Federal, que assegura reparação proporcional ao agravo, que, no caso, é duplo.

Também assim entende o juiz do Trabalho Fernando Formolo (“A cumulatividade dos adicionais de insalubridade e periculosidade”, in Revista Justiça do Trabalho, ano 23, n. 269, p. 49/64, maio de 2006), que enaltece o papel do intérprete da Constituição, o qual deve ter compromisso com a efetividade desta, optando por interpretações alternativas e plausíveis que permitam a atuação e concretização do espírito da lei.

Nesse sentido, em decisão unânime da 7ª Turma o Tribunal Superior do Trabalho (Processo RR-1072-72.2011.5.02.03840) afastou a argumentação de que o artigo 193, parágrafo 2º, da CLT prevê a opção pelo adicional mais favorável ao trabalhador e negou provimento ao recurso da empresa, sob o entendimento de que normas constitucionais e supralegais, hierarquicamente superiores à CLT, autorizam a cumulação dos adicionais, aduzindo, ademais, que a Constituição Federal (artigo 7º, inciso XXIII), garantiu de forma plena o direito ao recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, sem qualquer ressalva quanto à cumulação, não recepcionando aquele dispositivo da CLT.

Fundamentou o Tribunal Superior do Trabalho que a opção prevista na CLT é inaplicável em razão da introdução no sistema jurídico brasileiro das Convenções 148 e 155 da OIT, que têm status de normas materialmente constitucionais ou, pelo menos, supralegais, como foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal. A Convenção 148 “consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho”, e a 155 determina que sejam levados em conta os “riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes”, porque referidas convenções superaram a regra prevista na CLT e na Norma Regulamentadora 16 do Ministério do Trabalho e Emprego, no que se refere à percepção de apenas um adicional quando o trabalhador estiver sujeito a condições insalubres e perigosas no trabalho ao mesmo tempo.”

Sebastião Geraldo de Oliveira defende que:

“Discute-se, também, a possibilidade de cumulação do adicional de insalubridade com o de periculosidade. Pelas mesmas razões expostas, somos também favoráveis. Aponta-se, como obstáculo à soma dos dois adicionais, a previsão contida do art. 193, § 2º, da CLT: “O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido”. O dispositivo legal indica que os dois adicionais são incompatíveis, podendo o empregado optar por aquele que lhe for mais favorável. Entretanto, após a ratificação e vigência nacional da Convenção nº 155 da OIT, esse parágrafo foi revogado, diante da determinação de que sejam considerados os riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes (art. 11, b)”.

Também favorável à cumulação dos adicionais, José Augusto Rodrigues Pinto pondera que:

“O direito à cumulação é de uma lógica irrespondível: se a situação de desconforto pessoal tem correspondência numa indenização, o valor desta deve abranger tantos percentuais quantas sejam as circunstâncias causadoras do desconforto, que traz um dano efetivo ao trabalhador, ou do risco a que ele é exposto”

Destaca-se também a manifestação de Luciano Martinez, para quem:

“Independentemente da leitura que se possa fazer do mencionado dispositivo, a verdade é que ele foi revogado pela Convenção n. 155 da OIT, cuja integração ao ordenamento jurídico brasileiro foi dada com status de supralegalidade desde o ano de 1994. Anote-se que a referida Convenção foi aprovada pelo Decreto Legislativo n. 2, de 17 de março de 1992, ratificada em 18 de maio de 1992 e promulgada pelo Decreto n. 1.254, de 19 de setembro de 1994. Trata-se, portanto, de texto legislativo de hierarquia superior e de data mais recente.

O art. 11, b, da referida Convenção n. 155 da OIT é claríssimo ao dispor que “deverão levar-se em consideração os riscos para a saúde causados pela exposição simultânea a várias substâncias ou agentes” (destaque não constante do original). Esse, aliás, é o posicionamento de Jorge Luiz Souto Maior, para quem “ não há o menor sentido continuar-se dizendo que o pagamento de um adicional ‘ quita’ a obrigação quanto ao pagamento de outro adicional.”

Na mesma linha interpretativa Jorge Luiz Souto Maior assim defende a possibilidade de cumulação dos adicionais:

“2. Acumulação de adicionais: como o princípio é o da proteção do ser humano, consubstanciado, por exemplo, na diminuição dos riscos inerentes ao trabalho, não há o menor sentido continuar-se dizendo que o pagamento de um adicional ‘quita’ a obrigação quanto ao pagamento de outro adicional. Se um trabalhador trabalha em condição insalubre, por exemplo, ruído, a obrigação do empregador de pagar o respectivo adicional de insalubridade não se elimina pelo fato de já ter este mesmo empregador pago ao empregado adicional de periculosidade pelo risco de vida a que o impôs. Da mesma forma, o pagamento pelo dano à saúde, por exemplo, perda auditiva, nada tem a ver com o dano provocado, por exemplo, pela radiação. Em suma, para cada elemento insalubre é devido um adicional, que, por óbvio, acumula-se com o adicional de periculosidade, eventualmente devido. Assim, dispõe, aliás, a Convenção nº 155, da OIT, ratificada pelo Brasil.”

Vólia Bonfim Cassar assim se manifesta:

“Infelizmente e de forma absurda, o TST vem sustentando que os adicionais não se acumulam caso o empregado esteja exposto a mais de um agente nocivo, baseado na vedação contida no item 15.3 da NR-15, da Portaria nº 3.214/78. Entendemos de forma diversa. Se o adicional visa indenizar a nocividade do trabalho executado pelo empregado, se as nocividades são múltiplas, os adicionais também deveriam ser. Ademais, não pode uma portaria impor obstáculo não criado pela lei.”

De modo geral, os defensores da acumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade fundamentam o entendimento em uma interpretação evolutiva do artigo 193, §2º da CLT, com lastro no artigo 5º, §2º e artigo 7º, XXII da CF e da Convenção 155 da OIT, que teria sido incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com status de supralegalidade, pelo que seria possível permitir que os adicionais fossem pagos concomitantemente.

 

4.2 Entendimentos contrários à cumulação

Os opositores da possibilidade de cumulação defendem que não há espaço para uma interpretação evolutiva da previsão contida na CLT, posto que ela é enfática ao prever expressamente a impossibilidade de cumulação dos referidos adicionais:

“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:       (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;       (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.       (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

  • 1º – O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 3º – Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo. (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)
  • 4o – São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014).”

Defendem também que há interpretação distorcida e equivocada quanto ao conteúdo da Convenção 155 da OIT, posto que apesar do ingresso da norma no ordenamento jurídico brasileiro (Decreto nº 1.254 de 29/09/1994), não se constata a recomendação de acumulação dos adicionais.

Argumentam que o texto da aludida Convenção apenas recomenda que sejam levados em consideração a exposição a diversas substâncias ou agentes, mas em nenhum momento afirma ser devido os adicionais de forma acumulada.

E ainda, afirma que se trata de mera recomendação política, no sentido de orientar a política de proteção à saúde e segurança dos trabalhadores, de modo que em atenção ao princípio da precaução, devem ser sopesados todos as substâncias e agentes que tenham possibilidade de causar risco para a saúde dos trabalhadores.

Dizem também que não há no texto da Convenção nº 155 da OIT qualquer dispositivo prevendo o pagamento acumulado dos adicionais de periculosidade e insalubridade, ainda que se trate de fatores distintos.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia se posiciona da seguinte forma:

“Por fim, como o art. 193, §2.º, da CLT, assegura o direito do empregado de optar entre o adicional de periculosidade e o adicional de insalubridade, prevalece o entendimento de que ele não faz jus ao recebimento de ambos os adicionais ao mesmo tempo.

Consequentemente, não há como integrar o adicional de insalubridade no cálculo do adicional de periculosidade, justamente porque o recebimento deste afasta o direito ao primeiro.”

Podemos destacar também, as lições de Valentin Carrion, o qual leciona que: “a lei impede a acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade; a escolha pertence ao empregado (art. 193, §2º)”

Sergio Pinto Martins também defende a impossibilidade de acumulação com base na literalidade do artigo celetista: “o empregado não terá direito a adicional de periculosidade e de insalubridade concomitantemente, devendo optar por um deles (§ 2º art. 193 da CLT)”.

Prossegue o mencionado autor:

“(…) não se está impedindo o empregado de receber o adicional, tanto que ele vai escolher o adicional que for maior. Está também de acordo com o princípio da legalidade, de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo a não ser em virtude de lei.”

