A incorporação da Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes pelo Estado Brasileiro em consonância com a Justiça Global

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Resumo:  O presente estudo reflete a importância maior do reconhecimento dos Direitos Humanos no âmbito internacional, enfatizando a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, buscando por meio de topicos dispostos o mínimo para se compreender a sistemática proposta pelo tema. Inicia-se destacando os pressupostos filosóficos dos direitos humanos, dispondo acerca dos pensamentos de Immanuel Kant, uma vez que a ele atribui-se o primeiro enunciado acerca do princípio da dignidade humana, que por sua vez, está fortemente ligado aos Direitos Humanos. Trata-se da temática Direito Internacional dos Direitos Humanos referenciando questões concernentes a Declaração dos Direitos do Homem, a Justiça Global, adentrando na essência da Convenção contra a Tortura estudada, finalizando com comentários sobre o Brasil e os Direitos Humanos.


Palavras Chave: Tortura, Justiça Global, Direitos Humanos


Abstract: This study reflects the greater importance of the recognition of human rights internationally, emphasizing the Convention against Torture and other Cruel, Inhuman or Degrading treatment, searching through the topics arranged, the least to understand the methodology proposed by the theme. It begins by highlighting the philosophical assumptions of human rights, offering about the thoughts of Immanuel Kant, given that it assigns to him the first statement about the principle of human dignity, which in turn is strongly linked to human rights. We studied the theme of International Human Rights Law referring questions concerning the Declaration of Human Rights, Global Justice, into the essence of the Convention against studied Torture, concluding with comments about Brazil and Human Rights.


Keywords: Torture, Global Justice, Human Rights.


Sumário: 1. Precedentes filosóficos/históricos dos Direitos Humanos. 2. A Justiça Global e o Direito Internacional dos Direitos Humanos. 3. A Declaração Universal dos Direitos Humanos. 4. A Convenção contra a tortura e o Estado Brasileiro. 5. Principais abordagens da Convenção contra a Tortura. 6. O Brasil e os Direitos Humanos. 7. Considerações Finais. Referências bibliográficas.


1. Precedentes filosóficos/históricos dos Direitos Humanos


Não há como se tratar da tortura sem antes adentrarmos na temática dos direitos humanos, tendo em vista a ligação umbilical entre ambos. Desta forma, entende-se por direitos humanos aqueles direitos fundamentais da pessoa humana, pois sem eles esta não é capaz de existir nem de se desenvolver e participar plenamente da vida. Todavia, não é por demais afirmar que os direitos humanos representam as mínimas condições necessárias para que uma pessoa possa ter uma vida digna, ou ainda, o fato deles corresponderem às necessidades essenciais da pessoa humana, fundamentando-se para tanto na idéia de dignidade humana.


Atribui-se a Immanuel Kant, insigne filósofo alemão, indiscutivelmente um dos pensadores mais influentes da era moderna, a clássica formulação do princípio da dignidade da pessoa humana, em sua obra intitulada “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”(1785), que tem como título original em alemão: Grundlegung zur Metaphysik der Sitten. Por certo, tal atribuição se dá pelo fato de Kant ter sido o primeiro teórico a reconhecer que ao homem não se pode atribuir valor – leia-se preço – justamente na proporção em que se deva considerar como um fim em si mesmo e em virtude da sua autonomia enquanto ser racional.


Vê-se que é na liberdade intrínseca aos seres humanos, enquanto entes racionais submetidos a leis morais – personalidade humana – que funda-se toda a sistemática internacional de proteção aos direitos humanos, sendo esta a razão maior pela qual se identifica no pensamento de Kant (1785), a base para a construção da contemporânea filosofia dos direitos humanos.


Evidencia-se que toda a sistemática internacional que destaca a proteção dos direitos humanos se perfaz como uma flagrante tentativa de proporcionar uma restauração do paradigma da modernidade jurídica diante da ruptura do fenômeno totalitário. Desta feita, a concepção kantiana acerca da dignidade se perfaz como essencial à atribuição de um significado jurídico ao termo, e por certo, para se determinar o sentido do alcance do tão aclamado princípio da dignidade da pessoa humana.


Kant (1975) enfatiza que a dignidade é o valor de que se reveste tudo aquilo que não detém preço, desta forma, não é passível de ser substituído por algo equivalente, portanto, conclui-se que a dignidade é uma qualidade inerente aos seres humanos enquanto entes morais e por conseqüência é absolutamente inseparável da autonomia para o exercício da razão prática, motivo pelo qual apenas os seres humanos revestem-se dessa qualidade.


