Cláusulas abusivas nos contratos de adesão: o enriquecimento ilícito dos fornecedores versus o superendividamento dos consumidores

Resumo: O presente artigo tem por objetivo demonstrar que a inserção de cláusulas abusivas nos contratos de adesão pelos fornecedores de produtos e/ou serviços ocasiona o seu enriquecimento ilícito as custas dos consumidores, como nas hipóteses de cobrança de juros, multas e preços extorsivos. Em contrapartida, esse comportamento ilícito dos fornecedores contribui para o superendividamento dos consumidores – dívidas impagáveis, sem crédito para saldá-las – impossibilitando-os de consumir e até mesmo em algumas situações de retornarem ao mercado de consumo. Assim, caso os fornecedores não mudem essa postura ilícita quanto à inserção de cláusulas abusivas nos contratos de adesão sofrerão com as consequências dos seus próprios atos, vez que o superendividamento do consumidor retirar o seu poder de compra e sem crédito para o consumo de produtos e serviços não há lucro para os fornecedores – crédito e consumo andam vinculados na economia de mercado.

Palavras-chave: Cláusulas – Abusivas – Enriquecimento – Ilícito – Fornecedores – Superendividamento – Consumidores

Abstract: This article aims to demonstrate that the inclusion of abusive clauses in adhesion contracts by suppliers of products and/or services causes their illicit enrichment at the expense of consumers, as in the cases of interest charges, fines and extortionate prices. On the other hand, this illicit behavior from suppliers contributes to the super indebtedness of consumers – unpayable debts without credit to pay them off – making it impossible for them to consume and, even in some situations, to return to the consumer market. So if the suppliers do not change this illicit stance on the inclusion of unfair terms in adhesion contracts, they will suffer the consequences of their own acts, as the consumer super indebtedness withdraw their purchasing power and, without credit to consume products and services, there will be no profit for suppliers – once that credit and consumerism go together in the economy market.

Keywords:  Abusive Clauses – Illicit enrichment – Suppliers – Super Indebtedness – Consumers – Consumerism

Sumário: 1. Introdução – 2. Os Contratos de Adesão – 3.  As Cláusulas Abusivas – 4. Enriquecimento Ilícito dos Fornecedores versus o Superendividamento dos Consumidores – Conclusão.

“A mais louca e mais desprezível de todas as classes humanas é a dos mercadores. Ocupados o tempo todo com o vil amor ao lucro, empregam, para satisfazê-lo, os meios mais infames. A mentira, o perjúrio, o roubo, a fraude e a impostura preenchem sua vida inteira; apesar disso, acreditam que seu dinheiro deve fazê-los passar pelos homens mais importantes do mundo” – Erasmo de Roterdã, filósofo e teólogo em 1508.[1]

1. Introdução:

A crise atualmente enfrentada no Brasil causada pela instabilidade político-econômico ocasionou uma retratação no consumo e com isso um prejuízo econômico considerável nas indústrias e no comércio que não atingiram as suas margens de lucro e para manterem em andamento suas atividades de produção e circulação de produtos e serviços cortaram gastos e demitiram seus funcionários.

Aspecto preocupante constatado no mercado brasileiro tem sido a adoção de condutas ilícitas pelos fornecedores de produtos e/ou serviços ao inserirem cláusulas contratuais abusivas nos contratos de adesão, como forma de enriquecimento ilícito, valendo-se da vulnerabilidade informacional, jurídica, econômica e técnica do consumidor que encontra-se em posição de desvantagem em relação ao fornecedor, pois este muitas vezes amparado por uma consultoria jurídica e contábil adota posturas estratégias abusivas e ilegais para beneficiar-se do despreparo e do desconhecimento do consumidor.

A título exemplificativo, podemos citar como cláusulas abusivas : as que preveem imposição de multas rescisórias superiores a 10%; multas por inadimplemento superiores a 2%; juros contratuais extorsivos superiores a 2% ao mês (salvo as financeiras que estão autorizadas a tal cobrança); impõem a perda de todas as parcelas pagas no caso de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel; entre outras.

Essa prática infelizmente tem crescido na sociedade de consumo pelo fato das cláusulas no contrato de adesão de produtos e/ou serviços serem elaboradas unilateralmente pelos fornecedores sem que haja a participação do consumidor, e ainda, a falta de fiscalização pelos órgãos administrativos e pelo Ministério Público tem facilitado à disseminação dessa conduta abusiva e ilícita no mercado de consumo de massa.

Nesse cenário nos deparamos com o seguinte dilema: o consumidor evita adquirir produtos e serviços temeroso em assumir despesas ante a situação de incerteza econômico-político; e também não gasta por que não pode ou por não ter com o que gastar, encontrando-se numa situação de superendivdamento.

