O direito do esporte e do movimento olímpico internacional

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Resumo: O presente artigo aborda aspectos gerais do Direito do Esporte, e suas facetas de direito privado, público e internacional. No plano internacional será citado o Movimento Olímpico Internacional, e a Carta Olímpica, como diploma que regula toda a relação entre os membros integrantes do Movimento, cujo expoente máximo é o  Comitê Olímpico Internacional.

Sumário: I Direito do Esporte: natureza privada pública nacional internacional ou mista. II Olimpíadas movimento olímpico internacional jurisdição desportiva e Carta Olímpica. III Conclusão

I) Direito do Esporte: natureza privada, pública, nacional, internacional, ou mista?

O Direito do Esporte (ou Direito Desportivo) possui uma natureza híbrida: em princípio, tem uma natureza privada (por exemplo, a criação de um clube de futebol, segundo regras de direito local); pouco a pouco, somaram-se os times, que formaram organizações esportivas, que por sua vez originaram as federações esportivas, o que transcende o âmbito meramente privado, e requer uma regulamentação por parte dos Estados e do Direito Internacional. Esse caráter originalmente privado, portanto, vai adquirindo matizes também de Direito Público e Direito Internacional.

O Direito do Esporte é relativamente novo, e está se expandindo; nota-se sua crescente importância a partir do marco criado pelos jogos olímpico de Seul em 1988 (no qual participaram mais de 8.453 atletas de 159 países, com 27 esportes e 237 eventos esportivos[1]), no qual se notou a crescente profissionalização das olimpíadas. Nos países anglo-saxões prevalece o caráter privado; já em outros, como Espanha, França ou Itália o Estado estabelece regras, empregando tintas de Direito Público ao esporte. Nesse caso, existem organizações esportivas de natureza privada, mas exercendo atribuições  delegadas pelo Estado.

Assim sendo, o Estado outorga às associações certos poderes públicos e além disso o monopólio na organização de torneios, mas conservando elementos de sua natureza privada. De acordo com o esporte, os governos subvencionam as delegações, segundo critérios de conveniência e oportunidade, como ocorre muitas vezes, dentre outros, no atletismo.

Como visto, o papel do Estado vai ganhando relevância no âmbito do esporte. Na Itália, por exemplo, foi criado em 1914 o Comitê Olímpico Nacional da Itália, que é regido por um Decreto de 1999 (com modificações posteriores)[2], que tem natureza pública e goza de muita autonomia. Entretanto, o esporte possui também uma relevante faceta internacional, e nesse sentido citem-se os tratados e convenções internacionais sobre o tema, bem como o Comitê Olímpico Internacional (COI), uma associação privada regida por regras do Direito Suíço, criada em 1894[3]. O COI sustenta sua autonomia em relação a todos os governos e pretende estabelecer suas próprias regras; isso reflete o embate entre as organizações internacionais e os governos (a título exemplificativo, se uma delegação de algum país infringe as normas aplicáveis, pode ser suspensa ou expulsa de competições pelo COI, cuja decisão é soberana e independente).

II) Olimpíadas, movimento olímpico internacional, jurisdição desportiva e Carta Olímpica

O COI é uma organização não governamental criada em 1984 com a finalidade de reinstituir e organizar os jogos olímpicos da Grécia Antiga, assegurar sua realização periódica, promovendo os valores olímpicos, com sede na Suíça, sendo a autoridade suprema do Movimento Olímpico.

É regido pela Carta Olímpica, originalmente publicada em 1908, com posteriores modificações.  O referido Comitê tem, entre suas funções, atuar como colaborador e mediador entre todos os outros integrantes do movimento olímpico, qual sejam: as Federações Internacionais Esportivas, os Comitês Olímpicos Nacionais, os atletas e corpo técnico, os Comitês Organizadores dos Jogos Olímpicos, além de outras organizações e instituições reconhecidas pelo COI (cf. arts 1.2 e 1.3 da Carta)[4].

A Carta Olímpica é a norma regulamentadora do Movimento Olímpico, contendo os princípios fundamentais, as regras e preceitos aplicáveis pelo COI, além de fixar as condições para a celebração dos Jogos Olímpicos e a participação nos mesmos. A Carta tem 61 artigos divididos em 6 capítulos. Segundo seus preceitos, qualquer pessoa ou organização que pertence, em qualquer condição, ao Movimento Olímpico, está sujeita às suas disposições e deverá acatar as decisões do COI. Segundo o art. 1.2, os principais constituintes do Movimento Olímpico são o COI, as Federações Internacionais Esportivas e os Comitês Olímpicos Nacionais.  Segundo dados do próprio COI, atualmente existem 204 Comitês Olímpicos Nacionais, distribuídos pelos cinco continentes.[5]

Por sua vez as Federações Internacionais formaram associações, como forma de facilitar o tratamento e a organização de temas comuns: Associação de Federações Internacionais Olímpicas de Verão, Associação de Federações Internacionais de Jogos Olímpicos de Inverno, Associação de Federações Internacionais reconhecidas pelo COI e a SportAccord (que também agremia outras federações esportivas). 