Pelo que se vê, os entendimentos contrários à acumulação dos adicionais, são fundados em uma leitura literal da disposição celetista, sem permitir qualquer sistematização com os demais dispositivos legais e tampouco com as normas internacionais, dos quais o Brasil é signatário.

 

  1. A cumulação sob a perspectiva da legislação interna.

A Constituição Federal consagra o valor social do trabalho e o primado da dignidade da pessoa humana, consoante se infere do artigo 1º do texto legal, que alçou tais valores ao patamar de fundamentos do Estado Democrático de Direito.

No mesmo sentido, um dos objetivos da República Federativa do Brasil consiste em promover o bem de todos (art. 3º, IV da Constituição Federal), garantindo-se no artigo 6º, no capítulo dos Direitos Sociais, o direito à saúde a todos, o qual corresponde a um dever do Estado.

O art. 7º da Constituição Federal ao enumerar os direitos sociais dos trabalhadores urbanos e rurais, garantiu a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (inciso XXII) e, também, o pagamento de “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei” (inciso XXIII).

Vale frisar que é entendimento assente que o rol de direitos fundamentais dos trabalhadores, integra o contrato mínimo ou patamar civilizatório, de modo que a sociedade exige o pleno atendimento dessas garantias.

Sob a ótica constitucional, de um lado temos o estabelecimento de um meio ambiente do trabalho equilibrado e de outro lado, constata-se a imposição de retribuição pecuniária para compensar os efeitos nocivos decorrentes da exposição do empregado, em determinadas atividades, a agentes nocivos à sua saúde e segurança, o que a doutrina convencionou chamar de monetização do risco.

Lado outro, sob a perspectiva da legislação infraconstitucional, temos as disposições celetistas sobre os adicionais de periculosidade e insalubridade, bem como a previsão do art. 193, §2º que preconiza a impossibilidade de percepção simultânea desses adicionais.

Dito isso, vejamos uma análise aprofundada de tais disposições.

 

5.1 Proteção constitucional sobre meio ambiente de trabalho e os direitos inerentes à saúde e segurança no trabalho

O meio ambiente do trabalho insere-se no meio ambiente como um todo, o qual, por sua vez, integra o rol dos direitos humanos fundamentais, inclusive porque objetiva o respeito à “dignidade da pessoa humana”, valor supremo que revela o “caráter único e insubstituível de cada ser humano”, figurando, ainda, como verdadeiro fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1º, inciso III, da CF/88)”.

É sabido que a proteção a um meio ambiente saudável é cada vez maior, uma vez que já se formou uma consciência coletiva de que é necessário manter um equilíbrio ecológico para galgar uma melhor qualidade de vida.

Dentro do meio ambiente também é incluído o meio ambiente de trabalho.

Neste aspecto, reza a Constituição Federal:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Da mesma forma, há previsão constitucional específica mencionado o meio ambiente de trabalho. Vejamos:

“Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

(…)

VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.”

Ademais, a ordem constitucional também assegura o direito à saúde como um direito social e, diante de tal reconhecimento é certo que o cidadão tem direito à saúde e ao ressarcimento de danos físicos, o que imediatamente se protege é a saúde como integridade psicofísica (art. 7º, XXVIII).

Neste eito, a OMS estipula que saúde “é o completo bem-estar psíquico, mental e social do indivíduo”.

Com base em tais disposições, pode-se reconhecer que há uma proteção constitucional intensificada quanto ao meio ambiente do trabalho e, principalmente, quanto a saúde e incolumidade física dos trabalhadores.

Aline Monteiro de Barros destaca:

“Quando o empregado é admitido pelo empregador, leva consigo uma serie de bens jurídicos (vida, saúde, capacidade de trabalho, etc.), os quais deverão ser protegidos por este último, com adoção de medidas de higiene e segurança para prevenir doenças profissionais e acidentes no trabalho. O empregador deverá manter os locais de trabalho e suas instalações de modo que não ocasionem perigo à vida e à saúde do empregado. A falta de saúde do empregado gera a incapacidade, e se decorrente de ato ilícito ou de um risco gerado pelas condições de trabalho, a responsabilidade civil do empregador por dano material e/ou moral é uma técnica utilizada para reparar o dano e proteger a incapacidade, independentemente de seguro contra acidente feito por ele (art. 7º, XXVIII da Constituição).”

Neste aspecto, José Cairo Júnior ensina que:

“A legislação que trata de segurança, medicina e higiene do trabalho, encerra uma serie de obrigações de fazer e não fazer com relação ao empregador, diferentemente do que ocorre com as demais normas protetivas do trabalho.

As normas estatais laborais formam um conteúdo mínimo do contrato de trabalho e aderem a esse instrumento em forma de cláusulas contratuais.

O não cumprimento das obrigações dessa natureza, por parte do empregador, pode gerar a mora ou o inadimplemento contratual.”

Relevante destacar também os ensinamentos de Volia Bonfim Cassar:

“Uma das características da norma é o seu caráter imperativo. Entretanto, de acordo com o bem que pretende tutelar, o Estado o protege de forma mais ou menos intensa. É o caso da saúde do trabalhador, cujas normas que visam a sua proteção são cogentes, de ordem pública, pois visam proteger a higidez física e mental do trabalhador. Daí porque é dever do intérprete cumprir os diversos comandos e princípios constitucionais e infraconstitucionais que determinam a proteção ao meio ambiente do trabalho (art. 225 da CRFB), a redução dos riscos inerentes do trabalho (art. 7º da CRFB) e a proteção da saúde do trabalhador.

A Constituição de 1988 determina em seu art. 196, como direito de todos e dever do Estado, a saúde e estabelece em seu art. 6º que a saúde é um direito social, de acesso universal e igualitário. As normas relacionadas à saúde ostentam caráter de ordem pública e, portanto, inderrogáveis e inafastáveis pela vontade das partes.

Assim, deve o empregador proporcionar aos seus empregados e trabalhadores um meio ambiente de trabalho higiênico e saudável. Apesar disso, em algumas atividades, dadas as suas peculiaridades, o trabalhador acaba por ser exposto a agentes ou condições que colocam em risco a sua integridade física.

Diante de tal situação, o legislador estabeleceu regras que visam minimizar essa situação excepcional, não só indenizando aqueles trabalhadores submetidos a condições insalubres e perigosas, como também fixando regras que têm por escopo eliminar ou neutralizar alguns agentes agressivos. E, sob esse enfoque, trataremos de analisar a incidência dos adicionais de insalubridade e periculosidade.”

Prosseguindo, a mencionada autora conclui que:

“A integridade física e mental do trabalhador é um direito que decorre de vários Princípios Constitucionais, que são normas e, portanto, obrigam: princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º); princípio da valorização do trabalho humano (art. 170); princípio da defesa do meio ambiente (art. 170); princípio da redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, XII) e pelo princípio da função social da empresa, subprincípio do princípio da função social da propriedade (art. 5º, XXIII).

É, pois, dever de todos cumprir tais determinações e tentar, ao máximo, reduzir os riscos inerentes ao trabalho. Daí porque tanto o Estado como o empregador, o próprio trabalhador e a sociedade devem tomar medidas para tornar eficaz estes comandos constitucionais. O empregador deve zelar pelo meio ambiente, prevenir, tomar precauções, treinar seus trabalhadores, adotar as normas pertinentes ao assunto, adquirir equipamentos de proteção, instituir a CIPA e adotar suas determinações e fiscalizar a utilização pelos empregados do correto uso dos equipamentos, de sua ergonomia e do EPI.

Também os empregados devem realizar os cursos oferecidos pelo patrão, utilizar o EPI, participar das CIPAS e reivindicar a melhoria das condições de trabalho.”

A partir destas constatações, é possível perceber claramente que o maior intuito da legislação protetiva trabalhista não é somente a monetização do risco, mas sim a eliminação ou neutralização da exposição dos trabalhadores a situações gravosas e nocivas à sua saúde ou mesmo que tragam acentuado risco para a vida e incolumidade física.

Finalmente, importante destacar que o direito ao meio ambiente de trabalho com a adoção de medidas para a proteção da saúde e segurança no trabalho integra a órbita dos direitos de indisponibilidade absoluta, de modo que não cabe transação ou renúncia sobre seu conteúdo e alcance.