O Ilustre historiador Eric Hobsbawm ao explicar as consequências da política de mercado assim manifesta-se:

“(…) há coisas que o mercado não consegue prover”. Justamente aquelas que nos tornam humanos – e física e psicologicamente saudáveis – e estruturam a Sociedade e o Social: Amizade, Amor, Compaixão, Caridade, Voluntarismo, Filantropia entre outras…E que não tem etiquetas de preço e não podem ser compradas”.[2]

Se os consumidores não gastam as empresas continuam sem lucrar para a produção, agravando-se a crise econômica cada vez mais, e ainda, os consumidores sofrem com a alta dos juros, dos preços de produtos e serviços, ocasionados pela inflação do mercado.

Conforme ensinamento de Alain Touraine a respeito da crise global vemos que:

“O que sabemos é que a crise é global, que ela destruiu todos os interesses particulares e impôs a todos a lei impessoal do lucro máximo. É acima do mundo social que devemos, pois, descobrir uma força de resistência contra um poder que emana ele mesmo de forças que destroem a vida social e política: a globalização da atividade econômica e a lógica do lucro”.[3]

A crise econômica exige também do consumidor a readequação dos seus gastos e despesas, e com isso a rescisão de contratos de adesão cativos de longa duração, tais como: seguro-saúde, academias, telefonia, TV a cabo, entre outros, mas infelizmente em muitas situações o corte de gastos não é suficiente; o consumidor assume empréstimos perante as instituições financeiras, que tornam-se impagáveis, agravando ainda mais a sua condição econômica colocando-o à margem do mercado de consumo tornando-o escravo de suas dívidas, e ainda, impedido de retornar ao mercado de consumo em decorrência do seu superendividamento.

Ao tratar do superendividamento a Ilustre Profª Joseane Suzart Lopes da Silva apresenta a seguinte posição:

“Nos tempos pós-modernos, o fornecedores se utilizam de toda espécie de manobra para fazer com que os sujeitos sejam estimulados ao consumo excessivo de diversos itens, gerando desgastes financeiros que ultrapassam os meandros da normalidade e que exigem um olhar mais cuidadoso por parte do Pode Legislativo (…)”.[4]

 A análise do superendividamento dos consumidores pessoas físicas torna-se imprescindível no sentido de combatermos as atitudes ilícitas dos fornecedores para com os consumidores no mercado, pois a inserção de cláusulas abusivas no contratos de adesão contribui para o superendividamento do consumidor, e consequentemente para a retração do mercado de consumo e da economia.

2 . Os Contratos de Adesão:

Os contratos de adesão[5] também conhecidos como contratos padronizados surgiram a partir da Revolução Industrial entre 1760 a 1850, com a automação das indústrias há um crescimento na produção de produtos e serviços – devido a isso aumenta o consumo em massa – mas o uso e a aplicação desses contratos em larga escala constatou-se após a Segunda Guerra Mundial, os fornecedores com o objetivo de lucrar demasiadamente padronizam os contratos de prestação de produtos e serviços através de cláusulas contratuais preestabelecidas, de modo a desestimular o consumidor (contratante) a discutir tais cláusulas; e ainda, de uniformizar os modelos contratuais para que todos os consumidores indistintamente recebessem o mesmo tratamento contratual (contratos de massa ou massificação dos contratos), e com isso acelerar no mercado de consumo a prestação de produtos e serviços para que os Países atingidos pela guerra se reestruturassem com mais rapidez e eles fornecedores atingissem lucros vertiginosos com essa situação.

Ao explicar as consequências da industrialização, o historiador Eric Hobsbawm assim manifesta-se:

““Nenhuma mudança na vida humana, desde a invenção da agricultura, da metalurgia e do surgimento das cidades no Neolítico, foi tão profunda como o advento da industrialização”. Afinal, foi esse fenômeno que tornou possível a construção de uma sociedade da Mercadoria, uma sociedade do Consumo; inimaginável até então””.[6]

Apesar dos benefícios ocasionados pelos contratos de adesão aos fornecedores – o aumento do lucro, a massificação dos contratos e a agilidade do mercado de consumo – constatou-se por outro lado, prejuízos aos consumidores que por não discutirem as cláusulas unilateralmente impostas pelos fornecedores viam-se obrigados a concordarem e, por isso tornou-se necessário prever um mecanismo de proteção aos consumidores diante da impossibilidade de discutirem as cláusulas contratuais a eles impostas, sendo assim criadas as denominadas cláusulas abusivas.

