Direito civil constitucionalizado e humanizado

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Resumo O presente trabalho tem por finalidade realizar uma breve analise do Direito Civil brasileiro sob a ótica da Constituição Federal Brasileira de 1988, bem como quais as mudanças advindas com a promulgação do novo texto constitucional e suas implicações ao Código Civil de 2002, quais princípios constitucionais provenientes do texto constitucional que foram incorporados pela codificação civil e de que forma eles são aplicados.

Palavras-chave: Artigo. Direito Civil. Constituição Federal 1988. Reflexos do texto Constitucional. Direito Civil Constitucionalizado.

Abstract: The purpose of this paper is to conduct a brief analysis of Brazilian Civil Law from the point of view of the Brazilian Federal Constitution of 1988, as well as the changes resulting from the promulgation of the new constitutional text and its implications to the Civil Code of 2002, of the constitutional text that have been incorporated by civil code and in what form they are applied.

Keywords: Article. Civil right. Federal Constitution 1988. Reflections on the Constitutional text. Constitutional Civil Law.

Sumário: Introdução. 1. reflexo da constituição federal de 1988 no atual código civil – princípio da dignidade da pessoa humana. 2. princípio da função social. Conclusão. Referências

INTRODUÇÃO

O direito civil brasileiro, como se sabe teve suas origens históricas nas codificações europeias.

O direito romano, considerado como um termo histórico-jurídico se refere ao conjunto de regras jurídicas aplicáveis sobre os direitos nacionais europeus, perdurando até a contemporaneidade. São inúmeras as contribuições do direito romano para o nosso ordenamento jurídico, dentre elas a divisão do Direito em Público que regula as relações entre o Estado e a parte interessada e Privado, que atua nas relações jurídicas entre particulares.

Porém, conforme se nota, analisando as origens do direito civil, percebe-se claramente que ele sempre esteve ligado a regular as questões relativas à vida privada das pessoas. As matérias reguladas por esse ramo do direito nunca foi muito voltado ao lado público e social das relações, estando sempre distanciado dos almejos sociais e publicitas do direito constitucional.

O Código Civil de 1916, seguindo essa linha de regular apenas as relações privadas, cuidava das relações patrimoniais, desconsiderando as particularidades dos sujeitos. Havia preocupação apenas com o bem estar social das pessoas que detinham o poder, o que proporcionava um monopólio estatal da produção legislativa, tornando intensa a dicotomia entre o direito público e o privado, sendo isso reflexo de um pensamento individualista proveniente do século XIX com ideais da Revolução Francesa.

A busca por uma mudança de paradigma do direito civil vem sendo efetivada desde muito tempo, porém só se tornou mais efetiva com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que veio com essa tendência de acabar com a dicotomia entre direito público e direito privado que prevaleceu estanque durante muito tempo, trazendo um novo paradigma, um novo arcabouço para o conceito de família e consolidando a elaboração dos direitos da personalidade no âmbito do Direito de Família. Diante de tais esclarecimentos, pode-se extrair que a Constituição, como norma maior, balizadora do restante do ordenamento jurídico, deve ser o ponto de onde devem partir as demais. Não basta dizer que deverá ser o ponto de confluência; tudo deve partir e continuar trilhando o caminho permeado por ela e essa é a validade jurídica para a constitucionalização do Direito Civil que tem como consequência chave a elevação dos princípios fundamentais deste último ao plano constitucional.

Assim, após a promulgação do texto de 1988, inicia-se uma mudança na forma como é visto o Direito Civil, deixando de ser aquele ramo jurídico que regulamente apenas as relações privadas, onde o que o mais importa são as questões patrimoniais, ou o bem estar apenas de si próprio, para se pensar em um direito civil que apesar de regulamentar as relações privadas, onde o centro das relações são os interesses privados, tais interesses possam ser compatibilizados sob a ótica de uma função social dos direitos privados, sobre a possibilidade de se trazer para dentro das relações civilistas, um toque de social e público que poderá proporcionar o bem estar não apenas a um indivíduo, mas também da sociedade como um todo.

Pretende-se, com essa mudança de paradigma, não apenas investigar a inserção do direito civil na Constituição jurídico-positiva, mas os fundamentos de sua validade jurídica, que dela devem ser extraídos. Na atualidade, não se cuida de buscar a demarcação dos espaços distintos e até contrapostos. Antes havia a disjunção; hoje, a unidade hermenêutica, tendo a Constituição como ápice conformador da elaboração e aplicação da legislação civil. A mudança de atitude é substancial: deve o jurista interpretar o Código Civil segundo a Constituição e não a Constituição segundo o Código, como ocorria com frequência (e ainda ocorre).