 

5.2 A vedação contida na CLT e no item 15.3 da NR-15

A CLT regulamenta o mandamento constitucional contido no artigo 7º, XXIII, de modo que prevê o cabimento dos adicionais de insalubridade e periculosidade no capitulo dedicado às normas de proteção à saúde e segurança no trabalho.

A Constituição Federal vaticina que:

“Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(…)

XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

XXIII – adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;”

Um destaque especial deve ser dado à parte final do caput do artigo 7º da CF, uma vez que o legislador deixou prevista uma cláusula aberta, pois o rol de direitos pode ser melhorado ou aprimorado por outros direitos que visem a melhoria da condição social do trabalhador.

A melhoria da condição social mencionada no texto constitucional nos remete à idéia de vedação do retrocesso, de modo que os direitos trabalhistas, assim como os demais direitos fundamentais, devem ser melhorados e jamais diminuídos ou excluídos.

Pois bem.

A CLT, no intuito de regulamentar a disposição constitucional, assim dispõe:

“Art. 189 – Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos.                    (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

 Art. 190 – O Ministério do Trabalho aprovará o quadro das atividades e operações insalubres e adotará normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

Parágrafo único – As normas referidas neste artigo incluirão medidas de proteção do organismo do trabalhador nas operações que produzem aerodispersóides tóxicos, irritantes, alérgicos ou incômodos. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

(…)

Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)

I – inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

II – roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial. (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)

  • 1º – O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido. (Incluído pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)
  • 3º Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo. (Incluído pela Lei nº 12.740, de 2012)
  • 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014)”

No aspecto, as normas celetistas fazem remição para a edição de normas regulamentares por parte do Ministério do Trabalho, sendo que no caso da insalubridade houve a edição da Norma Regulamentadora nº 15, e no caso da periculosidade há as Normas Regulamentadoras nº 16, 19 e 20.

Mesmo diante de intensos debates em torno do cabimento ou não da acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, é fato que a CLT contém norma proibitiva.

Neste sentido, é a redação do art. 193, §2º da CLT:

“Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:                         (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)

(…)

  • 2º – O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido.”

Assim, pela norma celetista, apesar do mandamento constitucional de proteção do meio ambiente de trabalho com a adoção de todas as medidas necessários para inibir a exposição a riscos à vida e saúde, é vedado a percepção de cumulada dos adicionais, mesmo que motivados por fatos geradores completamente distintos e autônomos.

No mesmo sentido, a Norma Regulamentadora nº 15 do Ministério do Trabalho tem previsão à celetista. Vejamos:

“15.3 No caso de incidência de mais de um fator de insalubridade, será apenas considerado o de grau mais elevado, para efeito de acréscimo salarial, sendo vedada a percepção cumulativa.”

Mesmo que a referida Norma se refira ao adicional de insalubridade, parte da doutrina e da jurisprudência utiliza tal disposição para reforçar a vedação contida na CLT.

Mais aí surge o questionamento: sendo a CLT de 1943 e, portanto, anterior à Constituição Federal de 1988, teria ela poder para restringir um direito previsto na Constituição Federal?

Aqui não se trata apenas de análise sob a perspectiva da cronologia, mas sim de questão hierárquica.

Conquanto no Direito do Trabalho haja uma inversão da pirâmide de validade das leis, visto que prevalece a norma mais favorável ao trabalhador, é certo que a Constituição Federal sempre estará no ápice da pirâmide e constitui fundamento de validade para todo o ordenamento jurídico.

Por tudo isso, considerando a relevância do meio ambiente de trabalho e da proteção da saúde e segurança do trabalhador, resta claro que a norma proibitiva contida na CLT deve ser compatibilizada com a Constituição Federal, de modo a privilegiar a máxima efetividade dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

 

5.3 A dignidade da pessoa humana e sua repercussão sobre a legislação trabalhista

Para reforçar esse entendimento, quanto a leitura da CLT à luz da CF, é relevante salientar a preponderância da dignidade da pessoa humana sob o ordenamento jurídico como um todo.

A Constituição Federal de 1988 consagrou a dignidade da pessoa humana como princípio constitucional e fundamento do Estado Democrático de Direito (art. 1º, III, CF/88).

A dignidade da pessoa humana é um princípio aberto, mas que, em apertada síntese, podemos dizer se tratar de reconhecer a todos os seres humanos, pelo simples fato de serem humanos, alguns direitos básicos,  os chamados direitos fundamentais.

Enfatiza Silvio Beltramelli Neto:

“Nessa perspectiva, a construção do conceito de dignidade da pessoa humana não cabe ao campo jurídico, isto é, ao legislador ou ao juiz. Contudo, a sua proteção e promoção, no terreno do Direito, não prescinde de uma concepção construída na praxe dos casos concretos que envolvem situações de afronta à dignidade da pessoa humana exatamente pela agressão a qualquer um de seus atributos essenciais – seja pelo ataque à integridade física ou moral, seja pelo favorecimento do tratamento desigual. Isso faz da dignidade da pessoa humana uma idéia multidimensional, na medida em que congrega várias e distintas facetas da existência humana (autodeterminação, saúde, educação, meio ambiente, propriedade, etc.).”

A consagração constitucional da dignidade da pessoa humana resulta na garantia de uma existência mínima ao ser humano, ou seja, na obrigação do Estado em garantir à pessoa humana um patamar mínimo de recursos, capaz de prover-lhe a subsistência.

O direito à existência digna não é assegurado apenas pela não abstenção do Estado em afetar a esfera patrimonial das pessoas sob a sua autoridade, mas também pelo cumprimento de prestações positivas.

Em se tratando de um valor tão supremo, a dignidade humana necessita de proteção do Estado, posto que é através de seus poderes de atuação, que podem ser criados mecanismos para a sua promoção e inclusão social.

Nessa linha de idéias, e considerando a eficácia vertical e horizontal dos direitos fundamentais, o princípio da dignidade da pessoa humana serve como fundamento para todos os tipos de relações jurídicas, inclusive para as relações que se desenvolvem no contexto das relações de trabalho.

Tais concepções nos remetem à idéia de trabalho digno ou trabalho decente.

Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a noção de trabalho decente provem do eixo central para onde convergem os quatro objetivos estratégicos da OIT: a) respeito às normas internacionais do trabalho, em especial aos princípios e direitos fundamentais do trabalho; b) promoção do emprego de qualidade; c) extensão da proteção social; d) fortalecimento do diálogo social.

Assim, tendo por base a aplicação da dignidade da pessoa humana com a máxima efetividade dos direitos fundamentais, e ainda, a eficácia vertical e horizontal dos desses direitos, não há como acolher a norma proibitiva contida na CLT.

A Carta Magna impõe a proteção do meio ambiente de trabalho e da saúde e segurança dos trabalhadores, pelo que há uma mensagem do legislador para os demais interpretes do direito e até mesmo para os particulares, no sentido de que deve ser privilegiada a precaução e prevenção dos riscos de acidentes e doenças desencadeadas em decorrência do trabalho.

Sob esta ótica, não se coaduna o entendimento de que é impossível o pagamento simultâneo de adicionais de insalubridade e periculosidade amparados em fatores geradores distintos e autônomos.

Além do fim remuneratório, os adicionais também carregam em si um caráter educativo, pois visam desestimular a adoção de práticas danosas pelo empregador, bem como buscam que ele adote medidas para impedir ou neutralizar a exposição a agentes perigosos ou insalubres.

A prática revela que os empregadores adotam medidas mais adequadas em cumprimento à lei quando sofrem no bolso os efeitos de condenações ou das penalidades aplicadas pelos órgãos de fiscalização do trabalho.

Contudo, a adoção de literalidade do artigo 193, §2º CLT e do item 15.3 da NR-15, tem levado a Justiça do Trabalho a impedir a acumulação dos adicionais, mesmo na hipótese de fatos geradores distintos.

Neste sentido, relevante transcrever trecho do voto exarado pelo Ministro João Oreste Dalazen, no julgamento TST-E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064:

“Afigura-se-me relevante, aqui, ponderar que a vedação de cumulatividade dos adicionais de periculosidade e de insalubridade, sob a perspectiva da Consolidação das Leis do Trabalho, não é absoluta.

Com efeito. Uma interpretação teleológica e afinada ao texto constitucional da norma inscrita no art. 193, § 2º, da CLT conduz à conclusão de que a opção franqueada ao empregado, em relação à percepção de um ou de outro adicional, somente faz sentido se se partir do pressuposto de que o direito, em tese, ao pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade deriva de uma única causa de pedir.