Nas palavras da Profª Cláudia Lima Marques os contratos de adesão apresentam as seguintes características:

“Este método “por adesão” – por assim dizer – pereniza a assimetria de forças da fase antes chamada de “negociação” e impede uma verdadeira comuniação (comum-i-car, tornar comum) entre os futuros parceiros. Esta forte unilateralidade, tanto nas práticas comerciais pré-contratuais e no marketing unilateral, quanto na autonomia (auto-nomos, se autodeterminar/modelar) de estipular por si – ou em conjunto – o conteúdo do contrato, pereniza esta simetria de forças entre os dois contratantes da fase de contratação para todo o contrato, pela própria simples “adesão”. Se esta estandardização dos contratos (de adesão) é uma facilidade típica de nossa sociedade de massa, isso significa para o contratante profissional um aumento de sua “eficiência” na distribuição de produtos e serviços, mas significa para o contratante leigo ou mais fraco um aumento de seu déficit informacional. Diminui, também, a possibilidade de “autoprogramação” dos contratantes mais fracos, pois o “programa contratual” já vem determinado e a eles cabe simplesmente a este aderir”[7]

O Código de Defesa do Consumidor ao estabelecer as cláusulas abusivas tem por finalidade limitar a atuação dos fornecedores na elaboração das cláusulas contratuais, concedendo garantias e equilíbrio aos consumidores nos contratos, sejam eles de adesão[8] ou paritários – onde as cláusulas são discutidas e elaboradas em conjunto pelos contratantes.

3. As Cláusulas Abusivas:

Ao tratarmos das cláusulas abusivas importante ressaltar o direito básico do consumidor previsto no art. 6º, inciso IV[9] do CDC, que o protege contra qualquer tipo de abuso nas relações de consumos, e ainda, o art. 51[10] do CDC, que apresenta um rol exemplificativo de situações consideradas como cláusulas abusivas, e que uma vez verificadas nos contratos de consumo, podem ser conhecidas de ofício pelo juiz e invalidadas por nulidade, salvo quando tais cláusulas forem previstas em contrato bancário – o juiz não poderá conhecê-las de ofício, conforme previsto na Súmula 381[11] do STJ, tal posicionamento extremamente criticado pela doutrina, destoa por completo da finalidade e do caráter protetivo das cláusulas abusivas.

As cláusulas abusivas são conceituadas pelo Ilustre Profº. Nelson Nery Júnior nos seguintes termos:

“Nesse sentido, cláusula abusiva é aquela que é notoriamente desfavorável à parte mais fraca na relação contratual, que, no caso de nossa análise, é o consumidor, aliás, por expressa definição do art. 4º, nº 1, do CDC. A existência de cláusula abusiva no contrato de consumo torna inválida a relação contratual pela quebra do equilíbrio entre as partes, pois normalmente se verifica nos contratos de adesão, nos quais o estipulante se outorga todas as vantagens em detrimento do aderente, de quem são retiradas as vantagens a quem são carreados todos os ônus derivados do contrato”.[12]

O Código de Defesa do Consumidor ao tratar as cláusulas abusivas em seu art. 51, elenca XVI incisos, sendo que o inciso V (segundo as circunstâncias, e em particular, segundo a aparência global do contrato, venham, após sua conclusão, a surpreender o consumidor) foi vetado pelo Presidente da República, este inciso previa a chamada cláusula surpresa, que mesmo sendo vetado, poderá ser considerado como cláusula abusiva, eis que viola os princípios da boa-fé e da informação nas relações de consumo. Assim são cláusulas abusivas as que:

a) Impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis (inciso I) – a cláusula contratual que exonera o fornecedor de suas responsabilidades perante o consumidor é abusiva, pois, além de gerar um prejuízo (dano) ao consumidor acarreta o enriquecimento ilícito do fornecedor às custas do consumidor. Situação que exemplifica esta abusividade é a Súmula 130 do STJ (A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículos ocorridos em seu estacionamento). Na prática tem-se admitido a limitação da responsabilidade do fornecedor nas hipóteses em que o consumidor for pessoa jurídica e a cláusula sobre responsabilidade tenha sido discutida previamente entre eles; 

b) Subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código (inciso II) – As situações em que o CDC prevê o direito ao reembolso encontram-se descritas nos arts. 18, §1º, II; 19, II; 20,II e 49 (direito de arrependimento) do CDC, em todos esses casos o consumidor terá o direito de ser reembolsado pelo fornecedor de quantias previamente pagas. O fornecedor não poderá eximir-se e reembolsá-lo, ainda que haja cláusula contratual retirando o direito de reembolso do consumidor;

c) Transfiram responsabilidades a terceiros (inciso III) – os danos sofridos pelos consumidores na aquisição de produtos e/ou serviços são de responsabilidade dos fornecedores não podendo eximir-se de seus erros transferindo suas responsabilidades a terceiros estranhos a relação contratual; 

d) Estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade (inciso IV) – Cumpre ressaltar que o §1º do art. 51, nos seus três incisos, complementa o inciso IV do art. 51 do CDC ao elencar exemplificativamente o que seja vantagem exagerada obtida pelo fornecedor em detrimento do consumidor, são elas: “I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;  II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso”[13];

e) Estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor (inciso VI) – O art. 6º, VIII do CDC estabelece a inversão do ônus da prova apenas em favos do consumidor nas hipóteses de verossimilhança da sua alegação ou quando o consumidor for considerado hipossuficiente quando a demonstração e ao exercício de seus direitos no processo; logo pelo CDC a inversão do ônus da prova não poderá ser utilizado em desfavor do consumidor;