Vê-se que o legado máximo do pensamento kantiano para a filosofia dos direitos humanos se dá por meio da igualdade na atribuição da dignidade (1975). Desta feita, no momento em que a liberdade no exercício da razão prática seja o único requisito para que um ente seja revestido de dignidade, gozando todos os seres humanos dessa autonomia, a condição humana atinge o suporte fático suficiente e necessário à dignidade, o que independe de qualquer tipo de reconhecimento social.


Há que se salientar, porém, que apesar do inegável destaque científico feito por Kant acerca da dignidade humana, a primazia da sua análise deve ser atribuída a Beccaria que em sua obra “Dos Delitos e das penas” (1764) asseverou que “não haverá liberdade sempre que as leis permitirem que, em certas circunstâncias, o homem deixe de ser pessoa e se torne coisa”.


Cesare Beccaria (1764) na da obra destacada argumentou com propriedade acerca da irracionalidade da tortura como pena e meio de investigação, afirmando de forma veemente que “a tortura não é condenável apenas porque é desumana, mas porque é ineficiente e estúpida”.


Beccaria (2000, p.40) destaca ainda:


“Efetivamente, o inocente submetido à tortura tem tudo contra si: ou será condenado por confessar o crime que não cometeu, ou será absolvido, porém após ter passado por tormentos que não mereceu. Os culpados, ao contrário, tem por si um conjunto favorável; será absolvido se souber suportar a tortura com coragem, e fugirá aos suplícios que pesavam sobre si, sofrendo após ter passado por tormentos que não mereceu.”


Foucault (2001, p.30), por sua vez, ilustra a tortura como sendo uma forma de dominação sobre o corpo, através da produção de certa quantidade de sofrimento que se possa, se não medir exatamente, ao menos apreciar, comparar e hierarquizar.


2. A Justiça Global e o Direito Internacional dos Direitos Humanos


A justiça global, quando da conceituação na seara filosófica política, deriva da constante máxima de que não vivemos em um mundo minimamente justo, igualitário, onde muitas pessoas sofrem com a pobreza extrema enquanto que outras são detentoras de luxos desnecessários; muitos seres humanos são desgraçadamente submetidos a regimes estatais injustos e desumanos, sendo expostos às mais diversas formas de violência gratuita, como ocorre com a tortura.


A partir da Primeira Guerra Mundial a sistemática estatal tem se transformado substancialmente por meio da globalização, dando vazão à criação de instituições políticas e econômicas supranacionais, conforme se observa com as Nações Unidas, as Sociedades das Nações, dentre outras. Ainda, no mesmo período e em especial na década de 1970 a justiça global se converteu em um tema primordial para a filosofia política, mudando preceitos e paradigmas estatais.


Desde a Idade Moderna até os dias atuais a instituição política preeminente se traduz no estado soberano, que na maioria das vezes clama pelo uso legítimo da violência “intramuros” daqueles que são submetidos à sua tutela. Nesse mesmo período o interesse dos filósofos políticos na justiça se direcionou quase que somente nos temas de ordem doméstica, sem se preocuparem com o âmbito internacional, deixando para um segundo plano a justiça nas relações entre os estados e entre indivíduos posicionados do outro lado das fronteiras estatais, o que não é compreensível.


Nota-se que em um debate essencialmente contemporâneo acerca da justiça global, a temática geral da imparcialidade entre estados atinge o cerne do significado moral que trata dos limites da cidadania e ainda, da chamada cidadania compartilhada.


Basicamente três são as preocupações centrais que definem o debate acerca da justiça global na atualidade, sendo elas: as instituições, a justiça distributiva e o alcance da justiça. Como vivemos em um mundo essencialmente globalizado, a sociedade internacional cobra cada dia mais uma posição ética baseada na justiça equânime dos atores internacionais.


Há que se destacar que a coordenação de relações entre três ou mais Estados em conformidade com um conjunto de princípios, o chamado multilateralismo, representa um importante passo no processo de institucionalização das relações internacionais.