(…)

Solução diversa impõe-se, contudo, se se postula o pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, concomitantemente, com fundamento em causas de pedir distintas. Seria o caso, por exemplo, de empregado, técnico de enfermagem, que postula adicional de insalubridade em decorrência do contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas, em ambiente hospitalar, e, também, adicional de periculosidade em virtude do manuseio de equipamentos de raio-X, porque sujeito a radiações ionizantes (Orientação Jurisprudencial nº 345 da SbDI-1 do TST).”

No mesmo sentido, é importante destacar o entendimento manifestado pelo Juiz Luiz Antonio Colussi em artigo publicado no site da Amatra da 4ª Região, no qual faz uma análise da vedação de cumulação dos adicionais sob uma perspectiva da proteção constitucional da saúde do trabalhador. Vejamos:

“A Constituição Federal de 1988 positivou a garantia dos trabalhadores urbanos e rurais à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio da publicação de normas de saúde, higiene e segurança, juntamente com o direito à percepção de adicionais de remuneração para atividades reputadas penosas, insalubres ou perigosas, nos termos do seu artigo 7º, caput e incisos XXII e XXIII.

O espírito da norma visa preservar as condições consideradas normais de trabalho, dentro de um patamar mínimo que assegure o completo “bem-estar físico, mental e social” do  trabalhador, por intermédio de medidas de prevenção, e ainda, pela estipulação, também por lei, do direito à percepção de parcelas pecuniárias, nominadas adicionais, assim entendida “a contraprestação específica do trabalho penoso, perigoso ou insalubre”.

A natureza jurídica de salário sob condição dos adicionais de penosidade, periculosidade e insalubridade, atribuída pelo artigo 7º, inciso XXIII, da Constituição, lhes confere um caráter precário, sendo devidos tão-somente pelo prazo que perdurar a situação de anormalidade, ou seja, de maior desgaste físico do trabalhador no desenvolvimento da atividade produtiva, correspondente a um fato gerador lesivo específico.

Por força do aspecto dinâmico do Direito, e em decorrência das transformações pelas quais diariamente passam os fatos da vida, necessário se fazer uma revisão crítica do tratamento até então despendido à matéria, a fim de que sejam reavaliadas posições até então tidas por pacíficas, sob risco de serem mantidos como dogmas entendimentos anacrônicos e dissociados de uma realidade social, em prejuízo aos destinatários das regras protetivas.

Reafirmo que a Constituição, na condição de verdadeiro norte do arcabouço normativo, em sua citada norma, assegurou expressamente aos trabalhadores o direito à percepção de adicionais de remuneração, arrolados de modo exemplificativo, quando desempenhadas atividades penosas, insalubres ou perigosas.

Tal disposição deve ser examinada em conjunto com os Princípios que regem o ordenamento, em especial o da Máxima Efetividade ou da Eficiência, pelo qual “a uma norma constitucional deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe dê”, e não o contrário, em evidente prejuízo ao trabalhador, como há muito vem ocorrendo.

Assim, concluo que é constitucional e legal a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, quando restar comprovada na relação laboral a incidência concomitante dos dois agentes.”

Ante o que fora exposto, reputa-se que há procedência da argumentação de que a norma proibitiva da CLT deve ser interpretada à luz dos valores e princípios constitucionais atinentes ao meio ambiente de trabalho e destinadas à proteção da saúde e segurança dos trabalhadores.

Mais a mais, é cabível a proteção dos direitos fundamentais também no âmbito das relações entre particulares, ante a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, sendo que a doutrina mais atualizada ainda invoca a eficácia diagonal dos direitos fundamentais, a qual é própria das relações em que há disparidade técnica, econômica ou jurídica entre as partes, como no caso do Direito do Trabalho, em que se reconhece a superioridade econômica do empregador em face do empregado.

 

  1. A cumulação com base na OIT

Uma das correntes que defendem a possibilidade de acumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade é fundada em normas internacionais oriundas da OIT e que teriam sido incorporadas no ordenamento jurídico brasileiro.

Ante de mais nada é importante salientar que há três regras sobre a incorporação das normas internacionais ao ordenamento jurídico brasileiro.

Em se tratando de normas anteriores a CF/88 e que não digam respeito a direitos humanos, elas são incorporadas ao ordenamento jurídico brasileiro com status de lei federal.

Caso a norma seja anterior à CF/1988 ou posterior à CF/88 e sem sujeição ao rito especial previsto no art. 5º, §3º, mas diga respeito a direitos humanos, terá status de supralegalidade, conforme entendimento manifestado pelo STF no bojo da ação que julgou a validade da prisão do depositário infiel em face do pacto de San José da Costa Rica.

As normas posteriores à CF/88 e que tenham sido submetidas ao rito especial previsto no art. 5º, §3º, serão incorporadas com status de emenda constitucional.

Tem relevância a incorporação das normas editadas pela OIT e demais organismos internacionais voltados para a proteção de direitos sociais e direitos humanos ao ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que demonstra o compromisso da ação com a proteção da dignidade da pessoa humana.

 

6.1 Missão institucional da OIT e a adesão do Brasil aos princípios e normas internacionais

A Organização Internacional do Trabalho – OIT é um organismo internacional, com sede em Genebra, criada pelo Tratado de Paz (Tratado de Versalhes, de 1919) como parte da Sociedade das Nações, no final da Primeira Guerra Mundial, com a idéia de garantir um mínimo de regras trabalhistas a serem observados por todos os países, ou seja, regular, uniformizar, universalizar as normas trabalhistas.

Em 1944, à luz dos efeitos da Grande Depressão a da Segunda Guerra Mundial, a OIT adotou a Declaração da Filadélfia como anexo da sua Constituição.

Em 1998, foi adotada a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Seguimento. O documento é uma reafirmação universal da obrigação de respeitar, promover e tornar realidade os princípios refletidos nas Convenções fundamentais da OIT, ainda que não tenham sido ratificados pelos Estados- membros.

Aos Estados-membros que aderem voluntária e soberanamente à Constituição da OIT, esta impõe certas restrições e obrigações.

Assim, deste contexto, é possível extrair que a OIT foi criada para impedir a vulneração dos direitos trabalhistas mínimos, impondo uma uniformização perante as nações, de modo que todos obedeçam aos direitos mínimos dos trabalhadores.

A Organização Internacional do Trabalho tem como escopo alcançar a paz mundial de forma permanente baseada na justiça social, com a fixação de melhores condições de trabalho, diminuição de desemprego, proteção contra as enfermidades e acidente de trabalho, dentre outros objetivos.

Neste ponto, o Brasil é membro fundador da Organização Internacional do Trabalho.

Desta feita, pelo simples fato de ser membro fundador, tendo aderido à criação da OIT, o Brasil se submete à plena observância das normas e princípios fundamentais da OIT.

Nesse aspecto, a Declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais é clara ao dispor que:

“A Conferência Internacional do Trabalho,

  1. Lembra:
  2. a) que ao incorporar-se livremente à OIT, todos os Membros aceitaram os princípios e direitos enunciados em sua Constituição e na Declaração de Filadélfia, e se comprometeram a esforçar-se para atingir os objetivos gerais da Organização com o melhor de seus recursos e de acordo com suas condições específicas;
  3. b) que esses princípios e direitos se expressam e desenvolvem na forma de direitos e obrigações específicos em Convenções reconhecidas como fundamentais dentro e fora da Organização.
  4. Declara que todos os Membros, ainda que não tenham ratificado as Convenções, têm um compromisso derivado do simples fato de pertencer à Organização de respeitar, promover e tornar realidade, de boa fé e de conformidade com a Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas Convenções, isto é:

(a) a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva;

(b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório;

(c) a efetiva abolição do trabalho infantil; e (d) a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação.”

Malgrado, mesmo não tendo ratificado todos as normas emanadas da OIT, o país tem o compromisso internacional de atender e tornar efetivo os direitos fundamentais protegidos pela OIT.

 

6.2 As convenções da OIT e sua aplicabilidade à discussão da cumulação de adicionais

No caso específico dos adicionais de insalubridade e periculosidade, o Brasil ratificou duas Convenções da OIT que tratam do tema e que, inclusive, são invocadas nas decisões que analisam o pedido de acumulação dos adicionais.