Assim, com o advento do Código Civil de 2002, percebeu-se que o legislador, observando os preceitos contidos na Constituição, trouxe para dentro do Direito Civil e também ao processo civil os ideais constitucionais previstos em seu texto, sendo que em várias partes do diploma civil percebe-se a influência constitucional, através de princípios e outros ensinamentos, os quais serão vistos posteriormente.

1 – REFLEXO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 NO ATUAL CÓDIGO CIVIL – PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Os ensinamentos constitucionais encontram-se espalhados por todo o texto da codificação civil, ora como princípios a serem obedecidos, ora como normas de condutas a serem observadas, ora como formas de serem interpretadas as relações estabelecidas no âmbito privado. Aqui trataremos apenas de dois importantes instrumentos: o principio da dignidade da pessoa humana e o principio da função social.

Um dos grandes princípios que hoje se encontra enraizado dentro do Código Civil, é o principio da dignidade da pessoa humana, e com ele surge a força matriz e motriz de todo o ordenamento jurídico. Força matriz, pois de toda é da necessidade de uma existência digna que surge os preceitos legais, e força motriz, pois o desenvolvimento do sistema se dá, com o desenvolvimento digno. A dignidade é, portanto o foco de luz de todo o ordenamento e sistema. A constitucionalização do Direito Civil aponta para uma significativa mudança de eixo, do patrimônio à pessoa, a valorizar a principal beneficiária do direito civil, a saber, a pessoa humana, e não qualquer outro valor que possa substituí-la ou superá-la. Ocorre uma verdadeira humanização do direito civil, que apesar de ser tratado de forma tímida entre os artigos 11 e 21 do Código Civil, o aplicador do direito pode compensar tal fato aplicando-se às relações privadas a eficácia horizontal dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal.

Esse fenômeno se reflete na tendência atual de se reconhecer eficácia imediata e aplicação direta das normas constitucionais relativas aos diretos e garantias fundamentais nas relações entre particulares. Fenômeno de abrangência mundial, no Brasil, a Constituição Federal de 1988 apresenta importância fundamental. Os preceitos constitucionais referentes às liberdades e garantias se consagram como diretamente aplicáveis e vinculam tanto entidades públicas como privadas. Construíram-se, então, pontes axiológicas entre a CF e a legislação civil, fazendo com que as normas constitucionais incidissem diretamente sobre as relações privadas.

2 – PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL

Outro grande princípio constitucional que foi trazido da Constituição Federal para o Direito Civil, é o da Função Social, tanto da propriedade, quando da interpretação das cláusulas contratuais, conforme se nota nos ensinamentos do artigo 421 do Código Civil, que dispõe que na realização dos contratos a liberdade deverá ser exercida nos limites da função social.

Qualquer contrato que seja realizado, para que seja considerado constitucional, deve ser pautado e balizado pelos ditames da função social. Na atual codificação civil não se dá mais primazia apenas para o interesse individual de uma pessoa. Hoje se busca uma harmonização entre o interesse individual e o coletivo, de forma com que mesmo na realização de acordos de vontades, não se afaste também o cunho social do direito privado.

Quanto à propriedade, que anteriormente a esse movimento de humanização e socialização do direito civil, era vista como um direito individual da pessoa, em que essa poderia utilizá-la de qualquer maneira, desde que houvesse benefício individual e exclusivo, passa a ser vista sobre outra ótica. Uma ótica social, uma visão de que a propriedade é muito mais do que simplesmente um direito, do qual seu titular deve-se utilizar apenas para seu bem estar próprio.

 Assim, com essa mudança de paradigma do direito brasileiro optou por entre defender o valor individual da propriedade e o valor social, defender esse último.

É por isso que a Constituição Federal em seu artigo 5, inciso XXII, garante o direito de propriedade, mas no inciso em seguida, diz que a propriedade atenderá a sua função social.

Diante disto, a propriedade deve não mais só gravitar em torno dos interesses individuais; devem-se criar condições para que ela seja econômica, útil e produtiva, e que atenda o desenvolver econômico e os reclamos da justiça social.

A função social é intrínseca à propriedade privada, e o princípio da função social tem como objetivo conceder legitimidade jurídica à propriedade privada, tornando-a associativa e construtiva. Pode-se dizer que não basta apenas o título aquisitivo para conferir-lhe legitimidade.

O Código Civil de 2002 de forma a normatizar os preceitos constitucionais de função social da propriedade tratou em seu artigo 1228 de coibir o uso de forma abusiva da propriedade, afastando o individualismo, devendo a propriedade ser utilizada para o bem comum, conforme se vê pelo dispositivo transcrito abaixo:

“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

§ 1° O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

§ 2° São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.

§ 3° O proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público iminente.

§ 4° O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

§ 5° No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.”