f) Determinem a utilização compulsória de arbitragem (inciso VII) – é possível que o consumidor e o fornecedor utilizem-se da via arbitral para a solução de possíveis conflitos existentes, desde que esta cláusula tenha sido previamente discutida entre partes; o que não pode ocorrer é a imposição da arbitragem ao consumidor sem que este tenha se manifestado previamente quanto à aceitação ou não do uso da via arbitral;

g) Imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor (inciso VIII) – o fornecedor não poderá impor consumidor representante para que este pratique negócios jurídicos em seu nome. A chamada “cláusula mandato” utilizada nas hipóteses em que o consumidor ao ficar inadimplente em contratos bancários, constitui o banco como seu procurador (representante), assinando nota promissória ou letra de câmbio em seu nome, esta prática é considerada nula, tanto assim é que o STJ editou a Súmula 60 (É nula obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste);

h) Deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor (inciso IX) – Esta cláusula é abusiva, pois estamos diante uma condição puramente potestativa, também chamada de condição si voluero (se eu quiser, se me aprouver), esta cláusula gera desequilíbrio e insegurança contratual para o consumidor, pois, se fosse admitida deixaria-o ao puro arbítrio da vontade do fornecedor quanto à conclusão ou não do contrato[14];

i) Permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral (inciso X) – esta cláusula é de igual modo abusiva, pois trata-se de uma condição puramente potestativa, também chamada de condição si voluero (se eu quiser), esta cláusula gera desequilíbrio e insegurança contratual para o consumidor, pois, se fosse admitida deixaria-o ao puro arbítrio da vontade do fornecedor a variação do preço do produto e/ou serviço estipulado no contrato;

j) Autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor (inciso XI) – os contratos consumeristas, em regra, são cancelados mediante acordo entre as partes (distrato) ou por rescisão decorrente de inadimplemento de uma das partes. O cancelamento unilateral somente será admitido quando tal direito for conferido a ambos contratantes – fornecedor e consumidor, mas não será admitido quando concedido este direito apenas ao fornecedor;

k) Obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor (inciso XII) – esta cláusula é abusiva, pois obriga apenas ao consumidor ressarcir o fornecedor no caso de inadimplemento, para que tal cláusula seja válida é necessário que o contrato preveja que o fornecedor também ressarcirá o consumidor na hipótese de seu inadimplemento[15]

l) Autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração (inciso XIII) – esta cláusula é também abusiva, pois trata-se de uma condição puramente potestativa, também chamada de condição si voluero (se eu quiser), esta cláusula gera desequilíbrio e insegurança contratual para o consumidor, pois, se fosse admitida deixaria-o ao puro arbítrio da vontade do fornecedor quanto a modificação do conteúdo ou qualidade do contrato. Imagine a hipótese na qual o consumidor contratou determinada marca de um produto por ser conhecida a sua qualidade e no curso do contrato o fornecedor modifica o contrato para o fornecimento de um produto de marca diversa qualitativamente inferior ao que foi acordado, não resta dúvida quanto à abusividade do fornecedor em face do consumidor;

m) Infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais (inciso XIV) – a preocupação com o meio ambiente e a sua proteção é norma constitucional prevista no art. 225, que possui o seguinte teor: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”; neste caso os contratos consumeristas não poderão conter cláusulas que prejudiquem o meio ambiente, pois é dever do Poder Público e da coletividade defendê-lo, ainda que tais cláusulas sejam benéficas para o consumidor serão consideradas abusivas, pois, a prioridade é a proteção ambiental;

n) Estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor (inciso XV) – esta cláusula demonstra que as cláusulas abusivas previstas no art. 51 do CDC são apenas exemplificativas, vez que o sistema protetivo do consumidor não se resume apenas ao CDC, mas também a outras leis esparsas, tais como: a Lei de Plano de Sáude (9656/98), Lei da Economia Popular (1521/51), Lei dos Crimes contra a Ordem Econômica (Lei 8137/90), entre outras, mas este inciso através de uma norma abrangente resguarda o consumidor de outras abusividades previstas em Lei, além das já elencadas no art. 51 do CDC; 

o) Possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias (inciso XVI) – as benfeitorias necessárias são aquelas consideradas de conservação do bem, ou seja, sua realização é necessária, caso contrário o bem se depreciará, exemplo desta benfeitoria é o conserto do freio de um automóvel zero adquirido pelo consumidor, em virtude de um defeito de fabricação do automóvel no qual não foi realizado o Recall pela fabricante.