A Convenção nº 148 da OIT trata da “proteção dos trabalhadores contra os riscos profissionais devidos à contaminação do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho”, foi ratificada pelo Decreto nº 93.143 de 14/01/1982.

Há ainda, a Convenção da OIT nº 155, que versa sobre “segurança e saúde dos trabalhadores e o meio ambiente de trabalho”, tendo sido ratificada pelo Decreto 1.254 de 18/05/1992.

Com fundamento em tais Convenções, doutrina e jurisprudência defendem que possuem norma explícita em que assegura a percepção cumulativa dos adicionais de periculosidade e de insalubridade em decorrência da exposição do empregado a uma pluralidade de agentes de risco distintos.

No artigo 8º, item 3 da Convenção 148 da OIT, que trata especificamente das medidas de prevenção e de proteção, é dito o seguinte:

“3. Os critérios e limites de exposição deverão ser fixados, completados e revisados a intervalos regulares, de conformidade com os novos conhecimentos e dados nacionais e internacionais, e tendo em conta, na medida do possível, qualquer aumento dos riscos profissionais resultante da exposição simultânea a vários fatores nocivos no local de trabalho.”

Os defensores da possibilidade de acumulação dos adicionais defendem que tal norma recomenda ao Estado-membro a adoção de conduta que imponha aos empregadores a obrigação de pagamento cumulativo de adicionais decorrentes de condições de trabalho mais gravosas.

No entanto, uma leitura atenta desse dispositivo nos revela que ele  traça meras orientação, dispondo somente que os critérios e limites de exposição dos trabalhadores à contaminação do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho devem considerar, na medida do possível, o aumento dos riscos decorrentes da exposição simultânea a mais de um fator nocivo.

Há ainda, a utilização do texto da Convenção nº 155 da OIT para a mesma finalidade, isto é, para fundamentar um entendimento de que é possível a cumulação.

Fundamentam com base na seguinte previsão do texto da Convenção 155 da OIT:

“Artigo 11

Com a finalidade de tornar efetiva a política referida no artigo 4 da presente Convenção, a autoridade ou as autoridades competentes deverão garantir a realização progressiva das seguintes tarefas:

(…)

  1. b) a determinação das operações e processos que serão proibidos, limitados ou sujeitos à autorização ou ao controle da autoridade ou autoridades competentes, assim como a determinação das substâncias e agentes aos quais estará proibida a exposição no trabalho, ou bem limitada ou sujeita à autorização ou ao controle da autoridade ou autoridades competentes; deverão ser levados em consideração os riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes; (…).”

Novamente, não se constata nenhuma determinação direta de que haja pagamento de adicionais de forma simultânea.

As duas normas da OIT visam a preservação do meio ambiente de trabalho saudável e seguro, e nesse mister, acabam determinando a adoção de medidas pelo Estado-membro.

Não bastasse isso, as Convenções 148 e 155 da OIT, tais como as demais normas emanadas daquele órgão, ostentam conteúdo aberto, de cunho genérico, e portanto, apenas orientam os Estados-membros, não dispondo ou prevendo propriamente obrigações para os empregadores representados pelo Estado signatário.

No aspecto, é imperioso transcrever trecho do voto do Ministro João Oreste Dalazen no julgamento do processo TST-E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064:

“Relembro, a propósito, que a tese vencida no presente julgamento, externada no douto voto do Exmo. Ministro Relator originário, invocava, em favor da pretensão deduzida na reclamação trabalhista, as Convenções da OIT nos 148 (art. 8º, item 3) e 155 (art. 11, alínea “b”).

Data venia do entendimento esposado por Sua Excelência e pelos Exmos. Ministros que o acompanharam, as Convenções nºs 148 e 155 da OIT não contêm qualquer norma explícita em que se assegure a percepção cumulativa dos adicionais de periculosidade e de insalubridade em decorrência da exposição do empregado a uma pluralidade de agentes de risco distintos.”

Com o devido respeito aos entendimentos manifestados pelos renomados doutrinadores e membros do Poder Judiciário, não se constata qualquer norma nas Convenções 148 e 155 da OIT que autorize a percepção simultânea dos adicionais de periculosidade e insalubridade, também não há que se falar na revogação do artigo 193, § 2º, da CLT por meio de tais normas.

Por amor ao debate, é relevante destacar que há doutrinadores que defendem que as decisões contrárias a acumulação importam em descrédito aos instrumentos normativos internacionais dos quais o país é signatário, mas não concordamos com tal argumento, uma vez que as normas internacionais contém comandos gerais direcionados aos países, isto é, apenas orientam a conduta da nação frente à problemática da proteção da saúde e segurança no meio ambiente de trabalho.

Dessa forma, o artigo. 193, § 2º, da CLT, além de plenamente recepcionado pela Constituição Federal, não conflita com normas de direito internacional antes mencionadas.

 

  1. Entendimentos jurisprudenciais

A (in)possibilidade de cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade sempre despertou calorosos debates na doutrina e jurisprudência.

De um lado, se defendia a literalidade da vedação contida no art. 195, §2º da CLT, com amparo no princípio da legalidade, insculpido no artigo 5º da Carta Magna.

Por outro lado, alguns defendiam que necessário uma interpretação evolutiva do artigo 193, §2º da CLT, com lastro no artigo 5º, §2º e artigo 7º, XXII da CF e da Convenção 155 da OIT, para se permitir que os adicionais fossem pagos concomitantemente.

Da mesma forma, a jurisprudência não era pacífica, havendo Tribunais que defendiam a possibilidade de cumulação, como no julgado adiante explicitado:

“ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. CUMULAÇÃO. Posição majoritária da Turma de que, por não haver sido o art. 193, § 2º, da CLT recepcionado pela Constituição Federal e em razão da ratificação pelo Estado Brasileiro da Convenção 155 da OIT, há possibilidade de cumulação dos adicionais de periculosidade e de insalubridade. Recurso provido. […]” (TRT-4, 2ª Turma. Relator o Exmo. Desembargador Alexandre Corrêa da Cruz. Processo n. 0000181-27.2012.5.04.0201 RO. Publicação em 19-12-2013)

“ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. Os adicionais de insalubridade e periculosidade dizem respeito a fatos geradores diversos, razão pela qual não há que se falar em impossibilidade de cumulação. O pagamento de tais adicionais tem por escopo proteger a saúde do trabalhador.” (TRT-4 – RO: 00001697320135040008 RS 0000169-73.2013.5.04.0008, Relator: MARCOS FAGUNDES SALOMÃO, Data de Julgamento: 13/05/2014, 8ª Vara do Trabalho de Porto Alegre)

“CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. Importante observar que os tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil gozam de hierarquia supralegal. As disposições contidas na Convenção n. 155 da OIT, aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 2, de 17.03.92, ratificada em 18.05.92 e promulgada pelo Decreto n. 1.254, de 29.09.94, devem prevalecer sobre àquelas constantes do parágrafo 2º, do art. 193 da CLT e do item 15.3 da NR-15. A norma constitucional, quando tratou do “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas”, não estabeleceu qualquer impedimento à sua cumulação, até porque os adicionais são devidos por causas e com fundamentos absolutamente diversos. A impossibilidade de percepção cumulada dos adicionais de periculosidade e insalubridade constante do parágrafo 2º, do art. 193 da CLT e do item 15.3 da NR-15 não se mostra compatível com as normas constitucionais mencionadas, notadamente ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho e ao meio ambiente laboral saudável.” (TRT-2 – RO: 00022934620125020064 SP 00022934620125020064 A28, Relator: IVETE RIBEIRO, Data de Julgamento: 19/05/2015, 4ª TURMA, Data de Publicação: 29/05/2015)

E ainda, Tribunais que defendiam a impossibilidade de cumulação:

“REMUNERAÇAO “POR FORA”. PROVAS DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL. DIFERENÇAS DEVIDAS. O empregado em regra tem dificuldade de comprovar o recebimento de remuneração “por fora”, pois geralmente a empregadora não documenta esse pagamento, razão pela qual a prova testemunhal detém especial relevância nessa hipótese. Comprovado por provas documental e testemunhal a existência de pagamento de remuneração clandestina pela empregadora, faz jus o empregado ao recebimento das respectivas diferenças deferidas na sentença. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. CUMULAÇAO. IMPOSSIBILIDADE. O õ 2º do art. 193 da CLT é claro ao dispor que o obreiro deverá optar entre o adicional de periculosidade e o de insalubridade, sendo vedada a sua cumulação. HORAS EXTRAS. EXCEPCIONALIDADE. ARTIGO 62, PARÁGRAFO ÚNICO DA CLT. NAO COMPROVAÇAO. DEFERIMENTO. Verificando-se que o obreiro não detinha poderes de mando e gestão na empresa, ou que o seu salário por cargo de confiança era inferior ao respectivo salário efetivo acrescido de pelo menos 40%, não há como ser aplicada a excepcionalidade prevista no parágrafo único do art. 62 da CLT. Recurso a que se nega provimento para manter as horas extras e seus reflexos deferidos na sentença.” (TRT-14 – RO: 976 RO 0000976, Relator: JUIZ FEDERAL DO TRABALHO CONVOCADO SHIKOU SADAHIRO, Data de Julgamento: 30/03/2010, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DETRT14 n.060, de 01/04/2011)

“CUMULAÇÃO DE ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. INDEVIDA. Indevida, na forma da lei, a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, cabendo ao empregado escolher entre eles, desde que verificada a presença das duas agravantes.” (TRT-1 – RO: 01159005620095010036 RJ, Relator: Angela Fiorencio Soares da Cunha, Data de Julgamento: 09/04/2014, Terceira Turma, Data de Publicação: 20/05/2014)

“RECURSO DE REVISTA. 1. ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. PAGAMENTO NÃO CUMULATÓRIO. OPÇÃO POR UM DOS ADICIONAIS. Ressalvado o entendimento do Relator, o fato é que, segundo a jurisprudência dominante nesta Corte, é válida a regra do art. 193, § 2º, da CLT, que dispõe sobre a não cumulação entre os adicionais de periculosidade e de insalubridade, cabendo a opção, pelo empregado, entre os dois adicionais. Assim, se o obreiro já percebia o adicional de insalubridade, porém entende que a percepção do adicional de periculosidade lhe será mais vantajosa, pode requerê-lo, ou o contrário. O recebimento daquele adicional não é óbice para o acolhimento do pedido de pagamento deste, na medida em que a lei veda apenas a percepção cumulativa de ambos os adicionais. Todavia, nessa situação, a condenação deve estar limitada ao pagamento de diferenças entre um e outro adicional. Para o Relator, caberia o pagamento das duas verbas efetivamente diferenciadas (adicional de periculosidade e o de insalubridade), à luz do art. 7º, XXIII, da CF, e do art. 11-b da Convenção 155 da OIT, por se tratar de fatores e, principalmente, de verbas/parcelas manifestamente diferentes, não havendo bis in idem. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido no tema. (…)” (TST, 3ª Turma, RR-1643-07.2012.5.04.0205, Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, DEJT 19/09/2014.)

“CUMULAÇÃO DE ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE – IMPOSSIBILIDADE. Os adicionais de insalubridade e periculosidade não podem ser cumulados, ante a existência de expressa vedação legal (artigos 7º, XXIII, da CR/88 e 193, § 2º, da CLT), cabendo o pagamento daquele mais benéfico ao empregado (art. 192, § 2º, da CLT).” (TRT-3 – RO: 00217201509603001 0000217-18.2015.5.03.0096, Relator: Marcus Moura Ferreira, Quinta Turma, Data de Publicação: 13/07/2015)

“CUMULAÇÃO DE ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. IMPOSSIBILIDADE. A norma contida no § 2º do art. 193 da CLT, recepcionado pela Lex Fundamentalis, impede a acumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, cabendo ao empregado optar pelo adicional que deseja receber.” (TRT-12 – RO: 00022157220135120053 SC 0002215-72.2013.5.12.0053, Relator: GARIBALDI TADEU PEREIRA FERREIRA, SECRETARIA DA 1A TURMA, Data de Publicação: 03/11/2015)

“CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. Entendo que o adicional de periculosidade não é pago cumulativamente com o adicional de insalubridade, e sim alternativamente, em razão do disposto no artigo 193 da CLT, que trata do adicional de periculosidade. Ainda, adoto o entendimento consolidado por este Tribunal Regional na Súmula 76, que veda a cumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade, sendo possível o empregado optar pelo adicional mais vantajoso.” (TRT-4 – RO: 00212237020145040005, Data de Julgamento: 27/01/2017, 9ª Turma)

Pelos julgados acima transcritos é possível perceber que havia muita cizânia jurisprudencial quanto ao tema, sendo que os Tribunais decidiam de modos completamente distintos e destoantes.

Haviam Tribunais, como o TRT da 4ª Região (Rio Grande do Sul), que ora entendiam pela vedação da cumulação, e ora entendiam pela possibilidade da cumulação, deixando claro um incerteza e insegurança jurídica sobre o tema.

Desta feita, após vários recursos questionando a matéria, e constatando o conflito de teses entre Regionais, bem como possível violação da legislação constitucional e infraconstitucional, o TST acabou aceitando Recursos sobre a referida temática, vindo a pronunciar-se em alguns processos.

Inicialmente, o TST entendeu pela impossibilidade de cumulação, mantendo-se o entendimento clássico e que propugnava pela aplicação pura e seca da disposição celetista.

Veja-se os seguintes arestos:

“RECURSO DE REVISTA. (…) 3. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. O § 2º do artigo 193 da CLT assegura ao empregado a possibilidade de optar, caso a função desempenhada seja concomitantemente insalubre e perigosa, pelo adicional que lhe seja mais vantajoso, a saber: o de periculosidade ou insalubridade. Assim, o egrégio Tribunal Regional, ao decidir pela possibilidade de cumulação dos dois adicionais, violou o artigo 193, § 2º, da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (…).” (RR-1088-45.2011.5.04.0004, Relator Ministro: Guilherme Augusto Caputo Bastos, data de julgamento: 12/6/2013, 5ª Turma, data de publicação: 21/6/2013)

“RECURSO DE REVISTA. 1. ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. CUMULAÇÃO. Preceitua o art. 192 da CLT que -o exercício de trabalho em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura a percepção de adicional respectivamente de 40% (quarenta por cento), 20% (vinte por cento) e 10% (dez por cento) do salário-mínimo da região, segundo se classifiquem nos graus máximo, médio e mínimo-. O art. 193, § 1º, da CLT, por sua vez, versa que -o trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa-. Já o § 2º do último dispositivo consolidado indicado estabelece que -o empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido-. Tem-se, assim, que o legislador, ao possibilitar ao empregado a opção pelo recebimento do adicional porventura devido, por certo, vedou o pagamento cumulado dos dois institutos. Recurso de revista conhecido e provido. (…).” (RR-812-96.2011.5.04.0203, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, data de julgamento: 12/6/2013, 3ª Turma, data de publicação: 14/6/2013)

“RECURSO DE REVISTA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. -Tem direito ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido- (Súmula/TST nº 364). Recurso de revista não conhecido. ADICIONAIS DE PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE – PAGAMENTO CUMULATIVO. O ordenamento jurídico brasileiro prevê a percepção do adicional de periculosidade, de que trata o artigo 193 da CLT, ao trabalhador exposto à situação de risco, conferindo-lhe, ainda, o direito de optar pelo adicional de insalubridade previsto no artigo 192 do mesmo diploma legal, quando este também lhe for devido. É o que dispõe o artigo 193, §2º, da Consolidação das Leis do Trabalho: -O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido-. Desse modo, o referido dispositivo legal veda a cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade, podendo, no entanto, o empregado fazer a opção pelo que lhe for mais benéfico. Portanto, não sendo possível a cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade, em razão da vedação legal, devem ser deduzidos os valores pagos pela reclamada ao reclamante a título de adicional de insalubridade. Recurso de revista conhecido e provido. HORAS EXTRAS – ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA. -A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário (Item IV da Súmula nº 85 desta Corte). Recurso de revista conhecido e provido.” (RR-276-37.2011.5.12.0050, Relator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, data de julgamento: 27/5/2013, 2ª Turma, data de publicação: 31/5/2013)