Conforme § 1° do artigo 1.228 do Código Civil, que é uma inovação em relação com Código Civil anterior, o direito de propriedade é limitado para adequá-lo aos problemas da contemporaneidade, fazendo referência a questões como o equilíbrio ecológico e a poluição.

Também, admite-se a desapropriação, por necessidade ou utilidade pública ou interesse social e se facilitam os mecanismos jurídicos necessários para fazer efetiva a usucapião especial com fins de moradia, seja individual, seja coletiva (artigo 1.288, § 4o).

O artigo 1.228 do Código Civil é uma regra mais de direito público que de direito privado, pois opta, prioritariamente, por tutelar os interesses públicos e apenas, reflexamente, os interesses individuais. Isto é um reflexo das reações surgidas no final do século XIX contra o individualismo jurídico exacerbado, fazendo com que o Estado abandonasse a sua posição passiva e passasse a atuar mais ativamente na ordem socioeconômica, antes delegada à esfera do direito privado.

Ao afirmar que o direito de propriedade deve desempenhar uma função social, o Código Civil faz com que, havendo conflito entre o interesse público e o particular, possa fazer prevalecer o primeiro, em razão da supremacia dos interesses públicos sobre os individuais (princípio da finalidade pública). Com isso, torna-se uma regra mais de direito público do que de direito privado.

A finalidade do Código Civil não é incentivar a intromissão do Estado na propriedade privada, mas apenas impor limites à ação do proprietário, quando ele extrapola a esfera de seu direito individual, exigindo a interferência do Poder Público.

Conforme exposto, percebe-se claramente a presença de princípios constitucionais dentro do direito civil, e que foram normatizados no Código Civil de 2002 tendo sua aplicabilidade concreta, não sendo apenas um dispositivo normativo escrito em um papel.

CONCLUSÃO

É notória a transformação advinda com a Constituição Federal de 1988, no que tange as garantias resguardas proporcionando uma maior abrangência jurídica, pois foi assegura a aplicabilidade de princípios enquanto força normativa. Dessa forma, a constitucionalização proporcionou a consagração de normas de outros ramos de direito na Constituição Federal e também o dever de interpretar as normas infraconstitucionais de acordo com a Constituição Federal, por ser ela a norma estruturante e inaugural do Estado, sendo que a interpretação constitucional dada à legislação civil, não fica somente atrelada a direitos patrimoniais, mas se embrenha por todo o direito de família, pelo direito consumerista, dentre outras matérias, de forma que tal hermenêutica jurídica deve ser feita a luz dos preceitos constitucionais, e dessa forma toda vez que se aplica uma norma infraconstitucional, aplica-se em maior ou menor grau de abstração e concretude uma norma constitucional, vez que esta deve estar compatível com a Constituição Federal, sob pena de ser declarada inconstitucional e banida do ordenamento jurídico.

Diante de tudo quanto exposto pode-se inferir que esse fenômeno chamado de constitucionalização do Direito Civil provocou uma mudança deveras importante no âmbito do direito civil. A constitucionalização do direito civil, entendida como inserção constitucional dos fundamentos de validade jurídica das relações civis, é mais do que um critério formal de interpretação. Constitui a etapa mais importante do processo de transformação, ou de mudanças de paradigmas, por que passou o direito civil, de um Estado liberal para o Estado social.

 

Referências
BARROSO, Luis Roberto. O direito Constitucional e a efetividade de suas normas. 7. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2002.
GAGLIANO, Pablo Stole; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil: direito de família. São Paulo: Saraiva, 2011.
TARTUCE, Flavio; Manual de Direito Civil, volume único. São Paulo: Método, 2014.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
LÔBO, Paulo Luiz Netto, Constitucionalização do Direito Civil, em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/453/r141-08.pdf?sequence=4.
DUARTE, João Carlos; LANA Gustavo; ARMOND, Lorena Silveira Rezende; ROCHA, Cristiane Assis de Freitas, Constitucionalização do Direito Civil, em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/102-322-1-pb.pdf.
Cursos Intensivos I e II da Rede de Ensino LFG Professores Pablo Stolze e Cristiano Chaves, em: https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2526086/no-que-consiste-a-chamada-constitucionalizacao-do-direito-civil
REALE, Miguel, A constituição e o Código Civil, em: http://www.miguelreale.com.br/artigos/constcc.htm
GODINHO, Adriano Marteleto. O fenômeno da constitucionalização: um novo olhar sobre o direito civil, em: http://institutodcc.org.br/?page_id=539

Informações Sobre o Autor

Antonio Carlos de Siqueira Junior

Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça de Goiás Graduação em Direito pela Universidade Católica de Goiás. Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil pela Faculdade FEAD – Centro de Gestão Empreendedora


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