As cláusulas abusivas nas relações contratuais de consumo, tem um papel preponderante como limitador de condutas abusivas pelo fornecedor, bem como de caráter protetivo e garantidor para o consumidor – considerado parte vulnerável em relação ao fornecedor, mas na prática tais cláusulas não estão sendo respeitadas pelos fornecedores que se valem da ausência de fiscalização do Ministério Público e dos órgãos administrativos para enriquecer-se às custas do consumidor desconhecedor da lei consumerista, tal conduta contribui para o superendividamento dos consumidores, fenômeno que retira o poder de compra do consumidor, tornando-o escravo de suas dívidas, abstendo-lhe do mínimo existencial para a sua sobrevivência, atingindo a sua dignidade enquanto pessoa humana.

4. Enriquecimento Ilícito dos Fornecedores versus o Superendividamento dos Consumidores:

Podemos conceituar o enriquecimento ilícito como o a apropriação indevida de bens por uma pessoa em detrimento de outra, sem que haja previsão legal para essa atitude. Logo, se o fornecedor estipula cláusulas contratuais abusivas cobrando juros, multas, preços extorsivos, entre outras, ficará caracterizado o seu enriquecimento ilícito.

Como dito anteriormente o uso indiscriminado das cláusulas abusivas nos contratos de consumo pelo fornecedor faz com que este enriqueça-se ilicitamente às custas do consumidor contribuindo tal atitude para a ocorrência do superendividamento.

O superendividamento do consumidor nada mais é do que a situação de endividamento que se encontra a pessoa física de boa-fé que não consegue saldar as suas dívidas em virtude de eventos fortuitos, de força maior ou por atos inconscientes e por isso possui um passivo financeiro significativamente superior ao seu ativo, colocando-a num estado de insolvência civil que impede-o de retornar ao mercado de consumo.[16]

O Profº. Antônio Carlos Efing, ao explicar o superendividamento, distingue os endividados em passivo e ativo da seguinte forma:

“A doutrina divide os superendividados em passivos e ativos. A primeira categoria se refere àqueles que não contribuíram ativamente para a situação de insolvência e não conseguem pagar suas dívidas por situações alheias à sua vontade, como desemprego, doença ou divórcio”.

“Já os superendividados ativos são aqueles que consumiram além das possibilidades permitidas por sua renda. Entre estes, há os que consomem de forma consciente sabendo, desde o início, que não conseguirão arcar com as dívidas contraídas e os que fazem de forma inconsciente, acreditando honestamente que conseguirão honrar suas obrigações mas que falham ao calcular o impacto das dívidas no seu orçamento, no mais das vezes verdadeiras vítimas da concessão irresponsável de crédito. O abrigo da lei é, reservado aos superendividados  passivos e aos superendividados  ativos inconscientes”.[17]

Hoje o aumento do superendividamento ocasiona uma preocupação aos economistas e juristas do Brasil, em virtude da retração do mercado de consumo causada pela perda do poder de compra do consumidor superendividado e a necessidade da Lei consumerista apresentar mecanismos capazes de reverterem essa situação, tais como: soluções conciliatórias administrativas e judicias entre fornecedores e consumidores; a criação de um sistema de insolvência civil próprio para as pessoas físicas consumidoras etc.

Ao analisar o superendividamento a Ilustre Profª. Cláudia Lima Marques apresenta o seguinte posicionamento:

“Desde 1995 alerto que o fenômeno se instala também em países emergentes e que o direito brasileiro está sendo chamado a dar uma resposta justa e eficaz a essa realidade complexa, principalmente se devemos distinguir superendividamento de pobreza em nosso País – basta citar os novos 50 milhões de clientes bancários! -, a forte privatização dos serviços essenciais e públicos, agora acessíveis a todos, com qualquer orçamento, mas dentro das duras regras do mercado, a nova publicidade agressiva sobre o crédito popular, a nova força dos meios de comunicação de massa e a tendência de abuso impensado do crédito facilitado e ilimitado no tempo e nos valores, inclusive com desconto em folha de aposentados, pode levar o consumidor a um estado de superendividamento. Como explicamos antes, há uma crise de solvência e de liquidez, que facilmente resultará em sua exclusão do mercado de consumo, parecendo uma nova espécie de morte civile, a “morte do homo economicus”.[18]

Dada às proporções do superendividamento no Brasil, uma Comissão de Juristas criada pela Presidência do Senado Federal, composta dentre eles pela Ilustre Profª Cláudia Lima Marques, apresentaram ao Senado o PLS 283/2012, cujo objetivo é prevenir o superendividamento da pessoa física; promover o acesso ao crédito responsável e a educação financeira do consumidor; apresentar medidas administrativas conciliatórias; a criação de um procedimento judicial de insolvência civil próprio para as pessoas físicas em situação de superendividamentos, dentre outras.