“RECURSO DE REVISTA. ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. PAGAMENTO NÃO CUMULATÓRIO. OPÇÃO POR UM DOS ADICIONAIS. Ressalvado o entendimento deste Relator, o fato é que, segundo a jurisprudência dominante nesta Corte, é válida a regra do art. 193, §2º, da CLT, que dispõe sobre a não cumulação entre os adicionais de periculosidade e de insalubridade, cabendo a opção pelo empregado entre os dois adicionais. Assim, se o obreiro já percebia o adicional de insalubridade, porém entende que a percepção do adicional de periculosidade lhe será mais vantajosa, pode requerê-lo, ou o contrário. O recebimento daquele adicional não é óbice para o acolhimento do pedido de pagamento deste, na medida em que a lei veda apenas a percepção cumulativa de ambos os adicionais. Todavia, nessa situação, a condenação deve estar limitada ao pagamento de diferenças entre um e outro adicional. Para a ressalva do Relator, caberia o pagamento das duas verbas efetivamente diferenciadas (adicional de periculosidade e o de insalubridade), à luz do art. 7º, XXIII, da CF, e do art. 11-b da Convenção 155 da OIT, por se tratar de fatores e, de principalmente, verbas/parcelas manifestamente diferentes, não havendo bis in idem. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR-611700-64.2009.5.12.0028, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, data de julgamento: 26/6/2013, 3ª Turma, data de publicação: 1°/7/2013)

Em julgamento realizado em 24/09/2014 a 7ª Turma do TST divergiu de tal entendimento até então consolidado e deferiu a cumulação dos adicionais, conforme se observa abaixo:

“RECURSO DE REVISTA. CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA DAS NORMASCONSTITUCIONAIS E SUPRALEGAIS SOBRE A CLT. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO STF QUANTO AO EFEITO PARALISANTE DAS NORMAS INTERNAS EM DESCOMPASSO COM OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. INCOMPATIBILIDADE MATERIAL. CONVENÇÕES NOS 148 E 155 DA OIT. NORMAS DE DIREITO SOCIAL. CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE. NOVA FORMA DE VERIFICAÇÃO DE COMPATIBILIDADE DAS NORMAS INTEGRANTES DO ORDENAMENTO JURÍDICO. A previsão contida no artigo 193, § 2º, da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 7º, XXIII, garantiu de forma plena o direito ao recebimento dos adicionais de penosidade, insalubridade e periculosidade, sem qualquer ressalva no que tange à cumulação, ainda que tenha remetido sua regulação à lei ordinária. A possibilidade da aludida cumulação se justifica em virtude de os fatos geradores dos direitos serem diversos. Não se há de falar em bis in idem. No caso da insalubridade, o bem tutelado é a saúde do obreiro, haja vista as condições nocivas presentes no meio ambiente de trabalho; já a periculosidade traduz situação de perigo iminente que, uma vez ocorrida, pode ceifar a vida do trabalhador, sendo este o bem a que se visa proteger. A regulamentação complementar prevista no citado preceito da Lei Maior deve se pautar pelos princípios e valores insculpidos no texto constitucional, como forma de alcançar, efetivamente, a finalidade da norma. Outro fator que sustenta a inaplicabilidade do preceito celetista é a introdução no sistema jurídico interno das Convenções Internacionais nos 148 e 155, com status de norma materialmente constitucional ou, pelo menos, supralegal, como decidido pelo STF. A primeira consagra a necessidade de atualização constante da legislação sobre as condições nocivas de trabalho e a segunda determina que sejam levados em conta os “riscos para a saúde decorrentes da exposição simultânea a diversas substâncias ou agentes”. Nesse contexto, não há mais espaço para a aplicação do artigo 193, § 2º, da CLT. Recurso de revista de que se conhece e a que se nega provimento”. (TST. 7ª T. 1072-72.2011.5.02.0384. Rel. Cláudio Brandão. DEJT 03.10.2014).

As demais Turmas do Tribunal Superior do Trabalho se mantiveram fiéis à interpretação clássica, conforme demonstram, por exemplo, diversos julgados recentes:

– AIRR-3293-59.2012.5.12.0046, 1ª Turma, Data de Julgamento: 16.03.2016, Rel. Des. Convocado Marcelo Lamego Pertence, DEJT 22.03.2016;

– AIRR-1691-38.2014.5.03.0038, 2ª Turma, Data de Julgamento: 02.03.2016, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, DEJT 11.03.2016;

– AIRR-1002-69.2013.5.02.0001, 3ª Turma, Data de Julgamento: 11.11.2015, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 13.11.2015;

– RR-70-43.2013.5.12.0053, 4ª Turma, Data de Julgamento: 09.12.2015, Rel. Min. João Oreste Dalazen, DEJT 11.12.2015;

– AIRR-1162-33.2012.5.15.0045, 5ª Turma, Data de Julgamento: 28.10.2015, Rel. Des. Convocado José Rêgo Júnior, DEJT 06.11.2015;

– ARR-800-24.2012.5.04.0017, 6ª Turma, Data de Julgamento: 07.10.2015, Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, DEJT 19.02.2016;

– RR-443-80.2013.5.04.0026, 8ª Turma, Data de Julgamento: 03.02.2016, Rel. Min.: Dora Maria da Costa, DEJT 12.02.2016.

Em 28 de abril de 2016, a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais – SDI-I julgou a matéria nos seguintes termos:

“ADICIONAIS. PERICULOSIDADE E INSALUBRIDADE. PERCEPÇÃO CUMULATIVA. ART. 193, § 2º, DA CLT. ALCANCE

  1. No Direito brasileiro, as normas de proteção ao empregado pelo labor prestado em condições mais gravosas à saúde e à segurança deverão pautar-se sempre nos preceitos insculpidos no art. 7º, incisos XXII e XXIII, da Constituição Federal: de um lado, a partir do estabelecimento de um meio ambiente do trabalho equilibrado; de outro lado, mediante retribuição pecuniária com vistas a “compensar” os efeitos nocivos decorrentes da incontornável necessidade de exposição do empregado, em determinadas atividades, a agentes nocivos à sua saúde e segurança.
  2. No plano infraconstitucional, o art. 193 da CLT, ao dispor sobre o direito à percepção de adicional de periculosidade, assegura ao empregado a opção pelo adicional de insalubridade porventura devido (§ 2º do art. 193 da CLT).
  3. A opção a que alude o art. 193, § 2º, da CLT não conflita com a norma do art. 7º, XXII, da Constituição Federal. Os preceitos da CLT e da Constituição, nesse ponto, disciplinam aspectos distintos do labor prestado em condições mais gravosas: enquanto o art. 193, § 2º, da CLT regula o adicional de salário devido ao empregado em decorrência de exposição a agente nocivo, o inciso XXII do art. 7º impõe ao empregador a redução dos agentes nocivos no meio ambiente de trabalho. O inciso XXIII, a seu turno, cinge-se a enunciar o direito a adicional “de remuneração” para as atividades penosas, insalubres e perigosas e atribui ao legislador ordinário a competência para fixar os requisitos que geram direito ao respectivo adicional.
  4. Igualmente não se divisa descompasso entre a legislação brasileira e as normas internacionais de proteção ao trabalho. As Convenções nos 148 e 155 da OIT, em especial, não contêm qualquer norma explícita em que se assegure a percepção cumulativa dos adicionais de periculosidade e de insalubridade em decorrência da exposição do empregado a uma pluralidade de agentes de risco distintos. Não há, pois, em tais normas internacionais preceito em contraposição ao § 2º do art. 193 da CLT.
  5. Entretanto, interpretação teleológica, afinada ao texto constitucional, da norma inscrita no art. 193, § 2º, da CLT, conduz à conclusão de que a opção franqueada ao empregado, em relação à percepção de um ou de outro adicional, somente faz sentido se se partir do pressuposto de que o direito, em tese, ao pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade deriva de uma única causa de pedir.
  6. Solução diversa impõe-se se se postula o pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, concomitantemente, com fundamento em causas de pedir distintas. Uma vez caracterizadas e classificadas as atividades, individualmente consideradas, como insalubre e perigosa, nos termos do art. 195 da CLT, é inarredável a observância das normas que asseguram ao empregado o pagamento cumulativo dos respectivos adicionais – arts. 192 e 193, § 1º, da CLT. Trata-se de entendimento consentâneo com o art. 7º, XXIII, da Constituição Federal de 1988. Do contrário, emprestar-se-ia tratamento igual a empregados submetidos a condições gravosas distintas: o empregado submetido a um único agente nocivo, ainda que caracterizador de insalubridade e também de periculosidade, mereceria o mesmo tratamento dispensado ao empregado submetido a dois ou mais agentes nocivos, díspares e autônomos, cada qual em si suficiente para gerar um adicional. Assim, se presentes os agentes insalubre e de risco, simultaneamente, cada qual amparado em um fato gerador diferenciado e autônomo, em tese há direito à percepção cumulativa de ambos os adicionais.
  7. Incensurável, no caso, acórdão de Turma do TST que nega a percepção cumulativa dos adicionais de insalubridade e de periculosidade se não comprovada, para tanto, a presença de causa de pedir distinta.
  8. Embargos do Reclamante de que se conhece, por divergência jurisprudencial, e a que se nega provimento.”