O Direito Internacional dos Direitos Humanos que tem uma importância filosófica e histórica maior do que a justiça global, pois esta precede aquele, pode ser definido como sendo aquele que visa proteger todos os indivíduos, qualquer que seja a sua nacionalidade, sendo o mesmo positivado em tratados, convenções ou costumes internacionais, logo, são direitos que já ascenderam ao patamar do direito internacional público.


Nas palavras de Hannah Arendt (1979), “[…] os direitos humanos não são um dado, mas um construído, uma invenção humana, em constante processo de construção e reconstrução.


Norberto Bobbio (1988, p.30), por sua vez, destaca que “[…] os direitos humanos nascem como direitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particulares (quando cada Constituição incorpora Declarações de Direito), para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos positivos universais”.


A sistemática universal de proteção dos direitos humanos foi concebida aos poucos, na medida em que a questão desses direitos adquiriu tratamento internacional. A internacionalização, por sua vez, se deu principalmente por meio da declaração de direitos em instrumentos específicos que levaram logo à frente ao estabelecimento de instituições e mecanismos para a sua garantia.


A internacionalização da proteção dos direitos em questão é um fenômeno recente, que se iniciou após a Segunda Guerra Mundial. Os abusos perpetrados contra os indivíduos naquela guerra impulsionaram a criação de normas e princípios concernentes em assegurar o respeito à dignidade humana, bem como a responsabilização dos Estados no plano internacional.


A Organização das Nações Unidas, criada à época para diligenciar pela paz e segurança mundial é que deu início ao movimento, que no âmbito da ONU desenvolveu instrumentos de proteção aos direitos humanos dando forma a uma sistemática normativa internacional e universal de proteção desses direitos.


Os principais instrumentos são a Carta das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos do Homem e os Pactos e Tratados temáticos internacionais, que são frutos de uma codificação das regras de proteção.


Fato é que a proteção dos direitos humanos vem se consolidando como uma questão de cunho supranacional, o que implica na discussão acerca da revisão do conceito tradicional de soberania absoluta do Estado, que, conforme a maioria majoritária dos doutrinadores que tratam do tema acabou sendo relativizada quando os tratados e convenções regionais e internacionais passaram a permitir a intervenção de organismos criados pelas Nações no âmbito nacional visando a proteção efetiva dos direitos humanos.


É notório que a cada tratado internacional celebrado entre os Estados-nações há um vertiginoso crescimento na aplicação do princípio da universalidade ou da justiça mundial para os delitos que atentem contra os bens jurídicos tutelados pelo Direito Internacional.


Dentre esses instrumentos disponibilizados para a proteção dos direitos humanos cabe-nos destacar a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes, temática do presente estudo.


3. A Declaração Universal dos Direitos Humanos


A Declaração Universal dos Direitos do Homem, datada de 10 de dezembro de 1948, é composta por 30 artigos, além do preâmbulo, e constitui o primeiro instrumento de âmbito geral de direitos humanos adotado por uma organização internacional.


Em uma análise perfunctória, vemos primeiramente que a respectiva Declaração(1948) determina direitos que pertencem a todas as pessoas, independentemente de limitações por quaisquer características, tais como: nacionalidade, raça, sexo, cor ou religião. Desta feita, incorpora-se a idéia de universalidade de direitos e liberdades pertencentes aos seres humanos e decorrentes de sua própria existência.


Em seguida, observa-se ainda que a mesma reúne direitos e liberdades de diferentes categorias, que se complementam e traduzem o ideal de dignidade humana. Logo, a priori, temos que a Declaração (1948) garante direitos e liberdades de caráter individual, e em seguida, vemos o reconhecimento dos direitos do indivíduo no mundo e, sobretudo nos grupos sociais aos quais pertence.


Mais à frente, destaca-se o reconhecimento dos direitos e liberdades espirituais, políticos e civis. Seguidamente, vislumbra-se os direitos econômicos, sociais e culturais, elevando o direito à seguridade social a um nível de vida pautada na dignidade.


Finalmente, é imposto um direito de todos a uma ordem social e internacional na qual os direitos e liberdades previstos sejam efetivados de forma plena.


O caráter universal e a indivisibilidade dos direitos humanos foram confirmados de forma expressa na Declaração de Viena (1993), quando da Conferência Mundial de direitos de Viena, onde destacamos o parágrafo 5º:


“Todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. A comunidade internacional deve tratar os direitos humanos globalmente, de maneira justa e equânime, com os mesmos parâmetros e com a mesma ênfase. As particularidades nacionais e regionais e bases históricas, culturais e religiosas devem ser consideradas, mas é obrigação dos Estados, independentemente de seu sistema político, econômico e cultural, promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais.”