Nas palavras do Mestre Ardyllis Alves Soares, os benefícios apresentados pela insolvência civil da pessoa física consumidora são os seguintes:

“Um  regime de insolvência de pessoas físicas é esperado para atender a uma ampla gama de objetivos nas sociedades contemporâneas. Não mais um mecanismo orientado ao credor para o cobrança forçada de débitos das entidades comerciais insolventes, as leis de insolvência agora contemplam benefícios que fluem para devedores pessoas físicas. Prover auxílio para devedores “honestos, mas desafortunados” tem sido um primeiro motivo dos regimes de insolvência para pessoas físicas. Adicionalmente, e mais importante, tal  regime fornece benefícios à sociedade como um todo. Por conseguinte, um regime para tratar a insolvência de pessoas físicas não somente persegue os objetivos de reembolsar os credores individuais e realçar uma distribuição justa de pagamento entre a coletividade de credores, mas, sobretudo, tal regime persegue os objetivos de fornecer auxílio aos devedores e suas famílias e abordar questões sociais mais amplas. Na consecução destes objetivos, um regime para a insolvência de pessoas f´sisicas deveria esforçar-se para um equilíbrio entre os interesses concorrentes”.(…)

“Um aspecto essencial quando se projeta um regime formal para o tratamento da insolvência de pessoas físicas é a sua interação com sistemas informais que resolvem amigavelmente os problemas financeiros. Uma importante função de um sistema formal de insolvência é encorajar  negociação informal e resolução de situações de superendividamento pessoal”.

“Em muitos  países, os legisladores têm priorizado a prevenção de processos de insolvência formais, em parte para favorecer soluções negociadas para problemas de endividamento. Há vantagens para soluções consensuais: evita o estigma; menor  impacto adverso sobre as pontuações dos créditos de devedores; menores custos relativos a procedimentos formais de insolvência; melhores resultados para credores; menores custos de trabalho preparatório; maior flexibilidade para servir às necessidades do devedor e dos credores; e mais boa vontade das instituições financeiras em renegociar os empréstimos”.[19]

O PLS 283/2012 apresenta medidas e soluções que visam prevenir o superendividamento, bem como de reinserir o superendividado no mercado, concedendo-lhe crédito para o consumo e com isso o reaquecimento da economia; caso contrário, não só a pessoa física ficará superendividada mas a sociedade como um todo, pois numa sociedade capitalista de mercado o crédito e o consumo andam vinculados – sem crédito não há consumo de produtos e serviços e sem consumo não há lucro para os fornecedores e como consequência aumenta o desemprego, entre outros problemas sociais, econômicos e políticos.

A Ilustre Profª Joseane Suzart Lopes da Silva ao comentar o PLS 283/2012 a manifesta-se nos seguintes termos:

“O Projeto de Lei em exame trará inovações na parte geral do CDC, ampliando o rol de princípios e de direitos básicos do consumidor, reforçando também os instrumentos da Política Nacional das Relações de Consumo. O elenco de práticas e cláusulas abusivas também passará pelo crivo do acréscimo, estatuindo-se, como visto, incisos complementares, respectivamente para o art. 39 e 51 da Lei 8.078/1990. Três conjuntos de práticas abusivas foram propostos, dividindo-se entre as que obstaculizam o exercício do direito do consumidor de contestar cobranças abusivas; as que violam o direito do sujeito de não consumir quando assim entender; e as que violam o direito do sujeito de não consumir quando assim entender; e as que atingem a garantia de informação plena sobre a estrutura contratual. As cláusulas arbitrárias contempladas pela propostas são as seguintes: as que dificultam o acesso do consumidor à justiça; as que obstaculizam o exercício do direito de autodeterminação acerca dos seus vencimento e patrimônio; e aquelas que estabeleçam consequências ou obrigações iníquas a partir da conduta do consumidor ou do próprio fornecedor”.[20]

A aprovação do PLS 283/ 2012 trata-se de medida necessária para prevenir e impedir o aumento do superendividamento entre os consumidores-pessoas físicas consumidores, mediante soluções jurídicas capazes de restabelecerem crédito aos consumidores superendividados, reinserindo-os no mercado de consumo e assegurando-lhes o mínimo existencial à sua sobrevivência e a sua dignidade como ser humano.   

Conclusão:

Pelos argumentos apresentados vimos que o uso indiscriminado de cláusulas abusivas nos contratos de consumo pelos fornecedores, faz com que estes enriqueçam ilicitamente às custas dos consumidores, em contrapartida os consumidores-pessoas físicas, veem-se cada vez mais superendividados, impossibilitados de consumir e em algumas situações de retornarem ao mercado de consumo, em virtude das suas dívidas impagáveis que os colocam num estado de escravidão.

Por sua vez, a dívida acarreta a falta de crédito para o consumo, sem consumo os fornecedores não lucram e por não lucrarem, cortam gastos, demitem funcionários- aumentando o desemprego – o que contribui ainda mais para a retração do consumo e para o superendividamento. Logo, se não há crédito não há consumo e se não há consumo não há lucro.