(TST, SDI-I, E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064, Redator Ministro: João Oreste Dalazen, Data de Julgamento: 28/04/2016, DEJT 17/06/2016).ra Maria da Costa, DEJT 12.02.2016.

Como se vê, por meio de tal julgamento a SBDI-I deixou margem para entendimento de que é possível a cumulação de adicionais motivada por fatos geradores distintos, isto é, se a causa de pedir é distinta cabe acumulação, mas não é possível a cumulação fundada no mesmo fato gerador.

No entanto, em julgado mais recente, a SBDI-I do TST passou a adotar a impossibilidade de cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade, mesmo que motivada por fatos geradores distintos, conforme jurisprudência abaixo transcrita:

“Adicional de insalubridade e de periculosidade. Fatos geradores distintos. Cumulação. Impossibilidade. O art. 193, § 2º, da CLT veda a cumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade, podendo, no entanto, o empregado fazer a opção pelo que lhe for mais benéfico. Sob esses fundamentos, a SBDI-I decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso de embargos, por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, dar-lhe provimento para excluir da condenação a possibilidade de acúmulo dos dois adicionais. Vencidos os Ministros Augusto César Leite de Carvalho, João Oreste Dalazen, José Roberto Freire Pimenta, Hugo Carlos Scheuermann, Alexandre de Souza Agra Belmonte e Cláudio Mascarenhas Brandão, que negavam provimento aos embargos para manter o pagamento cumulado dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, sob o fundamento de que a exposição do individuo a um determinado tipo de risco não exclui a sua eventual exposição a outro risco diferente, ante a existência de fatos geradores e causa de pedir distintas.” (TST-E-RR-1072-72.2011.5.02.0384, SBDI-I, rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, 13.10.2016) (Informativo TST nº 134)

Pelo que se extrai desse julgado, a SBDI-I do TST está entendendo que apesar da incorporação das Convenções nos 148 e 155 da Organização Internacional do Trabalho – OIT ao ordenamento jurídico brasileiro, elas não se sobrepõem à norma interna que consagra entendimento diametralmente oposto, aplicando-se tão somente às situações ainda não reguladas por lei.

Atualmente, a matéria está afetada a julgamento sob rito de recursos repetitivos (Incidente de Recurso de Repetitivo nº 239-55.2011.5.02.0319), cujo tema é “Cumulação de adicionais de periculosidade e de insalubridade amparados em fatos geradores distintos e autônomos”, sendo que o relator do processo concedeu prazo para manifestação de interessados.

Em consulta ao andamento processual, é possível constatar que houveram inúmeras petições anexadas ao processo, com pedidos de habilitação de vários órgãos e interessados na manifestação sobre a controvérsia.

Resta aguardar os próximos capítulos desta história e que será decidido no TST.

Alguns críticos enfatizam que há uma tendência de que o TST venha a manter o entendimento pela impossibilidade da acumulação, notadamente em razão do cenário atual de tentativa recorrente de flexibilização de direitos trabalhistas.

 

Conclusão

A acumulação ou não dos adicionais de periculosidade e insalubridade ainda é bastante controvertida na doutrina e jurisprudência.

Os adicionais, típicos complementos salariais, possuem destinações diferentes, mas ante a sua ocorrência no contexto das relações de trabalho eles acabam se entrelaçando, havendo hipóteses em que um mesmo fato pode dar ensejo aos dois adicionais.

Os adicionais de periculosidade e insalubridade são destinados a compensar situações diferentes, pois enquanto o primeiro visa retribuir a exposição permanente a risco acentuado para vida do empregado, o segundo é direcionado para compensar um prejuízo à saúde, e que pode causar dano à condição física do trabalhador.

Sempre houve intensa discussão na doutrina e jurisprudência sobre a possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade.

De modo geral, os defensores da acumulação de adicionais de insalubridade e periculosidade fundamentam o entendimento em uma interpretação evolutiva do artigo 193, §2º da CLT, com lastro no artigo 5º, §2º e artigo 7º, XXII da CF e da Convenção 155 da OIT, que teria sido incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro com status de supralegal idade, pelo que seria possível permitir que os adicionais fossem pagos concomitantemente.

No entanto, não se constata qualquer norma nas Convenções 148 e 155 da OIT que autorize a percepção simultânea dos adicionais de periculosidade e insalubridade, também não há que se falar na revogação do artigo 193, § 2º, da CLT por meio de tais normas.

Quanto a impossibilidade de acumulação de adicionais de periculosidade e insalubridade motivados por causa de pedir única, penso que já há consolidação do entendimento em âmbito jurisprudencial, de modo que esse tende a ser reforçado no julgamento do incidente de recurso repetitivo perante o SBDI-I do TST.

A grande cizânia ainda reside na hipótese de acumulação dos adicionais de periculosidade e insalubridade motivados por fatos geradores distintos e autônomos, o que consubstancia a matéria tema do IRR já mencionado no bojo deste trabalho.

Os entendimentos contrários à acumulação dos adicionais são fundados em uma interpretação literal da disposição celetista, sem permitir qualquer sistematização com os demais dispositivos legais.

Considerando a relevância do meio ambiente de trabalho e da proteção da saúde e segurança do trabalhador, resta claro que a norma proibitiva contida na CLT deve ser compatibilizada com a Constituição Federal, de modo a privilegiar a máxima efetividade dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

Assim, fazendo uso de uma interpretação teleológica e consentânea com o texto constitucional, a norma do art. 193, § 2º, da CLT conduz à conclusão de que a opção dada ao empregado, em relação à percepção de um ou de outro adicional, somente deve ser aplicada ao pagamento dos adicionais de insalubridade e de periculosidade decorrentes de uma única causa de pedir.

Entendo que a causa de pedir única deve implicar no pagamento de apenas um adicional, até porque é esta a opção manifestada pelo legislador.

Não bastasse isso, é fato que alguns ramos do direito enfatizam a vedação do bis in idem, como no Direito Penal e no Direito Tributário, pelo que a pessoa não é punida ou cobrada pelo mesmo fato.

Pela técnica do diálogo das fontes, o Direito do Trabalho também pode se utilizar deste entendimento, pelo que na hipótese do mesmo fato gerador, não haveria como determinar pagamento simultâneo dos adicionais.

Lado outro, ao obrigar o trabalhador a optar por um dos adicionais diante de fatos geradores distintos e autônomos, é como se a lei exigisse que ele trabalhasse em situação mais gravosa sem qualquer contraprestação, o que resulta em manifesto desequilíbrio da relação contratual.

É como se a legislação concedesse uma proteção equivocada para uma disparidade, pois a pessoa trabalharia com exposição a agentes insalubres e perigosos decorrentes de fatos geradores distintos e autônomos de forma simultânea, sem a devida contraprestação.

Portanto, havendo fatos gerados distintos e autônomos, penso que não há vedação à percepção simultânea dos adicionais de insalubridade e periculosidade.

 

Referências

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BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 9. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

CAIRO JÚNIOR, José. Curso de Direito do Trabalho: Direito Individual e Coletivo do Trabalho. 2ª Ed. Bahia: Editora JusPODIVM, 2008.

CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 31 ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

CASSAR, Volia Bomfim. DIREITO DO TRABALHO. 11ª ed. Sâo Paulo: Método, 2015.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 15. ed. São Paulo: LTr, 2016.

GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 2 ed. São Paulo: Método, 2008.

MARTINEZ, Luciano. Curso de Direito do trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual Esquemático de direito e processo do trabalho. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O controle jurisdicional da convencionalidade das leis. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 10. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 32 ed. São Paulo: Atlas, 2016.

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 6 ed. São Paulo: LTr, 2011.

PINTO, José Augusto Rodrigues. Tratado de direito material do trabalho. São Paulo: LTr, 2007.

RESENDE, Ricardo. Direito do trabalho esquematizado. 6. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016.

SILVA, Homero Batista Mateus da. Curso de Direito do trabalho aplicado: parte 1. 1. Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

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