Posteriormente foram elaborados tratados internacionais com força vinculante para os Estados, hábeis a determinar o exercício dos direitos e liberdades consagrados na Declaração Universal (1948).


Nota-se que nas últimas décadas a codificação acerca da proteção internacional dos direitos humanos tem se intensificado. Em que pese existirem amplos instrumentos de proteção desses direitos, vamos nos ater a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, temática deste trabalho.


Reafirmamos a existência de grande número de instrumentos referentes à proteção dos direitos humanos no sistema universal, com temas e circunstâncias específicas.


4. A Convenção contra a tortura e o Estado Brasileiro


Em uma dimensão individualizada dos vários crimes de violação dos direitos humanos, pode-se afirmar que a tortura é a que mais traz desconforto e repugnância à sociedade ética contemporânea, por isso, a necessidade de se formalizar a convenção ora destacada. Estudiosos do tema destacam que após as convenções direcionadas a erradicação da escravidão e de combate ao genocídio, que em tempo, são de natureza coletiva, a Convenção Contra a Tortura e outros Tratamentos Desumanos ou Degradantes (1984) destaca-se como sendo a primeira grande convenção especializada contra um tipo particularizado de violação.


A referida convenção foi adotada pela ONU no dia 28 de setembro de 1984 e define em seu art. 1º a tortura como sendo:


“[…] qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de uma terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou uma terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido, de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência.”


Nota-se que a definição de tortura destaca três elementos essenciais para a configuração da prática: 1- a inflição deliberada de dor ou sofrimentos físicos ou mentais; 2- a finalidade do ato, ou seja, a obtenção de informações ou confissões, o ato de se aplicar o castigo, a intimidação ou coação e qualquer outro motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; 3- a vinculação do agente ou responsável, direta ou indiretamente com o estado, sendo este um importante diferencial.


Não podemos deixar de citar que no sistema interamericano de proteção dos direitos humanos adotou-se a Convenção Interamericana para prevenir e punir a tortura no dia 09 de dezembro de 1985, reforçando ainda mais o dever imposto aos Estados de prevenir a punir esse flagelo. É curioso observar que a definição de tortura prevista nos artigos 2º e 3º dessa convenção são basicamente os mesmos previstos na convenção da ONU contra a tortura, o que nos leva a concluir que também compreende os três elementos supramencionados.


5. Principais abordagens da Convenção contra a Tortura


A Convenção Contra a Tortura divide-se em três partes, sendo que a primeira refere-se aos sujeitos ativos e passivos da tortura, sua definição e as medidas a serem tomadas pelos estados que a ela aderirem; a segunda trata de forma pontual do chamado “Comitê”, onde define a formação de um Comitê contra a tortura e seu modo de agir, membros, duração do mandato, relatórios, dentre outros; a terceira e última parte cuida da adesão dos estados-partes à Convenção, bem como emendas que possam vir a sugerir.


Logo de início a Convenção destaca que a tortura praticada em determinado estado por meio de seus funcionários públicos ou por outra pessoa no exercício de funções públicas, ou ainda, por sua instigação, consentimento ou aquiescência, por se tratar de uma prática condenável e de conseqüências graves e flagrantemente cruéis ao ser humano, deve ser reprimida por leis nacionais com rigor e de forma efetiva.


O Brasil, por meio da Lei n.º 9.455/1997 definiu os crimes de tortura, sendo este lei o principal instrumento de combate a tortura a nível nacional, propiciando mecanismos de implementação em conformidade com o que dispõe expressamente o art. 1º da Convenção contra a Tortura.


A Convenção destaca a jurisdição compulsória ao conclamar todos os estados a adotarem as medidas necessárias para impedir a prática de atos de tortura em seus territórios, destacando que em nenhum caso será permitido o estado aderente invocar circunstâncias excepcionais como ameaça ou estado de guerra, instabilidade pública interna ou qualquer outra emergência como justificativa para a prática da tortura.


Como medida concreta de proteção ao ser humano, o documento determina ainda que nenhum estado parte poderá expulsar, devolver ou extraditar determinada pessoa para outro estado quando houver fundadas razões para se crer que aquela pessoa poderá ser submetida a tortura no estado solicitante.