Se não olharmos para o superendividamento como um problema social, econômico, político e jurídico, retrocederemos drasticamente na proteção do consumidor, ao ponto de negar-lhe a garantia do mínimo existencial à sua sobrevivência e a dignidade da pessoa humana. Nas palavras de Benjamin Barber: “Um sistema de mercado que reconhece apenas o lucro e trata todos os outros valores como superficialidades a serem ignoradas pode devastar uma civilização enquanto assegura o retorno de investimentos”.[21]

Diante do exposto, concluímos que se os fornecedores não mudarem suas posturas ilícitas quanto à inserção de cláusulas ilícitas nos contratos de adesão que oferecem aos seus consumidores estaremos condenados a uma “sociedade superendividada” e não a uma sociedade de mercado.

 

Referências
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DA SILVA, Joseane Suzart Lopes.  Superendividamento dos consumidores brasileiros e a imprescindível aprovação do Projeto de Lei 283/2012.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 1001/2015. p. 361-391. São Paulo, julho-agosto/2015.
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_______. A crise econômica brasileira e o superendividamento da população emergência do aprimoramento legislativo para a tutela social.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 101/2015. p. 387-433. São Paulo, setembro-outubro/2015.
_______. Algumas perguntas e respostas sobre prevenção e tratamento do superendividamento dos consumidores pessoas físicas.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 75/2010. p. 9-42. São Paulo, julho-setembro/2015.
SOARES. Ardyllis Alves. Conclusões do relatório do banco mundial sobre o tratamento do superendividamento e insolvência da pessoa física – resumo e conclusões finais.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 89/2013. p. 435-450. São Paulo. setembro-outubro/2013.
TOURAINE, Alan.  Após a crise: a decomposição da vida social e o surgimento de atores não sociais. . Petrópolis: Vozes, 2011.
 
Notas
[1] Elogio da loucura. L&PM, Porto Alegre, 2010, p. 76.

[2] O novo século: entrevista a Antonio Polito. Companhia das Letras, São Paulo, 2009, p. 101.

[3] Após a crise: a decomposição da vida social e o surgimento de atores não sociais. . Vozes, Petrópolis, 2011, p. 73 e 74.

[4] Superendividamento dos consumidores brasileiros e a imprescindível aprovação do Projeto de Lei 283/2012.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 1001/2015. Pag. 369. São Paulo, julho-agosto/2015.

[5] Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.

[6] Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo. 6ª Edição. Editora Forense, Rio de Janeiro, 2011, p. 10.

[7] Contratos no Código de Defesa do Consumidor: O novo regime das relações contratuais. 7ª Edição. Revista, atualizada e ampliada.  Editora Thomson Reuters Revista dos Tribunais, São Paulo, 2014, p. 79.

[8] Nas palavras do Profº. Nelson Nery Júnior: “O contrato de adesão não encerra novo tipo contratual ou categoria autônoma de contrato, mas somente técnica de formação do contrato, que pode ser aplicada a qualquer categoria ou tipo contratual, sempre que seja buscada a rapidez na conclusão do negócio, exigência das economias de escala”. Código Brasileiro de Direito do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 10ª Edição. Revista, atualizada e reformulada.  Editora Forense, Rio de Janeiro, 2011, p. 652.

[9] Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(…)IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços.

[10] Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: 
I – impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis; II – subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos casos previstos neste código; III – transfiram responsabilidades a terceiros; IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade; V – (Vetado); VI – estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor; VII – determinem a utilização compulsória de arbitragem; VIII – imponham representante para concluir ou realizar outro negócio jurídico pelo consumidor; IX – deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora obrigando o consumidor; X – permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; XI – autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que igual direito seja conferido ao consumidor; XII – obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor; XIII – autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração;  XIV – infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais; XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor; XVI – possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias (…).

[11] Súmula 381 do STJ: Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.

[12] Código Brasileiro de Direito do Consumidor: Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 10ª Edição. Revista, atualizada e reformulada.  Editora Forense, Rio de Janeiro, 2011, p. 570.

[13] Conforme nos ensina Cláudia Lima Marques: “O inciso IV do art. 51 combinado o §1º deste mesmo artigo constitui, no sistema do CDC, a cláusula geral proibitória da utilização de cláusulas abusivas nos contratos de consumo. O inciso IV, de nítida inspiração no artigo §9º da lei especial alemã de 1976 (hoje incorporado ao § 307 do BGB-Reformado, com o mesmo texto), proíbe de maneira geral todas as disposições que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”. As expressões utilizadas, boa-fé e equidade, são amplas e subjetivas por natureza, deixando larga margem de ação ao juiz – caberá, portanto, ao Poder Judiciário brasileiro concretizar através desta norma geral, escondida no inciso IV do art. 51, a almejada justiça e equidade contratual. Segundo renomados autores, o CDC,  ao coibir a quebra da equivalência contratual e considerar abusivas as cláusulas que coloquem o consumidor “em desvantagem exagerada”, está a resgatar a figura da lesão enorme e a exigir um dado objetivo de equilíbrio entre as prestações. Parece-me que a norma do inc. IV do art. 51 do CDC, com a abrangência que possui e que é completada pelo disposto no §1º do mesmo art. 51, é verdadeira norma geral proibitória de todos os tipos de abusos contratuais, mesmo aqueles já previstos exemplificativamente nos outros incisos do art. 51”. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: O novo regime das relações contratuais. 7ª Edição. Revista, atualizada e ampliada.  Editora Thomson Reuters Revista dos Tribunais, São Paulo, 2014, págs. 1021 e 1022.