As Federações Nacionais, para serem reconhecidas, devem estar associadas a um Comitê Nacional que aceite a Carta Olímpica. Note-se que nos jogos olímpicos não competem países, e sim atletas. No entanto, caso algum governo por intermédio de alguma norma ou decisão de autoridades, mostra-se contrário à Carta, o Comitê Olímpico Nacional correspondente poderá ser excluído e, portanto, não se permite que atletas desse país possam participar, o que demonstra um viés político nas decisões do COI; ademais, por motivos políticos ou ideológicos um país pode deixar de participar nos jogos olímpicos. Exemplificativamente, não participaram dos jogos de Moscou  de 1980 nenhum atleta norte-americano, e em resposta, nos de Los Angeles em 1984 não participaram atletas da ex-URSS; a África do Sul foi excluída dos jogos olímpicos a partir das olimpíadas de Tóquio de 1964, pela prática do apartheid, somente readmitida nos jogos de Barcelona em 1992[6].

Quando uma cidade é eleita para sediar os jogos olímpicos, constitui-se um Comitê Organizador, e este comitê é quem responde perante o COI, e não o Estado; sediar os jogos olímpicos está condicionado ao cumprimento dos compromissos assumidos, o que significa que a decisão poderá ser revogada em caso de descumprimento.

O COI detém os direitos de exploração dos jogos olímpicos, e isso significa, dentre outros, que pode vender os direitos de transmissão dos jogos, os patrocínios, artigos comemorativos, sendo estas as suas fontes de recursos. Não obstante, as Federações Internacionais detêm os direitos de exploração dos eventos que organiza (como a FIFA, nas Copas do Mundo), o que lhes garante autonomia.

Para participar dos jogos olímpicos, cada atleta deve a aprovação do COI, ou seja, não basta ser selecionado pelo Comitê Olímpico Nacional. Além disso, os atletas aderem a certas regras, como submeter-se à jurisdição do COI, bem como não fazer declarações de qualquer classe em nome de seus governos (declarações políticas).

O quadro de sanções da Carta Olímpica (arts. 59 a 61) alcança a todos os envolvidos como membros do COI, desportistas, times, membros da delegação, jurados, Federações Internacionais e Comitês Olímpicos Nacionais. Como dito, pode ser retirado de um Comitê Olímpico Nacional o direito de realizar os jogos olímpicos; os atletas e demais participantes dos jogos podem ser suspensos ou excluídos (e é prevista inclusive a devolução de medalhas e certificados eventualmente obtidos).

As decisões do COI são auto-aplicáveis, definitivas, e inatacáveis após 3 anos do encerramento dos jogos olímpicos (art.  60 da Carta); isso se contrapõe às Constituições de muitos Estados, pois a tutela judicial efetiva deve alcançar  a todos. No caso do Brasil, a própria Constituição Federal consagra a inafastabilidade da tutela jurisdicional no art. 5º, inc. XXV (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”), entretanto prevê mais adiante, no art. 217, a necessidade de esgotamento das vias internas nos tribunais desportivos (“O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei”).

III) Conclusão

Como visto, pode-se afirmar que o Direito do Esporte possui natureza jurídica hibrida, pois  reúne aspectos de direito privado, de direito público e de direito internacional; trata-se de uma área que vem adquirindo uma relevância cada vez maior, e que requer uma regulamentação dos diversos aspectos relacionados ao fenômeno esportivo.

Nesse sentido, citem-se as olimpíadas como momento crucial do esporte em âmbito mundial, o que demonstra a relevância do seu expoente máximo, o Comitê Olímpico Internacional, bem como dos demais integrantes do Movimento Olímpico Internacional. A Carta Olímpica caracteriza-se como verdadeira Constituição Mundial sobre o tema, regulamentando o complexo relacionamento entre esses integrantes do Movimento, trazendo princípios gerais, regras organizacionais, jurisdicionais e disciplinares.

 

Notas:
[2] Para maiores informações consultar http://www.coni.it/it/home/il-coni.html. Acesso em: 22/04/2014.

[3] Para maiores informações consultar http://www.olympic.org/about-ioc-institution?tab=organisation. Acesso em: 22/4/2014.

[4] The three main constituents of the Olympic Movement are the International Olympic Committee (“IOC”), the International Sports Federations (“IFs”) and the National Olympic Committees (“NOCs”).
In addition to its three main constituents, the Olympic Movement also encompasses the Organising Committees of the Olympic Games (“OCOGs”), the national associations, clubs and persons belonging to the IFs and NOCs, particularly the athletes, whose interests constitute a fundamental element of the Olympic Movement’s action, as well as the judges, referees, coaches and the other sports officials and technicians. It also includes other organisations and institutions as recognised by the IOC.


Informações Sobre o Autor

Marco Aurélio Mellucci e Figueiredo

Procurador Federal. Graduado pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – Universidade de São Paulo USP. Mestre em Direito Público pela Universidad Complutense de Madrid


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