Visando uma justiça igualitária, a Convenção destaca que o suposto autor do crime de tortura deverá receber todas as garantias de tratamento justo em todas as fases do processo, logo, todos os princípios constitucionalmente consagrados pelo estado brasileiro deverão ser observados.


O estado que aderir à Convenção tem por obrigação observar o princípio da universalidade, onde todo aquele que praticar tortura poderá ser extraditado, mesmo que não haja Tratado entre as nações envolvidas, uma vez que a própria Convenção servirá de base legal para a extradição.


Vale destacar ainda que o artigo 14 da Convenção garante à vítima de tortura o pleno direito à reparação e indenização justa e adequada, incluindo-se os meios necessários para a mais completa reabilitação, e no caso de morte da vítima, seus dependentes é que terão direito à indenização.


6. O Brasil e os Direitos Humanos


A promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 1988 caracteriza-se como um marco temporal concernente ao reconhecimento de obrigações internacionais quando se trata de direitos humanos no país, e ainda, quando da inserção dos sistemas internacionais de garantia e proteção desses direitos.


A Lei Maior (1988) consagra a dignidade humana como um valor intrínseco ao estado brasileiro e norteador de toda interpretação e compreensão da sistemática constitucional.


O artigo 1º determina que a cidadania e a dignidade da pessoa humana são fundamentos da República Federativa do Brasil. O artigo 3º, por sua vez, destaca que os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil são: “[…] erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais[…]” e “[…] promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.


O artigo 4º destaca-se quando define os princípios que regem o Estado brasileiro em suas relações internacionais e inclui entre eles a “prevalência dos direitos humanos”.


A regra disposta no § 2º do artigo 5º da Carta Magna se mostra determinante quanto à inserção do país na dinâmica da proteção internacional dos direitos humanos, vejamos: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.


Outro dispositivo determinante na sistemática constitucional brasileira está contido no § 1º do artigo 5º da Constituição Federal, onde proclama a aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais no país, e conseqüentemente, essas normas deverão ser aplicadas de forma direta e máxima pelos poderes públicos constantes no território nacional.


O Direito Internacional dos Direitos Humanos tem incorporação automática pelo direito brasileiro, não sendo necessário um ato jurídico complementar para a sua exigibilidade e implementação, o que traz conseqüências relevantes no plano jurídico, pois de um lado, permite-se ao particular invocar diretamente os direitos e liberdades assegurados no âmbito internacional, e, de outro lado, proíbe-se literalmente condutas e atos violadores a esses mesmos direitos, sob pena de invalidação.


Dito isso, os tratados e convenções concernentes aos direitos humanos ratificados pelo Brasil são passíveis de imediata invocação pelos brasileiros, sem que se faça necessário editar qualquer ato cogente para sua vigência interna, como é o caso da Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes e conseqüentemente, a partir da entrada em vigor do tratado internacional, toda norma preexistente que seja com ele incompatível perde sua vigência de forma automática.


7. Considerações Finais


Por todo o exposto, entendemos ser de suma importância o acompanhamento permanente dos direitos humanos devidamente reconhecidos na seara internacional, evitando divergências outras que possam levar determinado indivíduo a ter sobrestado o seu direito de viver com o mínimo de dignidade. Por fim, exaltamos os dispositivos colacionados na Constituição Federal Brasileira, onde dispõe de forma clara e inquestionável a proteção absoluta dos direitos humanos em nossa pátria, sendo fato incontroverso que a temática relacionada à proteção dos direitos humanos está inserida de forma definitiva na agenda internacional e no Brasil. No que tange à Convenção contra a Tortura, esta deve ser observada com rigor pelas autoridades brasileiras, que tem o dever de evitar essa prática insensata por meio de seus agentes públicos, sendo que no caso de se constatar algum “deslize” deve-se de pronto restaurar a ordem com a punição exemplar prevista no diploma legislativo.


 


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Informações Sobre o Autor

Euripedes Clementino Ribeiro Junior

Advogado. Professor de Direito Penal e Direito Processual Penal na graduação PUC-GO e Faculdades Alves Faria ALFA e Pós-Graduação UniEvangélica e Faculdade Montes Belos. Especialista em Direito Penal UFG-GO. Mestre em Direito Relações Internacionais e Desenvolvimento PUC-GO


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