[14] No art. 51, incisos IX, X e XIII do CDC estamos diante de condições puramente potestativa. Conforme o posicionamento do STJ, o conteúdo puramente potestativo do contrato impôs a uma das partes condição, apenas e tão-somente, de mero espectador, em permanente expectativa, enquanto dava ao outro parceiro irrestritos poderes para decidir como bem lhe aprouvesse. Disposições como essa agridem o bom senso e, por isso, não encontram guarida em nosso direito positivo. Entre elas está a chamada cláusula potestativa. É estipulação sem valor, porque submete a realização do ato ao inteiro arbítrio de uma das partes. STJ – 3ª Turma, REsp 291.631-SP, Rel. Min. Castro Filho, v.u. j. 4.10.2001, DJU 15.4.2002.

[15] EMENTA: CONTRATO. CLÁUSULA PENAL. EFEITOS. In casu, trata-se de contrato de compra e venda de imóvel, no qual o promitente-comprador (recorrente) obrigou-se a pagar o preço e o promitente-vendedor a entregar o apartamento no tempo aprazado. Porém, o promitente-vendedor não entregou o bem no tempo determinado, o que levou o promitente-comprador (recorrente) a postular o pagamento da cláusula penal inserida no contrato de compra e venda, ainda que ela tenha sido redigida especificamente para o caso do seu inadimplemento. Assim, cinge-se a questão em definir se a cláusula penal dirigida apenas ao promitente-comprador pode ser imposta ao promitente-vendedor ante o seu inadimplemento contratual. Na hipótese, verificou-se cuidar de um contrato bilateral, em que cada um dos contratantes é simultânea e reciprocamente credor e devedor do outro, oneroso, pois traz vantagens para os contratantes, comutativo, ante a equivalência de prestações. Com esses e outros fundamentos, a Turma deu provimento ao recurso para declarar que a cláusula penal contida nos contratos bilaterais, onerosos e comutativos deve aplicar-se para ambos os contratantes indistintamente, ainda que redigida apenas em favor de uma das partes. Todavia, é cediço que ela não pode ultrapassar o conteúdo econômico da obrigação principal, cabendo ao magistrado, quando ela se tornar exorbitante, adequar o quantum debeatur. (REsp 1.119.740-RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 27/9/2011).

[16] Preleciona Cláudia Lima Marques: “(…) o superendividamento é um estado da pessoa física leiga (o não profissional ou o não empresário, que pode falir), um devedor de crédito que o contraiu de boa-fé, mas que agora se encontra em uma situação de impossibilidade (subjetiva) global (universal e nã passageira) de pagar  todas  as suas dívidas atuais (já exigíveis) e futuras (que não vencer) de consumo com a sua renda e patrimônio (ativo) por um tempo razoável (a indicar que teria de fazer um esforço por longos anos, quase uma escravidão ou hipoteca do futuro, para poder pagar suas dívidas). Neste mesmo sentido, vale lembrar que a referida lei francesa (Code de la Consommation, no art. L. 330-1) define a situação de superendividamento de pessoas físicas-consumidores como caracterizada “pela impossibilidade manifesta do devedor de boa-fé de fazer face ao conjunto de suas dívidas não profissionais, exigíveis e vincendas”. Algumas perguntas e respostas sobre prevenção e tratamento do superendividamento dos consumidores pessoas físicas.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 75/2010. p.  12. São Paulo,julho-setembro/2015.

[17] A crise econômica brasileira e o superendividamento da população emergência do aprimoramento legislativo para a tutela social.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 101/2015. Pag. 388. São Paulo, setembro-outubro/2015.

[18] Contratos no Código de Defesa do Consumidor: O novo regime das relações contratuais. 7ª Edição. Revista, atualizada e ampliada.  Editora Thomson Reuters Revista dos Tribunais, São Paulo, 2014, p. 1404.

[19] Conclusões do relatório do banco mundial sobre o tratamento do superendividamento e insolvência da pessoa física – resumo e conclusões finais.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 89/2013. p. 436 e 437. São Paulo. Setembro-outubro/2013.

[20] Superendividamento dos consumidores brasileiros e a imprescindível aprovação do Projeto de Lei 283/2012.  Thomson Reuters Revista de Direito do Consumidor. Vol. 1001/2015. Pag. 370. São Paulo, julho-agosto/2015.

[21] Consumido. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2009. p. 169.


Informações Sobre o Autor

Poliana Moreira Delpupo

Doutoranda em Direito Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP e Mestre em Direito das Relações Econômicas pela Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro UGF – RJ. Bolsista Integral da CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


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